Política

Ilha da fantasia

DANIEL LIMA - 20/02/2005

Nenhum deputado federal que tenha emergido das digitais do eleitorado do Grande ABC fez sucesso de verdade. Um ou outro tenta vender gato de varejismos pontuais por lebre de ação sistemicamente regionalista. Tudo não passa de cortina de fumaça, deliberadamente ou não lançada para embasbacar a platéia mais ingênua, menos informada ou mais acriticamente entusiasta.


De fato, preto no branco, considerando-se a tessitura de mandato de deputados da região que por Brasília passaram, nenhum, absolutamente nenhum escapa de nota de corte abaixo da média mínima desejada, por menor que seja o nível de exigência. De Lula a Celso Daniel, passando por antecessores e predecessores que saíram das entranhas do Grande ABC, ninguém escapa.


A biografia de cada um deles é pobre entre outras razões porque a capital federal é uma caixa-preta cujo segredo é tão enigmático quanto o Código Da Vinci. Com a agravante de que supostos decifradores vivem permanentemente em estado de euforia, certos de que não só desvendaram todos os mistérios da arte congressual como se tornaram estrelas de primeira grandeza nas terras de origem. Esse é o metabolismo da fisiologia, do compadrismo, do partidarismo e do demagogismo regido pela vaidade pessoal.


Entretanto, quando se dão conta de que o distanciamento do eleitorado é um contra-senso à imperiosidade de estarem fisicamente presentes, palpáveis, participativos, dentro da lógica de que os eleitores decidem seus votos de acordo com as problemáticas locais, acabam caindo na realidade. Muitas vezes é tarde demais.


Há, portanto, série de explicações para agravar e também para atenuar, dependendo do ângulo que se utilize, o desempenho dos deputados federais carimbados pela região. Entretanto, surge imponente uma certeza absoluta: o corpo a corpo de interação efetiva com os macroproblemas do Grande ABC se desprende na medida em que os nossos eleitos arrumam as malas e se mandam para a capital federal, sorvedouro do sentimento de regionalidade na exata medida de encantamento pela disputa do poder de influir ou de se pensar que se está influindo no destino do país.


É preciso quebrar essa série histórica de descuidos, para não dizer de omissões e de descasos. É indispensável retirar nossos deputados federais da obscuridade institucional em que se metem, cujos reflexos se irradiam no esfarelamento contínuo da importância econômica do Grande ABC no país.


Nem entra em debate o que faz de fato cada deputado federal da região, se produzem ou não, se resolvem questões miúdas ou não. O que deve mover as instâncias locais a converter seus mandatos em benefícios explícitos à comunidade são compromissos de peso. Não tem cabimento que apenas o liberal Edinho Montemor tenha acompanhado o prefeito William Dib, presidente do Consórcio Intermunicipal, no encontro com o ministro dos Transportes, para lembrar o governo federal de que o Rodoanel é uma obra que exige financiamento da União. Enquanto isso, Vicentinho Paulo da Silva e Wagner Rubinelli, deputados federais petistas, abriam alas para sindicalistas locais no Ministério da Fazenda na tentativa de persuadir o governo a impedir que a Chevron deixe o Pólo Petroquímico de Capuava.


O que os deputados federais precisam compreender — e a mesma reflexão pode ser estendida aos deputados estaduais — é que irão a julgamento não pelo que construírem individualmente, em benefício próprio, ao carreirismo e mesmo em favor de determinados nichos comunitários ou corporativos. Valerá mesmo o que deixarem de herança para o conjunto da sociedade regional.


Querem um exemplo de quem deve ser rigorosamente atirado ao mar da improdutividade regional, por mais que cantem de galo sobre supostos feitos individuais? Os deputados federais que nos representaram em Brasília durante os anos de chumbo do governo Fernando Henrique Cardoso contabilizam déficit irrecuperável perante o Grande ABC.


Quem era da situação, porque perdeu a oportunidade de sensibilizar o governo pelo exercício da proximidade.


Quem era da oposição, porque desconsiderou as vicissitudes pelas quais passou o Grande ABC que acumulou 39% de quebra do PIB industrial.


Não canso de repetir esses números porque são uma questão devastadora do histórico de riqueza construído ao longo de três décadas.


Os senhores deputados federais do Grande ABC, assim como os deputados estaduais, precisam ter mais responsabilidade coletiva com a sociedade regional. A Agência de Desenvolvimento Econômico e o Consórcio Intermunicipal de Prefeitos precisam reservar-lhes espaços para que entendam a dimensão de nossos problemas. Algo possível apenas quando se vive de fato nesse território.


Para começar, é inadmissível que estejam, os cinco federais, fora da reunião desta terça-feira com o ministro dos Transportes para acertos sobre o trecho Sul do Rodoanel.


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