Política

Diário do Grande ABC erra demais
nas pesquisas eleitorais na Província

DANIEL LIMA - 09/10/2012

Se o instituto que o Diário do Grande ABC diz ter montado para produzir pesquisas eleitorais nesta temporada fosse uma competição de tiro ao pombo, praticamente todos os pombos estariam leves e soltos, a comemorar a liberdade, a festejar a vida. Numa empreitada voluntarista, que a bem da informação não pode passar em branco, o DGABC Instituto fracassou bombasticamente. Nem mesmo a elasticidade do conceito de margem de erro para cima e para baixo que institutos mais tradicionais e preparados utilizam para evitar vexames públicos salvaria os dados do Diário do Grande ABC. 


 


Não duvido que o jornal faça uma apologia dos resultados que supostamente previu, porque a mídia, de maneira geral, não necessariamente a mídia provinciana, como é o caso do Diário do Grande ABC e da quase totalidade das publicações regionais, adora levar no bico o público consumidor de informação. Mas nada, convenhamos, resiste à análise fria e isenta dos números.


 


Com muito boa vontade, os resultados publicados pelo Diário do Grande ABC na véspera da votação – edição de sábado –apontam que apenas cinco dos 14 números individuais dos candidatos mais competitivos registraram desvios que não ultrapassaram a margem de erro simples de três pontos percentuais. Outros três concorrentes superaram moderadamente a previsão do Diário enquanto os demais, seis no total, ou seja, quase a metade dos candidatos para valer, registraram nas urnas reais números muito diferentes dos antecipados pelo jornal.


 


Quando se passa a outro componente de análise, dos resultados propriamente ditos entre os principais competidores em cada um dos municípios da Província do Grande ABC, apenas São Bernardo e Rio Grande da Serra não superaram a margem de erro. Nos demais, houve discrepâncias impressionantes.


 


A conclusão a que chego e pela qual deveria ser remunerado pelo jornal porque estou a fazer o papel de ombudsman sem ter acertado os ponteiros financeiros é que o Diário do Grande ABC precisa repensar a estrutura do instituto que criou, se instituto houver de fato porque o suposto departamento de estudos e análises é tão secreto que o próprio jornal jamais e em tempo algum ousou produzir uma mísera matéria sequer para explicar quem é responsável pelo trabalho, quantos profissionais atuam na retaguarda e no campo de trabalho externo, entre outras informações relevantes porque lida com um bem precioso. Ou as pesquisas de opinião viraram uma terra de ninguém, como muitos estão a desconfiar, a industrializar institutos em períodos eleitorais como pães quentes no final da tarde?


 


Embaraços individuais 


 


Vamos então aos números individuais, sempre tratando os candidatos sob o conceito de voto válido, ou seja, desconsiderando os votos nulos, os votos em branco e também as abstenções.


 


Quem ficou individualmente dentro de um enquadramento de semelhança entre as pesquisas publicadas pelo Diário do Grande ABC e a realidade das urnas foram Aidan Ravin, Luiz Marinho, Alex Manente, Gabriel Maranhão e Claudinho da Geladeira. Nenhum deles superou a três pontos percentuais da banda de margem de erro simples, para cima ou para baixo.


 


No caso de Aidan Ravin, prefeito de Santo André, a pesquisa publicada pelo Diário do Grande ABC na edição de sábado, véspera da eleição, apontava para 40,13% dos votos válidos, 2,90 ponto percentual acima dos 37,23% das urnas. Já quanto a Luiz Marinho, prefeito reeleito em São Bernardo, a diferença foi de exato um ponto percentual: na pesquisa do Diário o petista apareceu com 64,79% e no dia seguinte, nas urnas, deu 65,79%. Alex Manente, derrotado por Marinho, ficou 1,57 ponto percentual acima das urnas: o Diário lhe atribuiu 32,51% dos votos e o jovem deputado alcançou 30,94%. Gabriel Maranhão, eleito prefeito de Rio Grande da Serra com 60,60% dos votos válidos, alcançou na pesquisa do Diário 58,90%; portanto, 1,70 ponto percentual acima do captado pelos pesquisadores. Completando o quadro de acertos do DGABC Instituto, Claudinho da Geladeira, petista que perdeu a disputa em Rio Grande da Serra, registrou 37,04% dos votos nas urnas, ante 37, 60% do Diário. Uma diferença pífia de menos 0,56 ponto percentual nas urnas.


 


Dois dos três casos de resultados individuais de números levemente fora da margem de erro envolvem os candidatos finalistas do segundo turno em Diadema. O prefeito Mário Reali contava com 50,31% dos votos nas pesquisas do Diário do Grande ABC (o que o colocava, portanto, com um pé na reeleição) mas nas urnas reais caiu para 46,75%. Uma diferença, para menos, de 3,56 pontos percentuais. O adversário do petista, Lauro Michels, chegou a 38,45% na pesquisa do Diário, ante 41,92% nas urnas. Diferença de 3.47 pontos percentuais pró-realidade. O terceiro caso é do petista Carlos Grana, em Santo André: mais bem votado ao Paço Municipal, Grana receberia, segundo o Diário, 39,60% dos votos, mas as urnas lhe deram 42,85%. Diferença de 3,25 pontos percentuais.


