Política

Diadema e São Caetano resumem a
cara do voto ideológico na Província

DANIEL LIMA - 17/07/2012

As três últimas eleições presidenciais – todas decididas no segundo turno – dão uma ideia mais precisa de que o voto na Província do Grande ABC tem uma forte parcela de conotação ideológica. Os especialistas dizem que eleições municipais desgarram-se das eleições estaduais e federais, que são pauta doméstica nas quais o peso da zeladoria dos prefeitos, preocupados apenas com a manutenção dos serviços públicos, seria preponderante e sem qualquer tipo de encaixe partidário e ideológico.

 

Não é bem assim. Na Província do Grande ABC essa conceituação é uma verdade relativa por razões que já expus em outro texto, cujo link está abaixo. Aqui há componentes históricos que não podem ser desprezados e que sofrem sim influências externas, de programas eleitorais televisivos aos quais não temos controle porque vivemos numa penumbra tecnológica imposta pela topografia. A Província não é uma ilha político-eleitoral como querem fazer crer os estudiosos de generalidades do País que colocam argumentos bem costurados no mesmo saco. Há especificidades que precisam ser bem avaliadas.  Os benefícios e os estragos do movimento sindical, que permanecem nas entranhas da região, demarcaram o tecido político-ideológico de forma  contundente como em nenhum outro endereço do País.

 

São Caetano e Diadema são provas provadas de que ideologias permeiam as disputas municipais. O PT é uma agremiação tão combatida na primeiromundista São Caetano quanto ovacionada na operária Diadema. Forjados em trechos distintos de nossa história de ocupação demográfica, os dois municípios se apresentam antagônicos em muitos sentidos. Os indicadores socioeconômicos são claros. E diferentemente do que sugerem os apressados, são municípios igualmente difíceis de administrar. As demandas são distintas, mas igualmente apressadas em soluções.

 

Monitoramento permanente

 

Tanto é verdade que o prefeito de São Caetano, José Auricchio Júnior, conta com monitoramento permanente de consultorias especializadas para, mais que detectar, enfronhar-se nos desejos e cobranças dos moradores. Predominantemente de classe média tradicional, média-média, média-baixa e média-alta, São Caetano é um cristal que não pode ser arranhado no relacionamento entre o gestor público e a sociedade, sob pena de distúrbios nada agradáveis. Um passo em falso e lá se vão alguns anéis, quando não os dedos da governança e da governabilidade.  

 

Diadema é a consagração da classe de trabalhadores que, indevidamente, alguns marqueteiros e o governo federal chamam de nova classe média. Forjada nos últimos 30 anos sob avalanche migratória, a agenda social difere da de São Caetano mas é intensa e igualmente cobrada. Questões problemáticas como a criminalidade e o atendimento na área de saúde ,educação e habitação que ainda persistem, tomam muito tempo dos gestores locais.

 

Por que Diadema vota prevalecentemente nos vermelhinhos petistas e São Caetano nos tricolinos do PTB, associados com os azulados do PSDB? Por uma série de razões, entre as quais o fato de que São Caetano é a Diadema com que todos sonham na forma concreta do urbanismo e dos serviços públicos e na materialidade de potencial de consumo.  

 

Eleições presidenciais

 

Nas três últimas eleições presidenciais disputadas em segundo turno, São Caetano deu provas de que a centro-direita é sua vocação ideológica e eleitoral. A derrota de José Serra por 47% a 53% dos votos válidos em 2002 não causou surpresa alguma num período em que a Província do Grande ABC comia o pão que o Diabo amassou por conta de políticas econômicas dilaceradoras do governo Fernando Henrique Cardoso. A vantagem petista de 10,52% na contagem dos votos, entretanto, provava a resistência conservadora. Nos demais municípios da região o massacre favorável ao então candidato Lula da Silva foi impactante: 47,50% em Santo André (vitória de Lula sobre Serra por 65,61% a 34,39%); 54,22% em São Bernardo (68,60% a 31,40% para Lula); 62,67% em Diadema (72,82% a 27,18 para Lula); 57,65% em Mauá (Lula chegou a 70,25% ante 29,75% para Serra); 37,34% em Ribeirão Pires (Lula 61,48% contra 38,52% de Serra); e 35,77% em Rio Grande da Serra (Lula 60,89% e Serra 39,11%).

 

Para São Caetano naquele 2002 ter sucumbido (no sentido etimológico do termo, sem juízo de valor, portanto) ao candidato petista, dispensa-se qualquer adjetivação sobre os estragos do período Fernando Henrique Cardoso para a economia da região, atingida em cheio no coração e na alma da indústria automotiva.

 

No segundo turno das eleições presidenciais de 2006, agora com enfrentamento de Lula da Silva e Geraldo Alckmin e sob a influência do Mensalão, eis que a verdade história começou a ser restabelecida: São Caetano deu vitória a Alckmin por larga vantagem (46,20% de diferença, fruto do resultado de 65,02% a 34,98% nas urnas). Em Diadema, o Município mais vermelho da região e um dos 10 mais do País, Lula da Silva seguiu impávido com a vitória de 70,39% a 29,61% ante Alckmin. Uma vantagem de 57,93% dos votos válidos.

