Administração Pública

Dama de ferro

DA REDAÇÃO - 05/05/1997

Não perguntem à engenheira Miriam Belchior como anda seu mestrado sobre Planejamento Estratégico na Administração Pública, que já tem os créditos aprovados para tese na Fundação Getúlio Vargas até 1999. Esse sonho cultivado há anos foi temporariamente deixado para segundo plano, porque Miriam decidiu mergulhar neste final de século em outro desafio: transformar o Poder Público naquilo para o qual foi criado, ou seja, um eficiente prestador de serviços à comunidade.


 


Se tudo correr como planeja essa meticulosa aquariana de 39 anos, este pode ser o ano da virada em Santo André, cuja Prefeitura pouco difere da imagem que todo contribuinte tem do Estado em suas várias esferas, mestres no desperdício, na lentidão e na baixa qualidade dos serviços.


 


"Vamos mudar a cara do Poder Público e a postura do funcionalismo diante da comunidade" -- fala, em tom incisivo, a secretária de Administração de Santo André, verdadeira dama-de-ferro da gestão atual, que tem sob sua responsabilidade a espinhosa tarefa de passar a limpo a máquina do poder com seus 9.600 funcionários ativos, entre administração direta e indireta.


 


Esse exército vai consumir 87,2% do orçamento deste ano, previsto em R$ 235,2 milhões, o que garante antecipadamente a rejeição das contas do prefeito Celso Daniel, já que a Constituição limita a 60% os gastos com folha salarial. O pior, e Miriam Belchior não esconde, é que todo esse aparato está sendo incapaz de responder aos anseios dos 625 mil moradores da cidade.


 


"É absurdo um munícipe vir três vezes até o Paço para um serviço banal como obter certidão de valor venal de imóvel" - exemplifica. "Não é possível esperar até cinco minutos por um elevador dentro da Prefeitura" - dispara. "Temos apenas 150 microcomputadores, 60 dos quais XT, que chamamos de X-trecos tal a velharia" - zomba.


 


O estacionamento é surrealista: mais de 300 vagas para o funcionalismo e apenas 70 para o público, o que explica o gargalo das longas filas de veículos. A falta de geoprocessamento do mapa da cidade, baseado em foto aérea feita na gestão Celso Daniel em 1990 e descontinuado na administração seguinte, faz com que as obras sejam realizadas sob improvisação. Não se sabe exatamente por onde passam canos de água e rede de esgoto, onde estão equipamentos públicos como postos de saúde ou qual a cobertura de arborização da cidade.


 


Para tombar o modelo atual e virá-lo do avesso, Miriam está aplicando o mesmo choque de modernidade que a globalização impôs às empresas brasileiras. Passou a correr atrás de redução de custos, agilidade e administração com qualidade total. No seu plano de vôo, consta informatizar todos os departamentos e colocar essa tecnologia a serviço do público com atendimento via telefone ou até Internet.


 


Dados escassos


Outra providência é mudar o layout do Paço, do estacionamento ao 15° andar, sobretudo os térreos 1 e 2, que recebem 70% dos usuários. Há também agendado intenso programa de requalificação dos servidores. Um censo do funcionalismo será contratado junto ao Imes (Instituto Municipal de Ensino Superior de São Caetano). "Tudo o que conhecemos sobre nosso funcionário está limitado à ficha de admissão. Vamos atualizar isso, saber o que faz, que tipo de família tem, se aperfeiçoou a escolaridade, quais as expectativas sobre o cargo e também o que seu encarregado precisa" -- entusiasma-se a secretária, que espera ter os dados em mãos no segundo semestre.


 


O único perfil que já traçou, lançando olhar genérico sobre o cenário, é que o servidor é desmotivado e mal aproveitado. Remanejamento de horários e de setores já permitiram reabrir parques municipais e centros esportivos sem necessidade de contratações e horas extras. "O objetivo é trabalhar com produtividade. Afinal, o salário mais baixo, em média de R$ 500,00 do servente operacional, não é desprezível" - diz.


