Novos dirigentes do Ciesp (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo) no Grande ABC assumiram recentemente e prometem marcar período de intenso relacionamento institucional da entidade na região. Dos quatro titulares do Grande ABC, apenas Walter Bottura Júnior, de Diadema, foi mantido no posto com a eleição de Horácio Lafer Piva à presidência do Sistema Fiesp/Ciesp. Os outros três são novatos no cargo — César Garbus (São Bernardo), Shotoku Yamamoto (Santo André) e Willian Pesinato (São Caetano). Coincidentes em vários pontos, os dirigentes dos Ciesps integram um conjunto de lideranças empresariais que decidiram fazer carga junto a várias instâncias de governo para a importância da produção, contra o monopólio de debates e de prioridades voltadas ao campo monetário.
Propositalmente, esta entrevista foi realizada por meio de fax, enviados aos respectivos Ciesps. A idéia de reunir os quatro diretores-titulares da entidade num mesmo ambiente chegou a ser cogitada. Mas acabou prevalecendo a proposta de obter respostas por escrito e individuais até como estratégia de conhecer o grau de coesão ou de dispersão de pensamentos, interpretações e ações dos responsáveis pelo comando da entidade mais representativa do industrial paulista de pequeno e de médio porte.
Uma das constatações é que o presidente da Fiesp, Horácio Lafer Piva, conta com o prestígio do quarteto regional. É verdade que isso não surpreende, até porque Bottura, Pesinato, Shotoku e Garbus são uma extensão física do dirigente. A diferença em relação a outros tempos de Fiesp é que o discurso está afinado entre eles. E que discurso é esse? Mais produção, mais valorização do industrial, menos impostos. São temas macroeconômicos que a nata do empresariado paulista representada pela pirâmide da Avenida Paulista consegue capilarizar junto aos empreendedores, mas cujos efeitos práticos sugerem dificuldades de sensibilizar o governo federal, às voltas com cipoal de reformas.
Os dirigentes dos Ciesps do Grande ABC estão tão sintonizados com a linguagem pró-produção de Lafer Piva como com a percepção dos problemas regionais que dificultam o desenvolvimento econômico. Uma das questões abordadas no questionário trata exatamente disso — dos problemas que atravancam a produção industrial da região. Eles apontaram o engessamento da infra-estrutura, sobretudo a viária. Citaram o custo da água industrial, da mão-de-obra e dos privilégios trabalhistas que os sindicatos consideram conquistas sociais, além da dependência excessiva do setor automotivo, que naturalmente faz inflar ou refluir a dinâmica econômica da região, entre outros.
A responsabilidade que pesa sobre esse grupo de líderes de pequenas e médias indústrias do Grande ABC é proporcional ao esfacelamento histórico dos empreendedores locais. Depois do alvorecer econômico ditado pela chegada das montadoras de veículos, a indústria do Grande ABC conheceu os entrechoques com o sindicalismo, nos quais sempre levou a pior porque as negociações geralmente se davam com base na realidade das grandes empresas, com imenso poder de repasse de custos num mercado fechado.
Como se não bastasse a sangria desatada da exacerbação sindical, tiveram de conviver com processos inflacionários cada vez mais insuportáveis, que os retiravam da administração técnica e os submergiam em equações financeiras. Para completar o ciclo, vieram a desregrada abertura econômica em nome da globalização e o choque do fim da escalada inflacionária com o Plano Real. A estabilidade da moeda significou a dura constatação de que qualquer ponto percentual de custo adicional no produto é a sinalização de que um concorrente pode tomar clientes que pareciam cativos, consumidores que sugeriam fidelidade permanente.
É nesse clima de salve-se quem puder que impera na economia brasileira destes tempos bravios, e particularmente num Grande ABC que acusa dores de desgastes históricos e jamais tratados com unidade corporativa dos empreendedores, que os dirigentes dos Ciesps locais responderam ao questionário.
Como melhorar o índice de filiação do Ciesp? Que estratégias você utilizará?
César Garbus – Apesar da falta de indicativos oficiais, acredita-se que o número de indústrias hoje em São Bernardo situa-se em torno de 1,2 mil, com 12% associadas ao Ciesp. Um acontecimento gratificante ocorreu nestas últimas eleições, quando a procura por cargos no Conselho Diretor foi maior do que o número de vagas, demonstrando que o empresário está mais preocupado e quer participar ativamente das decisões tanto no aspecto econômico quanto no social e político. E é esta a estratégia que iremos utilizar. Ou seja: aproveitar o momento crítico em que vive a sociedade como um todo para incentivar o associado e os não associados a utilizarem a entidade de classe não só como prestadora de serviços, mas como grande fórum de discussão dos problemas que afetam as empresas, num trabalho conjunto com a Fiesp como órgão de pressão política junto aos poderes públicos.