 

Como teria se comportado naquele 2006 o eleitorado de Santo André, que tem sua porção de São Caetano menos pronunciada em termos relativos ante a população geral e uma classe popular menos frequentadora de chão de fábrica  e menos popular que a de Diadema? A diferença pró-Lula foi estreita, com 51,36% dos votos válidos, ante 48,64% do tucano. Ou apenas 5,30% de diferença. Em São Bernardo, menos classe média tradicional e mais classe operária que Santo André, a vantagem de Lula foi de 32,86%, resultado da contagem final de 59,83% a 40,17%.

 

E em Mauá, como se deu a disputa presidencial em 2006, sendo o Município mais parecido com Diadema, embora tenha  classe média tradicional minúscula mais  pronunciada? Deu Lula da Silva com 61,75% a 29,61%, vantagem de 38,05%; ou seja, um pouco mais que São Bernardo e bem menos que Diadema.

 

Em Ribeirão Pires, que conta com uma classe média relativamente semelhante à de Santo André, a diferença pró-Lula foi de 6,35%, resultado do placar de 51,46% a 48,36%. Já em Rio Grande da Serra, nas franjas de Ribeirão Pires, Lula ganhou com vantagem de 25,81% dos votos ao estabelecer 57,41% a 40,48% ante Alckmin.

 

PT em queda

 

Eis que chegamos ao segundo turno das eleições presidenciais de 2010, agora com Dilma Rousseff apoiadíssima por um consagrado Lula da Silva, que deu um nó, mesmo que temporário, na crise financeira internacional ao abrir as comportas do consumo, e de novo José Serra como antagonista. Quem esperava por números satisfatórios da candidata petista em São Caetano, caiu do cavalo. O Município tão avesso ao PT quanto os bairros nobres da Capital vizinha impingiu à ex-ministra um goleada: Serra venceu por 68,97% a 31,03%. Ou seja: 55% de vantagem.

 

Como teria sido a votação na antítese de São Caetano, a ainda em construção Diadema? Exatamente o inverso: Dilma Rousseff ganhou por diferença de 49,53% ao aplicar o placar final de 66,46% a 33,54% no tucano.

 

A dividida Santo André, que flerta entre o liberalismo e o socialismo deu vitória a José Serra por escassa margem de 4,68% dos votos, após o placar final apontar 51,20% a 48,80% nas urnas.

 

São Bernardo menos Diadema e menos Santo André ou semelhante a Mauá (quero dizer que São Bernardo é menos esquerdista que Diadema, mais que Santo André e parecida com Mauá), garantiu vitória de Dilma Rousseff por 22,09% de diferença, depois de as urnas apontarem 56,21% de votos válidos para a candidata escolhida por Lula da Silva e 43,79% para José Serra.

 

Como é quase um retrato de São Bernardo, Mauá também deu vitória a Dilma Rousseff por um placar de 57% a 43% dos votos válidos, ou 24,56% de diferença. Metade do que Diadema imprimiu nas urnas e menos de dois pontos percentuais acima de São Bernardo. Em Ribeirão Pires, uma Santo André com menor influência popular nas urnas, a diferença foi de 6,65% para José Serra – o placar apontou 51,72% a 48,28%. Completando o jogo, a popular Rio Grande da Serra, mesmo sob a influência do prefeito Kiko Teixeira, tucano de carteirinha, Dilma Rousseff ganhou por 54,05% a 45,30%, uma diferença de 17,18%.

 

Brasil com nuances

 

No cômputo geral de votos válidos em 2010 na disputa presidencial, Dilma Rousseff venceu por vantagem de 14,98% ao emplacar 54,05% a 45,95%. Um estreitamento forte em relação à disputa presidencial de quatro anos antes, que chegou a 25,81% favoravelmente ao petista Lula da Silva. E bem menos que os 51,05% dos votos que separam Lula de José Serra em 2002 no eleitorado regional.

 

Ao se estabelecer um confronto entre o resultado geral nacional e o resultado regional, constata-se uma forte semelhança. Em 2002, Lula venceu Serra na Província do Grande por 60,89% a 39,11%, enquanto nas urnas brasileiras saltou o resultado de 61,27% a 38,72%. Em 2006, Lula da Silva reelegeu-se com 60,83% a 39,17% dos votos a Geraldo Alckmin no Brasil e obteve 57,41% a 42,59% na Província do Grande ABC. Em 2010, Dilma Rousseff alcançou 54,05% a 45,95 ante José Serra na Província de 56,05% a 43,95% no País. Esses números significariam uma tomada de pulso das eleições presidenciais de 2014 tendo como instrumento as eleições municipais na Província este ano?

 

Seja lá o que for, não se pode esquecer que os resultados finais das eleições presidenciais na região escondem importantes nuances municipais que não podem, de forma alguma, ser ignoradas e muito menos catalogadas como consequência de acertos e equívocos meramente administrativo-municipais.

 

São Caetano e Diadema simbolizam o Brasil que deu certo e o Brasil que procura dar certo. Não é por outra razão, aliás, que o candidato peemedebista em São Caetano, Paulo Pinheiro, rejeitou a companhia do petista Edgard Nóbrega na chapa de oposição à situacionista Regina Maura Zetone. A contaminação seria compulsória e decisiva à definição do pleito.

 

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