Entrevista Especial

Muneratti diz que carga tributária
sacrifica mais o pequeno varejo

DANIEL LIMA - 05/03/2010

O advogado Sidnei Muneratti, presidente da Acisa (Associação Comercial e Industrial de Santo André) não considera a disparidade de forças entre pequenos e grandes varejistas um problema que justificaria o alto índice de desaparecimento de empresas. Para o dirigente que durante muitos anos atuou na multinacional Pirelli, o nó a ser desatado na economia brasileira está na excessiva carga tributária. Para Sidnei Muneratti, “cabe ao pequeno varejo papel importante, ou seja, especializar-se identificando necessidades locais e fidelizando clientes a partir de um modelo de atendimento personalizado”.


Estatísticas de empresas especializadas apontam que, cada vez mais, em todos os setores do comércio varejista, acentua-se a concentração econômica, com um grupo de grandes organizações avançando cada vez mais no controle da massa de consumo. Como o senhor observa essa situação?

Sidnei Muneratti – O avanço das grandes organizações varejistas ocupando enormes espaços de mercado, sendo que algumas destas grandes empresas, inclusive, estão presentes em boa parte do planeta, é um fato econômico típico da globalização e dos moderníssimos aparatos tecnológicos que permitem refinado controle de gestão. Porém, não obstante esse aspecto, cabe ao pequeno varejo papel importante, ou seja, especializar-se identificando necessidades locais e fidelizando clientes a partir de um modelo de atendimento personalizado, haja vista que o atendimento das grandes corporações é impessoal e as ofertas pautadas em imensos lotes homogêneos. Assim, podem perfeitamente conviver, no mesmo espaço, os grandes e pequenos negócios. Aliás, os shoppings centers são o exemplo vivo dessa afirmação.


Especialistas em varejo afirmam que a carnificina entre os pequenos e médios ainda não terminou e que agora o que está chegando é a exterminação gradual por conta do regime de substituição tributária, do governo estadual. Já há sintomas desse aperto fiscal entre os comerciantes de Santo André?

Sidnei Muneratti – Se o ponto de vista que apontamos acima, (também exposto por importantes especialistas do varejo), for verdadeiro, podemos supor que o promotor da carnificina, não somente no varejo, mas em todo o meio empresarial, não é a concorrência, já que existe espaço de mercado com criatividade e planejamento para todos os níveis de investimento, mas sim, o enorme volume da carga tributária brasileira. Culpar a substituição tributária, a meu ver, também é esconder a verdadeira realidade, pois com a substituição, muda-se tão somente a forma de pagar o mesmo imposto. Assim, com foco na questão, somos forçados a declarar que não será sonegando impostos que o industrial ou comerciante vai sobreviver, mas por meio de positiva e decisiva participação em entidades, como a Acisa, que poderão conduzir o governo a diminuir a sanha tributária. Friso que não estou simplesmente formalizando um discurso demagógico. As reduções de IPI, por exemplo, são recentes e demonstraram-se eficazes e foram frutos da pressão de órgãos empresariais, inclusive a Acisa. Esta postura não deve ser adotada somente em tempos de crise; merece ser exercida a todo o tempo.


Entre todos os fatores que pesam desfavoravelmente à sobrevivência do pequeno negócio do varejo, qual o senhor considera o mais nocivo? Seria a carga tributária? O despreparo técnico-administrativo? A concorrência dos grandes conglomerados?

Sidnei Muneratti – Boa parte da pergunta foi respondida, mas vale ressaltar que a concorrência, desenvolvida no âmbito do capital privado, é sinônimo de mercado livre, fundamental para a indústria e o comércio. Tributos adequados, de sua parte, são necessários para o melhoramento da sociedade. Assim, torna-se missão de todo o empresário a prática excelente de sua responsabilidade específica, ou seja, planejar o investimento, pesquisar o mercado, dotar-se de qualidade e bons recursos. Portanto, neste cenário, é a capacitação do empresário que o diferenciará, permitindo-lhe o sucesso. A Acisa, por meio do Projeto Empreender, instrumento que visa o melhoramento contínuo do micro e pequeno empresário, dotando o empreendedor de técnicas modernas de gestão, é campo visível dessa realidade.


Experiências internacionais vitoriosas com a reserva de parte dos recursos do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) para dinamizar atividades econômicas de áreas geográficas sobre as quais foram recolhidos o imposto jamais foram aplicadas no Brasil. Não estaria na hora de potencializar essa modalidade de investimentos de uma fonte tributária sob o controle das prefeituras, inclusive com a participação de representações da sociedade, associações comerciais, por exemplo?


Sidnei Muneratti – A Acisa apóia todas as boas iniciativas no sentido de se criar mecanismos de dinamização das atividades econômicas e a fórmula apresentada parece ser uma delas. Sem dúvida, é hora de empunhar essa bandeira.


Verificou-se no Grande ABC um complicador terrível durante o processo de desindustrialização dos anos 1990: trata-se do aumento descomunal de unidades de comércio e serviços. Uma combinação quase letal. Além disso, o constrangimento da massa salarial e de renda, que provocou a queda do PIB per capita da região, foi sobreposto por concorrência ainda mais numerosa, de pequenos negócios lançados por ex-industriários, e também com a chegada de grandes conglomerados. O que fazer?