Walter Bottura Júnior – O Ciesp de Diadema representa, em números absolutos, o maior quadro associativo na estrutura da entidade no Estado de São Paulo e cerca de metade dos associados do Grande ABC. Temos no Município aproximadamente 1.150 indústrias. Desse total, 428 são associadas. Mantemos contínuo trabalho de conscientização do industrial sobre as atividades da entidade e a importância de sua participação. Disponibilizamos uma estrutura de serviços adequada à realidade da região, a qual tem trabalho reconhecido pela ISO 9002, obtida em auditoria do organismo certificador BRTUV realizada em dezembro de 1996. Também recebemos o Prêmio Excelência como a melhor entidade do Ciesp em 1996 e mais recentemente o Prêmio Desempenho Empresarial.
Shotoku Yamamoto – A contribuição associativa deixará de ser uma despesa para ser tratada pelos empresários como investimento. Evidentemente, para tanto, o Ciesp de Santo André passará a ser verdadeiramente um guarda-chuva, protetor de empresas industriais. Promoveremos reuniões entre empresas por setor de atividade para diagnosticar os problemas comuns nas áreas tributária, fiscal e trabalhista, entre outras. Procuraremos melhorar o relacionamento capital e trabalho. Nesse sentido, a idéia é convidar também líderes sindicais para participar das reuniões com empresários. Já iniciamos também um trabalho de estreitamento das relações entre empresas industriais e autoridades fiscais da região. O mesmo acontecerá com parlamentares, para que o Ciesp deixe de ser uma entidade de adesão para ser uma entidade de pressão, como pensa nosso presidente, Horácio Lafer Piva.
Os empresários de nossa base territorial estão orientados para trazer e expor problemas e pleitos à diretoria. No momento em que sentirem que o Ciesp presta bom serviço aos associados, as empresas não associadas procurarão associar-se. Já contratamos um profissional de alto nível para divulgar nosso trabalho e atuar como agente de expansão social. Precisamos, enfim, nos preparar para o fim da contribuição sindical compulsória.
Willian Pesinato – Só melhoraremos o índice de filiação divulgando mais o que é o Ciesp e para o que serve. Pensamos em elaborar pesquisa junto às empresas para conhecer as expectativas de associar-se ao Ciesp. Também entendo que se melhorar o índice com prestação de serviços práticos, voltados às necessidades instantâneas do industrial, no campo jurídico, fiscal, tributário, financeiro e teórico. Nossa base associada é de 30%, já que temos 300 indústrias em São Caetano.
Resumidamente, o que você espera que seja alterado no comando do Sistema Fiesp/Ciesp para que as diretorias dos Ciesps ganhem mais força? Reclama-se muito da centralização das decisões na Fiesp.
Willian Pesinato – O Sistema Fiesp/Ciesp era realmente muito centralizado. Mais do que isso: funcionava sob modelo de gestão conservadora e não adequado à realidade atual, tanto no que se refere à rapidez de atendimento quanto nos serviços prestados. Sem falar do inchaço da administração.
Shotoku Yamamoto – A mudança já está acontecendo em ritmo acelerado. Com a reestruturação da casa, as diretorias regionais ganharam autonomia e as empresas serão assessoradas com maior velocidade e eficiência pelas diretorias da área técnica da casa.
Walter Bottura Júnior – A descentralização da entidade vem sendo implantada desde a gestão do doutor Carlos Eduardo Moreira Ferreira. Com a eleição e posse do doutor Horácio Lafer Piva foi implantado novo modelo de gestão, que agregou maior velocidade nesses trabalhos e ao mesmo tempo está modernizando a estrutura, tornando-a mais adequada à atual realidade do mercado.
César Garbus – A descentralização administrativa vinha acontecendo desde o mandato anterior. Entretanto, o novo presidente Horácio Lafer Piva, já na primeira reunião no comando das diretorias executivas, apresentou alterações estruturais na forma de funcionamento da casa que, sem dúvida alguma, atendem a todos os reclamos de recolocar a entidade no seu papel de órgão de pressão política. Ficou claro que nós esperamos muito tempo e que agora chegou a hora de arregaçar as mangas e partir para a ação em conjunto. A fase de esperar que o presidente faça acabou. O empresário está determinado a praticar sua cidadania e vamos lutar lado a lado para que a indústria volte a ser valorizada. O Horácio tem aqui parceiros desta luta.
Quando os Ciesps do Grande ABC vão atuar de forma institucional conjunta? Já houve avanço com o trabalho coletivo na área técnica? Não lhe parece que o industrial do Grande ABC não é devidamente valorizado, sobremodo o pequeno e o médio?
