A suruba operacional do mercado imobiliário é mesmo incontrolável. Não é que a construtora envolvida no caso do carro pagador no edifício-sede da Secretaria de Obras e Serviços de Santo André é a mesma que atuou na construção do Residencial Ventura, no Bairro Jardim, também em Santo André?
O Ventura é um condomínio de classe média cujos apartamentos foram vendidos quando um laudo de investigação ambiental, durante o governo do petista João Avamileno, documentava fortes indícios de contaminação. Foi o Semasa, a autarquia da Prefeitura de Santo André, a instituição responsável pelo laudo. Entretanto, o que se fez depois foi tudo muito estranho, até que a obra se consumasse e recebesse o habite-se da Administração Aidan Ravin.
O fato de a Construtora São José estar tanto num quanto noutro empreendimento é coincidência ou consequência?
Haveria sincronia entre o assalto ao carro pagador da Construtora São José e a falta de empenho da Administração Aidan Ravin em acabar com a farra de obras em terrenos suspeitos de contaminação, consolidada no arquivamento de proposta moralizadora do vereador Gilberto Wachtler Primavera?
Quem conhece o mundo mercadista assegura que tudo não passa de extensão de um método organizacional que não leva a sério, para valer, qualquer coisa que lembre a responsabilidade social. E sempre sob vistas grossas, descaso, inoperância e tudo o mais de Milton Bigucci, o eterno e ditatorial presidente da Acigabc, a associação das construtoras, imobiliárias e incorporadoras do Grande ABC. Uma denominação pomposa para uma entidade tão frágil de estrutura quanto poderosa em sensibilizar o servilismo da mídia.
A Acigabc está plantada na Província do Grande ABC para, entre outras finalidades, dar total proteção aos operadores do mercado imobiliário. Principalmente os amigos da confraria de Milton Bigucci, empresário que, coincidentemente, vê seu empreendimento alçar grandes voos após aproximar-se intestinamente de um representante político de alto coturno regional.
Não vou estender as asas de comprometimento ético que deveria pautar as ações da sede municipal da Ordem dos Advogados do Brasil, presidida por Fábio Picarelli. Seria esperar demais de uma organização que se meteu tanto em nível municipal quanto estadual e federal a trafegar solenemente pelos corredores do Poder Executivo e a embromar os associados com um calendário de cursos de modo a tapar o sol da inoperância institucional com a peneira de pontualidades técnicas.
Estou esperando mais notícias do jornal digital e impresso ABCD Maior, preocupado em acompanhar o desenrolar dos fatos do carro pagador. O noticiário de ontem dava conta de que o promotor criminal de Santo André, Roberto Wider, intimou o sócio-administrador da São José Construções e Comércio, Alberto Jorge Filho, a prestar depoimento no Fórum de Justiça. O Ministério Público, segundo o ABCD Maior, descobriu que a placa do carro de onde teriam sido roubados R$ 70 mil, no estacionamento da SOSP (Secretaria de Obras e Serviços Públicos de Santo André) é de propriedade da Construtora São José. Trata-se de um Audi, placar EQT 11 18 — São Paulo.
Tudo indica que as relações entre a Construtora São José e a Administração Aidan Ravin vão muito além da expectativa de desenvolvimento do mercado imobiliário porque a empresa, ainda segundo o Ministério Público, está envolvida em oferta irregular de imóveis residenciais e comerciais num amplo terreno da Avenida Industrial. O ponto nevrálgico é que o projeto sequer foi aprovado pela Prefeitura. Se forem mais a fundo na questão, possivelmente se encontrarão mais inconformidades, já que aquela área sediou durante muitos anos uma empresa do setor químico.
Possivelmente não haja gravidade semelhante (mas nem por isso minimizadora) à constatada pelo Semasa no terreno dos De Nadai, local que serviu de abrigo ao Residencial Ventura. Não é fácil encontrar no genoma territorial de Santo André algo semelhante a 70 anos de ocupação ambientalmente predatória como a Atlântis, indústria química que se mandou da cidade mas deixou um rastro de problemas que a volúpia imobiliária tratou de soterrar com torres de apartamentos.
Aliás, todos os espaços na região da Avenida Industrial, em Santo André, reciclados nestes tempos de mercado imobiliário em alta, deveriam passar por rigorosa inspeção ambiental. Mas o Semasa não é o mais indicado à empreitada. A seriedade do passado de presidência de Sebastião Ney Vaz há muito foi para o espaço. O que se tem hoje são indícios de que a farra do boi ali se instalou, para deleite do titular dessa espécie de caixa forte da Prefeitura. São Caetano, objeto de cobiça do titular do Semasa, que o diga.
O caso do carro pagador da Secretaria de Obras e Serviços de Santo André possivelmente não cairá na vala comum de denúncias que ganham espaço na mídia e, em seguida, por motivos geralmente inconfessos, desaparecem do noticiário. Aliás, desaparecem do noticiário é força de expressão porque há evidente conluio entre os transgressores e uma banda do jornalismo regional que simplesmente se omite na cobertura do assunto.
Nenhuma novidade, porque o Residencial Ventura recebeu blindagem mais que estranha. Mais que isso: o Ministério Público, destino de denúncia de irregularidades apontadas por este jornalista, está demorando demais para constatar a obviedade documentada: o lançamento comercial daquele empreendimento que abriga mais de 300 famílias foi irregular, independentemente de manipulação para tornar a área livre e desimpedida de complicações ambientais.
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