Imprensa

Diário: Plano Real que
durou nove meses (10)

DANIEL LIMA - 05/09/2024

É absolutamente imperdível a segunda edição da newsletter OmbudsmanDiário,  encaminhada a diretores, acionistas e editores do Diário do Grande ABC em 15 de junho de 2004 – portanto há mais de 20 anos.  Um pouco antes de assumir novo cargo no jornal, de Diretor de Redação. Cada edição de OmbudsmanDiário era um exercício trabalhoso. Estava na Redação do Diário do Grande ABC sem estar na Redação do Diário do Grande  ABC. 

Atuava de forma intensa, vasculhando as edições do jornal à procura de virtudes e imperfeições. Sabia que era preciso imprimir ritmo que permitisse chegar fisicamente ao jornal (sim, produzi esses textos na redação da revista LivreMercado) com ativo de conceitos que permitisse acelerar passos em direção a uma nova configuração editorial. O planejamento previa cinco anos à execução dos pontos básicos. Cada dia vivido era um dia a menos ou um dia a mais para superar o desafio imposto. Dependia do que se produzia a cada dia. 

Não se pode esquecer  ou perder o fio da meada explicativa para que atuasse como Ombudsman: havia  pendência entre os acionistas no campo jurídico que  pudesse assumir o comando da Redação. Era o que se decidira, após a aprovação do Planejamento Estratégico Editorial, o Plano Real do Diário que foi abortado nove meses após o tiro de largada.  Veja a minha atuação como ombudsman  naquele 15 de junho de 2004.

 EDIÇÃO NÚMERO DOIS 

Pretendia reduzir o volume desta segunda edição mas o acumulado de observações não me permitiu economia de espaço. Espero que a contribuição corresponda às expectativas dos emeiados. Meus agradecimentos aos editores do jornal pela receptividade de ontem à tarde, quando fomos apresentados pelos diretores Keynes Dotto e Oscar Osawa, acompanhados pelo editor-chefe Antonio Ximenez. Uma próxima reunião com o grupo dependerá única e exclusivamente do editor-chefe, porque nos colocamos à disposição para qualquer esclarecimento que se faça necessário. 

 UNIVERSIDADE PÚBLICA

O jornal recupera-se hoje das dificuldades já mencionadas neste espaço para acertar o tiro na direção de um enfoque mais analítico à implantação da Universidade Pública do Grande ABC. Entretanto, até mesmo para que a matéria não fosse eventualmente confundida com algo antipetista, o enfoque principal deveria ter-se concentrado não no fato de a maioria dos componentes do grupo dos 16 vestir cores vermelhas do Partido dos Trabalhadores, mas no quórum reduzidíssimo dos agentes econômicos. 

Não seria conveniente minimizar a partidarização do grupo dos 16, mas o mais relevante mesmo nos debates sobre a universidade prometida por Lula da Silva está na esqualidez das representações empresariais. Uma universidade que se pretende tecnológica pressupõe conexão íntima com agentes do mercado.  Estou curioso para saber o resultado do encontro de hoje. A Universidade Pública é um dos pontos nucleares deste momento na região.  

O fato de a prefeita Maria Inês Soares não ter atendido à reportagem do Diário pode sinalizar um desgaste da também presidente do Consórcio de Prefeitos, esfacelado neste período eleitoral.  

 METROPOLIZAÇÃO 

Um jornal comprometido com a perspectiva metropolitana que o engolfa deveria ter dado tratamento diferenciado à Urbis (Feira e Congresso Internacional de Cidades), aberta ontem na Capital. A problemática metropolitana é o eixo temático desse encontro de especialistas. Estivesse vocacionado à metropolização implícita de sua conformação geoeconômica, o jornal teria se preparado para estar presente ao evento durante toda a semana, em vez de recorrer à agência de notícia.  

Metropolização deve ser verbete de prioridade absoluta no planejamento editorial do jornal. Um repórter e um fotógrafo baseados num flat na Capital, provavelmente sem custo, poderiam acompanhar os principais debates programados sem se desgastarem em idas e vindas diárias. Nada dispendioso, como se observa, e com efeitos editoriais marcantes. O que não faltam são opções de um cardápio de preocupações do cidadão da Grande São Paulo com a avalanche de problemas típicos de desgastantes conglomerados humanos.

