Regionalidade

ENTENDA AS TRÊS MAIORES
AMEAÇAS AO GRANDE ABC

DANIEL LIMA - 25/04/2025

Se você quer me ver embaraçado, basta perguntar quais são as três maiores ameaças que deveriam tirar o sono de quem vive no Grande ABC. Se você quer me ver preocupado para valer, basta repetir a pergunta. Se você ameaçar abandonar esse texto caso não responda à insistente indagação, minha resposta é exatamente a seguinte: me dê um tempo para pensar. Pegar de supetão um pobre ombudsman com uma pergunta dessas é o fim da picada. Não falta mercadoria na prateleira de respostas.  O risco é excesso de mercadoria no carrinho de respostas. Ou seja: estamos fritos e mal pagos.

Como não sou de fugir da raia e tampouco quero perder o leitor atento ao que se passa na região, vou seguir em frente. Juro por todos os juros que estou escrevendo em tempo real. Ou seja: o que você está lendo agora não foi redigido agora, mas quando o foi era agora. Entendeu? Se não entendeu é porque é difícil mesmo de entender. Basta uma reflexão e tudo estará resolvido.

Traduzindo: não pensei nem nessa temática desafiadora  -- e consequentemente no resultante disso  --  quando resolvi, agora, às 10 horas e alguns minutos a noite desta quinta-feira, adiantar uma análise para dar conta das tarefas do dia seguinte que, passadas algumas horas virou, virou o hoje, sexta-feira.

Vamos ver então o que pensei? Juro mais uma vez que estou respondendo de bate-pronto, sem tempo para qualquer consulta a arquivos digitais e a sinapses. Vou no piloto automático da memória.

Listo três questões que, por serem expostas em tempo real, explicada a relativização do tempo real, me permitiriam até o final do texto introduzir alguma alteração. Vou seguir em frente com a convicção de que matarei a pau o desafio que me impus. Então vamos? 

SETOR AUTOMOTIVO.

LOGISTICA ESTRANGULADA.

INSTITUCIONALIDADE FRÁGIL. 

Nesse exato momento acabo de produzir 1.903 caracteres de um texto programado para não mais que 10 mil caracteres, equivalente a uma página inteira de jornal de papel. Caracter é cada letrinha que compõe cada palavra. Conte o espaço em branco entre uma palavra e outra e o resultado estará sendo respeitado. Vamos então a breve destrinchar do primeiro quesito já exposto:

SETOR AUTOMOTIVO

Somos inapelavelmente uma Detroit à Brasileira. Não bastasse a concorrência feroz implantada em vários Estados do País, movida à guerra fiscal e outros babados, a eletrificação vem aí. Essa é mais que uma ameaça. Trata-se de uma questão inexorável ditada pelo tempo. Sem possibilidade de recuo. Os chineses estão chegando com tudo. Diretamente com fábricas locais e com exportações. O Grande ABC já duramente batido nos últimos 30 anos com a descentralização automotiva vai comer novos pães que o diabo amassou. Não contamos com mais que 10% da produção de veículos no País. E perdemos participação a cada novo ano. A pior combinação possível de tudo isso é que vivemos dupla face de estragos: na medida que perdemos participação relativa nacional, aumentamos a incidência da Doença Holandesa regional. Ou seja: o setor industrial não encontrou alternativa para fugir do tranco. E a participação relativa interna das montadoras e das autopeças segue direcionando nosso destino. Não poderia haver situação pior. O polo automotivo da região poderá sofrer desfalque ainda maior do que o registrado nos anos 1990, arrasado durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. Investimentos à conversão de produção de veículos eletrificados vão gerar baita redução do parque de autopeças. Os veículos elétricos são destruidores de autopeças. Muito menos da metade dos componentes resiste à transposição fabril. Não vai faltar área à disposição de condomínios logísticos de empregos na maioria de baixo valor agregado. O que tem salvado a região como um todo e principalmente Santo André, Mauá e São Caetano especificamente, é a Doença Holandesa Químico-Petroquímica, que gera pouco emprego, mas muita grana fiscal. É pouco provável que ficaremos órfãos desse setor. O custo de fechamento ou de transferência de fábricas não compensaria qualquer operação. Mas estamos estagnados frente à produção nacional. Basta ver o que se passa em outros polos petroquímicos, de valor adicionado muito superior. 

