Política

Criminalizar Zacarias
é anedota ou golpe

DANIEL LIMA - 24/07/2024

O que poderia ser chamado de incidente politico no último sábado durante a inauguração do Cine Lyra, em Paranapiacaba, tem desdobramentos esperados. Tudo muito natural em período de caça aos votos.

A tentativa de criminalizar uma barbeiragem de Luiz Zacarias, candidato oposicionista em Santo André, autor da façanha de se colocar na cena de um crime que não se consumou, faz parte do jogo da partidarização,  inclusive da mídia partidarizada.

Por conta disso, decidi traçar  mapeamento sobre pontos relevantes do Caso Zacarias. São aspectos que precisam ser levados em conta pelos leitores e eleitores de CapitalSocial.

Há sincronismo de fontes de informações para lubrificar as engrenagens da fantasia lunática de que Luiz Zacarias, o trapalhão da ocasião, cometeu crime que o retiraria da disputa eleitoral de outubro em Santo André. Nada mais estúpido, mesmo se reconhecendo que a Justiça Eleitoral está longe de ser uma fonte de sincronia de legalidade impressa, submetida em muitas situações, de alcance abrangente no campo partidário, a interpretações que agridem a lógica.

BASE FRÁGIL À CASSAÇÃO

Mesmo assim, ou seja, com a subjetividade interpretativa que muitas vezes a Justiça Eleitoral trata questões que nem mesmo deveriam ser apreciadas, é de se acreditar que a eliminação de qualquer resquício de penalidade a Luiz Zacarias, explicitada por provavelmente a maior autoridade do campo jurídico-eleitoral, seria o complemento e a finalização do palco invadido inadvertidamente – aliás, tão inadvertidamente que a iniciativa descuidada  salvou o candidato do PL de complicações.

Acompanhe na sequência os fatores  mais relevantes à compreensão do que se deu às claras e não no escurinho do cinema em Paranapiacaba. Falta uma lanterna de luminosidade aos fraudadores dos fatos e aos fanáticos de torcidas organizadas. 

1. DESCUIDO POLITICO.

2. PROTEÇÃO LEGAL.

3. PAÇO SOFRÍVEL.

4. EFEITOS COLATERAIS.

5. MÍDIA SELETIVA.

6. CASO JOE BIDEN. 

Expostos os seis pontos aparentemente mais importantes do Caso Zacarias , nada melhor que os destrinchar: 

1. DESCUIDO POLITICO 

É impossível eliminar a presença do candidato Luiz Zacarias do enquadramento de descuido monumental, mas nem por isso fatal, no palco do Cine Lyra. Sorte se contar com o apoio de Jair Bolsonaro e provavelmente do governador Tarcísio de Freitas num eventual segundo turno, caso não se registre resquício algum de fatos que o coloquem na cena do descuido como protagonista.

Se houvesse gravação ou fotos que tornassem Luiz Zacarias participante efetivo da inauguração da reforma do espaço cultural, estaria infringindo para valer a legislação eleitoral. Aí não teria como se sustentar. Já teria data marcada para perecer eleitoralmente. Como não existe nada disso, até porque o cenário sonhado pelo Paço Municipal não se efetivou de fato, tudo não passa mesmo de especulação, de forçada de barra.

2. PROTEÇÃO LEGAL

A legislação eleitoral brandida pelo especialista Alberto Rollo é suficiente para tornar Luiz Zacarias alvo fora do alcance de irregularidades. Nome na ponta da língua como sinônimo de desembaraçador de novelos de campanhas rumo a qualquer cargo que tenha  participação popular, Alberto Rollo expressou secundariamente nas páginas do Diário do Grande ABC de segunda-feira o conjunto de parágrafos que retira Luiz Zacarias de qualquer ilicitude que possa prosperar.

Secundariamente significa que suas importantes declarações, que barram de imediato qualquer desdobramento do caso, nem foram alçadas ao título principal e também a qualquer referência de destaque editorial. Foram trechos quase que burocraticamente jogados no últimos parágrafos da reportagem.

