Política

CARTÃO AMARELO
AOS VENCEDORES

DANIEL LIMA - 07/10/2024

Os resultados de ontem no Grande ABC, que definiram quatro vencedores no primeiro turno (e mesmo os três cenários de segundo turno) não podem ser ignorados. Os números sinalizam advertência --espécie de freio emocional de arrumação -- àqueles de comemoram com justa  e pragmática razão: o eleitorado que garantiu mandato de quatro anos representa a média de apenas 38,80% do total disponível, aptos a escolher seus representantes. Traduzindo: votos em branco, nulos e abstenções superaram os votos votados.

Uma minoria que é maioria não pode ser interpretada como mão única de mando e comando. Muito menos ser glorificada como a fina flor da competência ou esperança.  Jamais, também, como salvadores da pátria.

Para o bem dos eleitos e da população em geral, é melhor se acautelar porque os desafios são imensos num Grande ABC que derrete a cada nova temporada econômica. Lembrar a realidade não é jogar água no chope de comemorações. É chamar à realidade que geralmente os vencedores subestimam até caírem do andaime dos fatos.  

OUTRAS PRAÇAS

Nas outras três praças municipais eleitorais da região que mantêm expectativa de definição dos votos, ou seja, que têm programação de segundo turno, a realidade não foi diferente em São Bernardo, em Diadema e em Mauá.

Quem acha que os números de votos válidos e não os votos consumados em relação aos respectivos colégios eleitorais representam para valer o que a sociedade moderna poderia chamar de cidadania precisa rever conceitos. Há alguma coisa muito equivocada na Democracia brasileira quando se obriga o leitor a votar e grande parte do eleitorado não vota. Muitos nem comparece às urnas. Seria menos acabrunhador se o voto não fosse obrigatório, visto sob o ângulo da representatividade sem imposições.

Voto obrigatório que majoritariamente não sai de casa, que vira voto em branco ou voto anulado  é voto contestador que também pode ser voto negligenciado, voto indiferente, coisas assim. Prefeito que faz festa com menos de 38% de votos disponíveis no estoque da democracia precisa prestar mais atenção no ambiente social que respira. Prefeito que faz festa com menos de 50% dos votos disponíveis também não deve subestimar o outro lado do resultado.

Contar com a maioria de votos que de fato é minoria no colégio eleitoral de Santo André, São Caetano e Ribeirão Pires (Rio Grande da Serra é exceção à regra) não é um feito regional circunstancial. Isso vem de longe. E está espalhado pelo País. Escrevemos sobre isso desde muito tempo.

NEGACIONISMO FANÁTICO

Mas há uma banda podre nas redes sociais e uma rede de omissos no jornalismo dito profissional que desconsidera as estatísticas sempre que as estatísticas vão além de interesses próprios. Mais que isso: atacam quem faz questão de lembrar que a disputa eleitoral desta temporada não é a primeira dos tempos modernos, supostamente modernos, de democracia.

A normalização de uma imperfeição representativa da democracia não é a esculhambação da democracia, mas o retrato de uma situação, que no caso do Grande ABC, deveria ser eixo a reflexões críticas.   

Repetindo: CapitalSocial bate nessa tecla há muito tempo, independentemente de vencedores e perdedores. É questão de cidadania, não de idolatria. Cidadania é uma moeda raríssima de se ver e de se praticar na região, tomada por interesses mesquinhos.

PARANÁ PESQUISAS

Uma análise preliminar dos sete resultados eleitorais de ontem na região remete a uma grande surpresa, não mais que isso. A quase totalidade dos números correu conforme as perspectivas para cá e para lá. Vamos tratar disso numa análise específica nesta semana, mesmo com a dificuldade de dar consistência aos dados porque o Instituto Paraná, no qual entregamos nossa alma de confiança e de desconfiança, não manteve na parceria com o Diário do Grande ABC um fluxo de projeções ajustado ao tempo de disputa.

Ou seja: entre as intenções de votos e as urnas eletrônicas houve um intervalo, em vários casos, impeditivo a avaliações seguras. De qualquer modo,  contrariando um histórico de lambanças sem fim na contratação de institutos de pesquisa, o Diário do Grande ABC acertou em cheio nesta temporada, até onde é possível esticar a metodologia desejada. Aparentemente (e vamos tratar disso) só houve uma grande barrigada. A votação de Gilvan Júnior foi além do que previu o Instituto Paraná.

Deixaremos para amanhã o que for possível destrinchar dos números das pesquisas do Instituto Paraná, sobre os quais sempre lançamos olhares de desconfiança comedida. Afinal, o histórico dessa indústria de resultados projetados geralmente para dar fluxo ao sistema de pague e leve exige cuidados.

ÚNICA SURPRESA 

E qual foi a grande e única maior surpresa nas sete disputas eleitorais na região? A não passagem de Flávia Morando ao segundo turno em São Bernardo. A chegada em primeiro lugar de Marcelo Lima não surpreendeu. Mais que isso: Marcelo Lima passou a ser o grande favorito à sucessão de Orlando Morando, porque deverá ter o apoio do PT hostilizado por Alex Manente, o outro finalista, e também de parte dos eleitores da família Morando.  

