Entrevista Especial

Estado muda para
arrecadar muito mais

DANIEL LIMA - 05/10/1997

O governo do Estado quer arrecadar mais. Depois de ter apresentado crescimento na receita do ICMS, Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, de 40% em relação a 1994, quando da introdução do Plano Real, o fisco estadual quer novos avanços, segundo Clóvis Panzarini, coordenador da Administração Tributária. A principal novidade metodológica é a fiscalização setorial adotada em substituição ao modelo circunscricional, considerada uma revolução dentro do programa de modernização. O modelo setorial permite ao Fisco visão sistêmica da economia, das relações intersetoriais, dos efeitos que cada setor provoca.


Clóvis Panzarini nega qualquer possibilidade de o Grande ABC sofrer pressão da ação fiscal mais intensa do que outras regiões, por ser densamente ocupada por empresas, mas em seguida afirma que a atuação do efetivo fiscal, “evidentemente”, obedece a distribuição da demanda por esse tipo de serviço. “Assim, o número de contribuintes, o volume de arrecadação e a extensão territorial são fatores determinantes da distribuição do efetivo fiscal” — afirmou.


Uma declaração que nem precisa ser traduzida como ingrediente do Custo ABC, já que a fiscalização que passa por aqui não necessariamente atinge com a mesma intensidade outras regiões.


O que mudou na política de arrecadação tributária no Estado de São Paulo durante o governo Covas em relação ao anterior? A fiscalização tornou-se mais rígida? Quais os resultados comparativos dessa transformação?


Clóvis Panzarini – A administração tributária do governo Covas está implementando ambicioso programa de modernização que conta, inclusive, com apoio técnico e financeiro do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Este programa, que pretende superar o abandono de 25 anos a que foi relegada a administração tributária estadual, tem quatro esteios básicos: capacitação dos recursos humanos, recuperação da infra-estrutura, informatização e revisão dos sistemas e procedimento.


Dentre os objetivos desse programa, destacam-se a redução de custos de administração tributária para o fisco e para o contribuinte, através da simplificação de procedimentos e eliminação de obrigações tributárias estéreis e, principalmente, o aumento da eficiência e eficácia no combate à sonegação fiscal. Esta política permitiu, em apenas dois anos, expressivo aumento da arrecadação tributária sem qualquer aumento das alíquotas.


A arrecadação do ICMS de 1996, descontada a inflação, ficou 40% acima da verificada em 1994 mesmo tendo sido reduzida de 18% para 7% a alíquota incidente sobre vários importantes produtos de alimentação da cesta básica (açúcar, café, óleos comestíveis, leite longa vida etc). A arrecadação do IPVA foi multiplicada por três, em dois anos, graças à modernização do sistema de controle, que permitiu eliminação plena da sonegação.


Dos R$ 250 milhões anuais de IPVA arrecadados até 1994, deveremos recolher em 1997 mais de R$ 900 milhões, mesmo tendo sido ampliada a isenção para veículos mais velhos (a isenção passou a abranger, a partir de 1997, veículos com mais de 20 anos. Até o ano passado a isenção beneficiava veículos com mais de 30 anos). Dessa forma, o governo Mário Covas tem reduzido, de forma seletiva, várias alíquotas de ICMS e do IPVA e, ainda assim, aumentado a arrecadação tributária.


Considerando-se que São Paulo é quase uma exceção à regra no universo de Estados brasileiros com essa política de elevação dos níveis de arrecadação com base em mecanismos modernos de fiscalização, não estaríamos vivendo situação paradoxal de incentivo à evasão industrial ainda maior em direção a outros territórios que dão folga aos empreendedores?


Panzarini – Não se pode imaginar uma política de desenvolvimento industrial calcada no incentivo à sonegação fiscal. O combate à sonegação, além de ser obrigação da administração tributária, busca a justiça fiscal e a eliminação da concorrência predatória exercida pelos maus contribuintes que, à mercê da fraude, roubam fatia de mercado dos que cumprem com o dever cívico de recolher os tributos.


Ademais, o aumento de arrecadação através do aumento de eficiência virá permitir, como em alguns casos já tem permitido, a redução da carga tributária nominal, dando-se, assim, vantagens comparativas aos contribuintes honestos.


Como já disse, um dos mais importantes objetivos do programa de modernização da administração tributária paulista é facilitar a vida do contribuinte e a redução de seus custos administrativos, dando-lhe, assim, mais condições de competitividade. Várias simplificações já foram implementadas e ainda outras estão por vir. Pretende-se, na medida do possível, evitar a necessidade do contribuinte frequentar as repartições fiscais. A informatização está permitindo que várias obrigações acessórias sejam cumpridas via Internet ou EDI.


A grande revolução que estamos fazendo, na realidade, é a mudança de mentalidade do fisco. O contribuinte não é mais encarado como adversário ou inimigo, mas como cliente da administração tributária, que existe para bem serví-lo.


Como o senhor observa a situação do Grande ABC no bolo de redistribuição do ICMS diante dos seguintes fatos: comparando os índices de 1982 com os de 1997, ponta a ponta, as perdas da região por contribuinte atingiram 37%, conforme estudos que realizamos recentemente. Se a comparação fosse feita ano a ano, as perdas cumulativas seriam ainda maiores, porque em quase todo o período a distribuição do ano seguinte reduziu-se em relação ao ano anterior. O que os números do ICMS estão escondendo, ou revelando, sobre a realidade do Grande ABC? Esses números não são mais graves à medida que se sabe que o Grande ABC, pela concentração de empresas, facilita a fiscalização por parte de sua Secretaria?


