Administração Pública

Patetice fiscal

DANIEL LIMA - 13/04/2005

O Legislativo de Mauá acaba de aprovar mais um ridículo capítulo de guerra fiscal. Não bastassem as inutilidades de mecanismos adotados já há anos pelo Consórcio de Prefeitos, cujos resultados são patéticos porque não acrescentaram nada de riqueza ao território regional, agora Mauá se dá à desfaçatez de criar um monstro que vai devorar suas próprias entranhas.


Para tornar didático o entendimento da aprovação do projeto de lei e suas consequências, vamos a exemplo prático:


Imagine o leitor que num determinado segmento industrial, as empresas de João, Pedro, Antonio, Augusto, Ernesto, Mathias e mais algumas dezenas de empreendedores lutem desesperadamente para se manter no mercado. Não se trata de dramatização, porque pequenas e médias empresas vivem às turras pela sobrevivência num País que só de impostos arrecada mais de 36% do PIB.


Pois vejam o que vai acontecer com esses empreendedores, todos submetidos aos mesmos rigores tributários municipais, estaduais e federais, quando, eventualmente, estimulados pela nova legislação, novos competidores chegarem a Mauá. As empresas que desembarcarem no Município para concorrer com as já instaladas gozarão de benefícios fiscais municipais que as mais antigas só desfrutarão, e mesmo assim proporcionalmente, com novos investimentos.


O que vai acontecer? É algo como determinar que, num jogo de futebol, apenas uma equipe tenha a liberdade de substituir quantos jogadores quiser, para adaptações técnicas e táticas em busca de melhor resultado. Ou que numa rinha de galo o embate que dilacera dois protagonistas seja interrompido e um dos contendores exausto seja substituído por um vigoroso e descansado reserva de luxo. O final é mais que previsível.


Tratar seletivamente é a síntese da guerra fiscal de Mauá. É, como se nota, um tiro no próprio pé tributário. Nada garantirá que recursos fiscais e benefícios sociais em forma de novos empregos de empresas que chegarem significarão, de fato, ganhos para o Município. Os empreendimentos diretamente atingidos pela distorção tenderão a perder mercado e trabalhadores.


Já escrevi artigos e artigos sobre esse assunto ao longo de minha carreira, tanto na revista Livre Mercado quanto na newsletter Capital Social Online. Lá atrás, e coloco os arquivos da revista e da newsletter à disposição dos leitores, cantei a caçapa de que a guerra fiscal pretendida pelo Grande ABC, disfarçada eufemisticamente de Lei de Incentivos Fiscais, jamais floresceria.


Quem acompanhou o depoimento do secretário de Finanças de São Bernardo, Marcos Cintra, na edição de ontem deste Diário, a propósito da decisão de Mauá, pode comprovar a correção de meus diagnósticos.


Devorador de literatura econômica, tenho pastas e pastas de arquivos sobre guerra fiscal, às quais nem me lancei para escrever estas linhas, de tanto que minha memória registra fatos.


A Lei de Incentivos Fiscais formulada e aprovada como salvação da lavoura regional foi um fracasso anunciado por mim não porque o desejasse, mas porque há texturas tão resistentes no tecido econômico que não é possível imaginar que se revoguem premissas ao sabor do demagogismo de plantão.


A única guerra fiscal que deu certo no Grande ABC ao longo dos últimos anos, e que foi vendida espertamente como planejamento econômico, constou da drástica redução de alíquotas de diversas atividades de serviços pela Prefeitura de São Caetano então dirigida por Luiz Tortorello. Fizeram tanto proselitismo sobre a medida vendida acriticamente pela Imprensa, que prevaleceu a sensação de que Tortorello inventara a pólvora.


Ao sabor das delícias daquela guerra fiscal que outros municípios da Grande São Paulo também introduziram, alguns dos quais antes de São Caetano, Luiz Tortorello lançou o projeto do Pólo de Tecnologia do Bairro Cerâmica. Divulgou-se que geraria mais de 80 mil empregos diretos e indiretos, vejam só!


O Pólo Tecnológico de São Caetano foi para a cucuia e seus empreendedores procuram novo eixo funcional, principalmente depois de o Congresso Nacional estabelecer limite mínimo de 2% de alíquota do ISS, acabando com a farra do 0,25% que São Caetano implantara para ganhar na escala de negócios. A regulamentação federal era o que faltava para a Capital tão vizinha e tão violentada pela fuga de empresas de serviços, atacar para valer na área, rebaixando várias alíquotas setoriais.


O Grande ABC ainda não se deu conta de que ações individuais como as de Mauá são pura bobagem. Precisamos de planejamento estratégico econômico regional que contemple semelhanças e diferenças municipais num contexto de competitividade internacional.


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