Como Veja e CartaCapital trataram a polêmica agressão a José Serra
DANIEL LIMA - 25/10/2010
Vou repassar em tamanhos equivalentes os principais trechos das matérias que as semanais Veja e CartaCapital publicaram sobre a polêmica agressão ao candidato José Serra no Rio de Janeiro. O material original de CartaCapital é muito mais amplo, mais detalhado, mais minucioso. Mas não é isso que o diferencia da reportagem de Veja. A revista comandada por Mino Carta trata a divulgada agressão a José Serra com ceticismo, como manda o bom jornalismo principalmente em situações análogas, de fartos ângulos interpretativos. Veja, da Editora Abril, conhecidíssima pela aversão ao PT, dá ao caso retumbância editorial extremista. Sugere uma catástrofe à democracia.
Como não sou de ficar em cima de muro algum, e como conheço bem a genética das duas publicações, não teria dúvida em assinar a reportagem de CartaCapital. Recebo em casa as duas publicações. Pratico o dever do contraditório informativo que se desdobra em acompanhar outros títulos tanto em papel como na versão digital. Não amarro o burro da ideologia ou do que quer que seja num único poste. Desconfio de todas as publicações. A opção pelo texto de CartaCapital está fundamentada no somatório de leituras de muitos anos e, principalmente, do desencanto com o rumo unilateral de Veja, caprichado panfleto dirigido à Classe Média Tradicional que se contrapõe aos jornais sindicais protegidos pelo PT e endereçados aos trabalhadores de Classe Média Emergente.
Mas não é apenas isso que me faria assinar o texto de CartaCapital e de desconfiar profundamente do de Veja. Os dias subsequentes ao caso fortaleceram a desconfiança de que o efeito midiático pretendido por José Serra não foi alcançado, por mais que a TV Globo tenha caprichado no figurino com classe e sofisticação. Tanto o tiro não foi tão certeiro assim que o assunto foi logo abandonado no programa eleitoral.
O exagero do candidato tucano, ao recorrer a supostos cuidados médicos, inoculou mais que uma dúvida imensa quanto à veracidade da agressão. Forneceu a certeza de que se pretendeu obter dividendos eleitorais acima do razoável. Pesquisas encomendadas imediatamente após o incidente devem ter retratado essa leitura. As mensagens dos candidatos são monitoradas o tempo todo pelo andar da carruagem da percepção dos eleitores. Eles são como apresentadores de programas de auditórios que mandam para os camarins ou seguram no palco atrações que derrubam ou elevam a audiência. É possível que pegou mal para o candidato tucano a espetacularização de uma suposta agressão.
Alguns trechos da matéria de Veja sob o título “Pau na democracia” e subtítulo “Militantes ensandecidos, agressão física contra José Serra e, por fim, o destempero de Lula. Na base ou no topo, o PT não conhece limites”:
Na quinta-feira passada, uma discussão bizarra tomou conta do Brasil: teria sido uma bolinha de papel ou um rolo de fita adesiva o objeto que atingiu a cabeça do candidato tucano à Presidência, José Serra, durante uma caminhada eleitoral no Rio? O debate movimentou a Internet, imagens do episódio foram exibidas e reexibidas na TV por ângulos diversos e até especialistas em áudio e vídeo foram consultados para opinar sobre a questão. Por fim, a Rede Globo, recorrendo às normas do bom jornalismo, repôs a verdade que o mau jornalismo do SBT surrupiara ao colocar no ar cenas do ocorrido flagrante e maliciosamente editadas. Eis a verdade: durante a caminhada que tentou fazer com a sua comitiva de campanha em um calçadão de Campo Grande, na Zona Oeste do Rio, Serra foi atingido duas vezes na cabeça: a primeira por uma bola de papel amassado; quinze minutos depois, por um rolo de fita adesiva. Com o segundo ataque, chegou a sentir-se “grogue”, segundo relatou o deputado federal Fernando Gabeira, que estava ao lado do candidato e ouviu-o comentar o mal-estar. Serra, então, entrou na van da campanha, recebeu uma bolsa de gelo para diminuir o galo que havia surgido no lugar da pancada e, em seguida, procurou um médico para examiná-lo. Conclusão: o tucano foi atingido, sim, a ponto de sentir-se tonto, e o objeto que provocou o seu mal-estar foi um rolo de fita adesiva, e não uma bolinha de papel. (…) Da mesma forma que é inútil esperar dos esquadrões petistas civilidade, parece igualmente vão cobrar do presidente a compostura que seu cargo exige. Desta vez, no entanto, é diferente. O presidente acusou Serra de ter protagonizado uma farsa e foi desmentido minutos depois por imagens gravadas e inequívocas. Deve desculpas não só ao candidato adversário, mas também a todos os brasileiros — escreveu Veja.
Agora os principais trechos da matéria de Carta Capital, sob o título “Papéis e papelões” e subtítulo “A simulação da agressão a José Serra no Rio de Janeiro é só mais um episódio de uma campanha tomada pela baixaria, a hipocrisia e a má-fé:
(…) A história da agressão a Serra é um caso para entrar no anedotário da política nacional. Houve, obviamente, desrespeito por parte de simpatizantes do PT ao candidato durante a caminhada. Serra foi chamado de “assassino” por ex-agentes do combate à dengue, conhecidos como “mata-mosquitos”, demitidos por ele quando era ministro e que se tornaram desde então ferrenhos adversários do tucano. (…) Na confusão, o presidenciável foi atingido por um objeto na calva, a princípio descrito como um rolo de fita adesiva, que se transformou, ao longo do dia, em pedra, depois em mastro de bandeira e, por último, de acordo com reportagem do SBT, numa mísera bolinha de papel. (…) Serra chegou a ser submetido a uma tomografia e aconselhado a repousar por 24 horas. Violência é algo condenável numa campanha, mas o que ocorreu diante das câmeras do SBT foi igualmente condenável: o tucano protagonizou uma encenação para se fazer de vítima da truculência “nazista” do PT, como declarou à saída do tumulto. (…) As imagens mostram o candidato sendo atingido por um pequeno objeto branco que não lhe causa nenhum ferimento aparente — o que foi confirmado pelo médico que o atendeu, Jacob Klingerman, seu amigo desde 1964 e secretário municipal de Saúde durante a administração de César Maia, aliado de Serra, na Prefeitura do Rio. Klingerman declarou que havia apenas um “inchaço” no local, o que ainda assim parece exagerado diante do tamanho do objeto arremessado, possivelmente não um rolo de adesivos, mas uma bola feita com adesivos. Na descrição feita pelo vice de Serra, Índio da Costa, era, porém, um “pacote de uns dois quilos”. O episódio virou uma guerra de versões na TV. O Jornal Nacional, da Rede Globo, disse que o tucano foi atingido em duas ocasiões. Primeiro por uma bola de papel e 15 minutos mais tarde, por um bolo de fita crepe. Mas o SBT manteve sua história. Disse que filmou todo o percurso e desafiou outras emissoras a exibirem imagens do segundo objeto. E insistiu: Serra só foi atingido uma única vez — escreveu Carta Capital.