Panzarini – Está ocorrendo evidente desconcentração industrial no Estado de São Paulo, não apenas na região do ABC, mas principalmente na área da Capital. Esta desconcentração industrial decorre de vários fatores. O principal é o que economistas chamam de deseconomia de aglomeração. Os crescentes custos locacionais da congestionada área metropolitana de São Paulo têm superado os benefícios decorrentes da aglomeração e isto tem levado as indústrias a se relocalizar no Interior do Estado e, o que é pior, em outros Estados.


De que forma é distribuída a fiscalização em São Paulo e qual o posicionamento do Grande ABC? Traduzindo: qual é a estrutura paulista de arrecadação de impostos e como se localiza estatisticamente o Grande ABC nesse trabalho? Somos uma região permanentemente na alça de mira da Secretaria?


Panzarini – Não há nenhuma razão especial para que o Grande ABC sofra pressão da ação fiscal mais intensa do que outras regiões. A distribuição do efetivo fiscal, evidentemente, obedece a distribuição da demanda por este tipo de serviço. Assim, o número de contribuintes, o volume de arrecadação e a extensão territorial são fatores determinantes da distribuição do efetivo fiscal.


Recentemente o senhor falou sobre mudança de metodologia de fiscalização, que deixaria a regionalização pela introdução da setorização. Como de fato isso será efetivado, quais os motivos para a mudança e quais as perspectivas de resultados? Algum outro Estado já aplicou esse modelo? O que isso significará para o Grande ABC?


Panzarini – A adoção da fiscalização setorial que aos poucos irá substituir o superado modelo circunscricional é uma verdadeira revolução que se está implantando dentro do programa de modernização da CAT – Coordenadoria de Administração Tributária. O modelo setorial permite ao fisco visão sistêmica da economia, das relações intersetoriais, dos efeitos que cada setor provoca para frente e para trás.


O campo de visão do fiscal não mais se cinge ao estabelecimento que está sendo fiscalizado. O estabelecimento fiscalizado é apenas uma peça no quebra-cabeça da economia. Quatro setores já estão eleitos, as ações já estão na rua e outros 18 setores estão sendo formatados. Esse modelo é inédito no Brasil, mas está despertando interesse do fisco de todos os demais Estados. A fiscalização setorial, na medida em que vem aumentar a eficácia no combate à fraude fiscal, terá importante significado para todos os contribuintes, não apenas para os do Grande ABC, que cotidianamente sofrem a concorrência desleal dos fraudadores.


Lideranças empresariais defendem a redução da alíquota do ICMS no Estado de São Paulo de 18% para 12%, como forma de concorrer em igualdade de condições com a maioria dos demais Estados. Alega-se que as supostas perdas de arrecadação não seriam confirmadas, porque a dinâmica dos negócios permitiria crescimento das relações comerciais. Como o senhor observa essa questão?


Panzarini – Uma redução de carga tributária dessa magnitude (33,3%) simplesmente inviabilizaria o governo do Estado de São Paulo. Essa colocação simplista de que a redução de alíquota aumenta a arrecadação pode ser conveniente mas, infelizmente, não é verdadeira. Quando muito, a queda de arrecadação é menos que proporcional do que a queda de alíquota. A alíquota do ICMS nas operações internas é, teoricamente, neutra em termos competitivos, uma vez que tanto a produção paulista quanto a de outros Estados sujeita-se, em território paulista, à mesma alíquota, seja de 18%, 25% ou 12%.


É claro que as mercadorias oriundas de outros Estados chegam a São Paulo com carga tributária de 12%. Entretanto, na venda subsequente, o contribuinte paga a diferença de alíquota, uma vez que essa mercadoria traz menos crédito que aquela adquirida de contribuinte paulista, que é tributada a 18%. Quando essa diferença não é paga é porque houve sonegação e sonegação fiscal deve ser combatida com modernização e com eficiência, não com redução de alíquota.


Ainda sobre essa questão, as estatísticas sobre a performance dos PIBs regionais não estariam fora da realidade se for considerado que a arrecadação de ICMS, um dos quesitos de avaliação, não recebe o mesmo tratamento em todos os Estados? É incorreto dizer que uma comparação linear de arrecadação de ICMS dos Estados como elemento de análise econômica não é material confiável porque há diferença de alíquotas? E também porque há renúncia fiscal?


Panzarini – Não existem diferenças substanciais entre as alíquotas internas do ICMS, praticadas pelos diversos Estados. As alíquotas interestaduais, que são diferenciadas, representam meramente partilha de arrecadação entre o Estado produtor e o Estado consumidor. Ademais, essas alíquotas internas estão estáveis desde 1989. Quanto à renúncia fiscal, praticada em função da chamada guerra fiscal, como regra não se faz através de redução de alíquota ou concessão de isenção, mas sim através de financiamento de capital de giro às empresas investidoras, a longo prazo, com recursos orçamentários do governo. Estes financiamentos têm como referencial o ICMS recolhido pelas empresas beneficiadas.


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