Seria uma espécie de prévia do júri popular a que a Justiça de Itapecerica da Serra levará Sérgio Gomes da Silva só Deus sabe quando, já que recursos legais não faltam para protelar a decisão. Trata-se do seguinte: estou disposto a deslocar a segundo plano a ideia de escrever livro de tudo o que apurei no caso Celso Daniel. Trocaria a iniciativa individual por um livro escrito a oito mãos — duas minhas e outras seis dos promotores públicos que integravam o Gaeco, grupo especial que o governo do Estado instalou em Santo André para melar a bateria de críticas do PT contra a caótica situação da Segurança Pública no Estado de São Paulo naquele janeiro de 2002, correlacionando-a diretamente à morte de Celso Daniel.
Há divergências graves entre o que os promotores criminais apuraram e o que este jornalista apurou. Mais que isso: entre o que os promotores criminais apuraram e o que a Polícia Civil e a Polícia Federal apuraram.
Que tal, então, um livro que reproduza o ritual de um tribunal de júri, com direito a acusação, defesa, réplicas e tréplicas?
Estou pronto para enfrentar os promotores que já não estão mais no Gaeco em Santo André, mas que atuaram incisivamente na elucidação do assassinato. Entenda-se elucidação do assassinato sob o ângulo deles, promotores criminais, resultado que conflitou diretamente com as conclusões da Polícia Civil e da Polícia Federal. E também com o resgate de um enredo vivenciado por este jornalista.
Quem ganhará com esse modelo serão os leitores, porque terão a oportunidade de acompanhar, num mesmo volume impresso, o manancial de informações que acabou disperso e contaminado de inverdades durante muitos anos de noticiários.
Seria um documento muito importante para acabar de vez — ou diminuir bastante — com a espetacularização de um assassinato sobre o qual anônimos do mundo digital e celebridades do mundo midiático desfilam insanidades brutais em nome da liberdade de expressão.
Não chamem essa proposta de algo abusivo ou provocativo porque é o que exatamente se apresenta: uma proposta de democratização do caso Celso Daniel. Não se trata, portanto, de desafio deste jornalista aos promotores criminais. Muito menos uma convocação à guerra de versões. No máximo, no máximo, permitindo-se certa liberdade de interpretação, o que teremos é um providencial entrechoque do qual esperamos que saiam sãos e salvos os mariscos da verdade que acabarão por se chocar com as rochas de eventuais manipulações.
O que quero é que a sociedade tenha a possibilidade de encontrar um norte na avaliação do caso, sem interferências de uma parte da imprensa partidária e ideológica que atuou descaradamente na degeneração de informações. Tratarei cuidadosamente de tudo isso na obra, porque provas não me faltam.
Sei lá se os promotores criminais topam a parada, mas acho que deveriam topar. O caso Celso Daniel é um prato cheio para quem gosta de emoções, como tenho provado e comprovado nas oportunidades em que sou questionado pessoalmente ou por e-mail. Duvido que com os promotores criminais seja diferente. Gostem ou não, tanto eles quanto eu, vivemos permanentemente sob a mira da curiosidade popular, quando não de impiedosos, desastrados e enlouquecidos atiradores partidários e ideológicos.
Não me iludo e jamais me iludirei com o resultado parcial deste confronto com promotores criminais. Seria ingenuidade demais acreditar que, pelas especificidades do caso Celso Daniel, pudesse estar este jornalista em outra situação perante a maioria dos leitores senão tomando uma goleada. Não diria que são 10 a 0, porque um golzinho devo ter marcado, mas que a maioria da população bandeou-se para a certeza de crime de encomenda, não tenho dúvida.
Nem poderia ser diferente. Experimente fechar a boca durante pelo menos quatro anos e, em posição inversa, permitir que adversários veiculem nas principais mídias do País tudo o que acreditarem de negativo sobre você. Tente reverter o quadro em seguida, quando resolver botar a boca no trombone, sem que, as mesmas fontes divulgadoras de versão em contrário, lhe abram as portas.
Foi exatamente isso o que ocorreu tanto com as forças policiais paulistas quanto federais, pressionadas por razões diversas a se calarem durante a fase em que o Ministério Público mais se expôs para condenar publicamente Sérgio Gomes da Silva. Apenas este jornalista, por razões que já cansei de afirmar, ousou furar a barreira de fogo. Contei com algumas fontes policiais que atuaram diretamente no caso Celso Daniel para quebrar a monotonia da unanimidade burra.
O caso Celso Daniel é apenas mais um capítulo no qual contabilizo de imediato extrema desvantagem no placar, porque o combate se apresentava desigual. Virei muitos resultados. Sei que não vou virar esse placar facilmente. Talvez nem o consiga integralmente. Haverá sempre no subconsciente popular a certeza de crime de encomenda. Não tenho ilusões, portanto. Mas terá valido a pena, mais que qualquer reconhecimento social, a salvação de um inocente. Como, aliás, constataram tanto as investigações da Polícia Civil como da Polícia Federal.
Por tudo isso e por muito mais, teria imenso prazer em debater democraticamente como os promotores criminais.
Não gosto de utilizar linguagem armamentista, para não transmitir a ideia de que sou belicista, mas não me falta munição da pesada para descaracterizar imensa gama de imprecisões das investigações do Ministério Público. Principalmente porque os promotores criminais eles ficaram reféns dos irmãos de Celso Daniel. Nada pior do que ficar refém de parente que se sente de alguma forma culpado por não ter conseguido captar a importância de quem se foi. João Francisco e Bruno Daniel não dormem em paz entre outros motivos porque se recriminam por não terem tido a percepção ou a humildade de reconhecer a exuberância intelectual do irmão famoso.
Já tenho a ideia de como poderia ser o formato do livro que trataria do caso Celso Daniel a oito mãos. Um máximo de 300 páginas seria suficiente. Contaríamos com um mediador escolhido de comum acordo para receber o material redigido. Numa primeira etapa, seriam 80 mil caracteres para a atuação do Ministério Público, contra 80 mil caracteres para expor meu trabalho. Cada material seriam entregue ao mediador e lido pelas partes, que, então, preparariam réplica de até 40 mil caracteres cada. Material novamente entregue, novamente lido pelas partes, partiríamos, eu e os promotores, à tréplica de 30 mil caracteres cada. Depois é só editar e lançar na praça. Já tenho editora interessada.
É claro que sintetizei toda a operação. Um contrato detalhando a operação seria preparado. Estou pronto, prontíssimo, para disputar esse jogo de informações e de provas. Quero sim socializar o quanto puder o caso Celso Daniel dentro de regras mais justas. Troco a unilateralidade que estaria indelevelmente acondicionada num livro com minha assinatura, pela multilateralidade de até oito mãos de uma obra que trataria de retirar muitas névoas desse que é um dos fatos mais marcantes, instigantes e intrigantes da vida brasileira.
Será que os promotores criminais estão dispostos a estabelecer esse diálogo ou preferirão o conforto sempre vassalo de uma imprensa que, ao se afundar em versões rocambolescas, não tem como escapar da armadilha em que se meteu senão insistir nos mesmos erros e condenar ainda mais o primeiro-amigo de Celso Daniel?
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11/07/2022 Caso Celso Daniel: Valério põe PCC e contradiz atuação do MP