Será que o Fórum da Cidadania alcançará novos degraus de consolidação institucional com o sindicalista Carlos Augusto César Cafu? Só quem duvida da capacidade mobilizadora do sindicalismo na região pode desqualificar as propostas reveladas pelo novo comandante da maior organização não-corporativa já instalada no Grande ABC. Carlos Augusto César não é a melhor maneira de identificar esse dirigente geralmente de barba por fazer, camisa mal-ajambrada que foge dos grilhões do cinto, rosto quase sempre suado de quem corre o dia inteiro para acompanhar a movimentação dos trabalhadores químicos. Carlos Augusto César é um nome tão pomposo para a simplicidade de quem assim foi registrado que a sabedoria sindical, semelhante ao que ocorre nos campos de futebol, fábrica de apelidos sob medida, não poderia lhe dar outra identificação — Cafu, simplesmente Cafu.
Pois é esse Cafu flamenguista e santista, amante da música e do cinema, líder sindical que confessa perder a paciência quando as negociações não têm o encaminhamento mais adequado, é esse Cafu que rompe a tradição do terno e gravata da coordenação-geral do Fórum da Cidadania. O jeito simples de falar e de vestir dribla quem pensa que Cafu é um maria-vai-com-as-outras. Assembleísta experiente, desses que não perdem um movimento facial, uma respiração mais profunda, uma dramatização mais aguda de sindicalistas consagrados, Cafu é muito mais astuto do que se possa imaginar. Ele só mete sua colher na hora certa, depois de esgotados todos os argumentos dos interlocutores. Aí fala com a voz mansa de quem não quer nada, de quem parece concordar mas, sutilmente, redireciona os debates. Sobra-lhe habilidade.
Nesta entrevista, Cafu fala do Fórum da Cidadania com cortante franqueza e independência. Eleito em chapa única com apoio de seu antecessor, o arquiteto Sílvio Tadeu Pina, Cafu deixa claro que não ofereceu à representatividade de quem saiu o sacrifício de avaliações próprias. Fosse outro a declarar o que declara nesta entrevista, provavelmente trincheiras de revanchismos se ergueriam. Dito o que vem em seguida por Cafu, o mínimo que se tem a fazer é acompanhá-lo com muita atenção.
Ao que parece, a se considerar a segurança com que Cafu fez cada declaração, sabidamente gravada, o Fórum da Cidadania do Grande ABC sob sua liderança será muito diferente do que encontrou. Será mais democrático, garante. Será mais representativo, assegura. Será também mais independente — deixa evidenciado nas entrelinhas de quem não se prenderá à quantidade de entidades associadas, muitas das quais reconhecidamente fantasmas, mas à qualidade. O Fórum, antecipa, irá até a comunidade. Não à frustrada tentativa de inversão dessa equação.
O workshop realizado para buscar novos caminhos do Fórum da Cidadania teve como ponto negativo a presença de poucas entidades. Na segunda etapa compareceram apenas 14 representações. A baixa participação não foi novidade, porque se tornou comum nas plenárias do Fórum. Pelo menos do ponto de vista qualitativo o encontro atingiu os resultados desejados?
Carlos Augusto César Cafu — Sem dúvida, tivemos grande representatividade em qualidade, com a presença de representantes de grandes entidades da região. O encontro serviu para tomar decisões que vão alavancar o novo eixo do Fórum.
Quais os pontos mais importantes em sua avaliação?
Cafu – Primeiro, a realização de mutirão para saber as razões do afastamento das entidades do Fórum e se as que estão filiadas existem de fato. É muito fácil falar que o Fórum tem 110 entidades filiadas. E na prática, o que significa isso? Será que essas entidades só existem no papel? Será que realizam reuniões, que têm associados? Será que têm representatividade?
Quer dizer que o próprio Fórum está fazendo mea culpa por ter permitido que muitas entidades entrassem em seus quadros sem mecanismos de seleção que salvaguardassem sua própria representatividade?
