Política

Muito além de Santo André (3)

DANIEL LIMA - 03/11/2008

O governo do Estado não entregou ao braço armado do deputado Campos Machado a missão de guerrear em Santo André por mero palpite, por birra pessoal contra o deputado estadual Vanderlei Siraque, porque não gosta do desenho arquitetônico do Paço Municipal ou porque os petistas de Santo André são mais vermelhos que os petistas de São Bernardo e de Mauá — outros pontos geográficos da região onde se deram as batalhas do segundo turno destas eleições.


O governo do Estado percebeu que Santo André apresentava as melhores características para um ataque silencioso, um ataque nas entranhas da sociedade tanto de classe média quanto suburbana. Um ataque que captaria os anseios da classe média mais resistente ao PT e que votou em larga escala nos três concorrentes do primeiro turno que sinalizavam a centro-direita. Um ataque de quem entende do ramo de superar o adversário com boa margem probabilística de sucesso. Como indicam os melhores manuais de eleições.


Ora, ora, ora, então por que Santo André, e não São Bernardo? Por que Santo André, e não Mauá?


Por muitas razões.


Mas fiquemos primeiro com as razões que excluíram São Bernardo e Mauá e que apontaram os fuzis das iniciativas de impacto para Santo André.


Em São Bernardo do prefeito William Dib e seu candidato, o deputado estadual Orlando Morando, as condições de defesa da principal cidadela regional eram menos favoráveis.


Os petistas organizaram-se nos mínimos detalhes. Juntaram vários partidos, reforçaram-se com o jovem Alex Manente, adversário de primeiro turno que jamais escondeu vocação de acrescentar o número 13 à empreitada de derrubar a liderança política da região que ainda ocupa o 18º andar do Paço Municipal.


Sem contar com o fator presencial e constante de Lula da Silva, canonizado pelas camadas mais populares do País e, por mais improvável que pudesse parecer, aprovado em maioria pela classe média mais conservadora.


Os ataques de Campos Machado e aliados não seriam garantidamente destruidores, mas também não seriam seguramente inúteis em São Bernardo. Havia espaços para estocadas. Orlando Morando é um moço de brilho, tecnicamente bom de debate, bom de voto, experiente como vereador e deputado. Mas havia um limite matemático intransponível. Havia a perspectiva de derrota acima do gráfico de vitória.


Pesquisas apontavam a estrela vermelha petista no horizonte de São Bernardo. Os adversários de William Dib conseguiram pespegar-lhe o selo de ineficiente, uma das mais certeiras estocadas dos petistas. Os situacionistas deixaram-se pautar pelos adversários e esconderam Dib da campanha durante bom tempo. Deixaram o quase imberbe Orlando Morando sozinho ou acompanhado sem muito brilho nas ruas. São Bernardo de Cara Nova, o mote da campanha, teve efeito reverso. Desconfiava-se da juventude de Morando. O bom moço que aparecia nas fotos e nas ruas não sugeria segurança de uma administração emocionalmente madura para uma São Bernardo complexa e desigual demais.


Luiz Marinho prometia cuidar da periferia. Maurício Soares replicava a pregação. A classe média de São Bernardo, apontavam as pesquisas, equilibrava-se entre os dois concorrentes. Luiz Marinho não tinha semelhança alguma com Marta Suplicy entre os mais endinheirados de São Bernardo. Nem Orlando Morando travestia-se de Gilberto Kassab entre os mais conservadores.


Mauá foi preterida pela campanha do governo do Estado no segundo turno porque o osso duro de roer do PT de Oswaldo Dias se consolidou em nível de desconforto para a equipe de Chiquinho do Zaíra, principalmente por conta de um certo grau de sentimento de resgate da justiça desmoralizada quatro anos antes quando, apoiado pelo mesmo Oswaldo Dias, o petista Márcio Chaves ganhou nas urnas, caminhava para o segundo turno redentor e foi eliminado por um artifício sacramentado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral). O envolvimento da juíza de Mauá responsável pela denúncia de irregularidade da campanha petista num caso escandalosamente comprometedor porque envolveu inclusive uma facção criminosa acentuou a estratégia de vitimização do PT.


É claro que havia o contraveneno dos situacionistas de Mauá para minar as forças de Oswaldo Dias. A prestação de contas polemicamente fora do esquadro de normalidade e a prisão de uma antiga auxiliar, a secretária de Finanças, atiraram combustível na fogueira de desconstrução da imagem do petista.


O pau comeu solto nos palanques e nos labirintos de votos, principalmente nas periferias que sufocam Mauá.


O jogo pesadamente destrutivo da reputabilidade dos dois finalistas foi uma guerra santa que discursos oficiais diante da Imprensa procuraram dissimular.


Quem conhece campanha eleitoral de campo sabe que não há terreno para a ética. Todo território é livre para acusações, sempre proferidas sob o pressuposto de defesa do ataque inimigo. Pouco se lixa para provas.


Quando os candidatos de alguma forma têm algum tipo de rabo preso com a integridade administrativa ou honradez pessoal, o diabo é chamado a intervir a todo instante. Deus provavelmente não quer nem saber de tantas baixarias.


Por que, insisto, o governo do Estado, Campos Machado à frente, alguns coturnos graduados locais ao lado, quando não se revezando com o artilheiro palaciano, preferiu apostar em Aidan Ravin para apertar o cerco em busca de uma vitória considerada improvável, mas possível?


Explico amanhã. Não custa esperar.


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