Costumo chamar esse tipo de pauta de regionalidade metropolitana. Não podemos nos enclausurar editorialmente quando temos obrigação de ampliar nossa territorialidade para as fronteiras metropolitanas.  

 ABAIXO O MERCOCIDADES

A reportagem "Rede Mercocidades realiza hoje encontro em Santo André" ratifica a certeza de que o jornal ainda não encontrou embocadura às questões mais encorpadas de gerenciamento territorial. O encontro programado para hoje no auditório da Rhodia, em Santo André, e que envolve representantes de 30 municípios do Mercosul, deveria estar no alto da página, rebaixando, portanto, a matéria "Feira do segmento de alimentação terá 14 empresas da região", que começa hoje no Anhembi.

Não bastasse a disparidade de forças entre tantos municípios em contraponto a um punhado de empresas, o evento governamental tem a região como palco, ao contrário da Fispal, como é conhecida a feira paulistana. 

 CADÊ O CHAMUSCA?

A reportagem "Conquista do grupo é um dos segredos de Chamusca", que se refere ao técnico do Santo André finalista da Copa do Brasil, está bem elaborada mas mal complementada porque a foto que a ilustra é do zagueiro Dedimar, não do personagem principal.  

 CADÊ O OSMAR?

Na edição de ontem uma matéria sobre Mauá destacou em retranca título que fazia referência à presença do ex-locutor Osmar Santos. Entretanto, a foto impressa, a exemplo do caso Chamusca, destacava personagem secundário.  

 EDITORIAL QUALIFICADO

Denso e afirmativo o editorial de hoje do Diário, sob o título "Plano Marshall". Faltou dizer que o Grande ABC também espera algo semelhante do mesmo governo Lula da Silva que defendeu investimentos de recuperação de países pobres. Os escombros deixados pelo governo FHC na região não podem ser subestimados. 

 SINDICALISMO

Talvez merecesse acompanhamento maior a nota de "Cena Política" de hoje dando conta de que um grupo de 150 sindicalistas do Grande ABC partiu ontem para Brasília, onde participa amanhã de ato contra a reforma sindical e trabalhista defendida pelo governo federal. Sindicalistas que reagem ao governo de um ex-sindicalista da região são um menu de prováveis contradições ideológicas.  

 PRINCESA EM MAUÁ

A editoria de Cultura e Lazer está sintonizada com as questões regionais, circunstanciais ou estruturais. A notícia sobre a presença do apresentador Netinho de Paula e sua trupe na produção do quadro "A Princesa e o Plebeu", com uma moradora da região, é um chamariz de audiência de parte do leitorado que adora celebridades. 

 INDÚSTRIA EM SÃO BERNARDO (I)

A matéria que o Diário publicou na edição de sábado sob o título "Empresa criará 700 vagas na região" e que retrata a ação diplomática de Vicentinho Paulo da Silva na Alemanha me deixou de cabelos em pé. Não que seja descabida. Acho que deveria ser publicada com mais comedimento espacial e cuidados redobrados na apuração, porque há cheiro eleitoral. A notícia de que a empresa alemã Döener Kebap instalará unidade em São Bernardo voltada à exportação e que geraria 700 empregos mereceria realce se um representante da corporação aparecesse no texto para dar testemunho à informação de Vicentinho. 

Mais consistente, e que portanto mereceria ser alçada à condição de destaque, foi a informação complementar de que Vicentinho Paulo da Silva assinou convênio com uma universidade alemã para transferência de tecnologia para a Universidade do Grande ABC e a Universidade do Empreendedor. Mesmo essa notícia se mostrou frágil em detalhamento. 

O mais complicado de tudo é que o texto deixou de registrar a metamorfose de pragmatismo ideológico de Vicentinho Paulo da Silva que, de sindicalista arredio ao capitalismo, se converteu em diplomata do empreendedorismo -- a Universidade do Empreendedor é uma de suas ambições. É claro que o texto não precisaria ser sarcástico, porque a ressalva que faço não é necessariamente sarcástica, mas não poderia abdicar de menção tão substantiva. 

