Quem acompanha atentamente meus escritos não se surpreendeu com o fato de o caso Celso Daniel ganhar elasticidade no Supremo Tribunal Federal. Antecipamos que, dada a retirada de cena do inquérito que envolvia o então deputado Remi Trinta (PL-MA), a denúncia do Ministério Público Estadual contra o inocente Sérgio Gomes da Silva iria transformar o primeiro-amigo do prefeito assassinado em ponto nuclear da questionada constitucionalidade de investigação criminal dos promotores de Justiça.
Não deu outra. Anteontem, segunda-feira, o STF adiou mais uma vez a decisão sobre o poder investigatório do MP em matéria criminal.
Para variar, a mídia cobre muito mal o caso Celso Daniel. Depois de produzir quase 700 mil caracteres (ou 186 páginas) para a revista LivreMercado desde outubro de 2005, asseguro que o tratamento da Imprensa é uma mistura de incompetência e desinformação. Um ou outro jornalista mais cuidadoso ao menos não comete escorregões. Resgatar o caso sem o ranço da culpabilidade acrítica de um inocente é impossível aos jornalistas acomodados, diligentes presas de informações unilaterais.
A decisão parcial do Supremo Tribunal Federal não permite prognósticos sobre o placar final. É provável que a interrogação se prolongue por mais tempo, porque o temário é explosivo. Se for confirmado o mérito do habeas corpus do empresário Sérgio Gomes e também a anulação da ação penal do MP de Santo André, casos análogos seguiriam pela correnteza da jurisprudência.
Ou seja: eventualmente poderá haver pressão despropositada que refletiria em prejuízo latente a Sérgio Gomes, repito, inocentado em todas as investigações policiais, as quais se deram com o acompanhamento de membros do Ministério Público — como determina a Constituição Federal.
Embora o placar interrompido seja de empate na interpretação do poder investigatório-criminal do MP, no caso específico da confirmação da liminar de habeas corpus, que retirou Sérgio Gomes da prisão, o primeiro-amigo de Celso Daniel vence por dois a zero, porque tanto o relator do STF, ministro Marco Aurélio, quanto Sepúlveda Pertence entenderam que a prisão preventiva não se sustenta. Ou seja: Sérgio Gomes foi vítima de abuso judicial.
Obviamente, o procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, defende a atuação do Ministério Público Estadual como agente de investigação e denúncia de Sérgio Gomes. Disse ele ao G1, site de notícias do jornal “O Globo”: “Não há na Constituição Federal nenhuma regra que exclua o poder investigatório do MP. As normas estabelecidas trabalham no sentido da sua ampla legitimidade investigatória, seja na área penal ou não. No caso concreto, a atividade do MP foi supletiva à policial”, afirmou.
O procurador-geral da República está enganado: a atuação do MP de Santo André não foi supletiva em relação à policial, mas substitutiva, porque agiu fora do enquadramento constitucional, à parte das apurações da Polícia Civil e da Polícia Federal.
Sérgio Gomes é sobrevivente de uma opereta irracional que o elegeu bode expiatório, aniquilando-o em todos os sentidos. Nenhuma reparação financeira conseguirá amenizar jamais as barbaridades que o atingiram, com efeitos danosos sobre seus familiares.
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11/07/2022 Caso Celso Daniel: Valério põe PCC e contradiz atuação do MP