Cafu — Há uma avaliação que não pode prescindir de elementos históricos. Quando o Fórum surgiu, há quase cinco anos, contou com apoio de entidades representativas da região, casos das associações comerciais e industriais, dos Ciesps, das OABs, dos sindicatos e várias organizações civis organizadas. O segundo momento do Fórum foi de inchaço, quando não se fez triagem dos novos associados. É isso que vamos fazer agora. A primeira medida que vamos tomar é saber quantas das 110 entidades existem mesmo. As que não existirem, não têm por que estar filiadas ao Fórum. Não podemos ter o que popularmente chamamos de INGs, isto é, Indivíduos Não-Governamentais. Temos que ter, sim, o que chamamos de ONGs, ou Organizações Não-Governamentais. O Fórum da Cidadania vai se fortalecer, entre outras razões, pelo fortalecimento das entidades que lhe dão sustentação.
Aliás, em realidade, esse foi o mote, o núcleo de concepção da entidade…
Cafu — Sem dúvida. Infelizmente, houve desvio de rota num determinado momento.
Qual outro ponto positivo do workshop em sua avaliação?
Cafu — Sem dúvida a reconstituição do Conselho Consultivo e a constituição da Comissão de Ética, adiada desde a fundação do Fórum.
O Conselho Consultivo, pelo que ficou deliberado, terá mesmo composição paritária, da qual participarão como membros natos todos os coordenadores-gerais do Fórum, no caso Wilson Ambrósio da Silva, Fausto Cestari, Marcos Antonio Gonçalves e Sílvio Tadeu Pina, e membros escolhidos pela plenária?
Cafu – A tendência é essa mesma. Isto é: as entidades trazerem pessoas de importância da região para compor essa instância.
Mas que participem efetivamente, não como chamariz de marketing, como funcionou na primeira etapa, com grande parte dos integrantes sem comparecer sequer a um encontro?
Cafu — Sem dúvida, para participar efetivamente. Aliás, a participação no Conselho Consultivo de ex-coordenadores dá novo significado ao organismo. Eles têm história na entidade. O importante mesmo é que todos contribuam para o Fórum da Cidadania. Não os queremos como espécie de rainha da Inglaterra.
E a Comissão de Ética?
Cafu — Essa instância de poder está no estatuto desde que o Fórum foi criado, mas nunca foi aplicada. Considero a Comissão de Ética fundamental, porque muitos dos problemas que ocorreram na última gestão, da qual fiz parte, não teriam acontecido. A atribuição de aplicar penalidades a quem infringir aspectos éticos da organização não pode ser repassada ao Colégio Executivo, que não é a instância estatutariamente reservada para isso.
Quais foram os motivos que levaram o Fórum da Cidadania a dar vez à Comissão de Ética?
Cafu — Tivemos muitos incidentes nesse último mandato. Tivemos pessoas que, embora coordenassem grupos de trabalho, trocaram sistematicamente de entidade a qual representavam. É lógico que a partir do momento em que esse representante do Fórum troca de entidade, deixa de ter representatividade para participar da organização. Tivemos também casos de coordenadores de grupos que levaram para fora do Fórum aspectos de debates internos que não foram aprovados nem no próprio grupo, quanto mais nas plenárias, instância maior da entidade. Aliás, esse tipo de equívoco foi cometido não só pelos coordenadores de grupos, mas pelos próprios membros do Colégio Executivo. Entendo que se o Colégio Executivo sair falando individualmente, sem que haja discussão e aprovação da entidade, o membro infrator terá de ser penalizado. Seja quem for, inclusive eu, porque a partir do momento em que tiver tomando deliberações que não constam das decisões plenárias do Fórum, evidentemente terei de ser submetido à Comissão de Ética.
Se essa Comissão de Ética tivesse funcionado na gestão anterior, o coordenador-geral Sílvio Tadeu Pina teria passado por avaliação?
Cafu — Olha, acho que não só o Pina, mas todo o Colégio Executivo teria passado. Aliás, pensando bem, não só o Colégio Executivo teria passado pela Comissão de Ética, mas grande número de participantes do Fórum. É exatamente por isso que a Comissão de Ética está agora em atividade.
