Política

Como disputar uma eleição com
possibilidades de chegar na frente

DANIEL LIMA - 03/11/2011

Depois de o Diário do Grande ABC tentar esterilizar a disputa eleitoral em Santo André na próxima temporada, instalando-a na estreiteza da subjetividade do quesito “carisma”, e na sequência do artigo que publiquei nesta revista digital, sigo em frente com o assunto. Leitores querem que querem que CapitalSocial forme uma Seleção de Competitividade Eleitoral. Desafio proposto, desafio aceito.


Faço algumas explicações antes de iniciar rápida exposição do time que organizei para desmontar a tese simplória do Diário do Grande ABC. Uma tese que por ser tão simplória nos ameaçaria a todos de ingressar no mundo cão-político. Ou estaria enganado este jornalista ao observar que bobagens não rebatidas consagram-se verdades nestes tempos de baixo senso crítico?


Poderia montar até dois times, duas seleções, de atributos essenciais para um candidato disputar a Prefeitura de qualquer Município da região, mas me fixei em 11 quesitos porque não quero fugir da metaforização futebolística anterior.


Os leitores vão perceber que carisma é apenas um desses elementos. Colocar no banco de reservas todos os demais equivale a desprezar tudo que se entende por comunidade e acreditar piamente que um campeão de sorrisos, de gestos fáceis, de fala mansa, de simpatia especial, seria automaticamente guindado a titular de algum Paço Municipal. Fosse tamanha estultice verdade, bastaria requisitar assemelhados do palhaço Tiririca. Querem gente mais simpática, mais carismática, do que os palhaços de verdade?


Por mais que a sociedade seja amorfa, em período eleitoral o bicho costuma pegar. As informações fluem com maior rapidez, as versões se propagam e não são poucos os leitores que de alguma maneira procuram conferir informações. Embora seja importante, carisma não enche as urnas eleitorais na proporção enunciada pelo Diário do Grande ABC.


Vamos, então, à Seleção de Competitividade Eleitoral. Propositalmente não meto a mão no bolso, ou seja, não falo em dinheiro para a campanha eleitoral, porque, convenhamos, é algo tão compulsório que não há razão alguma de constar da relação:


Interatividade pessoal – É uma sintonia fina com os eleitores, colocada à prova dos nove nos contatos pessoais nas ruas, nas instituições, nos botecos, nas lojas, onde houver gente. Há candidatos que jorram simpatia; outros são mais tímidos e vistos como arrogantes; e outros arrogantes por natureza. A sintonia entre candidato e eleitor depende de fatores que vão além do que se apresenta mais explícito. O julgamento individual nem sempre é o que parece. Carisma não tem cara única, não vem de fábrica, não é uma máscara que se coloque e tudo está resolvido. O carismático de ontem pode ser o indesejado de amanhã, caso não atinja a categoria dos intocáveis glamourizados pela mídia.


Infraestrutura material – Sem apetrechos de campanha, rigorosamente utilizados de acordo com a legislação, sobretudo em áreas de penumbra televisiva, caso da Província do Grande ABC, um candidato poderá ser mal avaliado. A visibilidade de uma campanha eleitoral deve ser explícita. Há muitas maneiras de contornar a legislação para chegar a um grau de exposição pública que induza o eleitoral a acreditar na força do candidato.


Coligações partidárias – Pode parecer bobagem que uma variedade imensa de partidos aliados ofereça a representatividade de que o candidato prescinde, mas é assim o jogo eleitoral. Contar com um vagão de siglas sem perder o sentido de locomotiva tem muito valor. Perguntem ao ex-presidente Lula da Silva, uma montanha de carisma, o quanto o isolamento do Partido dos Trabalhadores lhe foi penoso nas três derrotas presidenciais. E perguntem também o quanto foi importante descobrir a pólvora de somar mais e mais partidos no arco de alianças que o conduziu a três vitórias consecutivas.


Programa de governo – Candidato a cargo majoritário que dispense projeto de administração retirado das entranhas do Município é concorrente seriíssimo à desqualificação. O grande erro é transformar programa de governo em bíblia administrativa, um saco sem fundos de propostas sobre as quais poucos se interessarão como objeto de consulta. Programa de governo que pretenda atingir em cheio o eleitorado tem de ser simples, objetivo e esclarecedor. Os detalhamentos ficam reservados à introdução cuidadosa em caso de vitória.


