Em outubro do ano passado, quando pegava fogo o boné do guarda de idiossincrasias políticas por conta do segundo turno das eleições municipais, encontrei uma fórmula para a edição especial da revista LivreMercado (nada a ver com a “Deus me livre” que circula todo mês tardia e porcamente no Grande ABC) não ser vista como objeto de manipulação. Sim, porque quando se trata de paixão eleitoral, não faltam condimentos explosivos que fazem os mais próximos taparem o nariz diante de fedores manipulados.
Embora o contrato da Editora Livre Mercado para a produção de pesquisas eleitorais tivesse como parceiro de jornada o Instituto Brasmarket, a mesma empresa que quatro anos antes atuara para o Diário do Grande ABC, resolvi, num lance de ousadia, incluir também os resultados do Ibope, contratado pelo Diário do Grande ABC, e do Instituto Scenso, cujos números eram encaminhados inicialmente ao Repórter Diário. Como numa marcha unida, as três organizações trilharam o mesmo caminho naquele segundo turno, atribuindo, por força de pesquisas de campo, favoritismo aos candidatos petistas.
O que levamos aos leitores numa edição especial que circulou às vésperas do segundo turno, quando Santo André, São Bernardo e Mauá foram às urnas e o Partido dos Trabalhadores pintava com a possibilidade de apropriar-se de 82% do PIB (Produto Interno Bruto) foram os números dos três institutos.
E todos coincidiam, em pesquisas realizadas 10 dias antes da ida às urnas, no apontamento da vitória de Vanderlei Siraque em Santo André, de Luiz Marinho em São Bernardo e de Oswaldo Dias em Mauá.
Como se sabe, Aidan Ravin se converteu na grande zebra da disputa, depois de sair de 21% dos votos válidos no primeiro turno e ultrapassar um Vanderlei Siraque que ficou a pouco mais de um ponto percentual da vitória na primeira rodada.
Por que estou recuando no tempo e tratando das eleições do ano passado no Grande ABC? Porque também o farto material daquela edição especial e da subsequente, com a análise dos resultados do segundo turno, vai estar à disposição dos leitores deste site nos próximos dias.
É um trabalho jornalístico do qual este profissional muito se orgulha. Principalmente porque fundamentou-se o tempo todo em pesquisas contratadas e numa permanente interação com outros institutos especializados em aferir a vontade dos eleitores.
Contrariamente a outros veículos de comunicação que se restringiram durante toda a jornada aos próprios limites contratuais, ou seja, a ignorar completamente os demais rastreamentos de intenção de votos, democratizamos os números, independentemente de eventuais interesses específicos de terceiros que, como se sabe, não são paranóia numa disputa eleitoral em que orçamentos milionários, e também dívidas sociais impagáveis, estão em jogo.
Mesmo com a transparência que adotamos, e apesar da abrangência de dados, ainda há candidato derrotado que não consegue entender que o trabalho deste jornalista não ultrapassou jamais os limites da racionalidade dos números pesquisados.
O deputado estadual Orlando Morando, por exemplo, que perdeu a disputa para Luiz Marinho, em São Bernardo, reclama até hoje dos resultados publicados sob o controle informativo deste jornalista. Jovem, impetuoso, atrevido na luta por espaço partidário, infiltrando-se sem temor em searas complicadas, Orlando Morando elege aqui e acolá alguns responsáveis pela derrota para o candidato apoiado pelo presidente Lula da Silva. O Instituto Brasmarket, contratado pela Editora Livre Mercado, é uma das preferências do deputado.
Como mostrará o material que estou capturando dos arquivos digitais, o desempenho de Orlando Morando na reta final da campanha eleitoral de segundo turno foi detectado sem perturbações éticas tanto pelo Instituto Brasmarket como pelo Ibope e Instituto Scenso.
Houve algumas variações numéricas que não afetaram o resultado final. E seria muito difícil que numa disputa tão acirrada como a que se deu em São Bernardo não houvesse um balanço do navio dos números, por conta do próprio espaço de tempo entre a pesquisa e a ida às urnas.
Dez dias são um tempo razoavelmente longo quando se trata de reposicionamento de peças eleitorais. Aidan Ravin virou o jogo para valer nesse período, como também exporá aquele trabalho jornalístico. Elaboramos um texto, à ocasião, que simplesmente desvendou o sucesso eleitoral de Aidan Ravin que, ao contrário do que imaginava o restante da mídia, não teve nada de combustão espontânea. Foi guerra de guerrilhas mesmo, que o PT em ação semelhante executou em São Bernardo.
Não me permitiria com a experiência de mais de quatro décadas de jornalismo um olhar ingênuo sobre os interesses eleitorais. Sei inclusive que a choradeira de Orlando Morando, um especialista em marketing, tem outros interesses.
Por exemplo? Tentar me impor uma dose de culpabilidade e de débito por conta da derrota sofrida, quem sabe para obter dividendos futuros. Faz parte da natureza humana e principalmente dos políticos de carreira o uso e o abuso da psicologia. É natural e encaro a jogada como absolutamente democrática nessa atividade cuja flexibilidade ética é imensurável. Daí, entretanto, a me ver enredado na tática do deputado estadual vai diferença muito grande. Até porque, diferentemente da política, jornalista que se preza não a mimetiza em qualquer grau de condescência ética.
A edição das análises das eleições do ano passado no Grande ABC será mais um acervo incorporado a este site como prova de que não será por falta de memória que a informação se submeterá à desinformação e à traquinagem.