Não se corre o risco de a Comissão de Ética tornar-se espécie de caça às bruxas, atingindo diretamente representantes mais recalcitrantes com relação aos rumos do Fórum?
Cafu — Minha avaliação é que a Comissão de Ética vai ter atuação saudável. Afinal, temos definições em plenárias que depois são distorcidas, além de posicionamentos individuais que não passam por qualquer discussão interna. O trabalho da Comissão de Ética vai ser apurar esses fatos e levá-los até a plenária. As atribuições dessa instância não têm vinculação direta com eventual expulsão. Quem decidirá sobre isso será a plenária. Considero importante que a Comissão de Ética faça relatório consistente de cada caso e o apresente aos representantes das entidades para avaliação.
É de se esperar que teremos linguagem comum no Fórum da Cidadania, não uma salada mista de teorizações e práticas?
Cafu — Agora todos terão de respeitar todas as instâncias deliberativas do Fórum: dentro das plenárias, do Colégio Executivo, até no Conselho Consultivo.
Isto quer dizer que a imagem do Fórum tende a ser única para o público externo?
Cafu — Não teremos mais casos de discutir algo na plenária e, em seguida, cada um sai por aí expondo sua visão como se fosse a do Fórum, desrespeitando a deliberação de plenária.
E o Conselho Fiscal do Fórum, o que significa?
Cafu — Acho fundamental. Neste último mandato, desde agosto de 1998, implementamos na tesouraria a prestação mensal de contas. O Conselho Fiscal vai dar condições para que o Fórum não só se organize mais internamente, como se prepare para receber recursos externos, nacionais e internacionais. Um dos grandes complicadores do Fórum é que os grupos temáticos tinham ampla liberdade de administrar recursos financeiros. A liberdade não teve a contrapartida de ética e idoneidade de algumas pessoas, o que acabou manchando o nome da instituição. É evidente que houve consequências dessa falta de organização interna, refletida nas dificuldades adicionais de conseguir patrocínios. Instituímos na última gestão, depois de uma série de problemas, norma em que os recursos financeiros deveriam entrar e sair pela tesouraria. Agora completamos os cuidados com o Conselho Fiscal. Dessa forma, vamos disciplinar todos os recursos que entrarem no cofre do Fórum, assim como os recursos que saírem, inclusive de outras instâncias além do Colégio Executivo.
A criação do secretário executivo, espécie de coordenador dos grupos temáticos, seria o surgimento de um xerifão para colocar ordem nessa instância de poder?
Cafu — Sem dúvida, sua presença vai aliviar a carga de trabalho do Colégio Executivo e do coordenador-geral. É impossível ao coordenador-geral ficar fiscalizando internamente as atividades do Fórum e ainda ter de atuar externamente. O secretário executivo vai ser o ouvidor dos grupos temáticos, diria assim. Vai fazer acompanhamento permanente das atividades e levar todas as informações aos membros do Colégio Executivo que, por sua vez, tratará de encaminhar as propostas à plenária. Além disso, teremos seminários trimestrais com todos os representantes dos grupos.
Então vai ficar mais fácil evitar que o Fórum saia dos trilhos?
Cafu — É claro. Não vamos precisar esperar um ano para tomar decisões.
Que importância tem nessa reformulação por que passa o Fórum a análise crítica da Imprensa?
Cafu — A Imprensa tem papel fundamental, mas acho também que toda a sociedade deve ter esse papel. Por isso o Fórum deve levar suas propostas à sociedade, para que possa fazer também suas críticas. Será que estamos fazendo exatamente o que a sociedade quer enquanto cidadania? Temos de fazer esta pergunta.
Você acha que a Imprensa, nós todos da Imprensa, demos mole ao Fórum e só mais recentemente passamos a exercer nossa obrigação crítica?
Cafu — O Fórum necessita e muito da Imprensa. E nos dois aspectos. Desde posições positivas, que se mostre isso para a sociedade, como nas críticas, quando o Fórum estiver totalmente fora do foco. Esse papel é indispensável à Imprensa. Se amanhã tiver de cobrar do Fórum alguma coisa que esteja fora das deliberações da entidade, deve fazê-lo. Temos de ter capacidade de aceitar a crítica, ter autocrítica e até mesmo debatê-la.
