Política

O que diria Brandão sobre Aidan
Ravin como seu sucessor popular?

DANIEL LIMA - 27/12/2010

Sei lá o que o ex-triprefeito de Santo André acharia deste texto, mas agora não dá mais para ouvi-lo sobre um assunto que, aliás, na véspera de Natal, tangenciei neste espaço quando retratei o almoço que mantive com o ex-supersecretário petista Klinger Sousa. O caso é o seguinte: morto e enterrado no final de semana prolongado, é bobagem a imprensa correr atrás do herdeiro natural do eterno prefeito Newton Brandão. Já em vida, com Brandão meio cambaleante sob o peso da idade, surgira em Santo André como um furacão o político que não só mais se assemelhou às características de cair nos braços do povo com empatia incomum como tem tudo para superá-lo se botar o desenvolvimento econômico na bitola de novos tempos.


É claro que estou me referindo a Aidan Ravin, médico como Brandão e capaz de arrastar mais multidões que Brandão. É claro que os tempos são outros, que os meios de comunicação são múltiplos, que a Tecnologia da Informação pode tanto dar suporte como tornar-se cadafalso à imagem de políticos, mas quem está de lanterna na mão à procura do sucessor de Brandão provavelmente precise de oftalmologista. Ou de neurônios.


Vai depender apenas de Aidan Ravin e da equipe de assessores apanhar com as duas mãos, definitivamente, os eleitores que sobraram de Newton Brandão e, principalmente, manter e ampliar eleitores seduzidos nas últimas eleições municipais entre outros motivos porque o estilo popular se recicla a cada geração. A leva de eleitorado que consagrou Brandão no passado e que envelheceu junto com o triprefeito abre espaço para replicantes dispostos a seguir o prefeito de Santo André. É essa camada de um terço do eleitorado sem aprisionamento ideológico que costuma decidir as eleições aqui e em qualquer lugar do País.


Colar a imagem de Aidan Ravin à de Newton Brandão e de Celso Daniel, principalmente por conta do ressuscitamento da Cidade Pirelli, seria uma jogada de mestre. Ainda mais que agora há completo sentido metafísico a amparar o chefe do Executivo de Santo André.


É certo que o exagero na colagem de imagem de quem já deixou esse mundo pode causar desconfiança do eleitorado, mas a recíproca também é verdadeira: quem abrir mão de aproximação factível, perderá grande oportunidade de comunicar-se com responsabilidade com quem sabe que a política é como a vida, ou seja, não é possível interromper ciclos naturais. Celso Daniel e Newton Brandão morreram como tantos outros políticos, mas deixaram lições e especificidades para quem melhor souber apropriar-se legitimamente. Até porque tanto um quanto outro não fundaram doutrinas que exercitaram. Muito menos as especificidades pessoais no trato com o eleitorado.


Não tive muitos contatos com Newton Brandão. Não sou frequentador assíduo de corredores públicos. Aliás, não sou frequentador de coisa alguma, principalmente depois que a Tecnologia da Informação facilitou horrores os contatos com fontes de informação. Até porque, não costumo me expor com fontes de informação em locais públicos. Alerto-as sempre sobre riscos de retaliações de poderosos predadores.


O que poderia então escrever sobre Brandão que os eleitores mais maduros de Santo André choram a morte?


Que Brandão é a síntese da própria política. Um animal político. Coloco no presente a definição porque um dirigente público jamais morre. Biologicamente está morto, é verdade, mas suas decisões vão repercutir sempre. Faltou a Brandão o tempo todo o que o contexto permitiu negligenciar: a paixão pelo desenvolvimentismo que Celso Daniel adotou a partir do segundo mandato, em 1997.


Brandão foi prefeito a partir de 1969 até 1995 em três mandatos alternados. Foi um período em que Santo André e o Grande ABC ainda não acusavam as dores da desindustrialização. A chegada de indústrias era automática, principalmente até os anos 1980. Não havia com que se preocupar. Muito menos com a correção monetária dos tributos municipais. Era uma farra de populismo para Brandão e tantos outros prefeitos dirigir uma Prefeitura. Os repasses estaduais e federais asseguravam orçamentos nababescos.


Em 1975, Santo André contava com 50% do orçamento só para obras. Uma barbaridade perto dos 15% de hoje em dia. Como outros municípios de médio e grande porte do País. Em duas décadas Santo André perdeu dois terços de repasses do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) por conta da debandada industrial. A alternativa foi aumentar os tributos próprios. Para chiadeira da classe média tradicional, avessa a impostos locais, mas dócil à carga federal, muito mais cortante.


Mesmo com todas as facilidades que o gigantismo de receitas e a então comprimida base de demandas sociais permitiam governar Santo André com muito fôlego, Newton Brandão jamais poderá ser catalogado como administrador público comum. Se o fosse não teria se mantido uma década e meia no cargo, depois de submetido a três eleições separadas no tempo, sem direito à reeleição. Carisma é bom, eleitor adora, mas não é suficiente, isoladamente, para garantir a próxima vitória eleitoral.


Newton Brandão era afável, cavalheiro, agradável, piadista de memória prodigiosa. Uma pena que não tenha sabido parar na hora certa. Demorou para descobrir — ou talvez nem tenha descoberto voluntariamente — que a maioria do eleitorado que o consagrou em várias disputas já se antecipara à cronologia da morte depois da vida. O estreitamento da base eleitoral o levou, nas disputas de 2008, a vivenciar a esqualidez das urnas em primeiro turno, terminando com menos de 10% dos votos válidos.


Não faltaram candidatos em busca do espólio popular de Newton Brandão. Todos se deram mal. Newton Brandão não era potencialmente insubstituível como produto eleitoral em vida nem será em morte simplesmente porque Santo André conta com uma réplica com tudo para aperfeiçoar o modelo industrializador de votos que foge do raciocínio dos intelectuais, do fanatismo dos opositores e das exigências dos críticos. Resta saber se Aidan Ravin saberá corresponder à expectativa. Os dois primeiros anos do primeiro mandato foram apenas para aquecimento. Como o foram para outros prefeitos igualmente eleitos em 2008.


A Cidade Pirelli é a travessia da ponte para que Aidan Ravin acrescente à empatia popular de Newton Brandão o comprometimento com o futuro de administrador de Celso Daniel. Mesmo sem o brilho intelectual e acadêmico do inesquecível petista que, como se sabe, jamais correu na mesma raia de Newton Brandão.


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