Política

PT declara guerra
em São Bernardo

DANIEL LIMA - 13/08/2024

No Festival de Barbeiragens que Assolaram a Entrevista do deputado estadual Luiz Fernando Teixeira no podcast do Diário do Grande ABC, o candidato do PT à Prefeitura de São Bernardo deixou sacramentado com  série de hostilidades o quanto confia no passado específico e despreza o futuro suscetível a mudanças.

Luiz Fernando Teixeira desconhece ou finge desconhecer que passado nem sempre se reproduz no futuro quando a vontade do povo se manifesta, ou deveria se manifestar.  Especialmente nas disputas eleitorais. Especialmente quando um presidente eleito é fruto de uma frente ampla ante um presidente desgastado, uma frente ampla que se desfaz a cada dia no presente que sempre chega.

Luiz Fernando Teixeira transformou a disputa de outubro em São Bernardo no surrado repto de “nós contra eles”. No caso, o “nós”, claro, é o PT, e os demais, Flávia Morando, Marcelo Lima e Alex Manente, formam o pelotão do “eles”. Como se os três não fossem mutuamente adversários.

POÇO DE CONTRADIÇÕES

Luiz Fernando Teixeira não poderia ter sido mais incauto, para não dizer imprevidente, ou negligente, ou precipitado. Nem se o presidente Lula da Silva nadasse nas águas cálidas de prestígio intocável Luiz Fernando Teixeira poderia ter sido tão afoito.  

Juro por todos os santos que toda vez que vejo algo relacionado a Luiz Fernando Teixeira como representante público procuro ter a maior boa vontade de mundo. Não quero que impressões e conclusões anteriores contaminem as impressões e conclusões posteriores. É uma missão quase impossível.

Luiz Fernando Teixeira é um poço de contradições, uma montanha de irrealismos, um lago de subterfúgios e uma cascata de ilações improcedentes. Fosse uma força da natureza, seria uma catástrofe.

Ao se declarar o único candidato de esquerda de São Bernardo, especificamente o lulista, e ao decretar que os demais concorrentes são todos bolsonaristas e, portanto, adversários inconciliáveis, Luiz Fernando Teixeira aposta na superioridade numérica dos eleitores de São Bernardo, como se fosse um Lula replicado.  Ele mesmo diz isso. Diz e reafirma. Reafirma e aparentemente aposta a vida que terá sucesso.

E AS COMPOSIÇÕES?

Dissesse o tempo todo isso como disse na entrevista, o máximo que se poderia alegar em forma de crítica é que Luiz Fernando Teixeira teria fechado as portas a eventuais composições no segundo turno.

Mas Luiz Fernando Teixeira foi além: recriminou a todos que, segundo ele, tiram a disputa de São Bernardo do tablado municipalista de São Bernardo. Ora, bolas: ele nacionaliza a eleição em São Bernardo com o socorro eleitoral de Lula da Silva e paralelamente municipaliza com um discurso interno. Isso é coisa de maluco eleitoral.

Alega o candidato petista em São Bernardo que São Bernardo é petista por natureza e que portanto, subentende-se, não tem com que se preocupar ao tipificar os concorrentes como adversários petistas.

Pode parecer ao leitor destas linhas que eu tenha sido descuidado ao repetir palavras desnecessariamente, mas o faço de propósito para acentuar o grau de convicção do petista.

Luiz Fernando Teixeira afirma peremptoriamente que São Bernardo é uma cidade petista. Luiz Fernando Teixeira tem meia-razão. São  Bernardo é uma cidade tão petista quanto não-petista. É uma cidade dividida entre “nós e eles”. Entre avermelhados e amarelados. Antes do fenômeno direitista de Jair Bolsonaro, era uma cidade metade vermelha, metade azulada dos tucanos.

JOGO DIFERENTE

Para tentar justificar empiricamente a afirmação, Luiz Fernando Teixeira se vale dos números eleitorais da disputa presidencial e aos parlamentos estadual e federal em 2022, quando Lula da Silva foi eleito presidente e os quadros do partido na Assembleia Legislativa e na Câmara Federal foram representativos.