Você não acha que o Fórum, pelas circunstâncias com que foi concebido, quando a região vivia momentos de acefalia institucional, se sentiu no direito de se acomodar, de achar que já tinha feito a sua parte ao estimular o surgimento de outros atores, no caso a recuperação do Consórcio Intermunicipal de Prefeitos e o surgimento da Câmara Regional e da Agência de Desenvolvimento Regional?
Cafu — Talvez não estivéssemos preparados para chegar até onde chegamos. Como surgiu num momento de inércia regional, o Fórum poderia até deixar de existir hoje que já teria cumprido o seu papel. Nós pautamos a região, e a região cumpriu. Mas esquecemos de fazer a segunda parte, que consiste em estabelecer novas metas e cobrar as anteriores. Acho que a criação do Grupo de Gestão Pública é muito importante nesse processo de recuperação do Fórum. Teremos condições de reunir indicadores de qualidade de vida que vão pautar o Fórum e a região por longos anos. Desde saúde até desenvolvimento sustentável, todos os segmentos estarão nos indicadores de qualidade de vida.
Você é uma nova cara do Fórum, a cara de um sindicalista. O Fórum até então foi dirigido por executivos e empresários do setor privado ou assistencial. Como você analisa o processo eleitoral que o alçou à coordenação-geral, sabendo que encontrava resistências de representações filiadas? Como encara a missão de mostrar, primeiro, que sindicalista não é esse bicho-papão que muitos falam e, segundo, diante do desafio de reorganizar o Fórum, dar organicidade a uma instituição que foi ao fundo do poço na última gestão?
Cafu – Pelo fato de ser sindicalista, não foi nada fácil desde a montagem da chapa para concorrer ao Fórum. Alguns segmentos ainda têm grande preocupação com o movimento sindical, e isso se reproduz no Fórum, evidentemente. O movimento sindical mostrou seu papel na Câmara Regional e no Fórum repetiremos a ação. Vamos mostrar para que viemos. Não vamos fazer do Fórum novo braço sindical. O sindicalismo está no Fórum desde a fundação e soube esperar a vez. Tivemos outras oportunidades de estar na coordenação-geral, através de outros companheiros. Talvez tenhamos até sido preteridos. Não só preteridos mas tímidos em cobrar participação. Acho que estamos chegando com atraso na coordenação-geral do Fórum. Mas um atraso que não nos atrapalhará em levar o Fórum em direção daquilo que entendemos como cidadania.
A experiência que você tem, que o movimento sindical tem, em termos de assembléia, todo esse knowhow assembleístico, vai ajudá-lo a resgatar a organicidade das plenárias?
Cafu — Essa é uma das condições que temos para melhorar as plenárias nas questões de direitos, de democracia, o direito de todos falarem, de todos exporem pontos de vista. A experiência que acumulamos no movimento sindical em defesa do trabalhador vai nos dar condições de começar a mostrar a outras entidades nossa visão de cidadania. Vamos também em busca do que chamo de movimento social, ou seja, atrelar o Fórum à sociedade. Massificar o Fórum. Em vez de trazer entidades ao Fórum, como se pretendeu de forma pouco seletiva, vamos até os movimentos sociais. Em vez de inchar o Fórum com entidades, vamos inchar as entidades com a visão do Fórum. Precisamos mostrar cidadania, por exemplo, para São Caetano, que tem participação quase nula na organização. O Fórum precisa ir a Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra, primos-pobres da região. Temos de sair de alguns eixos já conhecidos, especialmente de Santo André e São Bernardo.
Por que então, nesse processo de massificação do Fórum, ainda se mantém o empresariado de fora das plenárias? Será que as empresas não poderiam ajudar na massificação do Fórum, arregimentando trabalhadores para as causas regionais? Por que o preconceito do Fórum ao empresariado?
