Caso Celso Daniel

Diretos Humanos
prefere esperar

DANIEL LIMA - 05/09/2006

O que tem feito a Comissão Especial do CDDPH (Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana) que acompanha o caso Celso Daniel? Exatamente 10 meses depois de formalmente constituída através do Diário Oficial da União, o relator Humberto Pedrosa Espínola responde por e-mail as indagações. As respostas de Espínola, em 17 de agosto, coincidiram com o 10º mês de composição da Comissão Especial, em 17 de outubro do ano passado, e exatamente um mês depois de receber o questionário.


Humberto Pedrosa Espínola é cauteloso. Ele explica que a demora para responder ao questionário se deve ao fato de ter estado fora do País. A legislação confere a condição de órgão colegiado, vinculado administrativamente à União mas independente politicamente da gestão do governo federal. A formação de comissões especiais é uma das prerrogativas do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana. O prazo de 120 dias para os trabalhos pode e está sendo prorrogado por quanto tempo for necessário.


O relator da Comissão Especial do CDDPH recebeu um exemplar de cada uma das 12 últimas edições de LivreMercado. Mais precisamente desde que a publicação resolveu investigar profundamente o caso Celso Daniel, contrapondo-se à mídia em geral que, depois de criminalizar o empresário Sérgio Gomes da Silva, praticamente esqueceu o caso.


Pesa contra veículos de comunicação a dificuldade de oferecer às fontes policiais tratamento dispensado durante mais de três anos aos promotores criminais de Santo André. Proibidos pelo secretário de Segurança Pública Saulo de Castro Abreu Filho de prestar informações à Imprensa durante todo aquele período, os policiais civis foram à ofensiva através de LivreMercado quando o mesmo secretário decidiu liberá-los. Também o policial federal José Pinto de Luna, que investigou o caso, considerou crime ocasional o assassinato do prefeito Celso Daniel.


Nos últimos três meses, os mesmos delegados paulistas que decidiram ir a público para demonstrar inconformismo com a unilateralidade de informações sobre o caso Celso Daniel resolveram voltar ao enclausuramento. Fontes policiais sugerem que tanto o titular do DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa), Armando de Oliveira, quanto o adjunto, José Masi, receberam recomendação do governo paulista para não se manifestarem sobre o caso Celso Daniel durante o período eleitoral. A mesma orientação teria sido encaminhada à delegada Elisabete Sato, titular do inquérito reaberto em julho do ano passado a pedido do mesmo secretário estadual, com acompanhamento dos promotores criminais de Santo André.


Quem até agora, entre protagonistas e figurantes do caso Celso Daniel, foi ouvido pela Comissão da qual o senhor é relator? Quais os resultados concretos desses depoimentos?


Humberto Pedrosa Espínola – A Comissão Especial foi constituída para “fazer o acompanhamento das apurações do homicídio praticado contra o prefeito de Santo André, Celso Daniel”, conforme está estabelecido na Resolução n.º 20 — CDDPH, de 11 de outubro de 2005, publicada no Diário Oficial da União. Para tanto, foi composta por cinco membros, dentre os quais este relator, e foi prevista para funcionar “por 120 dias, prorrogáveis pelo prazo que se fizer necessário ao exercício de suas atribuições”.


Portanto, não se trata de uma comissão com atividade apuratória, de inquérito, e sim de acompanhamento dos desdobramentos do chamado “caso Celso Daniel”, sobretudo os que estão se desenrolando no Judiciário.


Cabe esclarecer que as diversas hipóteses sobre a sua causalidade, as notícias de pressões políticas e econômicas e o caráter, inicialmente e por longo tempo, de segredo de justiça, motivaram as preocupações do CDDPH, direcionadas, assim, à presença da ampla defesa e do contraditório, e o seu exercício.


Quer dizer, à Comissão e aos seus membros não foi dada a missão de um trabalho apuratório, de um inquérito, para saber “quem matou e por que matou Celso Daniel”, que são ações de competência da Polícia e, agora, da Justiça. As atribuições dadas à Comissão Especial foram as de conhecer e acompanhar essas apurações, para atender a preocupação de que estejam adequadas às normas e princípios constitucionais e legais, sobretudo os direitos individuais da ampla defesa e do contraditório.


Dentro desse enfoque, a Comissão Especial manteve contatos com as autoridades competentes e buscou conhecer e reunir informações sobre o caso Celso Daniel, sobretudo as que permeiam o processo criminal em andamento. Essas atividades foram relatadas ao plenário do Conselho, que deliberou aprovar o que lhe foi relatado e prorrogar os trabalhos de Comissão Especial pelo tempo de duração do processo criminal, ora em andamento.


Por que até agora não foi ouvido o principal interessado no caso, a vítima (para a Polícia Civil e para a Polícia Federal) e réu (para o Ministério Público), Sérgio Gomes da Silva?