A retórica do deputado sobre a prevalência vermelha em São Bernardo, inclusive ou principalmente do ponto de vista eleitoral, é tão válida quanto invalida.

Na disputa anterior para os mesmos cargos, os petistas de São Bernardo sofreram duras derrotas. Nas duas corridas à Prefeitura, Orlando Morando ganhou de lavada. Mesmo  com o prefeito incumbente Luiz Marinho apoiando um petista à sucessão. O agora amarelo e o vermelho de São Bernardo, em partes iguais, não resistem a intempéries econômicas. 

VOLTANDO NO TEMPO

O PT de 2016 veio de um desastre chamado Dilma Rousseff e dos escândalos de corrupção e o PT de 2020 foi varrido como tantos outros partidos nas disputas locais  por enfrentarem incumbentes protegidos pela Covid-19 de baixa mobilidade social e eleitoral.

Mesmo na disputa presidencial de 2022, quando Lula da Silva foi eleito presidente, o resultado em São Bernardo não diferiu demais do resultado regional e nacional. Foram 53,83% a 46,95%, diante de um placar regional de 51,97% a 48,03%. Em Diadema, a cidade mais avermelhada da região, o placar favorável ao PT de Lula da Silva foi 60,02% a 39,98%.

Possivelmente ao se declarar adversário dos três concorrentes em São Bernardo, Luiz Fernando Teixeira tenha se confundido e entendido que é candidato à Prefeitura de Diadema que, há mais de 40 anos, é governada pela esquerda, exceto nos dois mandatos de Lauro Michels sob o patrocínio dos descalabros de Dilma Rousseff e das trapalhadas avermelhadas locais.

Também o petista Luiz Fernando Teixeira (e agora chego mais focalmente à questão temporal) se descuidou dos últimos dados de pesquisas em São  Bernardo. Esqueçam os resultados individuais dos concorrentes. Mirem nos dados de aprovação e reprovação tanto do presidente Lula da Silva quanto do governador Tarcísio de Freitas.

REALIDADE PREOCUPANTE

O Instituto Paraná detectou que há empate técnico de eleitores de São Bernardo que aprovam e desaprovam o governo de Lula da Silva. O resultado é de 48,1% que aprovam e 47,6% que reprovam. Já o governador Tarcísio de Freitas conta com 61,9% de aprovação e 33,2% de reprovação.

Convém lembrar que os dados de São Bernardo não são ilha de exceção na região. Nos demais municípios locais, ao responderem à mesma questão, os eleitores são declaradamente mais tarcisistas do que lulistas quando aprovação e reprovação são indexadores de sucesso.

Quem acha que isso não vai influenciar nos resultados de outubro, primeiro e segundo turno, que se apresente ao pelotão de fuzilamento de alto risco opinativo para execução automática.

Esse é o ponto à atenção especial quando afirmo que Luiz Fernando Teixeira imagina que o tempo é o senhor do tempo e que o tempo do passado não altera nada no futuro.  O desgaste do presidente Lula da Silva é natural de  mandatário, ainda mais num País em que promessas eleitorais não combinam com orçamento estrangulado.

ESTADO MANIETADO

Não passa de 10% o total do dinheiro de impostos escorchantes do Estado brasileiro fora do enquadramento obrigatório de despesas. É uma ninharia que transforma obras e intervenções públicas em promessas desanimadoras.

Não existe no horizonte próximo da politica nacional reverberação de potencialidades teóricas que indique intervenção tão profunda e imediata capaz de mudar o ambiente político-eleitoral a ponto de impactar tendências municipais.

E no caso de São Bernardo, já que é esse o assunto despertado na entrevista de Luiz Fernando Teixeira, se a bola já ficou praticamente dividida nas eleições presidenciais de 2022, quando o então presidente Jair Bolsonaro teve uma frente ampla a obstá-lo, o que dizer agora que o PT perde aliados e entra na disputa nacional fragmentada em municípios com muitos ônus, entre os quais o cadáver de Nicolás Maduro?

