Entrevista Especial

Ribeirão Pires começa a
mudar com planejamento

DA REDAÇÃO - 05/06/1998

Ribeirão Pires será politicamente muito diferente amanhã do que já foi ontem e do que ainda é hoje. Na economia, a mudança também será notável, porque pretende fazer convergir quatro vertentes igualmente importantes: o desenvolvimento de pequenas indústrias não poluentes, a profissionalização do turismo a que está naturalmente vocacionado, a constituição de um cinturão agrícola em regime de cooperativa e de pequenos produtores apoiados por especialistas, além da sede regional do que se convencionou chamar de qualidade de vida, com a instalação crescente de condomínios residenciais de alto padrão, apropriado para famílias de executivos empresariais.


A projeção é do secretário de Desenvolvimento Sustentado do Município, o arquiteto Jorge Hereda, que cultiva princípio elementar pouco valorizado na administração pública nacional — o de que sem base de informações, sem planejamento, não há como quebrar o ciclo vicioso de improvisações, de empirismo.


Ex-colaborador da Prefeitura de São Paulo nos tempos da petista Luiza Erundina e ex-secretário municipal de Diadema na gestão passada do também petista José de Filippi Júnior, Jorge Hereda é o homem-forte da Prefeitura de Ribeirão Pires, única da região comandada por uma mulher, Maria Inês Soares, igualmente do PT. Responsável pelo primeiro censo socioeconômico municipal do País, quando secretário em Diadema, Jorge Hereda repetiu a façanha em Ribeirão Pires. No ano passado, lançou publicação especial com dados até então desconhecidos sobre o Município.


Há muito o que fazer em Ribeirão Pires, inteiramente atingido pelas restrições ocupacionais da Lei de Proteção dos Mananciais. Exatamente essa legislação tem causado mais dores de cabeça do que soluções aos administradores públicos locais. Jorge Hereda faz críticas à atuação do governo do Estado. Não perde a polidez em nenhum instante, mas suas lamentações são incisivas.


Falta ao governo sistematizar ações no Município. Um exemplo citado pelo secretário: a Eletropaulo leva ao pé da letra a obsoleta legislação sobre uso e ocupação do solo, a ponto de não autorizar ligação de energia elétrica em dezenas de imóveis localizados no centro do Município, enquanto a Sabesp atira nas águas da Represa Billings esgotos não tratados.


Cinco de cada 100 habitantes do Grande ABC moram em Ribeirão Pires, de acordo com o Censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) anunciado no ano passado. São 100 mil habitantes para uma população regional de 2,3 milhões. E, como toda a periferia da Região Metropolitana de São Paulo, sofre com o transbordamento demográfico. A taxa média de crescimento anual da população no período de 1980 a 1991 atingiu 3,78%, mais que o dobro do índice nacional. É preciso dar ocupação também a esse contingente suplementar que procura o Município em busca de menores custos de moradia. Tanto que 70% da população tem casa própria.


Do ponto de vista econômico, o que é ser secretário em Diadema, Município densamente industrializado, e, em seguida, secretário municipal em Ribeirão Pires, cujo potencial maior é o turismo?


Jorge Hereda – Por incrível que pareça, há algumas semelhanças econômicas entre Diadema e Ribeirão Pires. A maior parte da arrecadação tributária decorre da indústria, embora os valores sejam bem diferentes. Ribeirão Pires tem perto de 240 indústrias, contra praticamente 10 vezes mais de Diadema. Proporcionalmente, o peso desse setor é semelhante nos dois Municípios. O ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) em Ribeirão Pires responde por volta de 47% da arrecadação total, enquanto em Diadema alcança perto de 50%. A arrecadação de tributos em Ribeirão vai atingir R$ 40 milhões neste ano, contra R$ 180 milhões de Diadema. A diferença é que Diadema não tem nada que aponte para a desindustrialização, enquanto Ribeirão tem tendência de perdas, principalmente por causa das restrições da legislação ambiental.


