Caso Celso Daniel

Caso Celso Daniel: nem
tudo que brilha é ouro

DANIEL LIMA - 06/02/2002

O que se passou no Paço Municipal de Santo André durante o período entre o sequestro, o assassinato, o velório e o enterro do prefeito Celso Daniel provoca interpretações equivocadas em vários campos. A visibilidade que estrelas locais, estaduais e nacionais do Partido dos Trabalhadores tiveram durante aquelas longas horas de angústia, desconsolo e prostração no Paço Municipal não significa que a luminosidade tenha imperado. E nem que aqueles que não foram vistos com frequência entre os batalhões de destaques do PT tenham se omitido a partir do momento em que a TV Globo anunciou o sequestro nos três tombos, no final da noite de sexta-feira. Pelo contrário. Nem tudo que reluziu foi ouro de dignidade e compaixão. Nem toda opacidade foi desinteresse, omissão e covardia.


Para que a verdade seja estabelecida e os valores humanos, partidários e éticos não sofram avaliações distorcidas, é preciso que se estabeleçam algumas referências por quem, como este jornalista, viveu intensamente aquele período no Paço Municipal, numa mistura de profissional em busca de informações e agente social inquieto com os acontecimentos.


Já escrevemos sobre a intempestiva — embora aparentemente incontrolável — politização do sequestro pela cúpula nacional e estadual do PT. Enquanto as estrelas nacionais e estaduais do partido apareciam nas entrevistas de emissoras de rádio e televisão à exaustão, numa associação de solidariedade e oportunidade que o sequestro — e, na sequência, o próprio assassinato — ensejava, um grupo de elite do PT de Santo André trabalhava intensamente nos bastidores, no prédio do Executivo. Viveu esse grupo, anonimamente, horas seguidas de tensão. Primeiro à espera de eventuais contatos dos sequestradores. Depois, tomando as providências de praxe para cuidar do corpo encontrado em Juquitiba e levado ao IML da Capital.


Esse grupo, do qual fazem parte os irmãos Mindrisz, Klinger Sousa, Ivone de Santana e Gilberto Carvalho, entre outros comandantes ou petistas influentes no Paço Municipal, não foi visto em noticiário algum, não deu entrevista nem palminhas nas costas de quem lotou o Paço Municipal. Enfim, permaneceu no quartel-general em busca de um fio de esperança com relação à sorte do prefeito Celso Daniel e, depois, operacionalizando ações igualmente discretas para que pudessem ser tomadas todas as medidas legais e burocráticas a partir do telefonema da polícia sobre a desova do corpo.


Enquanto isso — e posso afirmar sem medo de cometer pecado porque observei os movimentos no Paço e na Câmara Municipal — não faltaram aqueles que, além da natural comoção pelo infausto acontecimento, trataram de reforçar posições no jogo político-partidário do PT municipal, avocando para isso, inclusive, o suporte estrelado de representantes estaduais e nacionais, já que, como se sabe, Celso Daniel comandava o PT municipal com seu grupo de colaboradores sem depender de terceiros não radicados no Município. Reuniões paralelas ao sequestro seguido de assassinato e de velório foram ardilosamente organizadas. Não se esperou nem o corpo descer ao túmulo. Um excesso de zelo pela governabilidade do Paço Municipal foi estranhamente ensaiado, como se a torre enlutada estivesse à deriva.


Um dos petistas que tiveram comportamento exemplar em todo o acontecimento foi o agora prefeito João Avamileno, que se manteve o tempo todo ocupado com o que era de fato importante.


Se parte do PT não conseguiu neutralizar a fome de poder municipal diante de situação excepcionalmente dramática, como cobrar que candidatos à Prefeitura de Santo André e seus mais diretos colaboradores disseminassem na imprevidente imprensa paulistana, sobretudo de televisão, versões espetaculosas sobre as motivações que teriam provocado o crime e até levantassem escombros esquecidos na Justiça sobre supostas irregularidades licitatórias? A carnificina ética foi consumada a partir do anúncio do sequestro, expandiu-se com a chegada do séquito nacional e estadual do PT e ainda não terminou, porque os opositores de olho no Paço Municipal querem mais cadáveres, agora eleitorais.


Vivemos um País de ovação à Casa dos Artistas e ao Big Brother. O que se poderia esperar de diferente de representantes políticos à direita e à esquerda do bom senso?


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