Cafu — Acho que demos o primeiro passo, na forma de trazer as empresas através de suas entidades representativas. Agora estamos dando o segundo passo: queremos trazer as entidades representativas de determinados setores, como as empresas do Pólo Petroquímico de Capuava, a Anfavea como representante das automobilísticas, o Sindipeças como representante dos fornecedores de autopeças, a Abiplast ou o Sindiplast como representante do setor plástico. Vamos agregar várias novas representações empresariais.
Você acha que vai chegar o momento em que o Fórum deixará de ter preconceitos contra as empresas e permitirá a participação da classe de forma individual?
Cafu — Acho que o Fórum tem de deixar de ter preconceitos em todos os sentidos. Isso se aplica a todos os segmentos, inclusive ao setor universitário. Temos de abrir as portas para todas as entidades de expressão nacional e internacional.
Como você ajudará a resolver um dos maiores problemas do Fórum, que é o megatemário? O Fórum, como se sabe, quis abraçar o mundo sem ter recursos financeiros, técnicos e humanos, arregimentando um monte de temas, deixando de ser o grande pauteiro regional.
Cafu — A criação do cargo de secretário-executivo para acompanhar os grupos temáticos é o primeiro passo. Vamos ter um mapa mais preciso da forma como esses grupos estão contribuindo para o futuro do Fórum. Também deixaremos de querer resolver tudo sem que as decisões passem pela plenária. Com isso, teremos condições de acompanhar mais de perto a Câmara Regional. Aliás, em agosto passado, o Fórum teve a oportunidade de, como membro da Câmara Regional, pautar vários trabalhos. Não só pautou como questionou e provocou mudanças. Não temos que apenas estar na Câmara. Temos de questioná-la e pautá-la também. Temos de ter representação no Conselho Deliberativo e na Coordenação Executiva da Câmara Regional. Não temos de ter espaços nos grupos de trabalho. Já temos os nossos, cujos subsídios devem ser levados à Câmara Regional, nas instâncias mencionadas.
O problema é que o Fórum andou se envolvendo também nos grupos de trabalho da Câmara…
Cafu — Mas sem discutir em plenária. Na verdade, não foi o Fórum que se envolveu. Foram as individualidades, em nome do Fórum. Foram erros deliberados e de falta de experiência. Recebemos muitas reclamações no Colégio Executivo sobre pessoas que até usavam o nome do Fórum para solicitar emprego nas Prefeituras e no governo do Estado.
Quais decisões devem ser tomadas na primeira plenária do Fórum sob sua coordenação?
Cafu — Vamos discutir os novos coordenadores de grupos temáticos, eleger a Comissão de Ética, o Conselho Fiscal e o secretário-executivo.
Considerando-se que os vícios acabaram se sobrepondo e que a simples formalização da Comissão de Ética estabelece novo divisor nas relações, não se corre o risco de surgirem choques interpretativos nas primeiras decisões que visam controlar a falta de disciplina no relacionamento de membros do Fórum?
Cafu — A Comissão de Ética tem de avaliar e, se for o caso, punir quem infringir as normas. Temos de esquecer vícios, protecionismos.
As decisões da Comissão de Ética serão submetidas à plenária?
Cafu — O regimento interno determina que a instância deve avaliar e apresentar proposta à plenária. Ou seja: a plenária é soberana. Acredito que a partir do momento em que houver avaliação da Comissão de Ética de um caso grave e a situação for apresentada à proposta, o encaminhamento será praticamente definitivo quanto à punição. A constituição da Comissão de Ética reunirá dois membros do Conselho Consultivo, dois do Colégio Executivo e dois que serão indicados pela plenária. Como se vê, é altamente representativo. Uma posição da Comissão de Ética é realmente decisória.
Há reclamações de representantes de entidades que até deixaram de comparecer às plenárias do Fórum sobre o domínio de membros do Colégio Executivo e dos titulares dos grupos temáticos nas discussões que se colocavam ao conjunto dos associados. Esse monopólio nos debates minou as bases de representação e explica o esvaziamento do Fórum. Faltou mesmo democracia nas plenárias?
