Política

Siraque conta com mais votado

DANIEL LIMA - 21/10/2008

A estratosférica diferença de votos válidos contabilizada ao final do primeiro turno em Santo André entre o favoritíssimo Vanderlei Siraque e o azarão Aidan Ravin foi estendida nas duas semanas seguintes de campanha eleitoral do segundo turno ao campo da tática em busca de novos eleitores. Isso significa que, ao ingressar na semana decisiva de votação, a preocupação do petista era consolidar e aprofundar a dianteira. Ao médico Aidan Ravin parecia restar a esperança do imponderável. Ou o conformismo de que, depois da surpreendente chegada ao turno extra, o que viesse a ocorrer na sequência seria altamente lucrativo. Sobretudo para quem estica os olhos, de fato, a uma cadeira na Assembléia Legislativa em eleições programadas para 2010.


Enquanto a equipe de Vanderlei Siraque saiu em busca de reforços, concretizados com o alinhamento do PPS, parceiro do DEM de Raimundo Salles no primeiro turno, além da adesão do vereador Luiz Zacarias (PR), o mais bem votado em Santo André mas que não se reelegeu porque o quociente eleitoral lhe pregou
uma peça, Aidan Ravin cavoucou a semântica matemática. Em panfletagem densa espalhada aos quatro cantos, o oposicionista procurou desclassificar a representatividade da vitória de Vanderlei Siraque no primeiro turno.


O caso dos números brandidos por Aidan Ravin é simples, tosco e preocupante quando pode induzir a perspectiva de adotar linguagem técnica semelhante caso chegue ao Paço Municipal. Principalmente no trato orçamentário, muito mais sofisticado e comprometedor.


O material de campanha do candidato de oposição em Santo André que manipula a matemática coloca um enorme ponto de interrogação à frente dos 48,5% de votos válidos obtidos por Vanderlei Siraque seguido da seguinte pergunta: Você
acredita nisso? E segue: “Vamos refazer essa conta!”. Logo abaixo, aponta o total de eleitores de Santo André (533.428), o total de votos de Siraque no primeiro turno (182.387) e o total de eleitores restantes (351.041). É claro que Aidan Ravin omite a própria votação. Um gráfico no qual os candidatos em Santo André são identificados por cores diferentes e os respectivos percentuais de votos válidos é acrescido com símbolos de votos em branco, nulos e abstenções.


Espertamente, Aidan Ravin apropria-se de todos os votos dos opositores e também dos votos em branco, nulos e das abstenções para concluir com sabedoria política que deixaria Ulysses Guimarães envergonhado: obteria 65,8% dos votos no segundo turno, contra 34,2% do adversário.


O material de campanha afirma que Siraque recebeu 34,2% dos votos e que os demais 65,8% seriam contrários ao petista. Votos brancos, nulos e abstenções em Santo André somaram 32% no primeiro turno, um pouco acima (30%) do apontado ao final do primeiro turno há quatro anos, mas nada muito diferente dos 25% de São Bernardo, dos 21% de Mauá e de tantos índices semelhantes de outros municípios de médio porte.


Por mais que se admita política como atividade também mistificadora, principalmente em período eleitoral, a tática do vereador em primeiro mandato Aidan Ravin constrange a inteligência dos eleitores. Provavelmente o PT de Santo André esperasse mais dificuldades no campo de idéias de um adversário que fez fama principalmente na periferia de Vila Luzita, como médico dos mais carentes. A tortura dos números do primeiro turno, entretanto, sinalizou que Aidan Ravin não teria muito o que oferecer ao eleitorado como contraponto ou mesmo como complemento dos situacionistas.


Por isso o petista Vanderlei Siraque não perdeu tempo em voltar no tempo e correlacionar o petebista ao ex-presidente Fernando Collor de Mello. A imagem do hoje senador da República é sinônimo de aventura malsucedida, encerrada com mandato cassado entre outros motivos porque não contava com retaguarda partidária para sufocar a crise provocada por denúncias de corrupção. Contrapor a organização partidária do PT e os três mandatos consecutivos em Santo André ao quase individualismo e à denunciada ausência de plano de governo de Aidan Ravin foi a resposta mais agudamente profunda à acrobática engenharia matemática de Aidan Ravin.


