Entrevista Especial

Mindrisz quer Fundação do ABC
mais ampla e mais representativa

DANIEL LIMA - 19/01/2012

Se fosse um gênero musical o engenheiro e gestor público Mauricio Mindrisz se encaixaria como uma luva no jazz. É assim, com suavidade e discrição, que esse ex-integrante de uma orquestra de regionalidade chamada Administração Celso Daniel construiu uma carreira praticamente longe dos holofotes. Algo muito semelhante ao histórico da entidade da qual vai tomar posse como presidente esta noite em mandato de dois anos, indicado em sistema de rodízio pela Administração Luiz Marinho.


 


A Fundação do ABC chega aos 45 anos de atividades como raro exemplo de multilateralidade gerencial numa Província do Grande ABC municipalista e dividida. Mantida pelas prefeituras de Santo André, São Bernardo e São Caetano, a Fundação do ABC é muito maior e mais importante do que parece para o sistema de saúde regional. O paradoxo dos novos tempos é que a tarefa de tornar a imagem da instituição à altura da realidade operacional e administrativa caberá exatamente à diretoria de um Mauricio Mindrisz avesso à espetacularização de um samba, por exemplo.


 


Nesta Entrevista Especial, CapitalSocial mostra os planos de Mauricio Mindrisz. Os acordes do violinista ganham realce sem romper a estrutura conservadora da Fundação do ABC, plasmada sob cuidados político-administrativos de cristaleira. Ou alguém tem dúvidas de que estar no comando da Fundação do ABC, cujo orçamento deverá ultrapassar R$ 1 bilhão nesta temporada, não é algo que pode remeter ao timão de um Costa Concórdia?


 


Decididamente, Mauricio Mindrisz não tem vocação a repentes do capitão Francesco Schettino, em maus lençóis depois de se meter numa enrascada, vítima do próprio instinto. Daí à conclusão oposta, de que Mauricio Mindrisz vai pautar-se pela inercialidade, que vai tocar o transatlântico da Fundação do ABC sem proporcionar correções e aperfeiçoamentos de rota, vai muita diferença. Certo mesmo é que da mesma forma que não se aproximará demais de ilhas rochosas de controvérsias que possam chamuscar-lhe o prestígio, não se furtará a inovações em águas profundas mais que seguras.


 


O novo presidente quer expandir a atuação da Fundação do ABC em direção a Diadema e Ribeirão Pires, ainda fora da rota de atendimento. Também as oportunidades que surgirem na Região Metropolitana de São Paulo e na Baixada Santista não serão desperdiçadas. Mais que isso: serão prospectadas. A Fundação do ABC vai expandir sem dispersar critérios de produtividade moldados em plataforma de experiência nos serviços que presta em áreas geograficamente próximas. A Província do Grande ABC é o núcleo. O entorno metropolitano e o Litoral são mares a conquistar.


 


Outras medidas estão projetadas por Mauricio Mindrisz. Como a possibilidade de aumentar o efetivo do Conselho de Curadores da Fundação do ABC, espécie de Congresso Nacional da entidade. O dirigente público espera elevar a densidade social numa instância que o elegeu em 21 de novembro. Da mesma forma que quer ver a Fundação do ABC mais intestinamente participante do Clube dos Prefeitos. Mauricio Mindrisz substitui o médico Wagner Boratto, representante da Administração Aidan Ravin.


 


O senhor que pertenceu ao grupo de elite do prefeito Celso Daniel durante muitos anos e que nas últimas três temporadas está na cúpula da Administração Luiz Marinho, de forte viés social, é capaz de assegurar que a condução da Fundação do ABC ganhará vigoroso salto de regionalidade quando se sabe que ainda há série de arestas institucionais que precisariam ser aparadas?


 


Mauricio Mindrisz -- Além da forte intervenção nos três municípios instituidores, Santo André, São Bernardo e São Caetano, e no Hospital Mario Covas, assumimos o Hospital Nardini em Mauá e a UBS Central em Rio Grande de Serra. Assumimos também o AME (Ambulatório Médico de Especialidade) em Santo André e o AME de Mauá, equipamentos do governo do Estado. Deveremos também participar da gestão de UPA’s (Unidade de Pronto Atendimento) em Mauá. Atualmente só não atuamos diretamente em Diadema e Ribeirão Pires. Vale lembrar que nesses dois municípios a Fundação do ABC já participou da gestão da saúde. 


