Administração Pública

Cilurzo quer Fundação Santo
André sob controle social

DANIEL LIMA - 05/01/1997

A Fundação Santo André, complexo educacional construído entre as divisas de Santo André, São Bernardo e São Caetano, precisa tornar-se uma instituição pública, controlada pela sociedade, em vez de seguir o figurino estatal, vulnerável ao humor político-partidário. A proposta é do médico vascular Oswaldo Cilurzo, ninguém menos que o presidente dessa instituição que conta com sete mil alunos e faculdades de Filosofia, Ciências e Letras e de Ciências Econômicas, além de Segundo Grau.


Cilurzo, há três anos no comando da FSA e reeleito por mais um ano, mandato que coincidirá com o primeiro ano do retorno de Celso Daniel ao Paço Municipal, espera não ter problemas com o novo chefe do Executivo Municipal. É natural a preocupação, embora afirme ser amigo do prefeito. Cilurzo e Celso Daniel são antagônicos políticos. Cilurzo está alinhado ao grupo do agora ex-prefeito Newton Brandão, a quem disse ter apresentado inicialmente a proposta de abertura da Fundação e cujos estudos, afirma, podem estar na Secretaria de Educação, Cultura e Esportes.


A situação de Cilurzo é sintomática do quanto a Fundação Santo André sofreu ao longo dos 35 anos de atividades. Sobretudo quando nova corrente política assume o Paço Municipal. O presidente da Fundação conta com mais um ano de mandato e tem a retaguarda do que chama de completa reestruturação da instituição. Ele lembra que assumiu em 1994 numa situação delicada, de elevadíssima inadimplência dos alunos e de ambiente conturbado por manifestações político-ideológicas. “Mudamos completamente a Fundação, que voltou a ser uma instituição educacional comprometida com o conhecimento científico dos alunos. Tanto, que nas últimas eleições municipais não permitimos manifestações políticas no campus” — afirma.


Por se dizer preocupado com os próximos passos da Fundação Santo André, Oswaldo Cilurzo defende a ampliação dos membros do Conselho Curador, espécie de Conselho Deliberativo que, entre várias atribuições, elege o presidente. O Conselho Curador reúne 13 representantes e historicamente é controlado pelo Paço Municipal, que detém diretamente seis votos. A Câmara Municipal conta com um voto, os centros acadêmicos das duas faculdades têm um voto cada, as duas faculdades um diretor cada (indicados pelas congregações e escolhidos pelo presidente para período de quatro anos), o Ciesp (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo) Regional de Santo André soma um voto e a Associação dos Economistas completa a lista.


A proposta de Cilurzo é de que representações como a Ordem dos Advogados do Brasil, Fórum da Cidadania do Grande ABC, Associação Paulista de Medicina, Associação Comercial e Industrial de Santo André, Associação dos Engenheiros, entre outras entidades de nível cultural com sedes locais, sejam igualmente integrantes da Fundação.


A idéia de Oswaldo Cilurzo, considerado conservador no espectro político propagado pelos partidos de esquerda, especialmente o PT, identifica-se completamente com os propósitos enunciados pelas lideranças do próprio PT. A retirada da mão forte e geralmente desastrada do Estado, em suas esferas federais, estaduais e municipais, em favor do controle social é tanto defendida por Tarso Genro, ex-prefeito de Porto Alegre e candidatável do partido à presidência da República, quanto pelo próprio Celso Daniel.


O novo prefeito de Santo André manifestou-se sobre o tema controle social recentemente, comentando a formatação legal da entidade que administraria a pretendida Região Metropolitana do Grande ABC. Ele disse ser contrário à formação de uma representação que estabelecesse paridade entre os municípios do Grande ABC e o Governo do Estado. Prefere que representações públicas locais mantenham a organização, mas sob controle da sociedade organizada, sem vícios político-partidários.


Celso Daniel, coerentemente, quer exatamente isso também na Fundação Santo André, alinhando-se a Oswaldo Cilurzo: “Só que devemos ter como membros do Conselho Curador organizações sociais realmente comprometidas com a filosofia da instituição e decididas a participar efetivamente da gestão”– disse o novo prefeito.


Oswaldo Cilurzo é o 18º presidente da Fundação. O cargo não é remunerado, tradicionalmente esteve mais para algo honorífico, mas ele garante que tem atuado como executivo privado, dedicando parte de seu tempo à instituição. “Temos mais de R$ 3 milhões em caixa para investimentos. Situação bem diferente da de quando assumi. O País atravessava fase conturbada, com reflexos imediatos na economia, e o inconformismo dava ensejo à realização de passeatas e protestos, que eclodiram em toda a Nação. Santo André também se fazia presente, principalmente no meio universitário”– afirma o presidente num relatório da administração do período 94/96, referindo-se a ocorrências que precipitaram o lançamento do Plano Real.


Segundo o relatório, aprovado pelo Conselho Curador, em 1995 a Fundação Santo André conseguiu chegar ao equilíbrio econômico-financeiro. “Não precisamos aumentar a mensalidade em níveis exagerados. Temos hoje a menor mensalidade das escolas de Terceiro Grau do País. Nas Ciências Sociais, Contábeis e Econômicas, Letras e Pedagogia, o aluno paga R$ 153,22 por mês, enquanto em Administração de Empresas, Administração Hospitalar, Licenciatura em Matemática, Licenciatura Bacharelado em Ciências, Bacharelado em Matemática, Habilitação em Química e Habilitação em Biologia o valor é R$ 201,04″ — relata o presidente.