Ouvida pelo ABCD Maior, a socióloga Angélica Lovatto, professora da Fundação Santo André, disse o óbvio sobre o largo contingente de eleitores que votaram em branco, anularam o voto ou se abstiveram no primeiro turno: “Esse deve ser o foco dos candidatos no segundo turno”. Também fez conjectura rasa sobre a situação de Vanderlei Siraque: “Diante da improbabilidade do Siraque obter apoio dos candidatos derrotados, as abstenções eleitorais em Santo André serão o foco da campanha. Vale dizer que o PT larga na frente, pois pode se apresentar como o partido que transformou o Município” – afirmou.


Na primeira semana pós-primeiro turno em Santo André, o presidente estadual do PTB, Campos Machado, companheiro de chapa de Geraldo Alckmin na derrotada campanha à Prefeitura da Capital, acenou com a possibilidade de incomodar o candidato petista. Campos Machado antecipou a possibilidade de construir uma frente anti-PT, inclusive com a previsão da presença do governador José Serra. “Trata-se da única cidade no Estado onde concorremos diretamente como cabeça de chapa no segundo turno. Por isso, embarcaremos de mala e cuia em Santo André. Daremos toda a ajuda que for possível. O PTB vem forte para decidir a eleição” – afirmou ao Diário do Grande ABC de 11 de outubro.


O discurso de que Aidan Ravin é a alternativa de renovação contra o que chamou de continuísmo do PT em Santo André pelo menos mostrou que Campos Machado tem a sagacidade das raposas políticas que não pecam pelo noviciado de traquinagens
numéricas. Prefere mesmo a praticidade de oratória que possa sensibilizar os eleitores no corpo-a-corpo das ruas.


Como tudo é possível nas disputas municipais, enquanto o PTB em Santo André é adversário do aliado PT no campo federal, o PPS adversário na esfera nacional virou parceiro local. O acordo foi selado na noite de 8 de outubro e causou certa surpresa. O partido estava alinhado ao renitente opositor petista, Raimundo Salles, terceiro colocado no primeiro turno que desapareceu dos radares da mídia e dos assessores mais diretos nos dias subsequentes à derrota. O exército de 10 partidos que dava suporte a Vanderlei Siraque ganhou um novo reforço.


A explicação da direção do PPS em Santo André para a conversão à centro-esquerda petista foi estimulada por semelhante manobra de Alex Manente – o candidato que chegou em terceiro lugar na tentativa de alcançar o Paço de São Bernardo anunciara dois dias antes que se juntaria ao petista Luiz Marinho.


“O projeto do PPS é regional, passa por São Bernardo, onde fomos atacados covardemente. Não vimos isso acontecer em Santo André, o que nos deixou simpáticos a aderir à candidatura do Siraque. Além disso, a campanha aqui foi limpa e prospectiva” – desabafou Daniel Mazucatto – acompanhado do dirigente Renê Naves – tesoureiro da agremiação e responsável pela proposta de reestruturar o partido em Santo André.


Uma semana depois da abertura das urnas e da constatação de que haveria segundo turno em Santo André, o vereador Luiz Zacarias (PTB) também anunciava perfilamento à candidatura de Vanderlei Siraque. Detentor de 7.219 votos, Zacarias está fora do próximo Legislativo porque o quociente eleitoral do Partido Republicano não atingiu o mínimo regulamentar. Líder político no Sacadura Cabral, o reforço do petebista é potencialmente lucrativo para o PT porque o bairro é um dos calcanhares-de-aquiles do governo municipal. Zacarias também apoiou Raimundo Salles no primeiro turno e decidiu juntar-se ao PT depois de demoradas reuniões.


Pelo menos até o segundo domingo depois do primeiro turno o ex-triprefeito Newton Brandão mantinha-se irredutível ao assegurar que não subiria em nenhum palanque, depois de fracassar no primeiro turno com 8% dos votos válidos. Sem Brandão, os tucanos de Santo André perderam parte substancial de massa crítica no apoio anunciado nos primeiros dias pós-primeiro turno à candidatura de Aidan Ravin. “Não fui comunicado. Nem sabia desse encontro” – disse Brandão, referindo-se às declarações do presidente do diretório do PSDB em Santo André, José Luiz Cestari, que anunciou suposto apoio do ex-prefeito a Aidan Ravin.