Antes mesmo da entrevista esclarecedora de Alberto Rollo, as redes sociais antecipavam o estágio legal da trapalhada de Luiz Zacarias. A legislação eleitoral é claríssima na definição técnica do caso como de menor gravidade e, portanto, sem qualquer possibilidade de provocar mais dores de cabeça ao  oposicionista do PL.

É preciso contar com elevado grau de fanatismo, típico de torcedores organizados, para levar a sério a  esperteza tosca de encontrar um fio de cabelo de irregularidade onde a calvície de provas é impiedosamente alexandrina.  

Mas tudo isso faz parte do show democrático muitas vezes patético de dar corda a suposta ilegalidade com o objetivo eleitoral de confundir a plateia. Integra, portanto, o enredo previsível, à falta de enredo plausível. 

3. PAÇO SOFRÍVEL

O Paço de Santo André errou duas vezes no Caso Zacarias, a primeira com certo exagero no desenho hipotético deste jornalista, enquanto a segunda sem qualquer redutor de patetice.

No caso do exagero, trata-se do seguinte: o cerimonial do evento em Paranapiacaba poderia ter preparado uma armadilha a Luiz Zacarias. Sem assessores jurídicos e impetuoso como todo político que quer ganhar espaço em situações análogas, Zacarias teria caído feito patinho na lagoa se houvesse sido chamado ao palco. E participado ativamente da cerimônia. Aí estaria perdido no mundo eleitoral. Sem choro nem vela, muito menos fita amarela.

Agora vamos a uma situação mais que projetável, porque praticamente obrigatória para assessores cuidadosos da candidatura de Gilvan Junior. Trata-se, claro, da ostensiva declaração ao Diário do Grande ABC, edição de segunda-feira, do candidato situacionista Gilvan Júnior, ao dar conta de que iria ao Judiciário Eleitoral em busca do afastamento de Luiz Zacaria por cometimento de pretenso crime eleitoral.

Mais bem orientados, os demais concorrentes ouvidos pelo jornal ficaram na moita da discrição e de julgamentos precipitados. Não se expuseram declaradamente favoráveis ao ingresso na Justiça Eleitoral,  como o fizeram os assessores de Gilvan Júnior.

Traduzindo tudo isso: a antipatia que transita na mesma pista de temores, para não dizer de horrores, é o rescaldo compulsório que pesa, nesse incidente, na conta eleitoral de Gilvan Júnior. Pior que isso, ou seja, pior que se precipitar sobre algo que poderia ser mantido em sigilo, como peça alternativa à eventualidade de uso amanhã, foi a reação do opositor Luiz Zacarias, resumida na seguinte frase: quase que uma peça de autocondenação por um crime não cometido.

Certo mesmo é que a campanha do situacionista Gilvan Júnior jogou na lata do lixo uma estratégia que, mesmo sem lastro, poderia ganhar musculatura de interferência na campanha eleitoral em momento mais apropriado. Com a revelação das garras de suposta legitimidade da ação jurídico-eleitoral, a previsível demanda especulativa de interferência do TRE na reta de chegada da disputa poderia ser contida pelo adversário, preventivamente. Uma patetice atrás da outra, como se vê. 

4. EFEITOS COLATERAIS

Só o futuro próximo ou futuro próximo das eleições poderá responder à possibilidade de desdobramentos do Caso Zacarias. Diante de todas as omissões, trapalhadas e desperdícios que envolvem  protagonistas e assessores, tudo é possível tanto quanto nada seria possível.

Os mecanismos de controle dos dois lados dos concorrentes parecem frouxos demais para transformar em pontos positivos o que se localiza na área de passivos mútuos.

Entretanto, mesmo essas deficiências não significam que os demais competidores em Santo André tenham conquistado vantagens significativas.  O fato de não terem saltado à arena autofágica de dar conotação de punibilidade ao deslize do candidato Luiz Zacarias, como o fez Gilvan Júnior, não tem o condão de habilitá-los à conquista de parcela significativa dos eleitores.

Afinal, esses candidatos não passaram até agora de uma reação formal inteligente. O concorrente Coronel Sardano foi o mais enfático e assertivo: ele condenou a empreitada de Recruta Zero de Zacarias ao mesmo tempo em que não observou gravidade legal a ponto de cassação de candidatura.