Dê um exemplo prático dos problemas que a Lei de Proteção dos Mananciais tem provocado para Ribeirão Pires.


Hereda – Ainda hoje, estava conversando com um empresário local que tipifica bem o impasse que vivemos nessa área. Esse empresário comprou uma indústria em outro Município, no Sul de Minas. Diante das circunstâncias, se não conseguir ampliar as instalações aqui, acabará indo embora. Pela legislação atual, a empresa não tem como crescer em Ribeirão. Está no limite. Isso mostra que nossa realidade acaba fugindo de outros padrões de dificuldades da região. Em Diadema, por exemplo, quando constituímos um fórum de desenvolvimento econômico e social, encontramos muitas pessoas se queixando da reestruturação produtiva, dos problemas gerados pelo chamado Custo ABC. Já nos debates que promovemos em Ribeirão Pires, no Fórum de Desenvolvimento Sustentado, disse claramente aos empresários do Município que antes disso tudo eles têm um gargalo maior, que é a impossibilidade de expandir seus empreendimentos.


Você também entende que a legislação poderia ser abrandada?


Hereda – Acho que sim. Desenvolvimento econômico e ecologia são compatíveis, sem dúvida. Temos carinho muito grande pela qualidade de vida. A preservação dos mananciais é preocupação de todos que moram aqui. Diria que é uma relação de amor e ódio. O que entendo como mais complicado é a decisão de que, na dúvida, não se pode fazer nada. O conceito da restrição prevalece. O problema é que o Estado restringe, mas faz muito pouco. A única coisa que concretamente tem feito para preservar o meio ambiente em Ribeirão Pires é proibir a ligação de energia elétrica. O mesmo Estado tem a Sabesp (Companhia de Saneamento Básico, empresa estatal) que é responsável pelo tratamento de água e esgoto de Ribeirão Pires e que joga tudo in natura na Represa Billings.


Chegamos ao exagero, no caso da Eletropaulo, de não ligar luz no centro da cidade. Temos prédios aprovados pela legislação municipal que, por estarem em desacordo com a legislação estadual, permanecem sem energia. São perto de 80 unidades. Há casos de prédio de oito andares, de 17 apartamentos, cujo fornecimento de energia elétrica não é liberado pela concessionária do Estado.


Tudo isso parece algo kafkiano?


Hereda – Parece? Às vezes, tenho a sensação de que é isto mesmo. É um grande pesadelo. O objetivo da legislação é proteger os mananciais, o que é louvável, mas o que se observa é que determinados artigos acabam se tornando mais importantes que o espírito da lei. Não se tem boa vontade e flexibilidade para achar a saída necessária.


Voltamos à questão inicial, relativa à comparação entre Diadema e Ribeirão Pires: não há mais mobilização em Diadema, Município que há quase 20 anos é administrado por partidos de esquerda?


Hereda – Em Ribeirão Pires, às vezes é muito difícil vender para a população a ideia de que é preciso fazer o que fizemos em Diadema, isto é, um censo socioeconômico, na verdade pioneiro no Brasil. Mas consegui realizar nas duas. Outro exemplo é que estamos concluindo estudos aerofotogramétricos, que já realizamos em Diadema, primeiro passo para contarmos com informações geográficas do Município. Nada existia em Ribeirão Pires. Esse trabalho já está na fase final. As plantas estão digitalizadas. É difícil vender esse tipo de iniciativa numa administração pública. Conseguimos graças à compreensão da prefeita, que tem visão não imediatista, voltada para as perspectivas que se descortinam. Tudo isso exige intensos debates e participação da sociedade. Sinto que em Ribeirão Pires o engajamento é comparativamente menor do que em Diadema.


Talvez a grande diferença entre os dois Municípios esteja no aspecto político, já que em Diadema houve espécie de revolução com as sucessivas vitórias do Partido dos Trabalhadores, enquanto que em Ribeirão Pires o PT só chegou ao poder recentemente, com a vitória da atual prefeita?


