Administração Pública

Celso Daniel requisita estrela
para reinventar Santo André

DANIEL LIMA - 27/09/1997

O maior garoto-propaganda da modernização do Estado, o consultor norte-americano Ted Gaebler, co-autor do livro Reinventando o Governo e mestre em Administração Governamental pela Universidade da Pensilvânia, passou duas horas e meia no final do mês passado no palco do Teatro Municipal de Santo André. Convidado pelo prefeito Celso Daniel e pela secretária Miriam Belchior, da Administração, ele reforçou o plano de reorganização da Prefeitura. Falou professoralmente para platéia basicamente formada por funcionários públicos. Gaebler foi duro, mas não perdeu a ternura. Por isso, mesmo batendo o tempo todo na endêmica improdutividade da burocracia pública nacional, acabou aplaudido.


Nem o desconhecimento de determinadas realidades brasileiras, como a carga tributária de 31% do PIB (Produto Interno Bruto), que o impediu de análises específicas, provocou pane no desempenho de Gaebler. Ele se perdeu durante a etapa final, reservada ao questionamento do público, mas deixou ótima impressão durante exposição sobre sua experiência de executivo público. A possibilidade de que teria respostas encomendadas para satisfazer inteiramente a ação administrativa do prefeito Celso Daniel não resistiu a outro escorregão de Gaebler, quando ele, ao responder a um funcionário público, contrariou a política de enxugamento da máquina de Santo André, evidentemente sem o saber, e se mostrou contrário a demissões. Provavelmente sua resposta seria outra se lhe fosse apresentada previamente uma projeção de custos da Administração.


O deslize de Ted Gaebler acabou por fortalecer a credibilidade de sua pregação, essencialmente de mudança e não simplesmente de gestão dos governos. Sua mensagem foi clara: o Estado provedor e todo-poderoso, senhor dos céus e da Terra, está se esmilinguindo em todos os cantos do planeta. Só a África do Sul e a Coréia do Sul têm aumentado fatias de participação do Estado na prestação de serviços. Os governos dos Estados Unidos perderam 17% de participação entre 1976 e 1997. Gaebler relacionou vários outros países em que o conceito de governar já não se confunde mais com aumento de impostos.


Exemplos de parcerias com o setor privado não faltaram. Ele desfiou ações e mais ações que retiraram do Estado funções que políticos e intelectuais tupiniquins insistem em atribuir aos governos de diferentes esferas. Citou a segurança nos Estados Unidos, onde há dois milhões de policiais de empresas privadas e apenas um milhão do serviço público. A cada novo exemplo, mais o silêncio prevalecia no Teatro Municipal.


Mas houve momentos em que não faltaram sorrisos e comentários maliciosos. Um dos quais quando disse que apenas 1% dos funcionários públicos (e também das empresas privadas) roubam. E que apenas 5% seriam demissíveis.


Didaticamente, fazendo uso de transparências, o consultor destacou decálogos relacionados à produtividade, à qualidade e a novos conceitos de integração do Poder Público com a sociedade. “Reinventar é mudar, não quebrar regras” — disse, para diferenciar a ação de mudança da de quebra-galho que faz parte da cultura pública nacional. “E se o dinheiro fosse meu?” — indagou esse apaixonado por administração pública, referindo-se aos usos e costumes do funcionalismo público. “Se o mundo todo está mudando, se as empresas mudam com a concorrência, lutam contra a obsolescência, buscam novos produtos, se a largura das gravatas mudam, se o tamanho da saia muda, por que os governos não devem mudar?” — questionou ele de forma estrategicamente pausada para que a tradução não fosse prejudicada.


Gaebler usou de metáforas e de poemas. Só faltou plantar bananeira para assegurar as atenções da platéia. Contou piadas. Disse que conhecia 288 barreiras para os governos não acordarem para a necessidade de mudanças. E que aumentou o estoque para 289 durante viagem ao Canadá, quando um funcionário público bem-humorado e tiritando com a temperatura de 40 graus disse-lhe: “Está muito frio para mudar”. A platéia gargalhou.
Com Celso Daniel e Miriam Belchior na primeira fila do Teatro Municipal, Ted Gaebler chamou atenção para o exercício da criatividade. Defendeu o direito do erro em nome da criação. Sugeriu liberdade para o funcionalismo falhar. “O importante é aflorar a criatividade” — disse.


A palestra do norte-americano revela muito mais que enganosa conversão da administração de Celso Daniel ao neoliberalismo. O prefeito de Santo André quer provar que o Estado tem condições de prestar serviços públicos de boa qualidade. Ele disse isso com todas as letras na abertura do encontro, ao lado de Gaebler e de Miriam Belchior.


A reforma da Prefeitura de Santo André mal começou e envolve, entre outros aspectos, nova macroestrutura organizacional, descentralização de processos de compras, reformulação do atendimento ao público no Paço Municipal, informatização, implementação do programa de qualidade e de sistema de indicadores de desempenho e capacitação, além de integração dos servidores. Que as bênçãos renovadoras de Ted Gaebler se multipliquem.


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