Administração Pública

Marinho começa a descobrir que
teleférico é risco e desperdício

DANIEL LIMA - 10/09/2013

O prefeito Luiz Marinho terá enormes dificuldades para manter a proposta de construir o que se convencionou chamar de teleférico em regiões periféricas, inspirado nas imagens do Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, que, por sua vez, é uma cópia de colombianos e venezuelanos. Decidido a impressionar o eleitorado sem aparentemente medir as consequências, a Administração Marinho está descobrindo que vai ser muito difícil conciliar pontos cruciais do investimento, casos de recursos financeiros, efetividade maciça de utilização, custo relativo por passageiro transportado e imagem pública. É provável que desista da operação. A insistência o colocaria em situação delicada quando tiver de debater critérios de economicidade.


 


Em 16 de setembro do ano passado, inspirado na telenovela global Salve Jorge, Luiz Marinho anunciou a intenção de criar um sistema de integração tarifária que incluiria ônibus municipais, trólebus, metrô e estações de teleféricos nos bairros Montanhão, Ferrazópolis e Vila São Pedro. Desde novembro do ano passado se espera o projeto funcional do sistema também conhecido por metrô-cabo.


 


Naquela data, Marinho e o secretário de Transportes e Vias Públicas, Oscar José Gameiro, explicaram o resultado da viagem à Colômbia e à Venezuela para conhecer o sistema de teleférico. Marinho disse ao jornal ABCD Maior: "Estamos construindo um plano de mobilidade para a cidade e vamos integrar os transportes públicos. Junto com isso, principalmente nas regiões onde terão os teleféricos, vamos levar urbanização".


 


Sem estabelecer prazos, Luiz Marinho sugeriu há quase 12 meses que em dois anos o projeto poderia decolar. O Rio de Janeiro também foi objeto de incursão do titular do Executivo de São Bernardo. Teleférico é uma obra de visibilidade bem ao gosto dos alquimistas eleitorais. Saneamento não dá votos – eis uma das máximas mais conhecidas dos gestores públicos sem compromisso com o futuro.


 


Verso e reverso


 


Marqueteiros do prefeito petista acreditam que o impacto do teleférico junto à população (e ao eleitorado) seria portentoso. É claro que esqueceram de combinar com os russos a outra face da moeda promocional. Expor ao mundo jornalístico uma realidade da qual poucos têm conhecimento -- que a Capital Econômica da Província do Grande ABC é um mar de exclusão social – não passou pela cabeça dos fazedores de notícias. Provavelmente desconheçam que só o Montanhão é um aglomerado de quase 150 mil habitantes.


 


Mas isso não é tudo. Ainda se houvesse a segurança de que o investimento, elevadíssimo, valeria a pena, nada contra. O teleférico do Complexo do Alemão é prova provada de que o sistema é um tiro no próprio pé.


 


Ainda recentemente o portal iG publicou matéria que deveria servir de farol para a Administração Luiz Marinho colocar em estado de alerta a proposta do teleférico. O equipamento instalado no Alemão transporta apenas 10 mil passageiros por dia e custa ao Estado do Rio R$ 2 milhões por mês em subsídios. Inaugurado em julho de 2011, o teleférico do Alemão recebeu naquela oportunidade a visita festiva da presidente Dilma Rousseff. Muito barulho para pouca eficiência. Cada viagem do teleférico custa aos cofres do Estado R$ 6,70. Com passagem social a R$ 1,00 e com mais da metade dos passageiros (55%) desfrutando de gratuidade, o sistema é um disparate porque custa R$ 6,70 por passageiro. A conta é simples: os R$ 2 milhões subsidiados mensalmente são divididos por 300 mil passagens. O custo equivale a 2,4 vezes o preço da passagem do ônibus municipal no Rio de Janeiro (R$ 2,75), 2,3 vezes o valor do trem (R$ 2,90) e 2,2 o do metrô (R$ 3,10), que percorrem caminhos mais longos e têm muito mais passageiros. Se os valores fossem calculados com base em quilômetros percorridos, a distância de custo da passagem seria estratosférica.


 


Críticos e bajuladores


 


Ainda segundo o portal iG, apenas entre sete mil e oito mil habitantes do Alemão estão cadastrados no sistema do teleférico, o que lhes permite usufruir de duas viagens diárias gratuitas. Os cadastrados correspondem a apenas 8,4% da população do complexo de favelas, o que demonstra, segundo a reportagem, que o equipamento atende a uma pequena parcela dos moradoras da área.


 


É claro que não faltam bajuladores do sistema. Eles ainda não perceberam que existe uma grande diferença entre morar naquela área e ter aquele equipamento como atração turística ocasional com a coreografia das gôndolas, o desenho dos cabos e a vista inusitada da área. Mas também não falta quem se mantenha sóbrio ante as tentativas dos marqueteiros do governo e do prefeito do Rio de Janeiro. O iG relata que, quando em visita de militares reformados ao Complexo do Alemão, em fevereiro, um oficial da Força Pacificadora do Exército, guia do grupo na estação do Adeus, descreveu assim o equipamento: “Este teleférico leva do nada a lugar nenhum. É só para aparecer. O uso é reduzido”.


 


Para medir o tamanho da incúria com os cofres públicos, as 152 gôndolas operadas de 6h às 21h contam com 130 funcionários próprios e 70 terceirizados pela Supervia, a concessionária do transporte. O total de 200 funcionários significa um para cada grupo de 50 usuários.


 


Em junho último, agora segundo reportagem do portal de notícias UOL, o lojista Márcio Neves reagiu com a seguinte frase ante a visita da presidente Dilma Rousseff à favela da Rocinha, quando se anunciou recursos do PAC (Plano de Aceleração do Crescimento) naquela área, inclusive para a instalação de teleférico: “Na Rocinha, existem centenas de valões com esgoto a céu aberto. São muitos casos de crianças que pegaram doenças por brincar nesses valões. Queremos que o PAC 2 traga melhorias de verdade, e não apenas uma maquiagem para os gringos. Não adianta ter o teleférico, que é um enfeite, assim como foi no Complexo do Alemão”.


 


O prefeito Luiz Marinho tem procurado respostas efetivas a questionamentos que por certo emergirão caso sustente a proposta de teleféricos em três bairros da periferia de São Bernardo. Por mais que a oposição esteja dispersa e praticamente em silêncio, há determinadas questões gerenciais públicas que provocam reações. Subsidiar largamente o que poderá se confirmar como no Complexo do Alemão, apenas um enfeite urbanístico, com baixíssima repercussão social, comprometendo investimentos em infraestrutura, pode causar enormes dores de cabeça ao titular do Paço Municipal.


 


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