Hereda – Diadema possui, com certeza, grau de politização fortalecido depois de 15 anos de governos sociais. Ribeirão Pires tem menos hábito de discutir, embora ache que a sociedade tenha boa vontade de participar, mas está degraus abaixo porque não teve oportunidade em gestões anteriores. Diadema tinha divergências político-partidárias sérias, mas a oposição oferecia postura mais colaborativa em relação às discussões. Mesmo criticando, mesmo tendo visão diferenciada, participava ativamente do processo. Sempre estava à mesa de discussões. Em Ribeirão, a oposição ainda se esconde um pouco em ações que não contribuem para avançar. Em Diadema, em todas as iniciativas positivas para o Município, sentia espírito de todo mundo remar para a mesma direção, independente das divergências que já citei. Sobremodo na gestão do Filippi (José de Filippi Júnior, ex-prefeito, cujo mandato se encerrou em 31 de dezembro de 1996) se marcou muito essa coisa de abrir mais o diálogo. Houve, inclusive, aproximação com o empresariado para debates sobre a carga de impostos do Município.


A gestão conjunta de um Município, que pressupõe a participação efetiva e equilibrada da administração pública, dos representantes empresariais e da sociedade, não está tão evoluída em Ribeirão Pires?


Hereda – Temos contado com a participação de várias entidades em Ribeirão Pires, tanto empresariais quanto sociais, mas a realidade é que no conjunto não há o mesmo nível de organização que se encontra em Diadema. Acho que Ribeirão Pires tem jeito muito próprio de fazer política, algo que Diadema rompeu no começo dos anos 80. Em Ribeirão as coisas são mais familiares, mais próximas do coronelismo nordestino. Situação idêntica a de Diadema antiga. Entendo que a transformação é um processo histórico que será rompido. Ribeirão Pires não será mais a mesma depois desta administração. Esta forma de governar vai estabelecer divisão histórica no Município. A busca do consenso possível é nossa meta. Governar não é outra coisa senão administrar conflitos na direção da maioria. A cidade é um grande jogo de interesses. Temos de conseguir que a sociedade esteja à mesa o mais igualmente possível. A função do Poder Público é arbitrar as questões e tentar colocar as várias forças da cidade no mesmo tamanho.


Quanto tempo Ribeirão Pires demoraria para ter o mesmo perfil de participação social de Diadema?


Hereda – Ribeirão Pires tem nível de participação social interessante, principalmente se se considerar que a realidade recente era totalmente diversa. Entendo que vai caminhar rapidamente para alterar o perfil de forma significativa. Existe boa vontade da população em participar das discussões. As pessoas vão conversar com a prefeita, participam das reuniões do Fórum. Acho que o ritmo de mudanças vai depender muito das respostas que se der à população. Quanto mais rapidamente pudermos dar respostas, maior será o grau de credibilidade e de engajamento.


Para um executivo público como você, qual é a grande diferença entre ter trabalhado em Diadema e agora estar em Ribeirão Pires?


Hereda – É óbvio que há diferenças quanto às condições de trabalho, de recursos disponíveis. O que tinha de possibilidades de investimentos em Diadema, na Secretaria de Habitação e Desenvolvimento Urbano, a Prefeitura de Ribeirão Pires não tem hoje em todas as secretarias. Mas, Ribeirão Pires tem algo muito interessante que é o desafio da criatividade. Tem potencial muito grande. Diadema tinha caminho trilhado já algum tempo no setor industrial.


É preciso levar em conta, dentro desses desafios, que 60% da área geográfica do Grande ABC estão abrangidos pela legislação de proteção aos mananciais. Toda Ribeirão Pires está sob essa legislação. Essa vertente do Grande ABC ficou bom tempo esquecida, porque se privilegiou o desenvolvimento industrial. É algo que tem potencial como área de recreação de toda a Região Metropolitana de São Paulo. Acho incrível como até agora essa nova face de desenvolvimento não frutificou. Mas já começou a despertar interesse. O turismo é uma saída para Ribeirão Pires. Entendo que é muito importante manter as indústrias, por isso lutamos contra a legislação que restringe a instalação de indústrias. Por isso estamos lutando contra as amarras à implantação de indústrias não-poluentes na chamada Classe C, que é a área mais periférica do Município, de características rurais. A legislação atual, de 1996, só permite agroindústria na Classe C. Um problema sério, porque atinge 60% do território do Município, isto é, quase tudo que temos de áreas livres e potencialmente desenvolvimentistas.


