Política

Vitória de Tite
é compulsória?

DANIEL LIMA - 02/08/2024

Salvo hecatombe fora de qualquer laboratório sismológico eleitoral, a vitória de Tite Campanella em São Caetano é compulsória na disputa em outubro próximo. Uma composição partidária que juntou duas peças entre três com maior porção do eleitorado numa cidade que só conta com um turno de disputa acabou há muito tempo com qualquer perspectiva de a oposição triunfar.

Por isso, a pesquisa do Instituto Paraná divulgada esta semana pelo Diário do Grande ABC é espécie de desperdício de papel e de tinta, assim como foi a própria investigação eleitoral.

Só se admite algo em contrário a essa conclusão se o mundo de São Caetano virar do avesso. Mas para virar do avesso seria preciso que São Caetano não fosse São Caetano, uma cidade de identidade municipal homogeneamente forte, um nicho  concentrado num território exíguo e que não passa chega a 8% da população da região. Pensar em eleições na região sem distinguir São Caetano do mapa médio regional é falta de sensibilidade e de conhecimento.

São Caetano é a mais vistosa ilha do Arquipélago Cinza de uma região que de região não tem nada em forma de instituições integradas.  São Caetano e um mundo à parte especial do mundo à parte de cada parte municipalista da região.

Sem exagero, e sempre ressaltando que as eleições só acabam quando terminam, as autoridades já deveriam entregar o diploma ao indicado do prefeito José Auricchio Júnior.

INTERFERÊNCIA PETISTA

É claro que estou forçando a barra, que se trata de uma brincadeira, mas uma brincadeira que dá a dimensão do que é uma eleição em São Caetano.

O desenho fora de contornos previsíveis que eclodiu neste século em São Caetano, e que que colocou um suposto oposicionista na Prefeitura, com a vitória do médico Paulo Pinheiro, só ocorreu mesmo porque dois fatores influenciaram. 

Não custa revisitar a história ocorrida em 2012. O PT Federal e especialmente de São Bernardo tinha tanta bala na agulha para influenciar as eleições municipais na região que investiu pesado na campanha de Paulo Pinheiro contra a candidata Regina Maura Zetone, discriminada por boa parte do eleitorado durante um campanha difamatória que invadiu salões de beleza e outros redutos femininos.

Essa é uma história que os políticos de  São Caetano detestam contar porque se utilizaram de meios pouco éticos para sabotar Regina Maura.

DOIS CONTRA UM

O placar oficial da pesquisa noticiada pelo Diário do Grande ABC, que considera o cenário em que de fato vão se enfrentar os dois principais candidatos, o situacionista Tite Campanella e o jovem adversário Fabio Palacio, pela terceira vez na disputa, não deixa dúvida: os 45,5% a 28,3% de votos com margem de erro de 3,9 pontos percentuais dão a dimensão do quanto um concorrente está muito à frente do outro.

Num experimento sem sentido técnico, mas que de alguma forma lança luzes à confirmação de um cenário de amplo domínio situacionista, Regina Maura Zetone, secretária de Saúde durante muito tempo e uma vez candidata derrotada à Prefeitura, fica atrás de Fabio Palacio pelo placar de 38% a 21,4%.

Essa equação estranha levada a campo pelo Instituto Paraná, porque Regina Maura não encabeça chapa alguma,  revela dois pontos que confirmam a premissa de que a disputa eleitoral em São Caetano é uma barbada.

Primeiro, Regina Maura segue sendo vítima do conservadorismo de uma São Caetano de mais idosos do que jovens e a participação feminina na politica não tem os níveis de aprovação como em outros endereços de idade média e costumes menos semelhantes.

JUNTANDO AS PEÇAS

Parte maior do eleitorado de São Caetano não gosta de mulher na politica de São Caetano. E essa mulher tem nome e sobrenome. E um passado atacado por adversários implacáveis.

Segundo, o fato de Regina Maura formar dupla do Paço Municipal, reforçou uma chapa que comeu pelas beiradas eventual potencialidade de Fabio Palacio ganhar musculatura ante a divisão de forças.