Sidnei Muneratti – Realmente sofremos um forte processo de desindustrialização. Entretanto, clamar e insistir para o retorno das empresas que migraram é uma atitude desesperada e sem sentido. Devemos, isto sim, nos preparar para uma nova realidade econômica da região que permita a atração de empreendimentos de alta qualificação tecnológica e baixa contribuição de poluição ambiental, porém com forte necessidade de recursos humanos especializados. Aliás, já se oferece na região do ABC um excelente campus universitário. Assim, em vista da transformação de parte dos terrenos da Rhodia, uma indústria que reunia operários especializados, em Universidade Federal, que hoje passa a reunir especialistas em sofisticados conhecimentos, podemos imaginar que não estamos diante de um desastre, mas, possivelmente de um indicador auspicioso para a cidade.
Quanto à chegada dos grandes conglomerados, como os hipermercados e shoppings, tal se deu principalmente pela constatação do amplo mercado consumidor do Grande ABC. Ou seja, somos uma rica região para o comércio, o que se confirma pela implantação de novos shoppings e pela ampliação dos existentes. E em relação ao setor supermercadista, a Coop (cuja origem é Santo André) continua inaugurando novas unidades na região, o que sem dúvida é muito bom para o comércio local. E, finalmente, transformar operário em empreendedor, desde que capacitado, só pode ser saudável para a comunidade.


Como o senhor avalia a possibilidade de associações comerciais e unidades do Ciesp da região criarem uma instância à parte das respectivas corporações que representam, cujo eixo seja exclusivamente questões institucionais do Grande ABC que digam respeito a no mínimo mais de um Município? Não seria esta a fórmula mágica para manter a autonomia de cada entidade, dentro dos padrões históricos de atividades, e, paralelamente, abrir uma vereda de atuação coletiva com base num conjunto de temas?

Sidnei Muneratti – As associações comerciais da região já se reúnem periodicamente para discutir e juntar forças no senso de melhorar o ambiente regional do comércio e da indústria. O entrosamento com os Ciesps é perfeito, diria até mesmo histórico. Em todos os momentos em que é necessária a atuação conjunta, nos reunimos evidenciando a vontade do empresariado local. Aliás, o mais recente exemplo desta união foi o Diálogo do Grande ABC, que, sem dúvida, foi o estopim para as soluções que ajudaram o Brasil a enfrentar a crise de 2008/2009. Assim, a formalização de uma nova corporação, a meu ver, não é necessária para a atuação coletiva, pois, as entidades, que são centradas na região, não perdem foco nem identidade pertencendo a grandes redes de representação, como a Fiesp ou a Facesp; pelo contrário, na maioria das vezes é fator de sucesso.


Quem procura o Grande ABC para investimentos não consegue encontrar dados regionais confiáveis. No máximo há retalhos municipais nem sempre confiáveis. Falta ao Grande ABC um banco de dados que seja confiável tanto para possíveis investimentos como para consultas de estudantes, professores, imprensa. Esta saída não estaria exatamente vinculada à instância que estamos propondo?

Sidnei Muneratti – Esse realmente é um problema recorrente na região. E de muitos anos. Sem informações básicas sobre a região é evidente que diminui, sensivelmente, a capacidade de atração de novos investimentos. É absolutamente necessária a criação de um organismo que venha suprir essa falta e que atenda com suas informações a região do ABC. Propomos, e temos como compromisso desta gestão da Acisa, o desenvolvimento de um projeto que possa atingir esses objetivos. Inspiramo-nos no Instituto de Estudos Metropolitanos, atualmente quase desativado, mas ainda vivo no coração e mente do jornalista Daniel Lima. Tenderíamos, e o Daniel é parceiro fundamental para tanto, a juntar as nossas inteligências locais, fartas e presentes nas nossas academias, e patrocinar um empreendimento com tal objetivo, com a certeza do apoio dos nossos parceiros regionais.


Qual é o posicionamento do senhor a respeito da ausência de um Conselho Consultivo no Clube dos Prefeitos? Considera dispensável essa instância voluntária de poder ou até entende que em vez de posição apenas consultiva também poderia ser deliberativa? Ou seja: há espaço para a sociedade representada por instituições econômicas e sociais no Clube dos Prefeitos ou a centralidade de decisões exclusiva dos chefes de Executivo é mesmo a melhor alternativa?

Sidnei Muneratti – No estatuto atualizado do Consórcio Intermunicipal, no Título IV, Capítulo IV que engloba os artigos do 46 ao 53, está prevista a existência de um Conselho Consultivo como parte da estrutura administrativa. Cabe, portanto, à sociedade e seus agentes a cobrança da efetiva participação do Conselho nas deliberações e como apoio às decisões do Consórcio.


Defendemos há muito tempo o que chamamos de Planejamento Estratégico para o Grande ABC. O que parece essa proposta para o senhor que durante muitos anos atuou numa multinacional obrigatoriamente doutrinada a buscar resultados?

Sidnei Muneratti – Esse é um aspecto fundamental. Existem experiências mundo afora e mesmo no Brasil que demonstram que governar exige competências distintas em política e gestão. E é importante separar as duas coisas. A prática da gestão eficiente se faz com o planejamento de curto, médio e longo prazos suportados por uma definição estratégica dinâmica, compartilhada e apropriada por toda a sociedade. E, no Grande ABC, já houve uma iniciativa nesse sentido que, infelizmente, foi descontinuada muito antes que pudéssemos avaliar sua efetividade. Foi o Projeto Cidade Futuro de Santo André, que continha entre suas virtudes um processo de reavaliar periodicamente as condições de planejamento.


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