Nossa reação só tem força graças à Câmara Regional e ao Consórcio Municipal, que têm discutido a questão. Está na Assembléia Legislativa projeto de lei que determina mudança nos critérios e permite a instalação de empresas. Acredito que há demanda para novos investimentos nessas áreas. Temos um setor na Prefeitura especialmente preparado para receber empreendedores interessados em instalar-se em Ribeirão Pires e desde agosto do ano passado recebemos consulta de mais de 200 interessados, a maioria de fora do Município. É muito importante que a legislação permita a instalação de pequenas empresas.


Como a população observa toda essa movimentação?


Hereda – O interessante é que a população tem consciência de ligar industrialização com emprego, mas não perde o foco de que o turismo é importante para a cidade. Aliás, é nacional essa cultura de que indústria e emprego estão ligados. Tanto que dos 10 maiores pólos econômicos que surgiram nos últimos tempos, nove estão atrelados a investimentos de montadoras de veículos. Entretanto, não podemos perder o foco de que o emprego industrial custa mais caro. Cada emprego industrial exige investimento de US$ 90 mil a US$ 100 mil, enquanto no setor de turismo não ultrapassa a US$ 7,5 mil. Além disso, convém lembrar que 10% do PIB (Produto Interno Bruto) mundial são gerados pelo turismo.


Por isso, o que pretendemos até o final do ano é consolidar a rede de recepção de turismo com que contamos e organizá-la com série de atividades de atração. São atividades de finais de semana. Criamos uma carteira de turista preferencial que dá direito a descontos em equipamentos públicos e privados. Estamos concluindo a sinalização turística da cidade. Estamos realizando investimentos preponderantemente com recursos públicos, mas também já temos contado com parceria da iniciativa privada, muito bem representada no Conselho de Desenvolvimento Turístico. Também vamos concretizar o Plano Diretor de Desenvolvimento Turístico. Vamos criar evento voltado para o turismo de negócio, provavelmente no final de junho, começo de julho.


Estamos tentando mostrar que é possível investir na cidade. Mesmo com todas as restrições legais dos mananciais. Essa opção pelo turismo é a melhor forma de preservar os mananciais, porque vamos lhe dar uso compatível. Nessa linha, estamos montando espécie de cardápio de investimentos no setor. Quanto se investe e quanto se pode ter de retorno.


Outra atividade compatível com os mananciais, e que nos interessa de perto, é aproveitar a área rural para desenvolver pequenas propriedades voltadas à agricultura, inclusive em regime de cooperativa. Temos aqui plantas ornamentais exportadas para o Japão. Temos produção de cogumelos também para exportação. Essas pequenas propriedades reúnem condições de ser potencializadas e de gerar novos negócios. Estamos estabelecendo assessoria técnica com uma agência de desenvolvimento japonesa, cujos representantes já estiveram aqui para conhecer nossa realidade.


Então, temos uma Ribeirão Pires com três alternativas convergentes de desenvolvimento econômico. A primeira, de pequenas indústrias em áreas periféricas que seriam desbloqueadas pela Assembléia Legislativa. A segunda, voltada explicitamente para o turismo. E a terceira, uma espécie de cinturão verde?


Hereda – Acho que ainda temos uma quarta vocação, voltada a moradias de alto padrão, para atender à demanda de quem busca qualidade de vida. Estive outro dia na Solvay, fábrica que fica no extremo geográfico de Santo André, mas que é nossa vizinha, e descobri que muitos dos funcionários mais graduados estão construindo residência em pequenos condomínios. Eu mesmo mudei-me para Ribeirão. Acho que podemos ser a Alphaville da região. Não exatamente com aquela concepção, mas como pulmão de qualidade de vida.