O ajuntamento entre Tite  Campanella e Regina Maura Zetone tem o encaixe perfeito no sentido de competitividade. Junta-se um político emblemático de um dos orgulhos de São Caetano, no caso o movimento emancipacionista nada benéfico à regionalidade desejada, e a porção menos conservadora de um eleitorado feminino que não abriria mão da questão de gênero.

O matriarcado em São Caetano também teria relativa força que se contraporia ao machismo político-eleitoral. Uma espécie de resistência resiliente. Deveria ser objeto de estudos.  

TURNO DEFINIDOR

O ponto central das disputas em São Caetano é mesmo o turno único, reservado a municípios com menos de 200 mil eleitores. São Caetano não passa de 160 mil moradores. Com três candidatos potencialmente fortes, quem fica com duas partes fica com a maior parte.

O segredo revisional seria uma inversão de composição, com Tite  Campanella e Fabio Palacio frequentando o mesmo barco. Ou mesmo como concorrentes em raias distintas, inclusive com a participação individual de Regina Maura.

O grupo do prefeito José Auricchio não é bobo nem nada. Sabe que quem parte e reparte e no caso específico não fica com a soma de duas das três partes é concorrente a qualquer premiação que tenha a estupidez eleitoral como coroamento.

Só haveria uma possibilidade dessa composição de dois terços para cá e um terço para lá não dar resultado esperado em forma de vitória a homologar. Seria preciso que o prestígio do prefeito não fosse uma rocha plantada no coração dos moradores.

FORTALEZA DE APROVAÇÃO

Nada menos que 68,8% dos eleitores de São Caetano estão com José Auricchio. Número semelhante ao que tanto Paulinho Serra quanto Orlando Morando, também eleitos em 2016, obtêm em Santo André e São Bernardo. A maquina de cada centro de poder Executivo nos três municípios mais tradicionais da região funciona a toda prova. O juízo de valor administrativo é de dada observador ou morador ou eleitor ou consumidor. Seja o que for.  

São Caetano é o endereço regional mais bem equilibrado socialmente. Conta com porções mais aderentes de ricos, classe média, classe média precária e pobres/miseráveis.

As perdas econômicas nas duas últimas décadas, que seguiram as duas décadas anteriores do século passado, não feriram de morte o orgulho de viver num território de 15 quilômetros quadrados bem cuidados em zeladoria e atendimento público.

Solavancos na área de saúde, especialmente, só provariam que o Estado em forma de Município mesmo num Município com tantos recursos por habitante não resiste à demanda social cada vez maior. Sobretudo onde, caso de São Caetano, idosos são porções cada vez mais expressivas no conjunto da população.

MODELO APERFEIÇOADO

Sucessor de Luiz Tortorello, morto em dezembro de 2004, José Auricchio aperfeiçoou o modelo de gestão de São Caetano. Há uma extensa teia de ações que mantém aproximações e interações entre a Administração e representantes sociais. O Executivo não se descola da sociedade. Pode-se condenar ou não a engenharia estatal-sociedade, mas é funcional e operacional.  

Mesmo na derrota de 2012, com o dinheiro do PT de São Bernardo, São Caetano resistiu a qualquer movimento mais brusco. Até porque o prefeito eleito em nada diferia da modelagem da própria cidade. Não era um petista, mas um encabrestado pelo PT. O mesmo PT que jamais dirigiu São Caetano.

O PT não conseguiu vencer em São Caetano nem em 2004, quando Lula da Silva era presidente e o partido nunca foi tão votado em toda a região. O petista  Amilton Lacerda perdeu para José Auricchio por 45,% a 34,5%. Jamais o PT repetiria algo semelhante. Em 2020, o petista João Moraes não passou de 1,81%, enquanto o PSOL de Horácio Neto registrou 4,33%.  

TEMPO PROTOCOLAR

Os dois meses que restam para a abertura das urnas em São Caetano se configuram, portanto, apenas protocolares. Nada, entretanto, que leve o candidato Fabio Palacio a jogar a toalha ou apanhar o sabonete no solo.

Talvez o maior erro do candidato tenha sido não perceber que para chegar ao controle do Executivo como titular do cargo o melhor caminho é entender que o turno único e o poder mandante precisam ser observados como obstáculos a contornar, inclusive com aproximação estratégica. Tite Campanella executou esse trajeto. São Caetano de movimentos discretos e secretos não admite manobras bruscas.



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