 


Aproveitando o momento da minha posse, ao levar o convite aos prefeitos Mario Reali e Clóvis Volpi, falei do interesse e da importância da Fundação do ABC voltar a atuar nesses municípios. Ambos concordaram com a ideia e a curtíssimo prazo estaremos iniciando negociações para que isso ocorra.


 


Apesar da relação estabelecida com a saúde pública da região, até hoje a Fundação manteve-se totalmente distante do Consórcio Intermunicipal de Prefeitos. Por que será que isso ocorreu? Acho que a Fundação do ABC se intimidou, ficou esperando ser convidada. Por outro lado, sendo cuidadoso, tenho a impressão que o Consórcio pouco conhecia da Fundação do ABC. Hoje, o GT (Grupo de Trabalho) de Saúde é um dos mais atuantes do Consórcio Intermunicipal do ABC e tem avançado muito na organização do papel de cada serviço de saúde, entre outras situações. Os resultados obtidos pelo GT têm sido dos mais significativos dentro das discussões do Consórcio. Tenho certeza que entre outros motivos isso se deu porque a intervenção de cada Município foi feita por representantes de alto nível das respectivas secretarias de saúde.


 


A Fundação do ABC tem todas as condições de fortalecer o Consórcio com a experiência adquirida nos municípios e também aproximando o governo do Estado do Grupo de Trabalho de Saúde. Para que isso possa atingir resultados desejados a intervenção da Fundação do ABC tem que ser feita no mesmo nível das secretarias, não por seus equipamentos. Afinal de contas são prestadores de serviços às prefeituras. Ou seja, a participação da Fundação do ABC se dará através da alta direção, o que já começamos a discutir com a direção do Consórcio.


 


Há nas perspectivas de planejamento que o senhor deve ter tratado para os próximos dois anos um encaixe de peças regionais que permitiriam maior produtividade nas relações com o Grupo de Trabalho de Saúde do chamado Clube dos Prefeitos?


 


Mauricio Mindrisz – Vamos com calma. Não podemos superestimar o papel da Fundação do ABC nessa questão. Temos vontade de atuar junto ao GT de Saúde, um bom nível de conhecimento da situação local, relação privilegiada com atores envolvidos no âmbito municipal e estadual, mas o papel central da articulação regional, sem dúvida, cabe aos prefeitos e à direção do Consórcio. 


 


Entendo também que a Fundação do ABC pode apoiar o Consórcio naquilo que você chamou da aparar de arestas institucionais, sobretudo na relação com o governo estadual. Por exemplo: podemos tentar uma aproximação com a SPDM (Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina), Organização Social de Saúde (OSS) ligada à Escola Paulista de Medicina que administra e gerencia o Hospital Serraria de Diadema, para que nos acompanhe e participe das discussões e definições do GT.


 


É possível contar com lances surpreendentes na direção da Fundação do ABC, de forma a supostamente quebrar uma rotina de incorreções ou mesmo de eficiência industrial, quando se sabe que há um inevitável pisar em ovos ditado pela composição do quadro de curadores que observa atentamente a instituição?


 


Mauricio Mindrisz – Com certeza não haverá nenhuma ação pirotécnica na direção da Fundação do ABC, já que esse não é meu estilo nem dos demais membros da diretoria. Tenho um exemplo de nossa atuação nesse caminho, bem recente. Em 2009, na administração do doutor Marco Antonio Espósito, quando eu era vice-presidente, a Faculdade de Medicina do ABC vivia um momento muito difícil, com grandes complicações financeiras e enorme insatisfação da comunidade acadêmica com a forma de administrar do diretor doutor Luiz Henrique Camargo Paschoal. Associações de professores e de alunos encaminharam ao Conselho Curador pedido de intervenção e imediata substituição do diretor.


 


Mesmo sabendo que a situação financeira era difícil e que a insatisfação com as ações da direção era generalizada, o Conselho Curador avaliou que a solução pretendida por alunos e professores era equivocada, pois jogaria sobre a faculdade holofotes que poderiam levar a problemas que certamente interfeririam na vida acadêmica da instituição. Depois de varias negociações, optamos por um caminho diferente, que foi o de implantar um processo de cogestão com a direção da faculdade, o qual denominamos naquele momento de “gestão participativa”. A Fundação do ABC passou a dividir a gestão administrativa e financeira com a direção da faculdade.


