Administração Pública

Aidan Ravin continua jogando
como gosta à frente da Prefeitura

DANIEL LIMA - 18/03/2010

O prefeito Aidan Ravin tem uma fórmula de anestesiamento que deveria se patenteada como exemplo de gerenciamento de crises potenciais e de crises evidentes. Está certo que não há segredo na farmacologia aplicada para o prefeito de Santo André livrar-se de contratempos. Quem conhece tanto o ramo publicitário como a gestão pública sabe disso.

Quem tem um primeiro-ministro com a força de persuasão como o que oferece préstimos a Aidan Ravin fora do organograma oficial da Prefeitura pode ter certeza de que parte das complicações relativas à comunicação com a sociedade estará supostamente resolvida.

A resistência popular da imagem de uma administração não é peça de cristal que se quebra ao menor sacolejo de contratempos, mas também não ganha a forma e a consistência de blindagem às maiores bobagens. Um dia a casa cai.

Nos últimos dias pelo menos quatro casos chamaram a atenção do quanto a gestão de Aidan Ravin se desgarra dos limites da razoabilidade.

O estado de penúria da Vila de Paranapiacaba, a crise pós-eleição do ouvidor da Prefeitura, a Lei de Incentivos Seletivos e a desativação oficial do projeto Cidade Pirelli, transformada em suspeitíssima fonte de especulação imobiliária, são escorregões demais para uma mesma administração num período tão curto. Quando a banda de manteiga de um pão cai seguidamente contra o piso é melhor acreditar que não se trata apenas de sorte e de azar. Há uma lógica física a explicar a situação.

O mais chocante de tudo é constatar que o senso de valor da sociedade esfarela-se de tal forma que tudo isso, e muito mais, praticamente não altera em nada a roda da vida. A banda da manteiga da administração Aidan Ravin cai mas é sempre preservada. E a explicação, nesse caso, não é física. É outra coisa, muito, mas muito diferente.

Entramos num processo de completo alheamento social. O Grande ABC, mais que qualquer outro lugar importante deste País, afunda-se na completa ausência de cidadania.

Erra redondamente quem acredita que chegamos ao fundo do poço dos ideais de capital social. Cada vez mais o buraco se aprofunda, para deleite de todos aqueles que, no poder ou nas cercanias do poder, refestelam-se com o filé mignon e também com as carcaças do animal da cidadania abatido. Estamos em estado de putrefação social.

Honrasse Santo André o passado de mobilização mesmo que seletiva da sociedade, o segundo-ministro da administração Aidan Ravin, Nilson Bonome, não diria o que disse outro dia ao Diário do Grande ABC, abaixo do título “Bonome admite chance de extinção da Ouvidoria”. O também identificado secretário de Gabinete de Aidan Ravin reagiu de forma imperialista ao afirmar que, em contraponto às supostas irregularidades na eleição de Saul Gelman ao cargo de ouvidor municipal, a extinção do organismo apresentava-se como alternativa.

Um segundo-ministro que atira a areia da desconfiança de irregularidades num organismo atrelado à própria administração sem levar em conta que do outro lado do balcão, no caso os leitores de jornal, encontra-se um mínimo de senso crítico, é um segundo-ministro intelectualmente limítrofe.

Bonome e todo o Executivo de Santo André querem a própria Prefeitura controlando as demandas da população por soluções microssociais que marcam o perfil da ouvidoria. É claro que muitos vereadores fazem parte da panela. Eles querem elevar o grau de assistencialismo e de outros “ismos” sem intermediários voluntários e com muito maiores potencialidades de se cacifarem internamente no jogo do poder.

Os desdobramentos do caso ainda vão abrir novas vísceras da incapacidade de superação de um problema criado pela própria administração municipal. É claro que Aidan Ravin lança mão de seus principais braços num Legislativo dócil como a maioria dos Legislativos. Os vereadores José de Araújo e o Sargento Juliano, estreitíssimos nas relações com o primeiro-ministro, fazem o que os superiores indicarem e caem em silêncio se forem derrotados. Eles estão aí para isso.

O resumo da ópera da ouvidoria de Santo André é que o vencedor da disputa não está na zona de controle do Paço Municipal. Como aliás ainda não estaria a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de Santo André. Tanto que a entidade reagiu à intervenção do Paço em nota oficial e ao que parece vai coordenar reações mais enérgicas. O presidente Fábio Picarelli, pressionado também pelo caso da Cidade Pirelli, priorizou institucionalmente o caso ouvidoria.

Já a Vila de Paranapiacaba, que Celso Daniel deixou de herança em forma de imobiliário e o PT de alguma forma deu consistência ao processo de valorização do acervo e do potencial de turismo, está à deriva.

A gestão Aidan Ravin chegou ao cúmulo de retirar por tempo indeterminado a candidatura daquele espaço à chancela de patrimônio da humanidade e, paralelamente à insanidade, permitiu com a omissão típica de quem não está nem aí com o cheiro da brilhantina que fosse desativado o museu ferroviário depois que um transformador de energia elétrica queimou e não foi trocado. Outras baixas de atratividade de Paranapiacaba fizeram daquele espaço cidade fantasma.

O projeto de guerra fiscal que contemplaria uma legislação que beneficiaria novos investimentos em Santo André, tanto de empresas que resolvessem se instalar no território quanto de empresas já sediadas, desapareceu nos corredores do Legislativo. O emaranhado foi descoberto a tempo de evitar que Aidan Ravin passasse pelo vexame de fazer aprovar no Legislativo um tremendo presente de grego para as empresas locais. Mais que isso: alguém parece ter sussurrado ao prefeito que aquele calhamaço não alteraria praticamente nada a rota de investimentos em Santo André. Exceto diante da possibilidade de que haja imbricamento entre o projeto e a desativação da Cidade Pirelli.

De qualquer forma, a guerra fiscal ali contida seria um tiro no próprio pé. Aguardam-se para os próximos dias algumas novidades a respeito, mas não se descarta tentativa patética de mudança que de fato não mudaria nada e o projeto de lei só seria aprovado mediante a constatação de que há uma maioria de descerebrados em Santo André.

Para completar, o silêncio sobre as traquinagens da Cidade Pirelli é mais que condenatório à administração de Santo André, bem como aos petistas apeados do Executivo. Como esse é um caso sobre o qual já escrevi o suficiente para o entendimento dos leitores, resta dizer que o mínimo desejável é que o Ministério Público intervenha.

Fosse o prefeito Aidan Ravin de fato representante da sociedade que o elegeu, o mínimo que faria sem mandraquismos e com direito ao contraditório seria reunir representantes dessa mesma sociedade e prestar contas de tantas trapalhadas.

É claro que isso não passa de um sonho de verão que já se esgota, porque Aidan Ravin está tão convicto de que a sociedade de Santo André é amorfa, descuidada, desinteressada e facilmente manipulável que não tem dúvidas em seguir a cartilha dos marquetólogos que o levaram à vitória eleitoral e também os conselhos de uma cúpula executiva que tem compromissos apenas com suas próprias ambições.

Pobre Santo André que um dia imaginei que tivesse chegado ao extremo da loucura ao me conceder o título de “Cidadão Andreense”.



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