Cafu — O Fórum teve a perda fundamental de grandes expressões de entidades. Representantes de entidades que tinham histórico de participação menos intenso acabaram desestimulados por timidez ou porque não contavam com instrumentos que os estimulassem a introduzir-se nos debates. Contribuiu para isso, também, a insistência em se debater assuntos que não tinham a relevância esperada. Não podemos ficar realizando plenárias para discutir picuinhas, questões pessoais. Tudo isso vai agora para a Comissão de Ética. Nossas plenárias têm de dar vez à cidadania. Vamos democratizar o debate.
O Sindicato dos Metalúrgicos de Santo André há muito tempo quer participar do Fórum, mas sua situação jurídica, em decorrência de ruptura com o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, está indefinida. O que você, como membro da CUT (Central Única dos Trabalhadores), instância à qual está subordinado o Sindicato do ABC, pretende fazer para resolver o caso?
Cafu — Vamos cumprir o estatuto. Não vou defender A ou B. A plenária é que decide. O estatuto é claro quando diz que entidades que tenham problemas judiciais estão impedidas de participar do Fórum. Os representantes do Sindicato de Santo André já estiveram no Fórum e o Colégio Executivo encaminhou cópias da solicitação do sindicato a todas as entidades. Se houver alguma comprovação de pendência judicial, logicamente a resposta será negativa.
O Sindicato dos Metalúrgicos do ABC está filiado ao Fórum?
Cafu — Sim, é filiado ao Fórum. Aliás, é um dos fundadores.
Isto quer dizer que provavelmente venha a obstar a tentativa do sindicato de Santo André?
Cafu — Pode fazer isso. Pode arguir ilegalidade. E aí vamos cumprir o estatuto.
Você vai trazer mais sindicatos ao Fórum, depois da perda de muitas representações do segmento? Diríamos que você é um dos últimos dos moicanos do movimento sindical no Fórum da Cidadania.
Cafu — Vamos ter de aumentar a representação sindical, bem como dos Ciesps, das OABs, das associações comerciais, dos movimentos sociais. As grandes entidades fundadoras do Fórum e as que chamaremos a participar não podem ficar de fora. Além das sociedades amigos de bairros. Vamos fazer um mutirão nesse sentido. Aliás, vamos avaliar detidamente a participação das entidades. Quem não tiver relevância nos trabalhos de plenária, não terá por que continuar no Fórum.
Quer dizer que o Fórum chegou à conclusão de que não adianta ter quantidade?
Cafu — Precisamos ter qualidade. Isso é fundamental.
O grande diferencial que se estabelece entre você e o Sílvio Pina, que acabou de deixar a coordenação-geral do Fórum, e que poderá representar o processo de recuperação da entidade, é que você tem experiência de assembléia. Tem habilidade suficiente para comandar plenárias. O Pina teria se desgastado justamente porque não teve essa qualidade?
Cafu — Essa é uma vantagem que temos não só sobre o Pina, mas em relação a outros coordenadores também. A vantagem de aceitar a democracia plena de uma plenária. Pura e simplesmente coordenar os encaminhamentos finais. Ouvir todas as partes e daí filtrar o melhor caminho para o consenso e as diretrizes do Fórum. As reclamações quanto a essa falta de democracia não se restringem ao Pina. Alcançam outros coordenadores também. A queixa é que a participação dos coordenadores que passaram pelo Fórum se igualava à participação de todos os representantes. Igual no sentido de que falava tanto quanto cada um dos debatedores, o que acabava por distorcer o volume de participação. Um erro que se agravava porque o peso do coordenador sempre é maior. Outra vantagem é o respaldo do Sindicato dos Químicos. Hoje sou apenas diretor do sindicato, não mais coordenador regional dos químicos do Grande ABC. Além disso, conto com apoio de sindicatos co-irmãos, que vão me auxiliar na tarefa de coordenar o Fórum.
Você não estaria generalizando avaliação sobre os ex-coordenadores do Fórum, quando se sabe que tiveram atuações diferentes?