 


Essa medida associada à mudança de direção da Faculdade de Medicina ao fim do mandato do antigo diretor deu à faculdade condições para tratar da questão acadêmica, e os resultados estão aí: em 2011, a faculdade conquistou nota máxima no Enade (Exame Nacional de Desempenho de Estudantes), foi aberto Doutorado em ciências da saúde e residência da faculdade é uma das mais concorridas do País.


 


Ao dizer que o Conselho Curador “observa atentamente a instituição”, e que cumpre sua função de zelar pela saúde financeira e administrativa da instituição, você dá a entender que o órgão é em geral conservador e que seria incapaz de tomar medidas arrojadas. Apesar de viver diretamente a instituição há apenas três anos, acho que isso é um mito construído, uma lenda urbana, como se diz. Por exemplo: quando foi necessário tomar uma decisão estratégica como foi o de assumir a gestão do Hospital Radamés Nardini, em Mauá, conhecendo a difícil situação financeira daquele Município, não houve qualquer titubeio. E o Conselho Curador fez isso por entender o importante papel estratégico que aquele equipamento tem para a saúde da região.


 


Por falar em quadro de curadores, o senhor faria algum reparo quanto à composição institucional de seus representantes ou entende que houve aperfeiçoamento ao longo do tempo e a sociedade como um todo está sim espelhada naquela instância?


 


Mauricio Mindrisz – A atual composição do Conselho Curador é de 2002. Conta com representantes dos três municípios instituidores, de seus conselhos municipais de saúde e de suas câmaras municipais. A Faculdade de Medicina do ABC conta com representantes de alunos, professores, residentes, ex-alunos e pais de alunos. Conta ainda o Conselho Curador com representantes de funcionários da Fundação do ABC.


 


Naquele momento, em 2002, a Fundação do ABC gerenciava basicamente a Faculdade de Medicina, o Hospital Anchieta (que também é conhecido como Hospital de Ensino) e o Hospital Mario Covas. Hoje a realidade é bem diferente. Parece-me que há uma super-representação da Faculdade de Medicina. Em função da realidade atual, talvez caiba a representação de entidades regionais (talvez o Consórcio, já que dessa maneira as representações dos municípios não-instituidores estaria contempladas). Talvez caiba também a participação de entidades locais que acompanhem a vida econômica do ABC.


 


A Fundação do ABC vem aumentando gradualmente seus tentáculos administrativos e técnicos, espalhando-se por territórios além dos três que lhe deram origem e que o sustentam prevalecentemente. É possível acreditar que chegará o dia em que a Fundação do ABC poderá até mesmo ganhar uma denominação complementar, em referência a novos parceiros, ou as incursões serão sempre tratadas como oportunidades que não alterarão os cromossomos com que foi criada?


 


Mauricio Mindrisz – A origem da Fundação do ABC é a Faculdade de Medicina. A partir da década de 90 e mais fortemente a partir de 2001, a Fundação do ABC vem assumindo equipamentos em toda a região do ABC. A partir de 2008, aproveitando oportunidades que foram surgindo, a Fundação do ABC assumiu equipamentos no Litoral. Chegou ao quadro atual de 11 hospitais, três AME’s e mais de 30 planos de trabalho.


 


A Fundação do ABC pode assumir esse grande conjunto de equipamentos pela estrutura de apoio da Faculdade de Medicina que nos aporta grande parte da qualidade dos serviços, já que é de sua responsabilidade a direção técnica desses equipamentos. Entendo que a expansão da FUABC deve se dar fortemente na região do ABC, já que há ainda muitas oportunidades aqui. No Litoral, segunda região de atuação, devemos buscar outras oportunidades. Se encontrarmos alternativas interessantes, poderemos vir a assumir novos equipamentos. Eventualmente, ante propostas muito interessantes do ponto de vista estratégico ou financeiro, poderíamos considerar os demais municípios da Região Metropolitana.


 


Temos recebido convites de varias regiões paulistas e mesmo de outros Estados, mas temos declinado. Acho que além dos limites que já expus não me parece possível nem interessante ampliar a atuação da Fundação do ABC. Certamente estaríamos limitados pela capacidade de expansão de apoio técnico da Faculdade de Medicina, e mesmo pelas dificuldades de acompanhamento por parte da alta direção da Fundação do ABC.


