Administração Pública

Dinheiro público

DANIEL LIMA - 12/09/2004

O aperto ético e gerencial sobre os administradores públicos principalmente desde a queda de Fernando Collor de Mello e, sobretudo, após a introdução da Lei de Responsabilidade Fiscal, desestimula termos de comparação entre o antes e o agora na avaliação da honestidade de políticos.


São notórios os casos de enriquecimento explícito ou dissimulado de mandatários municipais, estaduais e federais sem que as estripulias tenham deixado rastros de improbidade. Era mais convidativa e menos arriscada a malandragem administrativa no passado do que no presente. A atividade política era uma terra praticamente sem leis e, principalmente, sem qualquer compromisso mais rigoroso e detalhista de fiscalização.


São inúmeros os políticos que construíram gigantescos patrimônios coincidentemente durante mandatos delegados pelo povo. Alguns casos são constrangedoramente apontados no âmbito do Grande ABC e envolvem personagens que se consideram acima de qualquer suspeita. Gente que canta em verso e prosa honorabilidade amparada principalmente pela frágil legislação do passado, substituída pela mais rígida mas nem por isso intransponível Lei de Responsabilidade Fiscal.


Imaginar que os níveis potenciais de corrupção na atividade pública estão sufocados pelas restrições legais seria um exagero, porque não faltam mecanismos de inventividade a serviço do próximo financiamento de campanha, entre outros objetivos menos nobres.


Entretanto, o grau de dificuldades de agora em relação ao passado não muito distante é insuperavelmente maior. Antes, as facilidades eram tão evidentes quanto o baixo risco de a empreitada dar com os burros n’água. Agora, toda uma engenharia está a serviço da compatibilidade orçamentária às regras legais cada vez mais rígidas, mas nem por isso invioláveis.


Estenderam uma rede de proteção aos cofres públicos. Antes, a liberdade de movimentos era muito mais flexível. Sobretudo porque o processo inflacionário não só permitia como estimulava desvios de recursos financeiros com relativa facilidade. O capital de giro de determinadas prefeituras deslocava-se para o overnight sem-cerimônia, uma parte no oficial, outra no paralelo. 


Lembro-me de, por volta de 1987, numa matéria para o Estadão, ter provocado desconforto a um secretário municipal de uma das prefeituras da região quando, ao confrontar o volume de aplicação financeira com um município menos poderoso, a diferença obedecia a uma lógica transversa, ou seja, quem mais dispunha de dinheiro para aplicação recebia menos. O ensacamento de dinheiro hidratado nas tardes de sextas-feiras e cujo destino não guardava qualquer relação com casa bancária parceira explicava a diferença da modalidade de investimento de recursos públicos.


Por essas e por tantas outras, portanto, a relativização de gestões supostamente honestas do passado se faz oportuna, sob pena de, entre outros motivos, desconsiderar que a desfaçatez de gestores públicos é uma das mais sérias enfermidades que levaram o Brasil a chegar ao século XXI com tamanhos disparates sociais e econômicos.


Isto posto, o encaminhamento da seleção natural do voto nas próximas eleições precisa agregar mais que autodefinições de integridade ética e administrativa. A situação do Grande ABC neste começo de novo século depois de imprevidências de muitos administradores públicos do passado exige associação de qualidades que começa com o respeito ao dinheiro do contribuinte e termina com a valorização desse mesmo dinheiro na forma de competência gerencial com olhos e mente muito além da próxima eleição.


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