A Fundação Santo André, que já dependeu fortemente dos cofres públicos, representou até outubro do ano passado 2,27% de contribuição municipal. As mensalidades dos alunos garantiram, com participação de 83,68%, a quase totalidade das receitas. Receitas financeiras participaram com 4,77% e multas sobre mensalidades alcançaram 1,20%. O bolo se completou com outras taxas, receitas do exercício anterior e a rubrica outras receitas. Já na coluna de despesas, os professores ocupam a maior fatia, com 47,45%, contra 14,90% do pessoal administrativo, as duas rubricas de maior peso.


“Diferente de antes, quando os níveis de inadimplência dos alunos chegaram a quase 100%, agora rebaixamos para pouco mais de 20% e vamos apertar mais o cinto. Grande parte dos alunos conta inclusive com veículo próprio e não é correto tratar a Fundação Santo André com descaso quanto ao pagamento de mensalidades” – diz Cilurzo.


A previsão de despesas para este ano da FSA é de R$ 12 milhões, dos quais R$ 1 milhão constam como subvenção da Prefeitura, aprovada pela Câmara. Trata-se aparentemente de valor problemático para o prefeito Celso Daniel, às voltas com os custos do funcionalismo público. O prefeito analisa a aprovação da Câmara como autorização ao investimento, não necessariamente como obrigação do Executivo. Cilurzo diz que a Prefeitura pode dispensar o aporte de recursos na FSA, numa contrapartida à cessão de bolsas de estudos para estudantes comprovadamente carentes e obedecendo a rigorosos critérios de distribuição.


A Fundação Santo André mantém, além de duas faculdades, a Coordenadoria de Pós-Graduação, Pesquisa e Extensão com cursos na categoria Lato Sensu em áreas diversas, como Sistemas de Informação, Química Industrial, Capacitação Gerencial, Controladoria e Finanças, Teoria da Literatura Comparada, entre outros.


Já a escola de Segundo Grau conta com 700 alunos. O Centro de Informações exigiu do presidente Oswaldo Cilurzo muita atenção em 1996. “É o coração da instituição e mereceu profunda transformação” — relata. O Centro de Informações, que envolveu recursos de US$ 500 mil, dispõe de três laboratórios com capacidade para abrigar 70 microcomputadores. Está equipado com micros 486 e processador Pentium, todos ligados à rede interna, que permite a integração dos setores da FSA. Os novos equipamentos tomaram o lugar de produtos defasados tecnologicamente para as necessidades da FSA e foram doados à Secretaria da Educação, Cultura, Esportes e Turismo. A biblioteca também preocupa Cilurzo. Nos três anos de gestão, conseguiu aumentar em quase dois mil exemplares o acervo. São mais de 21 mil unidades à disposição de alunos e professores e perto de 35 mil consultas anuais.


Cilurzo fala com entusiasmo das obras que já realizou à frente da FSA. Cita a construção de refeitório de R$ 40 mil, a ampliação da gráfica com troca de máquinas e equipamentos, também com inversão de R$ 40 mil, e a construção do prédio de laboratórios e salas de aula anexo à Faculdade de Economia, cujo prazo de entrega é março deste ano e envolve R$ 1 milhão em recursos. Além disso, há em projeto o Centro Poliesportivo e a ampliação do prédio da Faculdade de Filosofia, ainda para este ano.


A FSA conta com 82 funcionários, todos abrigados sob convênio médico extensivo a familiares e docentes, além de outros benefícios, como cesta básica para administrativos e docentes do Segundo Grau. O corpo de professores soma 278 profissionais. Cilurzo relaciona outros benefícios, como ticket alimentação para funcionários administrativos, acerto de dívida dos funcionários de antigas administrações no valor de R$ 800 mil, bem como o aumento de salários em 1996 na ordem de 46% mais bonificação de final de ano, bem como a criação do coral com a contratação do maestro Flávio Florence e o tombamento da Casa Amarela, sede administrativa da entidade. Cilurzo também destaca a colocação de uma parada de ônibus dentro do campus, com mudanças de linhas municipais e intermunicipais para reduzir o grau de violência que cercava os alunos e professores à saída da FSA.


A escola foi criada durante o governo do prefeito Fioravante Zampol, no qual Cilurzo atuou como secretário. O presidente da FSA também já foi por três vezes diretor do Hospital Municipal de Santo André e presidente da Fundação do ABC, que mantém a Faculdade de Medicina do ABC, construída ao lado da Fundação Santo André durante as gestões dos prefeitos Newton Brandão, Aldino Pinotti e Oswaldo Massei.


A unificação da FSA e da Medicina ABC é velho sonho de Cilurzo. Embora a Faculdade de Medicina tenha direção tripartite, das Prefeituras de Santo André, São Bernardo e São Caetano, ele afirma que a fusão com a FSA reforçaria as necessidades de Santo André transformar a FSA em universidade, acoplando a área de Medicina. Para ele, os administradores dos outros dois municípios provavelmente facilitariam a transferência, uma vez que a sede da instituição está em Santo André.


O presidente da FSA sabe que tem mais 12 meses de mandato e que, por melhor que faça, dificilmente será mantido no cargo. O componente político prevalece sobre qualquer indicador de eficiência administrativa, uma rotina da administração pública cujos custos acabam repassados para os contribuintes. Os mesmos contribuintes aos quais Cilurzo sugere proteção, com a formação mais ampla e pretensamente mais independente do Conselho Curador.


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