Fiquei matutando um tempão para decidir por onde começar a análise da pesquisa publicada pelo Diário do Grande ABC na edição de domingo, tendo como fantasmas as condicionalidades que apresentei no texto de ontem e que está no link abaixo. E cheguei à conclusão que o melhor caminho era de alerta: os resultados podem dizer muita coisa, podem dizer várias coisas e, principalmente, podem dizer pouca coisa. Me entenderam? O elevadíssimo índice de eleitores que, nas entrevistas, disseram não saber em quem votar, antes que lhes fossem apresentados cartões com os nomes de todos os concorrentes
É claro que há outros senões, mas esse voto induzido pelo cartão é um voto sujeito em alguma escala importante a chuvas e trovoadas. A pesquisa assinada pelo Diário do Grande ABC segue a mesma trilha metodológica, ao que parece, da pesquisa que o mesmo Diário do Grande ABC apresentou quatro anos antes, nas eleições municipais da Província do Grande ABC. A diferença é que aquela era assinada pelo Ibope e esta é fantasma, porque não explicita os responsáveis técnicos. Se aquela apresentou fissuras, o que dizer desta?
O índice de eleitores que não souberam quem apontar como preferido antes da exibição do cartão é uma agulha na mão de criança numa festa junina repleta de balões coloridos. Bem mais que na Capital, onde os veículos de comunicação têm audiência mais massificada. Principalmente porque a mídia eletrônica (rádio e televisão) conta com mais apelo popular. Como se sabe, vivemos na penumbra midiática típica de regiões metropolitanas nas quais a Capital é a Cinderela e a vizinhança um ajuntamento de Gatas Borralheiras.
Rejeições sem valor
Se o voto declarado por grande parte de entrevistados pelo Diário do Grande ABC (no apontamento estimulado, cartela com os nomes à disposição, baixou para menos de 15% em média a decisão de não votar em nenhum deles ou não saber em quem votar) decorre dessa baixa sustentabilidade, como levar também a ferro e fogo o conceito de rejeição sugerido pela pesquisa?
Para complicar ainda mais a situação, a formulação da pergunta é vulnerável a uma rigidez analítica, porque permitiu que cada eleitor entrevistado apontasse quantos nomes quisesse como descartável, sem estabelecer hierarquia de eventual aversão a cada um deles. A melhor saída teria sido qualificar a rejeição, com uma pergunta simples: em quem o eleitor não votaria de jeito nenhum. Até mesmo uma outra indagação poderia ter sido incorporada: em quem o eleitor não votaria de jeito nenhum como segunda opção de veto.
Como o questionário botou todo mundo no mesmo saco sem fundo, o que se viu como resultado foram casos praticamente inverossímeis. Ou não é algo sem pé nem cabeça, por exemplo, que o candidato do PRTB de Santo André, Alexandre Flaquer, tenha contado com apenas 0,6% dos votos na pesquisa espontânea, com 2,7% na pesquisa estimulada e, vejam só, com 33,8% na pesquisa para aferição de rejeição? Como alguém veta um candidato sem que ao menos o conheça de nome, de produção política, pessoal ou profissional. Alexandre Flaquer é um dos muitos casos de prefeituráveis desconhecidos na região.
Não há explicação que convença alguém minimamente dotado de cérebro que um concorrente desconhecidíssimo registre tanta ojeriza do eleitorado, acima inclusive dos 33,1% do petista Carlos Grana, e um pouco abaixo do pedetista Raimundo Salles, com 44,5%. Também Marcelo Reina, igualmente anônimo, recebeu 26,3% de rejeição do eleitorado de Santo André. Mais que os 25,4% do peemedebista Nilson Bonome, muito mais público e por isso mesmo sujeito a restrições e encantos.
Exemplifico o disparate do quesito rejeição
Se for dada credibilidade à pesquisa do Diário do Grande ABC no critério de rejeição, o prefeito Aidan Ravin já pode pegar a viola e botar no saco, porque não teria possibilidade alguma de vitória. Afinal, somaria 53,1% de descarte, muito acima, portanto, dos 50% mais um voto para se eleger em primeiro ou em segundo turno. Isto quer dizer o seguinte: que a liderança de Aidan Ravin na pesquisa estimulada, com 32,5% ante 20,4% de Carlos Grana e 17,8% de Raimundo Salles, não passa de perda de tempo. É possível sim que o nível de rejeição do eleitorado a Aidan Ravin seja alto, mas não há segurança alguma em afirmar que seja tanto, dadas as razões já expostas. Fosse a pergunta bem formulada ("Em quem o entrevistado não votaria de jeito nenhum") estaria tudo mais bem encaminhado.
Também o grande universo do eleitorado que não soube responder de forma espontânea em quem votaria nas próximas eleições e que, sob estímulo, disparou definições avaliativas, não dá suporte à análise mais ajuizada de cada Administrador Municipal que ocupa os respectivos paços municipais. Sobretudo porque a formulação do questionário não definiu valoração do conceito de "regular".
Hermetismo demais
Como é possível garantir, por exemplo, que o prefeito Oswaldo Dias, em Mauá, que, entre "ótimo" e "bom", registrou 22,1% dos votos, não alcançou marca mais aceitável se outros 30,8% afirmaram que seu mandato é regular? Quem diz "regular" tanto pode ser no sentido de aprovação como de reprovação. Uma variante de "regular positivo" e "regular negativo", que alguns institutos de pesquisa adotam, resolveria a questão. Ou, melhor ainda, uma pergunta simples e também adotada em entrevistas eleitorais ("Que nota de zero a 10 o entrevistado mais se ajusta ao prefeito") acabaria com o problema. É assim que o DataFolha faz. Para que inventar?
Ainda sobre esse aspecto da pesquisa, os números do prefeito José Auricchio Júnior,
Vou escrever amanhã sobre os resultados numéricos de cada Município tanto na pesquisa espontânea quanto estimulada. Me sinto bastante inseguro também nesse campo, pelas razões já expostas. Aos candidatos que saíram atrás, um sopro de esperança por conta das deficiências de sondagens tão distantes de definições do eleitorado: em 2008, as pesquisas do Ibope para o Diário do Grande ABC apontaram, na primeira rodada em 20 de julho, três líderes que não suportaram a corrida ao pote de ouro. Orlando Morando, Vanderlei Siraque e José Augusto da Silva Ramos viraram cavalos paraguaios. Quantos cavalos paraguaios teremos agora, afinal?
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