Administração Pública

Novo modelo de
gestão ambiental

DA REDAÇÃO - 05/04/1999

A palavra ecodesenvolvimento foi usada pela primeira vez em 1973, quando Maurice Strong, secretário-geral de Estocolmo, na Suécia, condensou proposta de desenvolvimento ecologicamente orientado, capaz de impulsionar os trabalhos do então recém-criado Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). Um quarto de século depois, a implementação de novo modelo de gestão ambiental para áreas de mananciais pousa em Santo André por meio de convênio firmado por Prefeitura e Semasa (Serviço Municipal de Água e Saneamento Ambiental) com a UBC (University British Colombia) e outras organizações do Canadá. O projeto prevê transferência de tecnologia e recursos para financiamento de capacitação e treinamento. "Não iremos receber dinheiro em espécie do Exterior" -- avisa Jeroen Klink, assessor para Assuntos e Captação de Recursos Internacionais da Prefeitura de Santo André.


No início de fevereiro, missão andreense de 11 pessoas rumou para o Canadá para acertar detalhes do projeto e ver de perto as experiências bem-sucedidas. A equipe deparou-se com cuidado ambiental muito além dos maiores sonhos locais. No Canadá a preocupação com a qualidade da água é questão de sobrevivência econômica. Afinal, o salmão move as cifras daquele país. "Vancouver também tem problemas de enchentes e lá existem os piscinões, só que com tratamento da água pluvial antes de permitir o escoamento para os rios" -- descreve o superintendente do Semasa, Maurício Mindrisz.


A sustentabilidade do desenvolvimento é caminho óbvio a seguir e obriga ao crescimento econômico contínuo em bases não-predatórias, seja para garantir a riqueza, seja para eliminar a pobreza -- importante causa da degradação ambiental. Nepal, Quênia e Vietnã, além da região de Vancouver, acumulam resultados positivos do conhecimento aplicado da UBC que Santo André agora quer adotar.


Na prática, o projeto de ecodesenvolvimento da Prefeitura busca meios para receber empreendimentos em áreas de mananciais sem causar prejuízos à qualidade da água da Represa Billings e à qualidade de vida das populações assentadas no local. Ou seja, Santo André quer soluções para as questões do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras terem meios de suprir as próprias necessidades. "Esse projeto significa mudança de postura. São medidas saneadoras nem sempre simpáticas, mas que são eficazes. Durante muito tempo foi mais cômodo omitir a realidade do que encarar o problema de frente. Alguém precisava iniciar o processo" -- dispara o secretário de Habitação e Desenvolvimento Urbano, Irineu Bagnariolli.


Não é de hoje que esse desafio atrai atenções em todo o mundo. Desde 1983, quando a Assembléia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas) criou comissão independente para encontrar propostas inovadoras e realistas para harmonizar meio ambiente e desenvolvimento, política e economia mundiais não tiveram mais como abster-se da questão. Para iniciar a boa relação entre ambientalismo e modernidade em Santo André, foi escolhido o Parque Andreense, loteamento de cerca de 15 quilômetros quadrados onde moram oito mil pessoas. Até o fim deste ano a administração pretende levar a coleta de esgoto e muita, muita informação a essa população.


Para conduzir o processo de transição na direção de uma sociedade sustentável, a Prefeitura quer tirar do Estado a exclusividade de gerir áreas de mananciais. Em janeiro, o Semasa entregou ao governo estadual proposta de repasse de atribuições para a municipalidade e ainda pleiteia legislação específica para a Bacia da Billings. "A lei cria dois mundos: a cidade formal e a informal, alvo fácil para o clientelismo" -- avalia Bagnariolli.


Existem três vertentes mundiais sobre ecodesenvolvimento. A primeira, mais estatista, considera que a qualidade ambiental é essencialmente um bem público, o qual somente pode ser resguardado de maneira eficiente por meio de intervenção normativa e reguladora do Estado. A segunda prioriza a sociedade civil, atribuindo a organizações de base, grupos comunitários, movimentos sociais e ONGs (Organizações Não-Governamentais) papel predominante na transição. Esse enfoque valoriza as possibilidades de avanços em níveis local e regional. A terceira via acredita que o mercado, por meio da própria lógica acompanhada de significativa apropriação  privada dos recursos naturais e da expansão dos consumidores verdes, avança com eficiência na direção de uma sociedade sustentável.


Cenários -- O primeiro take da implantação do projeto com a UBC aborda análise e diagnóstico da Represa Billings. Em conjunto, equipes andreense e canadense  vão simular situações como meio de conseguir respostas para um futuro não muito distante. "Temos de identificar o potencial de desenvolvimento local" -- afirma Mindrisz. Para isso está sendo criado CD-ROM com informações sobre a área de mananciais que será utilizado para construir cenários cujos impactos serão debatidos pelos envolvidos no projeto.