Walter Bottura Júnior – As unidades do Ciesp da região desenvolvem trabalhos integrados desde setembro de 1997. Na área técnica, diversas ações já foram implementadas. Na área político-institucional também é desenvolvido trabalho conjunto. Podemos exemplificar através da participação no Fórum da Cidadania, na Câmara Regional do Grande ABC e mais recentemente na Agência de Desenvolvimento Econômico. Quanto à valorização da classe, sabemos que o industrial não é devidamente valorizado no País, especialmente as micros, pequenas e médias indústrias, principalmente pelos órgãos governamentais. Isso é demonstrado pela elevação absurda das taxas de juros, quantidades surrealistas de impostos e total falta de respeito com os empreendedores, geradores de empregos e renda.
César Garbus – A aproximação entre os Ciesps da região já aconteceu e vários projetos estão sendo desenvolvidos em conjunto. Quanto às ações político-institucionais, nesse período de maturação pós-eleições, com certeza estaremos discutindo estratégia dirigida. Muito se discursa em apoio às pequenas e médias empresas. Entretanto, o que se vê é o mesmo de sempre: não existe política definida e nada foi feito em benefício dessas empresas. Pelo contrário: esse setor nunca é chamado. Dentro do Plano Diretor do Ciesp de São Bernardo para o triênio 1998/2001, que está em fase de conclusão, teremos duas prioridades. A primeira será direcionar esforços às empresas já instaladas na região. A segunda, priorizar programas que beneficiem as micros, pequenas e médias empresas.
Shotoku Yamamoto – O ex-diretor titular do Ciesp de Santo André, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra, Fausto Cestari Filho, atuou decisivamente para valorização e fortalecimento da entidade. Foi, junto com outros líderes da região, o idealizador do Fórum da Cidadania e da Câmara Regional. O problema é que alguns empresários, por causa da angustiante situação resultante da conjuntura econômica do País, esperam receber benefícios mais imediatos que mudem o rumo de suas empresas. Os Ciesps do Grande ABC já atuam de forma integrada há mais de um ano, dentro do espírito de que o que é bom para Diadema ou São Caetano é bom para Santo André e São Bernardo, tendo em vista a semelhança das regiões.
Willian Pesinato – Anteriormente às medidas da nova gestão do Sistema Fiesp/Ciesp, o Grande ABC já se movimentava com o estabelecimento de trabalho conjunto entre as diretorias regionais. Esta união foi tão profícua que hoje agrega as diretorias de Cubatão e Santos, mostrando que a união de esforços proporciona trabalho mais objetivo e forte em todas as áreas de atuação. Precisamos valorizar o empresariado. Estamos cansados de ver proteção aos banqueiros, enquanto somos esquecidos. Por isso mesmo que na reunião da Fiesp em novembro o presidente Horácio Lafer Piva convidou a bancada federal de São Paulo e propôs trabalho conjunto para revitalizarmos a indústria. Para isso, é indispensável a participação de todos os empresários em suas entidades de classe.
Qual sua visão particular, de empreendedor, sobre o futuro do Grande ABC no setor econômico? Temos mais motivos para preocupações ou para satisfação?
Willian Pesinato – O Grande ABC foi palco de movimentos que provocaram, em parte, a fuga de indústrias. O Custo ABC é uma realidade. Basta compará-lo com outros locais para onde as indústrias se evadiram. Quando ressalto o aspecto parcial do Custo ABC quero dizer que não houve aumento de despesas apenas nos salários e benefícios dos trabalhadores, mas de forma geral. Se compararmos, além de salários, moradias, alimentação e transporte, verificaremos que todos são mais caros também em relação a outras regiões.
Shotoku Yamamoto – O Grande ABC, como todo o Estado de São Paulo, está sendo vítima da guerra fiscal entre os Estados. Tenho conhecimento de empresas que foram beneficiadas com incentivos fiscais em outros Estados e vêm aqui oferecer produtos a preços inferiores, competindo com empresas do Grande ABC que não têm nenhuma vantagem fiscal. Nesse sentido, a diretoria regional de Santo André levará o problema para a Avenida Paulista e vai solicitar à casa que exerça pressão junto ao governo para conseguir isonomia competitiva. A criação da Agência de Desenvolvimento Econômico do Grande ABC vai ter atuação decisiva para atrair novos investimentos à região. O Grande ABC tem vantagem comparativa em termos de mercado consumidor, mão-de-obra qualificada, logística portuária, centros tecnológicos. Com o trabalho de aproximação entre capital e trabalho, vamos extirpar aquela imagem de que no Grande ABC o sindicalismo atrapalha o investimento.
