Caso Celso Daniel

Caso Celso Daniel: júri popular
conectado ao calendário eleitoral

DANIEL LIMA - 28/07/2010

Há uma disputa no campo jurídico atrelado ao político-partidário para manter e também para mudar a data do julgamento dos acusados pela morte do então prefeito de Santo André, Celso Daniel. O site Consultor Jurídico anunciou nesta quarta-feira que um dos sequestradores, Marcos Roberto Bispo dos Santos, teve o julgamento adiado para novembro, a pedido da promotoria. O juiz da 1ª Vara de Itapecerica da Serra, Antonio Augusto Galvão de França, remarcou a plenária para 18 de novembro, logo após o segundo turno das eleições.


Outros cinco acusados ingressaram com recurso contra a sentença de pronúncia que os levaria a júri popular ainda em agosto. Já Sérgio Gomes da Silva, a quem a força-tarefa do Ministério Público em Santo André acusa de mandante do crime, numa operação que cansei de denunciar como política, não irá a julgamento. O processo contra ele foi desmembrado. O andamento da acusação que lhe pesa depende de entrega de provas solicitadas pela defesa.


No fundo, no fundo, tudo isso já era previsto, porque o ordenamento jurídico assim o indicava. O mundo criminal é um jogo com muitas prorrogações, com cobranças de pênaltis que se alongam quase à eternidade. A movimentação de peças em situações excepcionais como do caso Celso Daniel reúne batalhões de especialistas em multiplicar a subjetividade do tempo, porção metafísica de medição incalculável.


A movimentação extra-campo desse novo capítulo do caso Celso Daniel está permeadíssima de interesses que ultrapassam o campo criminal.


Como se sabe, também invade a área constitucional — na briga de foice no escuro de manejo de filigranas jurídicas entre a Polícia Judiciária e o Ministério Público, forças concorrenciais em defesa de interesses corporativos quanto à legalidade do poder de investigação dos promotores criminais. Tudo desemboca, nesse caso, no campo eleitoral. Ou alguém se esqueceu que está programada para outubro uma peleja nacional para os cargos executivos e legislativos mais importantes do País? Basta recorrer ao noticiário político — que se assemelha à guerra de vizinhos – e ao linguajar bélico de José Serra e de Dilma Rousseff.


Já imaginaram os estragos às candidaturas petistas e de aliados se o júri popular instalar-se antes das eleições desta temporada?


Um vendaval de ilações tornaria Itapecerica da Serra espécie de Serra Pelada criminal, para onde acorreriam todas as manchetes sensacionalistas de uma mídia sempre disposta a priorizar três desdobramentos de situações semelhantes: audiência, depois audiência e, finalmente, audiência.


Nem a mais cobiçada rede de televisão, que tem por costume e competência dar roupagem mais sofisticada a assuntos policiais — retirando-os do populismo ao qual os menos apetrechados se atiram freneticamente — se furtaria a adicionar algumas toneladas de dinamite à carga pesada que relegaria a cobertura do caso Nardoni a apagadíssimo festim.


A Procuradoria-Geral paulista trata o julgamento do caso Celso Daniel como um dos mais importantes na esfera criminal. Nenhuma surpresa. Por causa disso, aliás, indicou, conforme noticia o Consultor Jurídico, uma tropa de choque do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao crime Organizado) do Grande ABC. Mais que isso: escalou uma megaestrela do mundo criminal. O promotor Francisco Cembranelli, popstar do julgamento do casal Nardoni, que atua no 2º Tribunal do Júri da Capital, foi designado ao julgamento de todos os réus do caso Celso Daniel.


Uma jogada de mestre para quem quer ver em chamas o circo do Partido dos Trabalhadores, ao qual Sérgio Gomes da Silva estava atrelado à época da morte de Celso Daniel. Do outro lado do júri popular poderá estar o advogado de defesa, Roberto Podval, que atuou a favor dos Nardoni. Pode estar certo de que ainda está com o juízo em dia quem chegar à conclusão de que poderá ser automática a mancha de contaminação à criminalização do então primeiro amigo de Celso Daniel.


Como se sabe, Sérgio Gomes da Silva foi apontado pelo Gaeco como mandante do crime, apesar de todas as evidências e provas em contrário de duas minuciosas investigações da Polícia Civil do Estado de São Paulo e uma da Polícia Federal, esta por determinação do então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, atendendo solicitação do então presidenciável Lula da Silva.


Será que Sérgio Gomes da Silva levado à júri popular tendo Francisco Cembranelli a acusá-lo e Roberto Podval a defendê-lo conseguiria escapar de uma sentença do júri popular que, representando o pensamento médio da população brasileira, o coloca como acusado às portas da condenação?


Quem ao longo de quatro anos em que os policiais civis e federais foram instados a silenciar-se, enquanto os promotores criminais ocuparam sistematicamente a mídia com o desfilar de declarações que incriminaram Sérgio Gomes da Silva, resistiria à condenação pública?


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