No início do próximo mês, missão canadense desembarca em Santo André para finalizar a primeira versão do CD-ROM. Dos quatro cenários propostos para debate, a intocabilidade das áreas de mananciais está descartada. Restam situações de restrição a ocupações, ocupações sem controle e o caminho intermediário que aposta na recuperação ambiental com obras de infra-estrutura e educação da população. Os folders distribuídos para a população abordam de maneira didática cuidados com lixo, com água e esgoto, fossa séptica, além de material genérico identificando o que pode e o que não pode ser feito em áreas de mananciais.


Em desenvolvimento desde abril de 1997, o projeto de transferência de tecnologia envolve ainda USP (Universidade de São Paulo), Emplasa (Empresa Metropolitana de Planejamento da Grande São Paulo), Instituto Cidade e Democracia, Instituto para Resolução de Conflitos, Administração Regional Metropolitana de Vancouver e Conselho de Bacias do Rio Frasen. "O conceito de formação do Conselho do Rio Frasen, em Vancouver, foi criado de baixo para cima. A iniciativa partiu de entidades num processo semelhante ao da Câmara Regional do ABC" -- compara Jeroel Klink.


Enquanto a Prefeitura se empenhava em dar crédito ao projeto junto aos governos canadense e brasileiro -- já obteve a aprovação das duas esferas --, o Semasa puxava a responsabilidade ambiental para o próprio rol de atribuições. Há seis meses entrou em operação o Departamento de Meio Ambiente, menina dos olhos da autarquia. Com 40 agentes ambientais e 16 profissionais de nível superior, o recém-criado departamento responde pelos preparativos para receber o projeto. Divide-se em três áreas de atuação: Geren (Gerência de Recursos Naturais), Gema (Gerência de Educação e Mobilização Ambiental) e Geplan (Gerência de Planejamento e Controle), zelando por 52% do território de Santo André enquadrado como manancial. "Contamos com 13 fiscais na área, 10 a mais que o ínfimo contingente que o Estado dispensa a todo o Grande ABC" -- orgulha-se o diretor do departamento, João Ricardo Guimarães Caetano. 


O cenário encontrado no início das atividades do departamento não poderia ser mais preocupante. Em plena área de mananciais há significativa cicatriz que bem poderia alastrar-se não fossem as intervenções e a permanente fiscalização, inclusive em fins de semana, quando aumentam as tentativas de ocupação irregular. Cerca de 35% das áreas de mananciais de Santo André estão ocupados regular ou irregularmente por assentamentos. Desse montante, 20% acolhem danos irremediáveis. "Temos 10 viaturas, um ônibus e um helicóptero fretado que sobrevoa a área pelo menos uma vez por semana por cerca de uma hora e meia" -- diz João Ricardo.


O resultado desse meio ano de trabalho assusta. Foram retiradas cerca de 80 carcaças de veículos, centenas de restos de despachos de umbanda e candomblé, embargados 22 movimentos irregulares de terra, desmanchados 18 focos de obras irregulares, detectados três pontos de desmatamento, dois depósitos ilegais de lixo e duas pocilgas, isso sem mencionar cadáveres.


Parceiros -- Em janeiro deste ano o Departamento de Meio Ambiente do Semasa passou a contar com apoio do Departamento do Uso do Solo Metropolitano e da Polícia Florestal. "Temos agora um trabalho de fiscalização mais coordenado" -- defende o diretor. Pelo menos uma vez por semana os parceiros organizam ações concentradas para inibir o crime ambiental. As intervenções ocorrem contra possível dilatação de ocupações já existentes e surgimento de novas.


Em paralelo a essa dinâmica curativa, o departamento implementou o Programa de Educação Ambiental Continuado para Áreas de Mananciais. Por meio de folhetos didáticos e trabalho de porta em porta com as populações, o departamento vai inovando a cultura local. "O cidadão que mora em área de manancial tem de entender que o Poder Público não irá jamais oferecer serviços da mesma qualidade do perímetro urbano" -- dispara João Ricardo. Dessa maneira, a opção de morar em área de preservação terá de considerar tais restrições.


Ao mesmo tempo em que fixou cerca de 40 placas sinalizando as áreas de mananciais, o departamento do Semasa comanda levantamento do potencial local para ecoturismo. "Precisamos ter noção geral do que somamos de atrativos" -- justifica o diretor. Empresa metalúrgica desativada próxima a Paranapiacaba está sendo cogitada para abrigar o primeiro Centro de Visitação e Interpretação da Natureza.


No perímetro urbano o departamento pegou pesado no controle da poluição veicular. De junho de 1998 a fevereiro deste ano 800 veículos pesados -- caminhões e ônibus -- foram multados por expelir fumaça preta. O maior foco de autuações foi a Avenida dos Estados. 


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