Alguns passos táticos poderiam ser anunciados em função do acontecimento, mas até esta data nada se levou adiante com impacto transformador.

O primeiro ostensivamente favorável à perda do direito de concorrer de Luiz Zacarias foi o influenciador digital e eletrônico André Ribeiro do Vivo. Aliás, André do Viva colocou o assunto em pauta. Mas também não passou disso. A impetuosidade com que se dirigiu a internautas parece que arrefeceu. André do Viva também é candidato a prefeito. Tem votos para influenciar o resultado num eventual segundo turno apertado. Tanto ele quanto Sardano. E, claro, quem ficar de fora da finalíssima. 

5. MÍDIA SELETIVA

Os jornais (impressos ou digitais) que trataram o Caso Zacarias nas edições de ontem (outras publicação seriam menos ativas no noticiário) , revelaram sintonia muito fina com o que poderia ser chamado de militância política.

Diário do Grande ABC, ABC Repórter e Repórter Diário seguiram a mesma trilha noticiosa de enviesamento privilegiador. Todos deram corda aos efeitos de criminalização eleitoral de Luiz Zacarias. O pressuposto insustentável se instalou no balcão de maleabilidade interpretativa de que o candidato teria infringido a legislação.

Em comum, estranhamente ou não, suprimiu-se o contraditório básico e desclassificador de manchetes e textos que pretenderam dar suporte à fantasia informativa. As publicações retiraram as declarações esclarecedoras do especialista Alberto Rollo.

Ouvido, repetimos, na edição de segunda-feira do Diário do Grande ABC, Alberto Rollo praticamente eliminou a possibilidade de cassação da candidatura. Disse o especialista que seria necessário o protagonismo de Luiz Zacarias no evento em Paranapiacaba.  Zacarias, como se sabe e se prova, não passou de  espécie de penetra, mesmo sendo vice-prefeito. Ele se posicionou lateralmente durante todo o evento.

Um breve vídeo que chegou a circular na Internet revelou que Zacarias foi praticamente barrado do baile por uma mulher que se posicionava à frente e que parecia orientada a impedir que ele fosse flagrado nas proximidades de um prefeito com quem divide o comando formal da Prefeitura há quase oito aos.

Como se sabe e não custa repetir, Zacarias foi preterido pelo grupo que decidiu apoiar Gilvan Júnior. O mesmo Gilvan Junior que se manifestou favorável a medidas punitivas no caso do palco do cinema.

6. CASO JOE BIDEN

Para completar, acoplando a esse texto um dos milhares de exemplos possíveis nos últimos anos de anarquismo informativo, para não dizer algo que lembre a profissão mais antiga do mundo, reproduzo o artigo da colunista da Folha de S. Paulo, Lucia Guimarães, há quase 40 anos radicada nos Estados Unidos. 

Militante democrata e feroz crítica dos republicanos, especialmente de Donald Trump (e aqui não vai juízo de valor algum, apenas uma constatação que move o enviesamento permanente de seus textos, como se o outro lado fosse um rebanho de sacerdotes puros de alma), Lucia Guimarães produziu uma pérola de patetice jornalística em fevereiro deste ano.

Foram necessários apenas cinco meses de distância para quebrar a cara da credibilidade, período no qual a saúde mental do presidente norte-americano, Joe Biden, o levou a uma derrota fragorosa no debate com Donald Trump, situação que o colocou a deriva até ser substituto ao enfrentamento em novembro.

Leiam alguns trechos de Lucia Guimarães, que, guardadas as devidas proporções, remete à uníssima posição dos jornais que, negando as evidência do Caso Luiz Zacarias (e principalmente às condicionantes impostas pela Justiça Eleitoral, expressas por um especialista que traduziu a situação), alardeiam consequências que satisfazem o apetite de um dos lados interessados em capitalizar um fracasso estratégico semelhante ao equivoco do protagonista da oposição, sem que o tenha sido, entretanto, protagonista do evento.

