Provavelmente São Caetano é o único Município do País a contar com três prefeitos. Eleito em 1996, Luiz Tortorello é prefeito licenciado desde a semana passada, internado que está há quase 30 dias no Hospital Albert Einstein, em São Paulo. O prefeito interino, com mandato regulamentar de 15 dias, Silvio Torres, foi consagrado vice-prefeito na chapa de Tortorello. E o prefeito eleito, José Auricchio Júnior, ganhou a disputa no último 3 de outubro.
O drama de São Caetano é exatamente esse: tem prefeitos demais e não tem prefeito nenhum. O prefeito licenciado, o prefeito interino e o prefeito eleito, por razões específicas de cada um, não podem ser prefeitos na plenitude que o cargo exige. Vamos às explicações:
Primeiro: Luiz Tortorello vive momentos dramáticos num leito hospitalar. Quais são os sinais dessa dramaticidade? A própria logomarca do Albert Einstein, um centro de saúde de nível internacional. Mais? O tempo de internação. Outro? Informações de fontes absolutamente confiáveis, inclusive no interior da família Tortorello, de que o quadro é complicadíssimo. Mais? A família prometeu e não cumpriu a promessa de liberar boletins médicos. Não fosse o quadro clínico desesperador do prefeito licenciado, a emissão de notas oficiais da situação médica seria o melhor remédio para afastar eventuais especulações. Tudo isto posto, conclui-se que Luiz Tortorello está fora de combate na articulação do Paço Municipal.
Segundo: Silvio Torres é um prefeito interino que jamais deixou a interinidade. Isso significa que, por mais boa vontade que mostre, sempre será o segundo da escala. Mesmo quando o primeiro está distante do cotidiano. A vulnerabilidade de um prefeito assumidamente interino joga água no chope de iniciativas consistentes. Sobretudo porque a gestão se esgota no calendário constitucional.
Terceiro: José Auricchio Júnior é um prefeito eleito que sabe melhor do que ninguém o quanto precisa se equilibrar no fio da navalha da importância de contribuir para a governabilidade do Município e da possibilidade de lhe atribuírem certo grau de açodamento. Trocando em miúdos: a disposição com que vem encarando a missão de organizar a equipe que lhe dará sustentação técnica, política e administrativa a partir de 1º de janeiro pode ser confundida como algo pouco respeitoso não só ao prefeito licenciado como também ao prefeito interino. Como se sabe, administração pública e política partidária são incubadoras de maledicências. José Auricchio não quer carregar para o resto da vida a impressão de que ultrapassou o sinal ético, mas também é atormentado pela possibilidade de lhe imporem a pecha de vacilante.
A vantagem institucional de São Caetano é que falta pouco tempo para que o triunvirato de prefeitos se desfaça, já que o primeiro dia do ano novo marcará a posse de José Auricchio. Aí, o que vai pegar para o então novo prefeito é a maturidade para se mover entre velhos e manjados costumes de uma gestão especialmente centralizadora e personalista de Luiz Tortorello, seu idealizador e eleitor principal.
E a missão de José Auricchio não será das mais confortáveis porque, independentemente de possível ausência de Luiz Tortorello, ele encontrará ambiente político complicadíssimo. Luiz Tortorello deixará a Prefeitura muito longe da suposta consagração dos 78% dos votos com que se elegeu em 2000. José Auricchio foi eleito em outubro com escassos 46% dos votos e enfrentou nas urnas três oposicionistas que não lhe darão folga nos próximos anos, casos de Hamilton Lacerda, Tite Campanella e Iliomar Darronqui. Todos integrantes de núcleos contrários ao estilo tortorelliano de governar, do qual, acreditam, Auricchio seja explícito sucessor.
Apenas a título de explicação sobre os “escassos” 46% de votos que conduziram José Auricchio à vitória em primeiro e único turno em São Caetano: em Santo André o prefeito João Avamileno de uma administração bombardeadíssima durante dois anos seguidos também alcançou 46% dos votos válidos no primeiro turno, concorrendo igualmente com três adversários de relativo peso.
A possível ausência de Luiz Tortorello nos interiores do Paço de São Caetano, quer por debilidade de saúde quer por motivo ainda maior, é espécie de moeda sobre a qual o prefeito eleito José Auricchio deverá lançar a própria sorte. Caberá a ele altearar os dois lados em sustentáculo de sua gestão, transformando a cara manjada de usos e costumes arraigados de obstáculos a serem desativados com sabedoria e a coroa de desafios administrativos em exercício de permanente superação de metas.
Auricchio sabe que quando o triunvirato virar passado, e está próximo disso, o que vai decidir mesmo seu destino como administrador público será a sensibilidade para neutralizar naturais complicações herdadas do antecessor e atender às expectativas do sucesso alcançado também pelo antecessor.
Dá para tomar uma Kaiser antes?
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