César Garbus – Existem dois pontos: satisfação em poder ver a participação de setores empresariais, trabalhadores, entidades diversas e Poder Público discutindo melhorias para a região; e preocupação com a realidade atual das empresas. Será que haverá tempo para conseguirmos traçar um planejamento mais amplo, mais direcionado, com o desenvolvimento realmente sustentável?
Walter Bottura Júnior – A visão tem de ser otimista, pois é impossível dissociar o empreendedor do otimismo. Do contrário, não abriríamos nossos negócios. Já em relação a motivos para preocupações ou para satisfação, temos mais razões para inquietação, uma vez que o destino de nossos negócios está vinculado a ações governamentais nas áreas tributária e de política industrial e, mais recentemente, também a ações de outros governos dentro da economia globalizada.
Relacione três aspectos que dificultam a atividade empresarial no Grande ABC, independente de aspectos macroeconômicos.
César Garbus – A mão-de-obra, apesar de qualificada, é uma das mais caras do País. Falta também uma política de incentivo direcionado às pequenas e médias empresas. E também faltam ações concretas que incentivem o desenvolvimento econômico, como são os exemplos de incubadoras de empresas, linhas de financiamento e excesso de burocracia, entre outros.
Walter Bottura Júnior – Custo do Grande ABC tanto de infra-estrutura como tributário, excesso de protecionismo nas cláusulas sociais dos acordos coletivos e dependência do setor automotivo para o giro da economia.
Shotoku Yamamoto – Trânsito caótico que dificulta a locomoção dos trabalhadores e o transporte de matérias-primas e produtos acabados, o alto custo da água industrial para empresas do Pólo Petroquímico e os problemas ambientais.
Willian Pesinato – Entendo que a questão já foi respondida anteriormente.
Já dá para traçar paralelo entre Moreira Ferreira, que recentemente deixou a presidência do Sistema Fiesp/Ciesp, e Horácio Lafer Piva? O que os diferencia?
César Garbus – Diferenças entre pessoas sempre existem, mesmo porque Moreira Ferreira pertence a uma geração e Horácio Piva a outra, assim como as mudanças no mundo globalizado e principalmente no nosso País estão ocorrendo muito rapidamente. Moreira Ferreira teve atuação muito importante no comando do Sistema, além de ter preparado o caminho da transição. Hoje o Horácio é a esperança de algo novo, mais arrojado. Vai direcionar a força de sua representatividade para questões estratégicas.
Shotoku Yamamoto – São dois estilos diferentes. Não se trata de diferença entre Piva e Moreira Ferreira. O Moreira Ferreira fez trabalho de fortalecimento do Interior através do movimento que ele chamou de a Paulista para o Interior. O que o Piva está fazendo é uma reestruturação no organograma funcional das entidades, visando maior fortalecimento das indústrias paulistas.
Willian Pesinato – Se observarmos apenas as diferenças de idade e de características pessoais de cada um, não precisamos explicar mais nada.
Walter Bottura Júnior – Ainda é prematuro traçar um paralelo, mas podemos observar que o novo presidente implantou um modelo de gestão descentralizado, ficando a seu encargo a gestão política, estratégica e institucional. Lembramos que sem a gestão anterior do Moreira Ferreira nada disso seria possível.
O senhor Delfim Netto disse recentemente que faltam espaços para a indústria no Grande ABC. Escrevemos que o que mais nos sobram são galpões industriais. Falta mesmo é política voltada especialmente para pequenas e médias empresas. Quem tem razão?
Willian Pesinato – Se o senhor Delfim Netto referiu-se realmente a espaço físico, basta darmos um passeio por nossas ruas e contarmos as placas de vende-se ou aluga-se na frente dos galpões.
Walter Bottura Júnior – Acreditamos que o que falta, e nossa entidade, Fiesp/Ciesp, está lutando, é uma política industrial, a qual, após implantada, vai tornar sem sentido a discussão de quem tem razão: se falta espaço ou indústria.
César Garbus – Acreditamos que faltam espaços competitivos, pois o custo de um imóvel no Grande ABC é muito maior do que no Interior do Estado ou em outras regiões do País. Agora, sem dúvida, falta uma política voltada especialmente às pequenas e médias empresas. Daí surge uma proposta do Ciesp: o lançamento na Câmara Regional de um Grupo de Trabalho para desenvolvimento de política de incentivo às pequenas e médias empresas. Com certeza, o Ciesp terá o maior prazer de coordenar esse trabalho.
Shotoku Yamamoto – A revista LivreMercado está correta. As empresas de tecnologia intensiva, contrariamente às de artesanato, não precisam de grande espaço físico. O que precisamos é de mão-de-obra qualificada e centros tecnológicos avançados, o que o Grande ABC tem de melhor.
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10/05/2024 Todas as respostas de Carlos Ferreira