 


O senhor seria capaz de aceitar alguma coisa conceitualmente definidora da atuação da Fundação do ABC que a remetesse a algo que poderia ter sido seguido pelo Clube dos Prefeitos como exemplo em termos de regionalidade ou esse tipo de comparação seria um exagero porque a entidade que reúne os sete prefeitos é mais complexa, ao lidar com todo o conjunto de demandas sociais e econômicas e não apenas com a área de saúde?


 


Mauricio Mindrisz – Se você analisar adequadamente, a Fundação do ABC não é no seu gene um órgão regional, como os demais que existem por aí, como o Consórcio Intermunicipal e Agência de Desenvolvimento Econômico. A Fundação do ABC vem conquistando esse espaço exatamente ao assumir trabalhos nas cidades do ABC. Por isso insisto tanto na necessidade de buscarmos serviços em Diadema e Ribeirão Pires. Atuando em todas as cidades da região e em três equipamentos regionais, a Fundação do ABC se credencia claramente a ajudar na busca da melhoria da saúde na região, preocupação maior dos moradores do ABC, conforme mostram as pesquisas. Ao que eu saiba, UFABC e outras entidades acadêmicas vêm atuando com as prefeituras e com o Consórcio em suas respectivas áreas de conhecimento.


 


Entrando rapidamente nessa questão da regionalidade, não tenho dúvidas de que a região tem necessidade de estruturas formais para atuação em determinadas áreas. Uma que é óbvia é a da Agência Regional de Saneamento, obrigação dos municípios, segundo a nova lei de saneamento. Não tenho dúvida que criar uma agência regional é muito melhor do que cada Município criar a sua, ou ainda a de se associar à agência estadual.


 


Para que os contribuintes possam ter mais informações sobre as engrenagens administrativas, financeiras e econômicas que sustentam a Fundação do ABC, o senhor disporia de números que convergissem para a garantia de que se trata de um exemplo de eficiência e produtividade a salvo, portanto, de desperdícios?


 


Mauricio Mindrisz -- Por tratar-se de uma entidade sem fins lucrativos, a Fundação do ABC, instituída pelo Poder Público, é acompanhada pela Promotoria de Fundações e pelo Tribunal de Contas do Estado.  Na estrutura administrativa cada unidade mantida (Faculdade de Medicina, hospitais, AME’s e a central de convênios – responsável por cerca de mais de 30 planos de trabalho) tem autonomia administrativa e operacional, que, por sua vez, é limitada aos recursos financeiros dos contratos de gestão estabelecidos com as prefeituras e governo do Estado.


 


Internamente, a Fundação do ABC dispõe de estrutura de acompanhamento e controles profissionalizada, de apoio à presidência e à diretoria, na qual todas as informações são tratadas quanto a aspectos de legalidade, economicidade e objetivos a que destinam os recursos. Mensalmente são levantados oficialmente os balancetes e relatórios financeiros sobre todos os gastos de pessoal, material, investimentos e outros, que, após análise e avaliação das áreas de auditoria e controladoria internados, são apresentados à presidência e submetidos à aprovação do Conselho de Curadores e do Conselho Fiscal, órgãos máximos de representação do Poder Publico e da sociedade civil. Anualmente, é elaborado o balanço geral e o balanço social, os quais são submetidos à apreciação de auditoria externa e à aprovação do Conselho Superior, devidamente publicadas no Diário Oficial e outros jornais.


 


Cumprindo requisitos legais, a Fundação do ABC é obrigada a reinvestir todo e qualquer superávit operacional, buscando o equilíbrio entre receitas e despesas. A eficiência de gestão operacional pode ser medida pelo resultado alcançado nos últimos quatro anos. Em 2011 registra a receita de R$ 923 milhões, que, comparada com a receita de R$ 381 milhões de 2007, representa crescimento de 142%. Nesses quatro anos, considerando que o resultado operacional acumulado foi superavitário, me parece que não resta duvida quanto a boa saúde financeira da instituição.


 


Como o senhor se preparou tecnicamente para assumir o comando da Fundação do ABC durante esse período em que se tornou representante da Administração Luiz Marinho na diretoria da entidade? A Fundação do ABC tem especificidades que o senhor não encontrou na cúpula petista em Santo André, na assessoria da Administração Luiz Marinho e também à frente do Semasa, autarquia de Santo André da qual o senhor também somou experiência? Os princípios de gerenciamento valem para todas as atividades?


