Administração Pública

Locomotiva emperrada

DANIEL LIMA - 09/09/2004

Ser governador de Estado, de qualquer Estado, é uma grande moleza no regime de repartição de responsabilidades que impera no Brasil. A bucha da crítica mais ácida sobra geralmente na grande mídia para a presidência da República e na mídia de médio e pequeno porte para os prefeitos. Governador nada de braçadas. Mantém-se a salvo de quase tudo. Quase tudo, bem dito. As poucas tarefas em que governos estaduais ganham visibilidade com certa frequência são extremamente delicadas. Economia e segurança pública, por exemplo.


Os governos paulistas, de há muito tempo, antes e durante Mário Covas, agora mesmo com Geraldo Alckmin, não conseguem debelar as chamas de uma economia em constante afrouxamento e de uma segurança pública irritantemente caótica.


Mário Covas foi condecorado em vida e sacralizado pós-morte merecidamente por ter se esmerado em colocar ordem na bagunça e na pouca responsabilidade fiscal e tributária dos antecessores. Atuou com rigidez, denodo, perseverança. Especializou-se, com seu secretariado mais próximo, em dar ao Estado de São Paulo um mínimo de organização gerencial. Tudo verdadeiro. Mas foi leniente tanto na economia como na segurança pública.


Na economia, porque o Estado de São Paulo viu desaparecerem grandes nacos de sua indústria de transformação sem que o chefe do Palácio dos Bandeirantes se desse conta da gravidade da debandada. Não fosse a força de atratividade dos municípios interioranos, principalmente os mais próximos da Região Metropolitana de São Paulo, que estabeleceram medidas atenuantes à guerra fiscal de outros Estados, teríamos dançado ainda mais feio. Mas perdemos o suficiente para ver o PIB industrial do Estado comprometido. Sem a centralidade da Capital no sistema financeiro, o comportamento do PIB paulista, como um todo, teria desabado.


Na segurança pública, porque os rescaldos do rebaixamento de renda dos trabalhadores após o enxugamento maciço das linhas de produção industrial não poderiam mesmo deixar de aparecer. Somente acadêmicos idiotas presos a gabinetes refrigerados não conseguem enxergar a relação entre esvaziamento econômico e criminalidade em alta. Sobremodo nas regiões metropolitanas, onde os contrastes sociais são um incentivo ao inchamento de registros policiais.


Quando se vive historicamente em comunidades pobres, e portanto sem questionamentos subjetivos, aspectos econômicos não ferem de morte a auto-estima nem estimulam a transgressão de convivência. Entretanto, quando ricos, remediados, pobres e miseráveis se entrecruzam no cotidiano, o oferecimento de alternativas para cortar caminho contra a desigualdade social geralmente se consuma pelo trem da criminalidade.


Pois o Estado de São Paulo antes e depois de Mário Covas, mas principalmente durante e após Mário Covas, se perdeu completamente ao não estancar a depauperação econômica e social. Prova inquestionável está no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH): a queda de participação dos municípios paulistas entre os 100 primeiros colocados é inquietante. Perdemos feio para o avanço sincronizado dos Estados do Sul do país, notadamente Rio Grande do Sul e Santa Catarina.


Os paulistas vivem há muitos anos uma grande crise desenvolvimentista porque os dirigentes públicos, além de representantes da iniciativa privada instalados em prédios suntuosos, perderam a grandeza filosófica de que a base de tudo é a economia. Preferiu o governo do Estado, principalmente a partir de Mário Covas, investir para valer em parafernálias gerenciais para arrecadar mais e mais impostos, apertando o cerco contra agentes produtivos, mas devolvendo quase nada para a recomposição de uma locomotiva que está nitidamente em desvantagem perante outros Estados. Com ou sem guerra fiscal.


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