Na página seguinte, a repercussão da viagem de Vicentinho com o secretário de Finanças de São Bernardo, Marcos Cintra, contém evidentes restrições e injunções eleitorais. A intervenção de Marcos Cintra em outra página transmite a sensação de que ele foi ouvido depois de a matéria ter sido concluída com a entrevista de Vicentinho e de algumas lideranças de São Bernardo que também se manifestaram sobre o propalado investimento industrial. O correto seria a junção das informações de Vicentinho e de Marcos Cintra e a consequente reportagem que contrapusesse à euforia do primeiro a desconfiança do segundo. 

 INDÚSTRIA DE SÃO BERNARDO (II)

Já na edição de ontem, segunda-feira, o Diário volta ao assunto, agora nas páginas de Política Grande ABC (a matéria de sábado é de Economia) e trata de forma entusiástica a nova faceta de Vicentinho Paulo da Silva. Novamente, desaparecem da biografia do candidato à Prefeitura de São Bernardo as tormentosas ações sindicais. Num box, o sempre incandescente Raimundo Salles pronuncia-se em nome do Paço Municipal em duro ataque à suposta vertente eleitoral de Vicentinho. 

Creio que o assunto ainda não se esgotou. Com as facilidades da Internet, é possível tirar a limpo o investimento da empresa alemã ouvindo algum executivo. Precisamos retirar o empenho de Vicentinho da penumbra de desconfiança motivada, entre outros pontos, pelo calendário eleitoral. 

 CRIMINALIDADE  (I) 

Sugiro que se mantenham os olhos abertos e o olfato em dia para a notícia de que o Legislativo de Santo André apreciará a regulamentação de horários de funcionamento de bares e restaurantes. É a chamada Lei Seca. A informação sobre a cronologia decisória foi publicada pelo jornal na edição de terça-feira passada. Suponho que a apreciação tenha ficado para esta semana. Entendo que a notícia deva ser acompanhada com atenção, mas poderia ser desdobrada entre as editorias de Política Grande ABC e Setecidades.

O temário poderá ser reduzido no conteúdo legislativo e incrementado na área de segurança pública com dados de arquivo sobre Diadema, Santo André e, mais recentemente, São Caetano. 

 CRIMINALIDADE (II) 

Provavelmente por causa de substituição em massa de setoristas da editoria, não tenho visto nas páginas policiais o costumeiro balanço mensal do andar da carruagem das estatísticas criminais no Grande ABC. O Diário sempre cobriu bem essa modalidade de notícia e não me parece que seja justo para com os leitores o buraco cavado por decisões da chefia. Sem entrar no mérito das demissões, não posso me furtar em dizer que nenhum produto fica imune a trepidações na área de recursos humanos. A preparação e o treinamento de novos profissionais são custos adicionais à obtenção da qualidade. 

O IEME (Instituto de Estudos Metropolitanos) reúne dados que colocam os principais municípios do Grande ABC em confronto estatístico e analítico com vários endereços paulistas. Acredito que o retorno das estatísticas mensais, que dão posicionamento instantâneo do quadro criminal, somado aos dados históricos do IEME, permitirá abordagem mais esclarecedora. 

 CRIMINALIDADE (III)

O Diário cobriu com relativa competência os incidentes da semana passada nas imediações do Clube Atlético Aramaçan, em Santo André. O inferno vivido pelos moradores da vizinhança do maior clube associativo da região -- antes, durante e depois do show do grupo de rock Rappa -- é rotina que ultrapassa em muito aquela área.

A sequência da cobertura no dia seguinte não esteve à altura da importância dos fatos, elevados à relevância de editorial. Há outros endereços de entretenimento no Grande ABC que incomodam. Uma espécie de mapa do infortúnio de morar próximo dessas zonas de ninguém poderia ser pacientemente traçado com o suporte da Polícia Militar. Mais que isso: os efeitos mercadológicos da situação no preço dos imóveis são subproduto de algo que se assemelha à infelicidade de feira livre em frente de casa. 