Abrangência territorial – Não se disputa uma campanha eleitoral sem uma bússola na ponta do nariz. Algo a indicar que o território a ser conquistado não se esgota no centro, à direita, à esquerda, a leste ou a centro-oeste. Todas as direções devem estar na ordem do dia. Mesmo as aparentemente mais inóspitas. Não há território inacessível a uma disputa para valer, pelo menos para reduzir a diferença que separa o candidato do favorito naquela área. Não bastasse a realidade de que um voto vale um voto em qualquer ponto geográfico, o efeito contaminação para o bem e para o mal de redutos mais permeáveis ou mais complexos ao discurso de um candidato pode atingir áreas no entorno só aparentemente definidas.


Engenharia social – Candidato bom de verdade recorre a estudiosos da alma popular e envereda por ruas e vielas com o prato feito de propostas e mensagens que calarão mais fundo. A distinção social do universo eleitoral vale para quem quer ganhar uma disputa eleitoral e também para governar um Município. Ter as reivindicações mais pungentes na agulha de proposições é o que se espera de um candidato competitivo. Até mesmo a forma de vestir pesa nessas horas. Uma roupa social no Bairro Jardim, em Santo André, tem efeito bem distinto de uma roupa social no Parque Guaraciaba. Mas até nisso os estudiosos oferecem conclusões inesperadas. Dizem que o povo gosta mesmo de gente bem vestida, enquanto a classe média tradicional não leva tão a ferro e fogo encontros informais com um candidato em mangas de camisa.


Observatório político – Quem concorrer a uma Prefeitura imaginando que o adversário mais agudo não deve causar preocupação corre o mesmo risco de um treinador de time poderoso que ignora o oponente, fiando-se nas virtudes de seus comandados e nos conhecimentos acumulados. Decifrar e reagir a cada passo do adversário é essencial à consecução de tarefas do dia a dia e, quem sabe até, à readequação de movimentos táticos. É preciso estar muito atento a cada iniciativa contrária, distinguindo os golpes que poderão se tornar certeiros e escorregões que poderão ser fatais.


Temáticas de ponta – Um programa de governo conciso, penetrante e assimilador das demandas sociais e econômicas é meio caminho andado a uma campanha competitiva, mas não se pode ignorar a importância de temáticas mais incisivas. Alguns carros-chefe do projeto de governo deverão ser analisados, aprovados e expostos à exaustão aos eleitores. Melhor ainda se traduzir essas questões numa fraseologia que sintetize os objetivos a ser alcançados, a esperança a ser traduzida em conquistas. Candidato de mensagem robusta que ratifique o anseio do eleitorado é candidato fortíssimo.


Retaguarda jurídica – Candidato forte sem suporte de especialistas em legislação eleitoral fica exposto demais a intempéries de contratempos. Quem se descuida da retaguarda jurídica corre o risco de desgastar-se em reuniões demoradíssimas. Um quadro jurídico experiente é essencial para o candidato despreocupar-se completamente de torpedos de adversários que sabem o quanto são irritantes manobras que não visam necessariamente a constatação de irregularidades, mas a aporrinhação burocrática.


Marketing – O suporte de profissionais experientes em marketing é ponto-chave ao fortalecimento contínuo de uma candidatura. Entenda-se por marketing muito mais que gente competente para lidar com a imagem pública do candidato, como normalmente é interpretada essa especialidade. O suporte de marketing envolve muito mais que o candidato e suas relações com o público. Bons marqueteiros ligam todas as pontas do aparentemente entrecortado projeto eleitoral. É improvável que uma campanha torne-se competitiva com desgarramentos dos quesitos básicos elencados. Pouco adiantará uma retaguarda jurídica atenta se associada a uma engenharia social mambembe. De nada adiantará um centroavante de programa de governo espetacular se o goleiro de coligações partidárias comprovar-se frangueiro.


Relações institucionais – É paradoxal que tanto em Santo André quanto em outros municípios da região as instituições são quase que de fachadas, mas candidato que quer somar votos não pode esquecê-las. Entidades de classe ajudam a formar opinião, mesmo com baixo grau de penetração social. Os dirigentes são os mesmos de sempre e encontram cada vez mais dificuldades de relacionamento com o público-alvo que dizem representar. A fragmentação da sociedade é uma realidade nestes tempos — vejam que ironia — cada vez mais interativos em redes sociais. Afastar-se dessas instituições é um tiro no próprio pé, porque seus representantes são sensíveis demais. Eles gostam de um pouco de atenção e de uma representação formal no governo a ser conquistado, mas candidato avesso a engano não pode cair no conto da sereia de que com essas entidades a vitória está garantida. Fosse assim Celso Daniel jamais teria sido prefeito em Santo André. Nem Luiz Marinho em São Bernardo. E outros, bem mais íntimos dos dirigentes, seriam vitoriosos anos a fio.


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