Política

Assalto ao carro pagador coloca
Aidan Ravin contra Luiz Marinho

DANIEL LIMA - 06/09/2011

A canelada que o prefeito de Santo André, Aidan Ravin, desferiu nas páginas do Diário do Grande ABC desta terça-feira contra o prefeito de São Bernardo, Luiz Marinho, tem  dois significados complementares: o titular do Paço Municipal sente que há pressões terríveis que colocam seu secretário de Obras na parede de uma verdade inconveniente e de dimensões inimagináveis e, por conta disso, pretende reduzir o foco de exclusividade da mais que evidente escorregadela administrativa.


Aidan Ravin pretende dividir os custos dos incômodos holofotes com o vizinho poderoso, integrante de destaque do partido político que poderá voltar a dirigir Santo André após os resultados eleitorais do ano que vem.


Tudo indica que o Paço de Santo André sabe que o mar de irregularidades expostas no assalto ao carro pagador não está para peixe de contemporizações.


As trapalhadas da equipe de Aidan Ravin, incluindo-se vereadores da base aliada, são a prova provada de que a gestão petebista é uma sucessão de improvisos.


Petebistas e aliados não têm noção do que significa gabinete de crise. Mais que isso: transmitem a certeza de que têm sim um gabinete pró-crise, com capacidade infinita de, a qualquer indício de complicações, ampliar os calcanhares de Aquiles.


As declarações do secretário de Obras de Santo André, Alberto Casalinho, na edição de sábado último do Diário do Grande ABC, deveriam ser submetidas a especialistas em desvios cognitivos ou então abrir as portas à literatura de ficção, na qual certamente ele faria muito sucesso. Principalmente se seus leitores abandonarem qualquer veleidade analítica porque, convenhamos, até ficção de boa qualidade recomenda verossimilhanças.


Destaco alguns trechos do material jornalístico para, em seguida, explicitar o tamanho do buraco de incoerências em que o secretário se meteu, e que, certamente, influenciou a artilharia do prefeito Aidan Ravin contra Luiz Marinho nesta terça-feira:


 O secretário de Obras e Serviços Públicos de Santo André, Alberto Casalinho, veio a público para revelar que possui cópia do sistema de monitoramento em que registra todo o momento do roubo da mala no estacionamento do prédio da Pasta. Após depoimento dos guardas-civis municipais, que acompanharam a ocorrência, no Ministério Público, Casalinho confessa que errou ao omitir informações: “Talvez pela inexperiência de tratar o fato como algo pontual”. A Promotoria chegou a enviar ofício pedindo a gravação do assalto ocorrido dia 13 de junho, só que o estacionamento Multipark justificou que as imagens ficam no armazenamento por 30 dias, por ser rotativo. Porém, o secretário confidencia que, para se precaver, requisitou uma cópia própria. “Está comigo para apresentar ao MP, mas é extraoficial. Todo sistema se apaga de forma contínua. Quando teve o ocorrido, é óbvio que tirei cópia e guardei comigo”.


 Apesar de ter citado anteriormente em entrevista ao Diário que não sabia quem era o condutor do carro roubado, agora, Casalinho recua e admite que encontrou-se em uma única oportunidade com o empresário Alberto Jorge Filho, dono da construtora São José, braço da Brookfield. Ele alega que não tinha nenhum relacionamento com o assaltado. “Conheci o Alberto há quatro, cinco meses, não sei precisar, quando o pessoal da Brookfield teve reunião conosco por conta do sistema viário que vai ser feito na Avenida Industrial”.


 Segundo Casalinho, mesmo sem intimidade com a vítima, Jorge Filho ligou para seu celular dizendo que estava sendo perseguido e indagou se podia estacionar o automóvel no prédio, já que ele não conhecia as proximidades — o empresário é morador da Capital. “Estava em reunião com os diretores e assessores. Recebi o telefonema fatídico e fui avisar a guarda. Quando desci, me avisaram que havia ocorrido o assalto”. O secretário relata que Jorge Filho estava “extremamente branco”, externando nervosismo, por isso o chamou para tomar copo d’água na secretaria.