Leiam até que ponto o engajamento militante é capaz de produzir estragos (que me lembram o engajamento da mídia regional em negar ou omitir o processo de desindustrialização da região, enquanto este jornalista apanhava de todos à frente da revista LivreMercado por expor cientificamente a realidade). O título do artigo da Folha de S. Paulo de 14 de fevereiro é desclassificatório e autonocauteador -- “Pressão com idade de Biden mostra que imprensa política ados EUA está gagá.

 Em novembro de 1983, um ano antes de concorrer ao segundo mandato, Ronald Reagan recebeu o então primeiro-ministro de Israel, Yitzhak Shamir, na Casa Branca e discorreu, nostálgico, sobre seu papel na liberação de campos de concentração nazistas, no final da Segunda Guerra Mundial. O fato é que Reagan passou toda a guerra em Culver City, na Califórnia, como ator de filmes B, frequentemente fazendo papeis de tenentes ou recrutas. Em 1986, com Reagan já reeleito e dando sinais evidentes do Alzheimer cujo diagnóstico só seria revelado em 1994, a repórter Lesley Stahl, da rede CBS, foi se despedir dele no Salão Oval. A jornalista havia passado mais de uma década como uma das mais visíveis correspondentes da Presidência.

MAIS NOCAUTE

 Stahl recordou em suas memórias, em 2011, que ficou perplexa ao notar que o presidente com quem tanto convivera não a reconhecia e aparentava estar perdido. Ela concluiu que, naquela noite, teria que "contar aos compatriotas que o presidente dos Estados Unidos é um cadete espacial trêmulo". Stahl, assim como a elite dos repórteres lotados na Casa Branca, não revelaram ao público o que discutiam abertamente na sala de imprensa. Entre estes colegas está Chris Wallace, 76, cujo programa na CNN estampava na tela, no último sábado, a manchete: "A idade de Joe Biden é problema maior do que os indiciamentos de Donald Trump?"

MAIS NOCAUTE

 Voltamos a 2016, à obsessão malfeitora da imprensa política dos EUA com os emails de Hillary Clinton e ao papel de cúmplice da mídia em facilitar a eleição do mais criminoso presidente da história do país.  Numa semana em que o republicano de 77 anos fez ameaças cada vez mais delirantes, sugerindo que a Rússia invada países-membros da Otan, quem exibe senilidade é o New York Times, que não para de debater o óbvio envelhecimento de Joe Biden, 81, com uma hipocrisia editorial notável. Interlocutores de Joe Biden não relatam preocupações com demência, mas, no domingo, o Times afirmava, na capa: "Biden é mais prejudicado por erros do que Trump."

MAIS NOCAUTE

 É o tipo de cobertura descrita como "séria negligência jornalística" por ninguém menos do que Margaret Sullivan, ex-ombudsman do Times e hoje professora de jornalismo da Universidade Columbia. Como é possível sugerir que os lapsos de memória de Joe Biden são mais sérios do que os sinais de demência de Donald Trump, um sujeito que Noel Casler, ex-produtor do seu reality show, garante, há anos, cheirava regularmente comprimidos esmagados de metanfetamina no set? O dito produtor nunca foi interpelado judicialmente pelos incidentes que detalhou.

MAIS NOCAUTE 

 Trump afirmou, sem provas, que a eleição de 2020 foi fraudada e buscou formas de se manter no poder. O ápice desses esforços foi a invasão. Na terça (13), a jovem e popular deputada nova-iorquina Alexandria Ocasio-Cortez alertou no ar, durante o enésimo segmento sobre a idade de Biden: "Precisamos entender o que estamos contemplando neste país. Se Donald Trump for eleito presidente, não sabemos se haverá uma próxima eleição com integridade."

MAIS NOCAUTE 

 Pode-se debater a sensatez do idoso Biden em ter insistido em se candidatar. Pode-se criticar sua atitude sebastianista, o impulso de, mais uma vez, salvar o país do monstro Trump. Mas ele não roubou as primárias, e os eleitores ignoraram o único pré-candidato rival, Dean Philips, um mentecapto que sugeriu oferecer um ministério a Elon Musk. A imprensa política deve ao público cobrir o que está em jogo, as consequências reais da eleição que ameaça o Estado Democrático de Direito. E não fulanizar a campanha.



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