O prefeito Aidan Ravin não teve como romper compromissos eleitorais que o levaram a mais surpreendente vitória em segundo turno desde a implantação do sistema no mercado brasileiro. Compromissado com o deputado estadual Campos Machado, presidente estadual do PTB, o mesmo Campos Machado que aparece em programas eleitorais vinculando o partido a símbolos nacionais, Aidan Ravin está atropelando candidaturas locais que gravitam em torno da maioria obtida na Câmara de Vereadores. É claro que há insatisfação geral. O custo desse desbalanço político poderá aparecer mais à frente. Depois de uma eleição municipal sempre vem uma nova eleição municipal.
É importante lembrar que foi com o decidido apoio de Ronan Maria Pinto, presidente do Diário do Grande ABC, que se preparou a avalanche eleitoral que culminou com a vitória do até então obscuro vereador Aidan Ravin. Todos sabem que o território de Aidan Ravin se limitava à Vila Luzita. Ali desenvolveu ações na área de saúde, médico que é.
A elasticidade dos votos de Aidan Ravin se deu por conta de orquestração interpartidária com apoio logístico de aliados regionais do Palácio dos Bandeirantes. O carisma pessoal de um prefeito que se daria extremamente bem como animador de auditório — e não vejam nisso nenhum preconceito, por gentileza — deu tratos à bola da viabilidade eleitoral.
Um pangaré não teria obtido aquela reviravolta no placar. Virar aquele jogo não é uma virada qualquer. O time da casa, no caso o PT, ganhava de 5 a 0 ao final do primeiro tempo. Perdeu de 6 a 5.
Por todas aquelas circunstâncias demarcatórias da coalização que implodiu o favoritíssimo de Vanderlei Siraque, cobra-se agora fatura compensatória de Aidan Ravin. Não só de Aidan Ravin, mas do próprio Diário do Grande ABC. O jornal meteu-se numa enrascada e tanto porque chuta a canela da política editorial herdada dos fundadores da empresa. Um dos líderes da Frente Andreense, o então diretor de Redação do jornal, Fausto Polesi, defendia bravamente o voto regional.
A bandeira de “Vote no Grande ABC”, que originou o movimento Fórum da Cidadania do Grande ABC, ganhou desdobramentos ao longo dos anos. Agora, está às portas da extinção não por inutilidade ou insensibilidade do eleitorado que consome informações do jornal da Rua Catequese. O silêncio do jornal à representatividade política regional em forma de votação se dá porque Campos Machado é aliado estratégico dos sonhos de Ronan Maria Pinto controlar a maioria das administrações públicas municipais do Grande ABC.
Campos Machado é ponta-de-lança de Geraldo Alckmin e José Serra. Daí, a briga de foice do Diário do Grande ABC com a administração de Luiz Marinho, devidamente enquadrada em dispositivos que acabaram por praticamente silenciar o jornal e por fortalecer a posição de liderança regional do petista.
Aliás, sobre isso, escreverei qualquer dia destes, porque me cobram posicionamento. Querem saber o que mudou desde que Ronan Maria Pinto e o prefeito de São Bernardo sentaram-se à mesa do restaurante mais chique de Santo André. Nem todos os leitores conseguem distinguir a linha editorial de um jornal ou de uma revista conforme prerrogativas de bastidores ou o ritmo da música ideológica. No caso do Diário do Grande ABC, não há notas musicais em jogo.
Aidan Ravin é político de cumprir compromissos que lhe pareçam indispensáveis para continuar sonhando o sonho da reeleição, apesar da pedra no caminho de Miriam Belchior, preparadíssima para um voo de retorno às origens. Tanto é decidido a honrar a palavra que vale a pena ser honrada que Aidan Ravin não dispensa ao aliado de primeira hora Campos Machado todo o apoio logístico e material que a candidatura do deputado exige.
Na semana passada um mundão de comissionados da Prefeitura de Santo André foi convocado a um salão de festas da periferia, quando recebeu espécie de ultimato surpreendente. Eles não estavam preparados para nada que não fosse algo trivial: cada um deve fazer parte da corrente prá frente em defesa de Campos Machado. Que esqueçam, portanto, benfeitores políticos locais. Aidan Ravin tem cota de votos a cumprir em favor da candidatura do petebista-chefe do Estado e não aceita fracassar. Deixar Campos Machado na mão é contrariar acordos pré-eleitorais de 2008.
A pesquisa anunciada ontem pelo Instituto Unidade de Pesquisa do especialista Sidney Kuntz apontou que em Santo André o contingente de eleitores decididos a votar em candidato do Grande ABC tanto à Assembléia Legislativa quanto à Câmara Federal é de 63,9%. Exatamente o mesmo percentual médio do Grande ABC. Aidan Ravin está contrariando, com o apoio a Campos Machado (já há algum tempo ele declarou ao Diário do Grande ABC que apoiaria aquele deputado, e está cumprindo a palavra) nada menos que dois terços do eleitorado de Santo André.
Se juntarmos a essa porção algo como boa parte dos 27,1% dos eleitores andreenses que, respondendo ao Instituto Unidade de Pesquisa, disseram que tanto podem votar em candidato da região ou de fora, aumenta consideravelmente o embate entre o prefeito e o eleitorado que o colocou no Paço Municipal.
Já escrevi tanto sobre voto regional que o melhor para o entendimento dos leitores é sugerir alguns textos, como consta logo abaixo deste artigo. O caso envolvendo Aidan Ravin é diferente. Trata-se do chefe de Executivo que rompe com qualquer um dos pressupostos de vinculação de voto exclusivamente por conta de compromisso pessoal. A situação do Diário do Grande ABC é semelhante. Sem que vinculem a crítica deste jornalista a xenofobismo eleitoral, o haraquiri da própria identidade editorial deve-se a acordos de bastidores que estão longe de trafegar por amplas avenidas de valorização da governança regional.
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