Não pretendia escrever, ainda, sobre o novo capítulo do caso Celso Daniel. Entretanto, como há leitores que pedem ou mesmo exigem posicionamento, não dá para esperar um documento que julgo importante para o contraditório que só os imbecis temem.
Trata-se de responder à seguinte questão: e se Sérgio Gomes da Silva, que a imprensa ostensivamente favorável à consumação jurídica da condenação popular chama de “Sombra”, for a júri popular?
Estaria Sérgio Gomes irremediavelmente condenado e trancafiado?
Já fui partidário da certeza de que, por conta do histórico de extravagâncias que constituem meias verdades e, principalmente, mentiras inteiras, Sérgio Gomes não teria possibilidade de escapar de condenação. O júri popular seria uma farra de pressões e de espetacularizações. Uma romaria de candidatos a celebridade de ocasião. Coisas que os leitores sabem como são.
Agora penso diferente: exceto se as condições ambientais não ultrapassarem todos os limites de grande show televisivo, os defensores legais terão elementos de sobra para convencer os jurados de que, além de vítima do sequestro, Sérgio Gomes converteu-se em boi de piranha de investigações viciadas que deslocaram assunto estritamente criminal à esfera política.
São tantas as nuances nas quais mergulhei durante tanto tempo para consolidar a convicção baseada em materialidades de que Sérgio Gomes da Silva é inocente que, francamente, nem sei por onde continuar este texto.
Há entrecruzamentos tão diversos do caso Celso Daniel que talvez a melhor maneira de explicar aos leitores as razões de acreditar num resultado favorável a Sérgio Gomes da Silva seja o cotidiano de explicações que me pedem leitores mais frequentes ou interlocutores ocasionais.
Ainda neste final de semana prolongado, num passeio no Shopping Metrópole, em São Bernardo, mantive contato com três pessoas com as quais jamais trocara mais que algumas frases. Conversamos por mais de três horas sentados que estávamos num dos bancos instalados nos corredores do shopping e, eis que a morte do então prefeito de Santo André acabou lançada na arena de comentários.
Era o que mais temia, porque me desgasto toda vez que tenho de explicar apurações jornalísticas. Poderia simplesmente concordar com a abordagem e dar ao tema a durabilidade de uma bolha de sabão. Mas, confesso, não resisto ao assunto. Principalmente quanto tenho tempo para debatê-lo.
Os interlocutores não tinham conhecimento de meus mais de dois milhões de caracteres sobre o caso Celso Daniel. Jamais imaginaram que estavam diante de quem não sossegou o facho enquanto não foi às profundezas das investigações da Polícia Civil, da Polícia Federal e do Ministério Público.
Querem saber o resultado da conversa? A certeza de que “Sombra” era um assassino frio e calculista, que Celso Daniel era um santo administrador público que jamais participou de qualquer iniciativa que visasse a arrecadar fundos para o Partido dos Trabalhadores, entre tantas variáveis, ruiu como o alambrado do Estádio Anacleta Campanella, em São Caetano, naquele jogo em que o Santo André venceu o Saad na prorrogação, gol de Lance, e se classificou para as semifinais do campeonato de acesso que o levaria à Primeira Divisão, em 1981.
Expus aos interlocutores apenas alguns aspectos das verdades substantivas que a chamada grande imprensa omitiu descaradamente ao longo do tempo para sustentar a versão de crime de encomenda por motivação político-administrativa. Expliquei a farsa da versão estúpida do assassinato do perito do caso, contestei com dados e remissão a fontes policiais a idiotice de troca de calça de Celso Daniel entre o sequestro e o assassinato, destrocei as milongas sobre o assassinato de várias testemunhas, desmascarei a bobagem de que Celso Daniel foi encontrado de cueca pelo avesso, entre outros pontos.
Esqueci das patetices do senador Eduardo Suplicy e sua aventura rocambolesca com um pastor evangélico que teria não só assistido a tudo nos Três Tombos, onde o veículo dirigido por Sérgio Gomes foi abalroado, como também gravado as cenas. Um desvario que se comprovou estupidez, porque o suposto pastor não passava de um vigarista e o senador petista, como se sabe, é um candidato sempre pronto a chamar holofotes para si.
Querem saber o resultado final da conversa? Como um doutrinador, um missionário da Justiça, meus vizinhos de bancada de shopping mudaram completamente de posição ao ouvirem minhas explicações. Passaram a entender que o caso Celso Daniel jamais foi uma complementaridade entre as supostas propinas no Paço Municipal de Santo André e o sequestro que terminou com a morte do então prefeito.
A pergunta que mais ouço de leitores ou curiosos refere-se aos motivos que me levaram a comprar uma briga de cachorros grandes, de gente graduadíssima que digladia por espaço político e corporativo.
A resposta mais comum que exponho sem frescura é que sou jornalista independente, um completo idiota porque sei que meus textos sobre o caso Celso Daniel só me causaram prejuízos com perseguições, mas que, sempre estúpido, jamais vacilei entre a obrigação de informar e a compensação por não informar. Faço isso há 45 anos, sejam quais forem os assuntos a que o destino me apresenta.
O caso Celso Daniel marcou minha vida entre outros motivos porque, além de sentir na pele e no bolso o quanto custa contrariar poderosos de plantão, descobri que há mais sujeira e indecência ética nos grandes veículos de comunicação do que os tolos imaginam e os céticos têm certeza.
Uma tristeza, convenhamos, porque as perversidades jornalísticas a mando de patrões mercantilistas incentivam e se tornam salvo-condutos a donos de jornais mais modestos, que se sentem à vontade para agir sob o escudo de liberdade de expressão, que, de fato, não passa de liberdade do patrão.
Sérgio Gomes da Silva tem sérios motivos sim para ficar preocupado com possível julgamento popular, embora os fatos e as provas lhes sejam amplamente favoráveis. A imprensa sórdida que o condenou antecipadamente, industrializando mentiras e sonegando o contraditório, não encontrará barreiras éticas para sustentar uma farsa sobre a qual a maioria da população tem absoluta certeza de que se trata de puríssima verdade.
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11/07/2022 Caso Celso Daniel: Valério põe PCC e contradiz atuação do MP