Humberto Pedrosa Espínola – Cabe repetir que os objetivos da Comissão Especial são de acompanhamento. Não tem por que ouvir “protagonistas e figurantes”. O que ela buscou — e vai ficar acompanhando até o fim — foi conhecer as atividades daqueles que têm competência e acompanhar para tais oitivas, sobretudo no aspecto formal das garantias dos direitos individuais. Assim há um processo criminal em andamento colocando a questão “sub judice”; há um juiz regular, presidindo o processo criminal, e devendo presidi-lo com imparcialidade; há o Ministério Público exercendo as suas atribuições legais; e há a presença dos advogados dos acusados, que funcionaram por diversas vezes até na obtenção de habeas corpus e outras medidas junto aos tribunais superiores.


Por que se demora tanto para ter efetivos resultados da Comissão instalada desde outubro do ano passado?


Humberto Pedrosa Espínola – Os resultados das atividades da Comissão foram relatados ao CDDPH. Essas atividades prosseguirão porque o órgão assim decidiu. A Comissão Especial possui um caráter de apoio ao CDDPH. Não se destina diretamente ao esclarecimento público, não atuou “para os holofotes”, mas para cumprir as funções do Conselho.


Qual sua avaliação sobre o trabalho que vem sendo desenvolvido pela revista LivreMercado, cujos exemplares lhe foram remetidos?


Humberto Pedrosa Espínola – Recebi, e agradeço, alguns exemplares da revista LivreMercado, e apresento os meus cumprimentos pelo trabalho de divulgação dessa importante região do ABC Paulista, sobretudo dos seus aspectos econômicos. No que concerne ao posicionamento, informações e opiniões que estão sendo emitidos em relação ao caso Celso Daniel, o meu posicionamento como conselheiro do CDDPH é que devem ser respeitadas, dentro dos princípios democráticos da liberdade de expressão e de Imprensa.


A complexidade do caso Celso Daniel justifica até uma livre explanação dos diversos pontos de vista. Este conselheiro tem posicionamento claro pela liberdade de Imprensa e contrário a qualquer censura prévia. A liberdade de Imprensa é um dos pilares da democracia, aliás no que está ao lado do Direito a ampla defesa e ao contraditório em qualquer processo legal. Evidentemente, os eventuais abusos (e não estou afirmando que houve) devem ser cobrados pelos prejudicados e, se confirmados, punidos dentro da lei.


O resultado da CPI dos Bingos no capítulo relativo ao caso Celso Daniel foi uma aberração, principalmente porque retira da relação de supostos culpados tanto o ex-chefe da Casa Civil, José Dirceu, quanto Gilberto Carvalho. A matéria consta da edição de julho, que lhe remetemos. O que o senhor acha disso?


Humberto Pedrosa Espínola – Sem comentários, pois estou me manifestando como membro de uma Comissão do CDDPH, não podendo e não devendo tecer opiniões pessoais ou opinar sobre situações ocorridas em outras instâncias, como é o caso da CPI dos Bingos.


O que o senhor acha do fato de que o núcleo da denúncia do Ministério Público (a cúpula petista mandou desativar o esquema de propina na Prefeitura de Santo André, daí a revolta de Sérgio Gomes e a decisão de mandar matar o prefeito) se esboroou diante da constatação, materialmente provada, de que o PT já praticava financiamento eleitoral através de caixa dois e que, conforme declararam os promotores públicos recentemente, contava com a participação da mesma cúpula petista que, anteriormente, se considerou contrária ao esquema? Podem as mesmas lideranças apresentar, segundo a versão do MP, posições tão contrastantes?


Humberto Pedrosa Espínola – Esse questionamento deve ser direcionado ao processo criminal. O processo criminal serve para apurar todas as informações e provas, e tem como objeto primordial a identificação dos culpados e o estabelecimento de suas respectivas responsabilidades criminais. O essencial é que tudo seja devidamente apurado por mais complexo que possa parecer, com a comparação dos indícios, provas e contraprovas, fornecendo afinal as condições necessárias para um julgamento justo e imparcial.


O senhor teve acesso aos inquéritos policiais do caso Celso Daniel que consideram Sérgio Gomes vítima da ação dos sequestradores?


Humberto Pedrosa Espínola – Evidentemente, tivemos franqueado o acesso aos inquéritos e ao conteúdo do processo criminal destinado a apurar o assassinato de Celso Daniel.


Qual é a previsão para que a Comissão apresente efetivos resultados?


Humberto Pedrosa Espínola – A Comissão já apresentou resultados ao próprio Conselho, e vai continuar acompanhando, até o seu final, o processo criminal supracitado, sempre no interesse de que estejam presentes os direitos e garantias individuais e de que haja a punição de todos os responsáveis.


O senhor acredita na culpabilidade de Sérgio Gomes ou o considera inocente?


Humberto Pedrosa Espínola – Também sem comentários. Mesmo porque a minha convicção individual pouca ou nenhuma importância teria. A inocência e culpabilidade de cada um dos acusados, ou até mesmo de outros que forem identificados nas apurações, deve emergir da reunião das provas apresentadas ao longo do processo criminal, que ainda não acabou.


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