 


Mauricio Mindrisz – Sou vice-presidente da FUABC, indicado pelo prefeito Luiz Marinho, desde janeiro de 2009. Ocupei essa função por um ano como vice do Marco Antonio Espósito, representante de São Caetano, e nos dois anos da presidência do Wagner Boratto, indicado por Santo André. Tenho certeza que nesses três anos fui um vice bastante atuante, sobretudo na área financeira, que, segundo o estatuto da Fundação do ABC, é de responsabilidade da vice-presidência. 


 


Nesse tempo acompanhei o dia a dia da Fundação do ABC. Sou membro da Gestão Participativa, órgão cogestor da Faculdade Medicina. Minha especialidade é na área de gestão. Quando o Celso Daniel me convidou para assumir o Semasa, em 1997, fez exatamente devido a isso, já que nunca tinha atuado diretamente na área de saneamento. Junto com toda a comunidade da autarquia tive o orgulho de ter participado diretamente da criação e da administração da mais ousada experiência na área de saneamento e que serviu como modelo para criação do Ministério das Cidades.


 


A possibilidade concreta de que a Fundação do ABC se submete ao risco permanente de sofrer avarias diretivas e conceituais de atuação por conta do calendário eleitoral, cujos resultados nem sempre coincidem com a estrutura de poder do momento, é um empecilho à gestão voltada para estratégias de longo prazo ou o Conselho Curador é o anteparo para reduzir os impactos inerentes da situação?


 


Mauricio Mindrisz – Isso decorre do jogo democrático e esses riscos existem para a Fundação do ABC, mas também para as demais instituições.  Minha aposta como cidadão é que o avanço democrático no nosso País garanta que a Fundação do ABC continue no papel de importante aliado estratégico dos municípios na área de saúde. Na Fundação do ABC esses riscos de desvios existem, já que o sistema é fortemente presidencialista.


 


Uma das alternativas seria a criação do cargo de diretor-superintendente, que respondesse pela gestão da Fundação do ABC. Na estrutura atual existem apenas diretores de áreas, casos de jurídico, administrativo, financeiro, etc. A função de gestão é exercida pelo presidente, que pode ou não delegar parte das atribuições aos demais membros da diretoria (o vice-presidente eleito e o secretário que é indicado pelo presidente). Mas, em minha opinião, a existência desse superintendente não seria uma forte garantia já que certamente poderia ser demitido pelo presidente.


 


O Conselho Curador pode ter o papel de políticas de longo prazo, mas sempre existe a possibilidade de cooptação. Portanto, não há garantias e não há condições de serem construídas no campo democrático e no do bom senso condições para isolar a Fundação do ABC dessa situação. Mesmo sabendo disso, a Fundação do ABC não pode deixar de planejar a longo prazo. A continuidade do sistema de rodízio entre as prefeituras na presidência e o compartilhamento da gestão são alguns dos principais instrumentos de garantia da continuidade do papel da Fundação do ABC.  


 


No processo recente de definição do novo superintende do Hospital Mário Covas, houve tentativa de recondução de Geraldo Reple Sobrinho para um terceiro mandato, ao arrepio do estatuto que preconiza um mandato de cinco anos com direito a uma única recondução. Como essa questão foi superada? E os estatutos das demais mantidas, o que dizem sobre a questão do prazo do mandato e da possibilidade de reeleição?


 


Mauricio Mindrisz – Nesses 10 anos à frente do Hospital Mário Covas, o doutor Geraldo Reple Sobrinho executou trabalho reconhecido pela população atendida e com isso pode construir uma imagem de um equipamento de excelência. Provavelmente em função disso vários setores da população devem ter insistido para que continuasse. E esse clamor chegou à Secretaria Estadual da Saúde. Recebemos varias correspondências de atores da região solicitando a manutenção do doutor Geraldo no cargo, o que exigiria mudança estatutária. Essa mudança necessitaria de aprovação do Conselho Administrativo do Hospital Mario Covas e também por maioria qualificada (de dois terços) no Conselho Curador da Fundação ABC.


 


A questão foi encaminhada à alta direção da FUABC, que expôs as dificuldades, inclusive com eventual veto por parte da Promotoria das Fundações, que acompanha e fiscaliza nossas ações. Além disso, os prefeitos também mostraram interesse em aproveitar a necessidade de mudança visando maior transparência nas ações daquele equipamento. Somando as duas coisas, mostramos a inconveniência dessa mudança de regras e o exemplo dado pelo presidente Lula ao rejeitar a mudança da Constituição para um terceiro mandato. O estatuto foi mantido com a eleição do doutor Desiré Calegari, que se comprometeu com os prefeitos a uma maior participação no Hospital Mário Covas.