Francamente, nada mais anedótico do que a versão do secretário. Uma nova versão, é bom que se escreva. Alguns pontos precisam ser destacados, principalmente aos leitores que não acompanham o caso com assiduidade:


a) O assalto ao carro pagador não passaria de um caso informal, atirado sob o tapete do abafamento do escândalo, se o jornal dos servidores públicos de Santo André não tivesse publicado a notícia que, em seguida, serviu de base para a atuação do Ministério Público.


b) O valor surrupiado está muito acima dos R$ 70 mil propagados. Chega a R$ 400 mil. Valor reposto no dia seguinte aos destinatários de origem, após uma corrida colaborativa dos fornecedores imobiliários tratados com intimidades além da conta nos corredores públicos.


c) O secretário Casalinho foi obrigado, pelas circunstâncias, a alterar o enredo, piorando o desenlace, porque foi informado sobre algumas apurações preliminares da promotoria criminal. Sentiu-se pressionado a dar satisfações.


d) Numa matéria complementar do Diário do Grande ABC de sábado o secretário Alberto Casalinho afirma que está pronto para depor no Ministério Público. A prestatividade é compulsória. Ele não tem saída: será mesmo chamado pelo promotor Roberto Wider. Os indícios de que o carro pagador era mesmo carro pagador são consistentes.


e) O telefonema que o secretário diz ter recebido poucos minutos antes do assalto ao carro pagador, justamente do dono da construtora São José, teve outro tipo de diálogo. Era a senha para a troca de dono da maleta de dinheiro. A quebra do sigilo telefônico do secretário e do empresário já foi comunicada extraoficialmente ao titular da Pasta do governo Aidan. O secretário sabe que o sigilo foi quebrado, porque não teria outra razão para confessar publicamente que recebeu telefonema do empresário às portas do assalto. Quebra do sigilo telefônico não significa acesso aos diálogos, porque os telefones do secretário e do empresário não estavam grampeados. Ou estariam?


f) O anúncio, pelo secretário, de que a gravação de imagens do assalto ao carro pagador não foi eliminada, porque, vejam só, ele providenciou uma cópia assim que desceu ao estacionamento, é uma forma de minimizar os estragos de participação efetiva do representante do governo Aidan nas medidas para apagar pistas do assalto ao carro pagador. Como o Ministério Público investigou e descobriu a sequência dos fatos ouvindo guardas municipais que trabalhavam naquela data no estacionamento, não há razão alguma mais para esconder a fita. Até porque, sabe-se que o promotor criminal foi informado sobre o destino de uma cópia.


Diante de tudo isso e de outros pontos que o Ministério Público mantém sob segredo, são concretas as possibilidades de a crise provocada pelo assalto ao carro pagador atingir outros setores da Administração Aidan Ravin. Restou ao prefeito partir em direção a Luiz Marinho.


O caso da ONG Castanheira é mesmo grave. É uma das heranças malditas da Administração João Avamileno (outra é a Cidade Pirelli, à qual o governo Aidan Ravin faz vistas grossas porque lhe interessa o empreendimento como fonte de prestígio político, entre outras razões)que respinga na Administração Luiz Marinho. Afinal, a então secretária de Educação de Santo André, Cleuza Repulho, titularíssima em São Bernardo.


Sei lá se a iniciativa de Aidan Ravin vai dar resultado a ponto de a bancada petista em Santo André, discreta publicamente quanto ao assalto ao carro pagador, recuaria ainda mais. Teríamos uma versão do toma-lá-dá-cá no sentido inverso — ou seja, não-me-toque-que-não-te-toco?


Certo mesmo é que o contragolpe de Aidan Ravin reveste-se de dupla face de periculosidade política: tanto pode fazer refluir o ímpeto de confronto como pode embrutecer ainda mais o jogo. O ataque a Luiz Marinho possivelmente acabará de vez com a diplomacia de conveniência entre os dois prefeitos. O calendário eleitoral aperta o cerco. Não falta munição nesta Província sem cidadania política. Talvez toda essa barulheira ganhe a forma de armistício e, na sequência, de ajeitamentos mútuos. Por que seria diferente se a sociedade não está nem aí e se refestela mesmo nas colunas sociais?


Leiam também:


Ministério Público vai em frente na apuração do assalto ao carro pagador


Carro pagador e da construtora do caso do Residencial Ventura


Assalto ao carro pagador e as trapalhadas do Paço Municipal


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