Para que tudo isso ocorra, temos investido muito na mudança da legislação dos mananciais. Há inércia por parte do Estado nessa questão. Por mais boa vontade que a Secretaria Estadual de Meio Ambiente tenha, as ações da Sabesp são uma coisa, da Cetesb (Companhia Estadual de Tecnologia Ambiental) são outra. O Estado como um todo não tem sinergia.


O senhor não acha que o fato de se dar muito mais importância ao rodízio de veículos do que à reformulação da Lei de Proteção dos Mananciais está sintonizado com o retorno na mídia, com o Ibope?


Hereda – Com certeza. É lógico que o rodízio é importante, que contribui principalmente para desafogar o trânsito. Mas a situação é complicada porque não se investe em transporte coletivo de massa não-poluente, como o metrô. O Estado não investe para proteger os mananciais. Fica na proibição de ligações de luz. Acho que tem pirotecnia em muitas ações de meio ambiente que não resolvem no plano concreto.


A questão do desenvolvimento sustentado tem surgido como o grande caminho e todo mundo repete isso. De Istambul, na Turquia, onde estive durante o Habitat, à Eco 92 no Rio de Janeiro, em todos os lugares se fala no assunto. Até porque o modelo de desenvolvimento econômico que a sociedade criou é altamente destrutivo ao meio ambiente. Descobriu-se, enfim, que os recursos naturais não são inesgotáveis. Esse despertar para a necessidade de preservar a qualidade de vida dá Ibope sim, mas por outro lado gera uma porção de folclores complicados. Desde financiamentos para pesquisas em universidades até atividades como rodízio, por exemplo, que embora importante, passa a ser mais um efeito-demonstração do que qualquer outra coisa.


A falta de coordenação de investimentos públicos também é contraproducente e em nada contribui para resolver problemas ambientais, como os apresentados pela Represa Billings. Há uma avaliação de que seriam necessários US$ 300 milhões para recuperação da Billings, mas não existe política de ação conjunta nesse sentido. É lógico que a importância da Câmara Regional não pode ser minimizada, da mesma forma que não pode virar panacéia, mas sinto que o governo do Estado tem certa dificuldade de promover articulações entre suas secretarias. Falta, por exemplo, flexibilidade para mudar algum planejamento em função do surgimento de novas alternativas geradas em discussões locais. É preciso vontade política para reverter algum planejamento anterior, fundamental para avançar no enfrentamento dos problemas. A Secretaria de Meio Ambiente tem tido interlocução satisfatória com a região. O problema é que, dentro do governo do Estado, nem sempre reúne a força indispensável para que as propostas tenham consequência.


Essa dificuldade de articulação com o Estado como um todo acaba provocando rompimentos práticos. O desmembramento de terrenos, promovido de forma populista pela administração anterior de Ribeirão Pires, representa sério problema para a administração atual. Infelizmente, no caso específico de Ribeirão Pires, temos legalmente duas cidades: a do Município propriamente dito e a do Estado. A legislação do Município não bate com a do Estado. Muitas vezes o cidadão comum pensa que está com a habitação plenamente regularizada, porque o projeto foi aprovado pela Prefeitura e, de repente, aparece o Estado para atrapalhá-lo. Muitas vezes tem até registro em Cartório de Imóveis. Temos mais de mil lotes irregulares, que não podem ter ligação de energia elétrica. Além dos prédios no centro. Agora as casas estão ficando prontas. A Prefeitura tem posição muita clara a respeito: onde existe área consolidada tem de ser ligada a luz. Área consolidada é onde a malha urbana está explicitamente pronta, com rua, sarjeta, calçada. Sabíamos que o desmembramento criaria dificuldades como essas que estão aparecendo e quando a administração assumiu a Prefeitura tomou a providência de suspender o parcelamento. Há perto de dois mil lotes aprovados.