 


Em relação a como essa questão é tratada nas demais mantidas, pelo que sei cada uma agiu de maneira diferente, o que exigirá estudo detalhado. Algumas, como o Hospital Mario Covas e o Hospital da Mulher de Santo André, definem um prazo de mandato para o superintendente. Na minha visão, esse não me parece um caminho adequado. No caso de mudança de gestão, o governante pode considerar esse cargo estratégico, e com toda legitimidade conquistada pelo voto popular, querer indicar outro nome. O mesmo pode ocorrer em situações em que o superintendente não venha atendendo a contento os objetivos e diretrizes definidos pelo governante.


 


Em relação à definição do superintendente do Hospital Mário Covas, o estatuto exige que deve ser funcionário do equipamento ou da Faculdade de Medicina, o que me parece um equivoco porque certamente cria um clube fechado, já que existe certamente fora dessas instituições um sem-número de pessoas capazes de exercerem a função. Por isso, uma avaliação dos estatutos das mantidas será uma das medidas internas a ser encaminhadas em curto prazo.


 


Não lhe parece que a Fundação do ABC conta com uma estrutura de comunicação social muito menor do que o gigantismo dos números orçamentários que administra, de modo a parecer dimensionalmente muito aquém do sistema organizacional que a caracteriza? Trocando em miúdos: caberia uma reestruturação no organograma da entidade para enquadrá-la aos eventuais planos de avanços?


 


Mauricio Mindrisz – Com certeza. Mas provavelmente essa insuficiência não exista apenas na área de comunicação social, mas em quase todas. O crescimento da Fundação do ABC e de suas mantidas chega a 218% entre 2006 e 2011, o que equivale a cerca de 26% ao ano. A estrutura não acompanhou esse crescimento e várias vezes esse problema de infraestrutura de apoio aparece. De qualquer maneira, qualquer mudança será tomada avaliando cuidadosamente impactos financeiros.


 


O que é mais importante para a direção da Fundação do ABC, numa escala de gestão inquieta com o ambiente político-partidário inerente da administração de uma entidade pública de direito privado: um relacionamento estreito com os prefeitos em primeiro lugar, com os secretários municipais de saúde em seguida e com o governo do Estado na sequência, ou o bom andamento da entidade não permite hierarquização, de forma a que se horizontalize essas demandas?


 


Mauricio Mindrisz – Certamente não há condições de hierarquizar. A relação próxima com os prefeitos (nesse caso, estamos falando apenas dos prefeitos das cidades instituidoras – Santo André, São Bernardo e São Caetano) e com os secretários municipais de saúde é condição necessária (mas não suficiente) para um blindamento da gestão. Imaginar o contrário, ou seja, o do presidente trilhar um caminho independente ou contrário ao definido pelos prefeitos e secretários da saúde levaria certamente a uma crise em que a medida mais simples seria a mudança do presidente -- o que pode ser feito a qualquer momento pelo prefeito. 


 


Em relação ao governo do Estado, a situação é diferente. Trata-se de uma relação através da qual a Fundação do ABC tem que buscar a excelência dos serviços. Hoje a Fundação do ABC tem com o governo do Estado quatro equipamentos: o Hospital Mario Covas e os AME’s de Mauá, Santo André e Praia Grande. Além disso, parte do contrato com o Hospital Irmã Dulce de Praia Grande, que é municipal, vem de recursos do governo estadual, através da venda de leitos. Temos interesse muito grande em aumentar essa parceria seja com novos equipamentos como hospitais e AME’s ou outros.


 


Cada um desses equipamentos tem um diretor superintendente que faz a relação direta com a Secretaria de Estado de Saúde, o que pode trazer problemas para a Fundação do ABC, já que cada equipamento tem alto nível de independência para a organização e prestação de serviços. Por isso estou cada vez mais convencido de que precisamos ter na estrutura da Fundação do ABC alguém ligado diretamente à Superintendência que faça a relação entre a Secretaria Estadual de Saúde e as mantidas do Estado com o objetivo de garantir uniformidade ao atendimento.


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