Caso Celso Daniel

Menor executou ou não o prefeito?
Isso não tem importância relevante

DANIEL LIMA - 05/02/2006

Afinal, o então menor de idade Lalo, à época com 16 anos, foi ou não o executor dos oito tiros em Celso Daniel? Por que o agora maior de idade membro da quadrilha de sequestradores de Celso Daniel faz ziguezagues de declarações, ora afirmando e reafirmando que matou sim o então prefeito de Santo André, ora recuando e dizendo que assumiu o crime por ter sido ameaçado pelos demais integrantes da quadrilha?


Definir se Lalo mentiu ou não é apenas um detalhe nas investigações da reabertura do inquérito comandado pela delegada Elisabete Sato. Detalhe que não fere um milímetro sequer a estrutura dos autos da força-tarefa policial que chegou à conclusão de que Celso Daniel foi vítima de sequestro urbano. Não seria a primeira nem a última vez na historiografia criminal que um menor de idade assumiria o lance fatal de violências de comparsas, como acentuam diversas autoridades policiais.


Então, por que a disputa pela sustentabilidade das declarações de Lalo? Porque o Ministério Público atua decisivamente para desclassificar os inquéritos policiais. Apontar eventuais falhas é uma maneira de desgastar a Polícia Civil e fortalecer a versão de crime encomendado.


Lalo foi recapturado no mês passado depois de fugir da Febem em 2005. “Não tive nenhum envolvimento direto ou indireto no sequestro e na morte de Celso Daniel” — afirmou Lalo no depoimento aos policiais e promotores criminais. Ele relatou que na noite do sequestro estava na casa de José Edison, utilizada como cativeiro de uma jovem. Os promotores criminais argumentam que Lalo não participou da execução, já que não teria reconhecido o prefeito Celso Daniel por meio de fotos.


Espera-se para os próximos dias a conclusão das investigações da delegada Elisabete Sato. Por isso mesmo janeiro foi turbulento. Faz parte do jogo de pressões concentrar determinadas baterias de informações na mídia. É uma maneira de tentar influenciar decisões. O caso Celso Daniel voltou ao noticiário com força total. E geralmente enviesado.


A revista IstoÉ ocupou-se em duas edições seguidas do assunto. Não foi acompanhada por outras duas publicações nacionais de informações, Veja e Época. As reportagens de IstoÉ são um corolário de imprecisões. Na edição de 18 de janeiro, sob o título “Mudança de rumos”, há sucessão de desinformação. Pela ordem:


 Afirma que as investigações foram conduzidas por policiais do DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa) e com aval do deputado federal Luiz Eduardo Greenhalgh. A verdade é que o DHPP foi um dos departamentos da Polícia Civil a trabalhar no caso. No total, foram 10 delegados, inclusive federais, e 32 investigadores. Greenhalgh foi nomeado pela Câmara Federal para acompanhar as investigações, com base no passado de defensor dos Direitos Humanos.


 Afirma que a conclusão do caso Celso Daniel na esfera policial foi fortemente influenciada pela confissão do menor Lalo. A verdade é que Lalo tem importância suplementar. Os depoimentos dos demais sequestradores são muito mais consistentes. Retirar de Lalo a condição de figurante faz parte do espetáculo diversionista.


 Afirma que o legista Carlos Delmonte foi encontrado morto em circunstâncias misteriosas, sozinho em seu escritório, enquanto redigia o laudo agora concluído por Vasques. A verdade é que Delmonte provocou a própria morte, conforme concluíram os laudos periciais, depois de, também em noticiário fartamente divulgado, anunciar suicídio por causa da decepção de não conseguir reconciliar-se com a ex-mulher.


 Afirma que a delegada Elisabete Sato estaria caminhando para a convicção de que a quadrilha responsável pela morte de Celso Daniel agia de forma compartimentada. “Nessa modalidade de crime — segundo IstoÉ — nem todos os participantes têm conhecimento dos objetivos e do modus operandi da ação”. A verdade é que a compartimentação não oferece a contraface de crime político-administrativo, exatamente porque é rotina a divisão de tarefas, espécie de linha de montagem do crime organizado em sequestros urbanos sem qualquer conotação política. Seria mais factível para a consolidação da tese de crime político encomendado o contrário — que a operação de sequestro não tivesse divisões operacionais e, portanto, não abrisse brechas para delações. Mais que isso, que fosse produzida por profissionais do ramo, não “um bando de pés-de-chinelo”, como declararam os delegados da Polícia Civil e da Polícia Federal.


A revista IstoÉ voltou ao assunto na edição seguinte e bateu na tecla de que o adolescente indiciado como assassino revelou não ter sido o autor dos disparos que mataram Celso Daniel. Recorreu ao laudo do Instituto Médico Legal, apresentado pelo legista Paulo Vasques, para reafirmar a tese de crime encomendado porque haveria provas de que a calça com que Celso Daniel foi encontrado não era a mesma do jantar com o empresário Sérgio Gomes.


Já publicamos matéria que destrói essa versão: exames sofisticados solicitados pela Polícia Civil à USP (Universidade de São Paulo), confirmaram que a calça jeans que Celso Daniel vestia na noite de 18 de janeiro de 2002, quando foi sequestrado, era a mesma daquela manhã de 20 de janeiro em Juquitiba. A troca de calça daria margem à versão de crime encomendado, segundo reconheceu o delegado titular do DHPP, Armando de Oliveira. Por isso foram exigidos exames detalhados que a Imprensa, de maneira geral, insiste em ignorar.


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