Estamos na Justiça contra o governo do Estado, não só contra a questão que envolve a Eletropaulo como também para obter compensação, porque Ribeirão Pires está incluída em região de proteção de mananciais. Desde o final de 1995 estamos esperando a regulamentação de lei que estabelece os critérios de repasse de recursos financeiros, mas até hoje nada aconteceu. Já estivemos com o governador do Estado, já falamos na Câmara Regional. A Secretaria de Meio Ambiente do Estado concordou com nossa proposição, mas nada aconteceu. Estamos levantando os valores financeiros que reforçariam nosso caixa. Fizemos uma conta e, por alto, em toda a região, o mínimo que teríamos para compensar as restrições de ocupação espacial seria de US$ 70, 80 milhões por ano. Ribeirão Pires teria 10% desse valor, ou até mais.


O governo tem colaborado com os planos de Ribeirão Pires?


Hereda – Nem recebemos o que devemos e nem contamos com colaboração do Estado em nada do que estamos desenvolvendo para buscar alternativas de crescimento. A própria transformação de Ribeirão Pires em estância turística, que se traduz em recursos financeiros orçamentários do Estado, também não nos contempla. Tudo porque criaram dificuldades com relação à qualidade do ar. Enquanto isso, Poá e Embu, que também estão na Região Metropolitana e que nunca passaram por medidores da Cetesb, são estâncias. A Sabesp alega que na época da aprovação não era preciso a medição da qualidade do ar.


Acho que uma atitude coerente de qualquer governo, se há um Município fazendo esforços para arrumar saídas de atividades econômicas de uso compatível com a preservação, seria contribuir para que esses objetivos sejam alcançados. Para que isso? Para que não se tenha que investir em fiscalização repressiva. A Câmara Regional é a esperança da região, mesmo sem ser panacéia, porque é um investimento de se colocar as pessoas à mesa para debater a região. Quando se senta na mesa com interlocutores da região, tudo flui melhor. Já o governo do Estado, apesar de toda boa vontade, não contribui tanto, porque não tem complementaridade de atuação entre suas várias secretarias.


Como se sente ao sair da Prefeitura de Diadema e ver tudo que foi feito em termos de pesquisa socioeconômica praticamente inutilizado, porque o trabalho não teve sequência na atual administração?


Hereda – Quando concluímos o trabalho de coleta de informações em Diadema, numa pesquisa inédita do Imes (Instituto Municipal de Ensino Superior de São Caetano), estávamos criando um Conselho de Desenvolvimento Econômico, com representação de mais de 15 entidades. Chegamos até a ir à Câmara para aprovar o Conselho e dar sequência ao trabalho. Tenho me pautado em não criticar o governo do Gilson Menezes, até porque mantenho relação com o corpo técnico do Município nos trabalhos da Câmara Regional, mas acho que é preciso quebrar essa história de que o que é feito pelo antecessor deve ser desativado. Infelizmente, é isso que prevalece.


A impressão que tenho é a seguinte: se tivéssemos conseguido implementar os trabalhos dois anos antes, teríamos consolidado de vez as transformações. Diadema tem técnicos suficientes para executar as ações. Aliás, a Prefeitura era apenas parte do Conselho de Desenvolvimento Econômico. Representações sociais e empresariais também tinham contribuições a dar. Em Ribeirão, estamos em fase de consolidação de conselho semelhante para a cidade inteira. Mas já temos o Conselho de Desenvolvimento Sustentado, coordenado pela pasta que ocupo. Acho que o caso de Diadema é perder um pouco esse preconceito. O limite da disputa política tem de ser o interesse do Município. Se não for assim, a gente vai sempre chegar perto e voltando. Vai ter avanços e recuos. O próprio governo do Gilson Menezes tem avanços. Ao contrário do secretário que me substituiu em Diadema, e que é meu amigo, não recebi nada de meu antecessor em Ribeirão Pires.


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