Um outro ângulo que caberia à matéria -- e podem ser ouvidos tanto representantes da PM quanto dirigentes dos clubes -- está na desativação de programações domingueiras em tradicionais clubes associativos. Exatamente porque a incidência de criminalidade ultrapassou os limites da sensatez. O Tênis Clube de Santo André e o EC Santo André cancelaram domingueiras há muitos anos porque não havia como controlar o entorno. 

O fato é que temos um contingente cada vez mais substancioso de jovens -- o banco de dados pode ser acionado para levantar as estatísticas mais recentes -- que encontram as portas fechadas para o entretenimento porque outros jovens realçam uma agressividade que supera a resistência policial. 

Acredito que essa matéria poderia ser feita com vagar, sem prejudicar o dia-a-dia provavelmente já excessivamente desgastante. Segurança pública e juventude são temários extraordinários à sensibilização dos leitores.

 CRIMINALIDADE (IV) 

Ainda estou tentando entender como foi possível identificar como torcedores corintianos os jovens que agrediram dois são-paulinos na semana passada em São Bernardo. O pronunciamento da Gaviões da Fiel, que o jornal reduziu a coluna bastante discreta, me pareceu consistente. Mas vou mais além: como é possível dizer que eram corintianos todos os agressores se os dois agredidos voltavam de um jogo do São Paulo no Morumbi, pela Taça Libertadores da América, e o Corinthians não cumpriu nenhum compromisso naquela noite? Como é possível assegurar que todos eram corintianos, repito? A matéria não foi suficientemente elucidativa. Esse ponto de interrogação me martela a alma jornalística, a voracidade de leitor e, por que não, a paixão alvinegra. Ficarei feliz, acreditem, se conseguir encontrar uma resposta convincente. 

 FRANGO COM POLENTA 

A série de matérias sobre a Rota do Frango com Polenta é tão apetitosa que poderia ter réplica, menos intensa, menos sequencial, mas providencial: como anda a Rota do Amor de São Bernardo? Rota do Amor é a região dos motéis que tanto sucesso fez no passado e, pelas informações disponíveis, vive tempos inglórios por causa da crise que abateu o Grande ABC e do desbravamento de novos endereços do prazer em locais menos distantes da zona urbana. Zona urbana é especificidade geográfica. 

 INFORMEDIÁRIO 

As mudanças que se registram na chamada coluna social do Diário são evidentes. Há maior arejamento e distribuição de fotos e textos, novos enfoques ultrapassam o convencionalismo de registros puramente sociais e gente diferente dos medalhões de sempre parece existir no Grande ABC. A coluna social dos sonhos dos leitores (sou devorador das colunas do Estadão e da Folha) é o somatório do interesse coletivo de toda uma redação. Por mim, o colunismo social seria     instalado na área central da redação, por onde todos passam, por onde todos sentirão prazer de trocar informações. 

 PIB DO GRANDE ABC

A matéria publicada domingo sob o título "Região possui 8% do PIB do Estado" não oferece qualquer novidade a quem acompanha a economia do Grande ABC, mas não é por isso que seria descartável, até porque nem todo mundo consegue memorizar informações econômicas. O problema mesmo é que o texto está confuso. Há infográfico sobre a evolução do PIB no Brasil e nada sobre o mesmo critério envolvendo o Grande ABC. Uma série de dados foi lançada à arena da reportagem sem, entretanto, costura sedutora. 

 TARIFAS TELEFÔNICAS 

Apenas a Folha de S. Paulo havia informado, uma semana antes, sobre a redução dos custos das chamadas de terminais fixos nas regiões metropolitanas brasileiras. A regionalização ou metropolização enfocada pelo Diário foi providencial, assim como o quadro com dados comparativos do quanto pesa e do quanto pesará cada ligação no bolso dos usuários. A matéria pecou pelo título "Preço da ligação local vai cair 60%". Um grave erro, porque desperdiçou toda a excelente munição da apuração. Algo como "Tarifas vão baratear custos telefônicos" teria sido mais impactante, sobretudo porque o custo de concessionárias de serviços públicos receberá duro golpe. Salvo algum mandraquismo. 



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