Cafu — Não é exatamente isso. Digo que todos enfrentaram problemas. O Wilson Ambrósio, primeiro coordenador, homem inteligente e político, teve maiores facilidades porque pegou o Fórum na fundação, quando grandes entidades e lideranças participavam das plenárias. Ele soube extrair o consenso dessa situação. O Fausto Cestari trilhou o mesmo caminho, até que bem, com alguns problemas pouco significativos. Os maiores problemas do Fórum começaram na gestão do Marcos Gonçalves, porque se iniciou a quantidade de entidades representadas, sem ver a qualidade. O quórum elevado complicou as relações. Talvez o Fórum não estivesse preparado para o crescimento do quadro associativo.
Até que ponto as candidaturas de Marcos Gonçalves e Fausto Cestari, nas eleições proporcionais do ano passado, mexeram com a estabilidade interna do Fórum?
Cafu — Ambos foram os mais éticos possíveis para não envolver o Fórum em suas campanhas, mas acho que o Fórum precisa promover essa discussão política. Não adianta tapar o sol com a peneira de que não existem relações partidárias, porque isso é uma inverdade.
E por que não se foi a fundo no workshop?
Cafu — Deu-se o pontapé inicial. Vai caber a essa gestão, e às próximas, continuar essa discussão. Particularmente, acho que será algo inevitável. Teremos de discutir quais os políticos que queremos no Fórum. Essa que tem de ser a discussão. Achar que o Fórum não reunirá candidatos, ex-candidatos, futuros candidatos, é um sonho.
A conceituação histórica do Fórum sobre consenso foi alterada no workshop. Agora optou-se por consenso restrito, com 90%, quando, antes, consenso e unanimidade eram sinônimos. O que significa isso?
Cafu — Produzir consenso com mais de 100 entidades no sentido de unanimidade é muito difícil. Com 90% os debates irão para o Conselho Consultivo, que, por sua vez, terá de decidir por unanimidade, caso contrário a discussão volta à plenária. Esta foi a fórmula que encontramos para destravar o Fórum, porque bastava uma única entidade ou uma ING, como chamamos quem representa a si próprio, que, por qualquer razão, se colocasse contrária às decisões, e tudo ia por água abaixo.
Você certamente tem consciência da importância histórica para o sindicalismo do Grande ABC a eleição para esse cargo, que está fora do espectro corporativo ao qual se costumam relacionar os trabalhadores e que, por isso mesmo, o instala numa vitrine de visibilidade especial? Você pode contribuir para melhorar a imagem do sindicalismo no Grande ABC?
Cafu — O movimento sindical da região tem história ímpar no País a partir de Lula, cuja importância dispensa comentários. Posso citar tantos nomes de vários sindicatos da região como elementos de grande relevância regional e nacional. Nomes não faltam, inclusive entre os que estão surgindo no natural processo de renovação. Faço parte desse processo. Sei que a responsabilidade sindical no Fórum da Cidadania é maior do que a vitrine. Tenho consciência de que se o mandato for ótimo, não será nada mais que obrigação. Se não for um bom mandato, o movimento sindical vai pagar muito por isso.
Você não acha que, por ser sindicalista, vão lhe cobrar muito mais do que os coordenadores anteriores?
Cafu — Nós temos responsabilidade maior. Seremos mais cobrados. Os erros vão repercutir em todo o movimento sindical. O acerto será considerado normal. Sei que estou numa corda bamba. Bem bamba.
Estou no Fórum da Cidadania há dois anos, depois de chegar como suplente dos químicos. No ano passado assumi como membro do Colégio Executivo, escolhido pelos companheiros sindicalistas. Nunca pensei em ser coordenador-geral.
Você é tido como boa praça, mas não perde a paciência de vez em quando?
Cafu — Dependendo dos momentos, perco muito fácil, mas geralmente me controlo muito, principalmente nas assembléias. Já nos espaços mais reservados sou capaz de explodir. Nas relações com as empresas, discutindo salários, benefícios e empregos, as coisas nem sempre são calmas. Aliás, acho que é muito mais difícil negociar com empresas e encaminhar uma plenária com os trabalhadores do que dirigir o Fórum da Cidadania.
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10/05/2024 Todas as respostas de Carlos Ferreira