A expectativa de Newton Brandão mudar de idéia permanecia até domingo, 19 de outubro, depois de afirmar que precisaria ser convencido a bandear-se para um dos candidatos. O velho cacique da política de Santo André chegou provavelmente
ao fim de uma carreira de muitas vitórias e também de decepções seguidas desde que deixou o comando do Paço de Santo André em 1996. Os 31.044 votos do primeiro turno foram o canto do cisne. Quatro anos atrás, levou a disputa com o petista João Avamileno para o segundo turno e por pouco não se sagrou tetraprefeito.


Enquanto o ocaso de uma carreira brilhante como a de Newton Brandão parece definitivamente consumado, Vanderlei Siraque não quer perder a oportunidade de ocupar a cadeira de titular do Paço de Santo André. Nem mesmo o desencanto de ver a disputa estender-se ao segundo turno eliminou a tranquilidade pública do petista.


O apoio do governo federal que muitos imaginavam comprometido por ter desafiado e superado a vice-prefeita Ivete Garcia está restaurado. Provaram os assessores especiais da Presidência da República, Gilberto Carvalho e Miriam Belchior, dois dos principais integrantes do governo Celso Daniel que reforçaram a administração federal em Brasília. Eles participaram de um jantar para 600 pessoas num restaurante de Santo André no oitavo dia pós-primeiro turno. Também o ministro Paulo Bernardo, do Planejamento, engrossou a lista de convidados.


Não foi a primeira vez que Miriam Belchior juntou-se aos apoiadores de Vanderlei Siraque, embora a relação com Ivete Garcia seja mais sólida. Já no lançamento do Plano de Governo do petista, há dois meses, a assessora especial do presidente Lula da Silva reiterava pessoalmente a superação dos ruídos das prévias do partido, vencidas por Siraque por apenas 22 votos de diferença, em segundo turno. “Quem mora aqui sabe que os nossos governos melhoraram significativamente a vida das pessoas. Por isso é necessário dar continuidade ao que vem sendo feito” – afirmou a ex-secretária municipal de Santo André.


O ministro Paulo Bernardo foi mais longe: disse que quando assumiu a Secretaria da Fazenda de Londrina, Paraná, em 2000, resolveu copiar o Sistema de Atendimento ao Contribuinte implantado na gestão de Celso Daniel. Ao jornal eletrônico ABCD
Maior, Paulo Bernardo garantiu que o governo federal não deixará de investir na região: “Se tivéssemos de fazer um corte pesadíssimo nos investimentos, não mexeríamos no PAC ou nos investimentos iniciados. Se houver desaceleração e diminuírem as receitas, iremos cortar, mas o que está previsto manteremos no orçamento, por conta do PAC” — afirmou, referindo-se à crise financeira internacional.


Vanderlei Siraque e Aidan Ravin fizeram debate morno no Diário do Grande ABC. O petebista saiu um pouco do estilo ameno e procurou dar estocadas no petista. Tudo dentro do enredo esperado. A desvantagem nas pesquisas eleitorais agenda o comportamento dos concorrentes. Quem está atrás faz tudo para desequilibrar o adversário. Siraque não caiu na armadilha. Para quem prefere espetacularizar esse tipo de evento, os dois candidatos decepcionaram. Não houve histrionismos. Aidan cometeu o erro cênico de dramatizar a exibição de um pirulito, relacionando-o à exclusão social. Ele teria recebido a guloseima de uma criança carente. Siraque não perdeu a oportunidade para ironizar: “Você está tirando doce da boca de criança”.


Espera-se um ambiente menos tranquilo no debate previsto para a semana decisiva na TV+. A expectativa de que Siraque desenterrou alguns pecadilhos legislativos de Aidan Ravin como vereador deverá se consumar. O petebista também preparava questionamento mais ácido. Nada indica que o andar da carruagem eleitoral sofrerá mudanças em Santo André. A semana decisiva começou sem que Raimundo Salles e Newton Brandão dessem as caras. Oficialmente eles não apóiam nenhum dos finalistas.


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