Vamos deixar para uma próxima edição uma missão aparentemente impossível, ou seja, encontrar as razões que levaram o prefeito de melhor desempenho regional nos últimos oito anos (os indicadores técnicos de organizações independentes mostram isso) a sofrer uma derrota mais que inesperada.

Preliminarmente, e isso é mesmo uma preliminar, teria havido a subestimação do risco de escolher a candidata. A disputa política em São Bernardo é infinitamente mais abrasiva do que em Santo André. Por exemplo: o PT lulista de São Bernardo ainda respira votos municipalistas, enquanto em Santo André  só definha desde Celso Daniel.

SOMENTE 38%

Os quatro vencedores no primeiro turno de ontem na região somaram apenas 38,80% dos votos disponíveis. Entenda-se votos disponíveis o estoque de eleitores aptos à votação, num total de 846.084. Desse total, 328.685 foram votos efetivados aos vencedores.

Em Santo André, Gilvan Júnior, apoiado pelo prefeito de Santo André, obteve 37,96% dos votos disponíveis. Do colégio eleitoral de 583.229, somou 221.410.  Em São Caetano, Tite Campanella obteve 42,18% do total de votos disponíveis: foram 60.858 de 144.255.  Em Ribeirão Pires, Guto Volpi obteve a reeleição ao totalizar apenas 33,79% dos votos disponíveis, com 28.909 do total de 85.544. E, para completar, Akira Auriani, em Rio Grande da Serra, foi  o único dos vencedores com maioria de votos possíveis: 51,57% do total do estoque de eleitores. Foram 17.508 votos ante 33.946 disponíveis.

A competição entre votos consumados e votos sucateados nos quatro municípios que definiram os vencedores das disputas de domingo foi acirradíssima. Ante os 328.685 votos conquistados pelos quatro candidatos vencedores, nada menos que 294.236 se antepuseram como votos nulos, em branco e abstenções.

A maior participação de voto sucateado ante voto conquistado se deu em Santo André. O vencedor Gilvan Júnior totalizou 221.410 votos válidos ante 220.171 votos sucateados. Uma participação relativa de 99,44%.

Em São Caetano, Tite Campanella somou 60.858 votos (42,18% do total disponível e 59,61% dos votos válidos) enquanto o estrago provocado por votos sucateados alcançou 42.163. Uma taxa de estrago de 69,28%.

Na pequena Rio Grande da Serra, Akira Auriani contabilizou 17.508 votos, ou 68,58% dos votos válidos, ou ainda 51,57% do total de votos inscritos. Houve perda líquida de 8.234 votos sucateados, 47,03% do total do prefeito eleito. 

Completando a correlação de voto válido na urna do candidato vencedor e voto descartado em forma de abstenções, brancos e nulos, Guto Volpi se reelegeu prefeito de Ribeirão Pires com 28.909 votos consumados, que representaram 46,72% do total. Os votos sucateados, 23.668, representaram 81,87% dos votos consumados pelo vencedor. Quando se considera o total de votos de Guto Volpi em confronto com os votos disponíveis em Ribeirão Pires, a participação cai para 33,79%. Ou seja: menos de quatro votos para 10 eleitores. 

SUCATEADOS VENCEM

Nos três municípios da região que só vão decidir os vencedores em três semanas, todos os finalistas perderam no confronto com os votos sucateados pelos eleitores.

Em Diadema, Taka Yamauchi chegou em primeiro com 106.141 votos ante 100.983 do prefeito José de  Filippi Júnior. Registraram 47,39% e 45,09% dos votos válidos. No critério de voto disponível e nível registrado, Yamaguchi ficou com 31,18% num colégio eleitoral de 340.373 eleitores. Filippi marcou 29,67%. Faltaram 116.405 votos sucateados. 

Em São Bernardo, Marcelo Lima somou 28,64% dos votos válidos (119.593) ante 26,53% de Alex Manente (110.791). Na correlação com votos disponíveis, Marcelo Lima ficou com 18,60%, enquanto Manente não passou de 17,23%. O colégio eleitoral de São Bernardo corresponde a 643.023 votos. Nada menos que 225.430 eleitores formaram o batalhão de votos sucateados – brancos, nulos e abstenções. O petista Luiz Fernando Teixeira e Flávia Morando somaram 185.702, ou 28,88% do total disponível. Votos que vão decidir o segundo turno.

Completando o quadro regional, em Mauá, Marcelo Lima (93.374 votos, ou 45,13% dos votos válidos) e Atila Jacomussi (73.558  votos, ou 35,56% dos votos válidos) chegaram à finalíssima com baixa taxa de votos conquistados em relação aos votos disponíveis. Mauá conta com colégio eleitoral de 318.437 eleitores. A soma dos dois finalistas não passa de 166.932 votos (52, 42% dos votos disponíveis. Individualmente, Marcelo  Oliveira, prefeito que busca a reeleição, conta com taxa de 29,32% dos votos conquistados. Jacomussi tem menos: 23,10%.

Quem pode decidir a balança final é o terceiro colocado, Sargento Simões, que totalizou 10,20% dos votos válidos ou 6,62% dos votos disponíveis – 21.103. A diferença que separou a vitória no primeiro turno de Marcelo Oliveira contra Atila Jacomussi foi de 19.816 votos.

Vamos precisar de mais algumas edições para extrair o máximo do primeiro turno e também do segundo turno das urnas da região.



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