TERCEIRO TURNO

Ainda sobre a disputa presidencial de 2022, convém lembrar o que escrevi nos dias seguintes e que poderia ser também objeto de cautela do deputado Luiz Fernando Teixeira. No que chamei de terceiro turno, tanto Jair Bolsonaro quanto Tarcísio de Freitas obtiveram mais votos que Lula da Silva e Fernando Haddad, situação que reduziu a diferença na disputa presidencial e ao governo do Estado.

O terceiro turno precisa ser entendido como um corte no qual só utilizei os votos excedentes dos candidatos finalistas. Votos excedentes são os votos adicionais que os candidatos receberam em relação ao primeiro turno. Foram votos dos demais concorrentes tanto à Presidência quanto ao governo do Estado, concorrentes que não chegaram à finalíssima. Nessas porções de votos, Bolsonaro e Tarcísio prevaleceram.

Especificamente em São  Bernardo, a diferença favorável a Lula da Silva em relação a Bolsonaro no primeiro turno,  com todos os concorrentes,  chegou a 11,15 pontos percentuais. Foram 49,17% a 38,02%. Na finalíssima entre os dois mais votados, a diferença caiu para 7,66 pontos percentuais. Bolsonaro subiu para 46,17% e Lula somou 53,83%.

Na disputa estadual, Fernando Haddad venceu o primeiro turno por diferença de 12,58 pontos percentuais e no segundo turno a diferença caiu para 7,72 pontos percentuais. No primeiro turno Haddad venceu Tarcísio de Freitas por 44,82% a 32,24% e no segundo turno o resultado foi 53,81% a 46,19%.

PARMEABILIDADE

Tomar o amplo retrato das urnas de 2002 e transplantá-lo integralmente a outubro deste ano parece, portanto, uma ação de alto risco. Sobremodo porque, e isso ficou evidenciado já naquela oportunidade, havia uma banda estreita mas significativa de eleitores mais permeáveis à direita, centro-direita e centro.

A perda de prestigio de Lula da Silva nos números do Instituto Paraná não é obra do acaso. O poder encanta mas também desgasta. Principalmente nestes tempos de mídias sociais que repercutem alinhamentos muito além das divisas nacionais. E que se refletem no ambiente municipal. Não somos uma ilha.

Diferentemente disso. São Bernardo e a região são uma Gata Borralheira universal, não mais apenas uma esquizofrenia por causa da vizinhança com a Capital.  

Por fim, e deixei essa outra conclusão de propósito para o fecho desta análise, é mais que provável que a exortação ao petismo como fonte de eleitorado suficiente para tornar a candidatura de Luiz Fernando Teixeira uma aposta de sucesso tenha uma estratégia: o candidato precisaria de qualquer forma do eleitorado exclusivamente petista para chegar entre os dois finalistas numa disputa dividida por quatro concorrentes.

MANENTE SALVARIA?

O problema é o dia seguinte, claro: terá de convencer um ou dois grupos dos três derrotados a dar uma força suplementar no turno decisivo. Não é difícil que tenha o aval de Alex Manente, sempre uma linha auxiliar a quem pretende chegar ao Paço Municipal.

A desidratação de Manente é praticamente certa. Como sempre ocorre. Luiz Fernando ressaltou esse fenômeno durante a entrevista. Alex Manente é escravo da memória eleitoral, que, em geral, esmaece na medida em que o jogo vai ficando quente.

Sobre as declarações do candidato petista no campo econômico, a narrativa que nega o fracasso de Dilma Rousseff e os estragos no PIB da região é uma anedota de péssimo gosto ético-social.

Luiz Fernando Teixeira disse com a singeleza dos caras de pau que Dilma foi boicotada e levada ao cadafalso do impeachment por adversários terríveis, além de circunscrever a São Bernardo, por responsabilidade do prefeito Orlando Morando, a derrocada econômica que, todos sabem, atingiu duramente toda a vizinhança -- além do País, mesmo que de forma menos homogênea. Luiz Fernando Teixeira é um assombro..



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