LOGISTICA ESTRANGULADA

Essa é uma batalha praticamente perdida. Mais do que já ocorreu com a chegada do trecho Oeste e também do trecho Sul do Rodoanel Mario Covas. A área Oeste do Rodoanel, de Osasco e Barueri, entre sete municípios, ultrapassou com folga o PIB do Grande ABC. Antes da chegada do primeiro trecho, o trecho Oeste, em 2002, ganhávamos com facilidade na contagem anual de produção de riquezas. Daí em diante entramos em parafuso. Perdemos uma profusão de empresas e de potencialidades inseridas em forma de efetividade nas planilhas de custos. Está prevista para o ano que vem a entrega do Rodoanel Norte, que torna Guarulhos e vizinhança ainda mais fortes. Não adiante choro nem vela. Vamos dançar de novo. É inexorável. Aliás, mesmo sem o trecho Norte, mas beneficiada lateralmente pelo trecho Oeste, de Osasco e Barueri, a região de Guarulhos já ganhou um bocado de força. Os números são implacáveis. Deverá ultrapassar o PIB do Grande ABC quando forem atualizadas as temporadas pelo IBGE. Não adianta secretário de Desenvolvimento Econômico achar que logística é a menor distância entre dois ou mais pontos. Fora São Bernardo, e mesmo assim com limitações, não há Município da região que combine qualquer coisa que resulte em competitividade industrial. A logística pesa muito. O trecho Norte será nosso cadafalso. Não há o que fazer para obstar o estrago. Nem rezar. 

INSTITUCIONALIDADE FRÁGIL

A ladainha em torno da reorganização do Clube dos Prefeitos não dá sinal algum de que conduzirá o Grande ABC a outro destino senão à continuidade de fracassos encavalados. Os prefeitos que agora dizem para todo mundo que estão juntos não manterão esse entusiasmo porque deverão repetir o comportamento de autossalvação de várias turmas antecedentes. Na medida em que tomam mais contato com as responsabilidades de prefeitos municipais, mais se tornam evasivos como prefeitos regionais. Há o contraponto de que teriam eles, os novos prefeitos, descoberto a pólvora de que sem unificação de interesses e projetos, pouco será possível alcançar. Mas o imediatismo de resultados superará em larga escala a reflexão coletiva e construtiva além do próprio município. E mesmo que estiquem um pouco o prazo de validade regionalista, a concorrência externa, de outras regiões do Estado,  sem amarras territoriais que o separatismo criou no Grande ABC é muito mais flexível, ousada, livre e desimpedida para tomar dianteiras decisórias que aqui se arrastam. Vamos consolidar um Clube dos Prefeitos de Pedintes. Eles trafegarão em nome da regionalidade apenas em gabinetes estaduais e federais, porque, nessas instâncias, o discurso regional sempre tem mais força.

TUDO RESOLVIDO?

Agora cheguei ao total de 7.043 caracteres, depois de 20 minutos de dedos espertos no teclado como se pianista fosse. Sim, já escrevi sobre isso. Vivo a alma e o coração de pianista quando decido escrever. Talvez seja uma frustração que no caso ganharia outro nome, algo como motivação para fugir da realidade que me cerca toda vez que decido escrever mal traçadas linhas.

Escrever é minha terapia mental. E nesses dias até mesmo terapia física. Sofri uma queda idiota e feri meu pulso direito. Na medida que exercito meus dedos, sinto que recupero parte da mobilidade. Fiquei no limite de desmunhecar.

Francamente, não consigo imaginar nesse momento, caminhando para as 10 e 30 da noite de agora, que é noite de ontem quando você ler essa análise, não consigo imaginar que entre a vigília e o sono vão saltar de minha mente uma quarta, quinta ou mesmo uma sexta marcações que teriam peso semelhante às três escolhidos logo acima.

Fosse dirigente do Clube dos Prefeitos, não teria dúvida alguma de mandar afixar na porta de entrada, nas portas dos departamentos, no salão de eventos, no telhado, no assoalho, onde houver espaço à atração de olhares e responsabilidade, as três arapucas acima em que nos metemos. Já imaginaram placas de advertência e de motivação para essas três grandes batalhas? Forças-tarefas atentas iriam a campo.

REI DA INFRAESTRUTURA

Qualquer consultoria especializada em competitividade econômica que por ventura o Clube dos Prefeitos decida contratar para vasculhar a bola de cristal que determinaria o futuro do Grande ABC, forçosamente passará por esse Triângulo das Bermudas. Cada marcador é uma ponte que caiu e que precisa de reconstrução.

Não chamem charlatões para cuidar disso porque muitos já passaram por aqui. Houve até um governador de Estado que vendeu a falácia de que o Rodoanel colocaria São Bernardo na condição de Melhor Esquina do Brasil. Um paspalho populista como tantos outros que à falta do que realizar, propagam mentiras cabeludas glorificadas pela mídia de conveniências. Responsabilidade Social é artigo raro.

Certo fez o prefeito Orlando Morando que,  em dois mandados,  cuidou da infraestrutura física como nenhum outro prefeito ao longo da história. Mitigou situação estruturalmente dramática. Já escrevi que Orlando Morando foi o Celso Daniel da Infraestrutura de São Bernardo. Celso Daniel é referência como criador e incentivador da regionalidade institucionalizada.

Pronto, está encerrada a análise. Menos de meia hora e 10 mil caracteres depois. O que é tempo real para mim passa a ser tempo real para você, com a diferença de mais de 10 horas entre uma coisa e outra. Talvez nem Albert Einstein tenha projetado a relatividade do tempo nessas circunstâncias. Coisa de maluco.


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