Capital econômica do Grande ABC desde que as montadoras de veículos, quatro décadas atrás, começaram a ocupar seu território, São Bernardo só descobriu agora a importância de organizar estrutura administrativa pública voltada às atividades do setor. Escolhido pelo prefeito Maurício Soares para comandar a recém-criada Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Turismo, o empresário, advogado e economista Valter Moura acaba de compor autêntica força-tarefa para iniciar reviravolta de um quadro em franco processo de esvaziamento econômico.
Presidente da Associação Comercial e Industrial de São Bernardo durante muitos anos, privatista de um administrador público municipal com raízes petistas, Valter Moura sabe o que o espera: um quadro de complicações operacionais decorrentes das dificuldades econômico-financeiras de uma Prefeitura atolada em dívidas, além do desafio de introduzir respostas que cobrava sistematicamente como líder de classe.
Uma faxina geral na então Coordenadoria Econômica, criada pelo ex-prefeito Walter Demarchi e que se transformou em cabide de emprego, marcou o primeiro ato de Valter Moura. Sobraram apenas dois dos 20 funcionários. Os demais, todos comissionados, esmeraram-se numa fórmula de ludibriar o respeito pelo cargo público, revezando-se nas constantes ausências e nas raras presenças.
Valter Moura sabe que o peso da desconfiança que a administração pública sofre por causa de desvios como o que teve que eliminar requer trabalho redobrado para a conquista de credibilidade. E é o que está fazendo com seu grupo de colaboradores, todos egressos da livre-iniciativa.
Para a diretoria de Comércio foi convidado Antonio Loureiro. Cargo semelhante, mas da indústria, está ocupado por Fernando Longo, durante muitos anos executivo da Scania. A Divisão de Apoio Técnico é ocupada por Edson Gianelli e a Divisão de Turismo tem Paulo Tinoco como titular. Completando o quadro, Carlos Kubota atua na assessoria. É com esse time, poucos recursos financeiros, vários projetos e uma disposição incomum no setor público que Valter Moura espera mudar a imagem de São Bernardo que pouco difere da da região como endereço nada interessante para investimentos.
“Estamos assumindo num momento de grandes transformações na região. O sentido de integração regional é vontade de todos os prefeitos e de seus secretários, bem como das Câmaras Municipais. O Fórum da Cidadania dá sua importante colaboração nesse sentido. Então, o que temos de fazer é trabalhar” — afirma.
Um plano de ações já foi elaborado por Valter Moura e sua equipe. Não é volumoso como costumam ser os projetos públicos feitos para impressionar. Nem resvala em detalhismos. É simples, didático, exequível.
O Departamento de Comércio e Serviços traça planos para a unificação regional do ISS, para a criação da Comissão Municipal de Empregos, para o Manual do Empreendedor, para a capacitação profissional, para a regularização de atividades econômicas, para a programação visual dos corredores comerciais e para a criação do Shopping de Móveis a Céu Aberto. Nada que seja rebuscado, produzido para impactar e ficar só nisso.
O Departamento de Fomento à Indústria faz abordagens sobre o Custo ABC, com ênfase para o Custo São Bernardo, estuda o programa de capacitação do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador) com a CNM (Confederação Nacional dos Metalúrgicos), entre outras entidades, estimula o projeto Incubadora de Empresas mantido pela Fiesp/Ciesp, invade a necessidade de recuperação da área de proteção dos mananciais e a ativação do Parque Industrial dos Imigrantes. Um conjunto de ações que não exigem maiores dispêndios dos cofres municipais exauridos.
A Divisão de Turismo apresenta no documento síntese da proposta para o desenvolvimento da atividade em São Bernardo, da qual constam a geração de empregos, ampliação da arrecadação de impostos, melhoria e ampliação da infra-estrutura, entre outras metas.
Maior arrecadadora de impostos no Grande ABC, com previsão orçamentária de mais de R$ 800 milhões para este ano, São Bernardo também é um poço de problemas sociais. A população favelada, que cada vez mais avança nas áreas de mananciais, cresceu 60% nos últimos cinco anos, segundo os últimos números do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas).
Sede de cinco grandes montadoras de veículos (Volkswagen, Ford, Mercedes-Benz, Scania e Toyota), além da Karman-Guia, produtora de veículos especiais, São Bernardo abriga 41% do naco de empregos do setor em todo País, considerando-se as 24 empresas automobilísticas. Mas a participação já foi maior, já que perdeu 28,8% do contingente nesta década, enquanto a produção subiu 96,6%. É contra esse paradoxo, ditado pela economia globalizada, pela abertura comercial, pelo regime automotivo e por novas técnicas de gestão, que São Bernardo se debate. O inchaço da periferia já soou como alerta. Valter Moura e seu grupo de colaboradores diretos estão conectados com essas dificuldades.
“Sabemos que nenhum marketing de valorização regional resiste à falta de ações concretas, e isso estamos começando a realizar” — afirma o secretário. A julgar pelo entusiasmo com que os lojistas de móveis deixaram seu gabinete, depois de tratarem da viabilidade de transformar a Rua Jurubatuba, local de maior concentração do segmento, num shopping a céu aberto, Valter Moura já começou a superar os problemas. É verdade que o setor moveleiro já não tem a importância de antigamente, quando São Bernardo ganhou o título de Capital do Móvel e do Automóvel, mas é justamente a possibilidade de revitalização que mobiliza os dirigentes da Secretaria.
O entusiasmo com o momento político-institucional da região, em que a metropolização de fato parece mais nítida no horizonte, leva o novo secretário até a acreditar na possibilidade de criar-se uma espécie de banco regional de fomento, dirigido por empresários e administradores públicos com mandato a salvo de injunções políticas. Uma espécie de BNDES regional, alimentado por recursos disponíveis dos órgãos públicos e da comunidade. Uma instituição que encorpasse o sentimento regional. Um sonho? Moura diz que não.
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15/10/2024 SÃO BERNARDO DÁ UMA SURRA EM SANTO ANDRÉ