 


A secretária de Administração, que foi primeira-dama e deixou a gestão anterior de Celso Daniel com oito mil servidores diretos - contra os 6.506 atuais -, não considera a máquina inchada, embora admita que há gorduras e vá quebrar ovos para fazer a omelete da modernização. O primeiro passo é o programa de demissões voluntárias, seguido de cortes seletivos.


 


Outra alternativa é a redução da jornada de trabalho com diminuição de salários, algo que Miriam - mãe do pequeno Carlos Alberto, de dois anos - acha que sensibilizará sobretudo as mulheres e profissionais liberais que queiram dedicar-se a outras atividades. As horas extras já foram cortadas. Em abril pagou-se um terço do que foi gasto em dezembro de 1996.


 


Na área de requalificação, os primeiros a receber treinamento foram os serventes de limpeza do Hospital Municipal e já estão na fila os auxiliares de enfermagem. Também nos departamentos de Tributos e Controle Urbano houve programa de sensibilização de pessoas-chaves que se tornarão agentes multiplicadores dos novos conceitos de gestão.


 


Outro exemplo de mudança está nas ascensoristas, instruídas a não ler em serviço e orientar adequadamente o munícipe entre os andares. "Não adianta alterar a fachada do Poder Público se não comprometermos os funcionários com as mudanças" - afirma. Os seis elevadores, que antes serviam a todos os andares, estão testando paradas alternativas, pares e ímpares, para ganhar agilidade. Os andares térreos ganharão mobiliário moderno e colorido e serão abolidos os guichês pelos quais o funcionário fala com munícipes por minúsculo visor. O estacionamento será redistribuído, provavelmente com rodízio de placas para os servidores e guinchamento de veículos particulares após duas horas de uso.


 


Tudo isso pode parecer cosmético, mas Miriam Belchior diz ser imprescindível para azeitar a máquina com vistas não só a melhorar o atendimento ao público externo, mas conferir agilidade interna. Por isso, a informatização total é outra prioridade.


 


Equipamentos de grande porte, ultrapassados, vão migrar para a nova rede de micros e passarão a falar a mesma linguagem do mais moderno software da versão Office 97. Até o final de junho estará implantada a Intranet, para interligar todos os secretários e diretores. Serão 50 pessoas e áreas on-line, o que resultará em comodidades como reuniões por computador, controle de agendas, ordens e mensagens via eletrônica e, em breve, zerar todo o fluxo de papéis. O geoprocessamento do cadastro imobiliário permitirá atualizar constantemente o mapa de equipamentos e serviços feitos na cidade.


 


Mais licitadores


Outro ponto cardeal já mexido foi nas licitações, até então centralizadas em uma única e magra comissão de três membros, que cuidava desde a compra de prosaicos papéis sulfite até sacos de cimento e contratações de artistas, não sem antes passar por demoradas aprovações dos departamentos técnicos solicitantes. São agora cinco comissões, priorizadas por volume e qualidade das compras. Estão nas áreas de saúde, educação, serviços municipais, cultura-esportes-lazer e apoio administrativo.


 


O cadastro de fornecedores também foi foco de mudanças. Está aberto para novas inscrições, de modo a ampliar o leque de participantes nas cartas-convites e demais concorrências. No segundo semestre, a idéia é codificar todo o processo, registrando preços, especificações de materiais e históricos de compras, para que as requisições não se percam nas gavetas ou esbarrem em canetas burocráticas desautorizadas.


 


Fazer a máquina andar internamente exigiu, antes, mudar as atribuições da Secretaria da Administração, sob a qual estão as áreas de RH, Materiais e Patrimônio e Caixa de Pensão. Com a reforma administrativa aprovada pela Câmara, Miriam Belchior reforçou a musculatura agregando os departamentos de Informática e de Apoio Administrativo, passando a gerir, por exemplo, toda a frota e tudo o que diz respeito ao prédio do Executivo.


 


O centro Cívico Municipal, projetado pelo paisagista Burle Max, aliás, está em processo de tombamento histórico, daí a Secretaria correr contra o tempo para rejuvenescer uma estrutura de engenharia, elétrica e hidráulica que já soma 28 anos. Miriam enfeixou ainda serviços antes dispersos de atendimento à Regional do Parque Andreense, onde estão as áreas de mananciais, o chamado corredor polonês e a Vila de Paranapiacaba.


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