 


Agora vejam os casos de discrepâncias numéricas individuais relativamente acentuadas e bastante acentuadas. O candidato eleito em São Caetano, Paulo Pinheiro, obteve nas urnas 6,00 pontos percentuais a mais de votos indicados pela pesquisa do Diário do Grande ABC às vésperas da disputa: ele teria 57,35% dos votos, mas chegou a 63,35%. Adversária de Paulo Pinheiro, Regina Maura Zetone obteve nas urnas menos votos do que nas pesquisas do Diário: o jornal anunciou que ela teria 40,69%, mas houve queda para 34,81%. Diferença de 5,88 pontos percentuais.


 


Três casos individuais se situam em algo que poderia ser rotulado de desvios impressionantes dos números do Diário do Grande ABC em relação à verdade das urnas. Vanessa Damo obteve 11,22 pontos percentuais de votos a menos do que o traçado pelo Diário: de 45,12% das planilhas dos entrevistadores do jornal, caiu para 33,90% nas urnas. Com o adversário de Vanessa, Donisete Braga, emergiram números graves em termos de distorção, porque foram para menos: enquanto o Diário lhe dava no sábado 31,71% dos votos válidos, no domingo os eleitores o colocaram em primeiro lugar com 38,34%. Diferença de 6,63 pontos percentuais. Um pouco mais que isso são os números de Maria Inês Soares, candidata petista derrotada em Ribeirão Pires: ela registrou 27,61% dos votos válidos na pesquisa do Diário do Grande ABC e chegou a 36,85% no dia de votação. Diferença de 9,24 pontos percentuais.


 


Completando o circo de horrores individuais, o caso mais grave no enfrentamento entre as pesquisas do Diário do Grande ABC e o comportamento do eleitorado, Saulo Benevides, eleito prefeito em Ribeirão Pires, obteve nas urnas 14,55 pontos percentuais acima do apontado nas pesquisas: de 43,76% previstos pelo jornal, alcançou 58,31% junto ao eleitorado.


 


Complicações agregadas


 


Dos sete embates municipais, de números agregados, apenas em duas localidades as pesquisas do Diário do Grande ABC não escorregaram na casca de banana da imprecisão fora da margem de erro suportável.


 


O primeiro caso envolve Luiz Marinho e Alex Manente, em São Bernardo. A pesquisa do jornal indicava vitória de Marinho por 64,79% a 32,51%, ou seja, uma diferença de 32,28 pontos percentuais. As urnas ficaram próximas: diferença de 33,28 pontos percentuais, resultado da superioridade de Luiz Marinho por 65,79% a 32,51%. Em Rio Grande da Serra deu-se algo semelhante: o Diário apontou vitória de Gabriel Maranhão por 20,70 pontos percentuais de vantagem (57,22% a 36,52%), enquanto as urnas concluíram por 23,58 pontos percentuais (60,60% a 37,04%).


 


Nas outras cinco praças regionais o Diário do Grande ABC entrou em conflito com o eleitorado. Em Santo André, apontou o jornal que Aidan Ravin contava com vantagem de 0,53 ponto percentual dos votos válidos, diferença entre 40,13% a 39,60% ante Carlos Grana. Como o petista chegou à frente com 5,62 pontos percentuais de vantagem, a diferença foi esticada para 6,15 pontos percentuais (os 5,62 pontos percentuais das urnas mais os 0,53 da pesquisa do Diário). Grana alcançou nas urnas 42,85% dos votos, ante 37,23% de Aidan Ravin.


 


Em Diadema, a pesquisa do Diário do Grande ABC apontou que Mário Reali obteria 50,31% dos votos válidos, contra 38,45% de Lauro Michels. Diferença de 11,86 pontos percentuais que caiu, na materialidade das urnas, para 4,83 pontos percentuais, ou seja, 7,03 pontos percentuais de baixa. O resultado real em Diadema foi 46,75% a 41,92% para Mário Reali.


 


Em Mauá, os números foram mais robustos, porque a pesquisa do Diário do Grande ABC apontou que Vanessa Damo teria 45,11% dos votos válidos ante 31,39% de Donisete Braga. Um dia depois, urnas abertas, urnas fechadas, Donisete Braga liderou a eleição com 38,34% ante 33,90% da peemedebista. Uma diferença de 17.47 pontos – os 13,72 pontos percentuais favoráveis à Vanessa na pesquisa do Diário mais os 4,44 pontos percentuais favoráveis a Donisete Braga na vida real.


 


Completando os votos agregados, em Ribeirão Pires apontava a pesquisa do Diário do Grande ABC que Saulo Benevides ganharia a disputa por 16,15 pontos percentuais de vantagem, fruto de 43,76% dos votos válidos ante 27,61% de Maria Inês Soares. Nas urnas, a diferença subiu para 21,46 pontos percentuais, já que Saulo Benevides carimbou 58,31% ante 36,85% de Maria Inês. Uma diferença de 5,31 pontos percentuais entre a pesquisa e as urnas. 


 


Quase tudo que produzimos neste texto poderá ser contraditado pela estupidez de quem coloca a margem de erro de três pontos para cima ou para baixo como dispositivo de segurança a contrariedades nas urnas. Como já expliquei em outros trabalhos, essa tal margem malandra permite e incentiva que até 12 pontos percentuais de diferença sejam manipulados dentro da argumentação de que os resultados estavam previstos. Uma grande besteira, feita sob medida para quem faz de pesquisas eleitorais um instrumento de marketing de resultados mais que manjados.


 


Convém ressaltar, apenas a título explicativo, porque até gente graduadíssima em matemática faz confusão: pontos percentuais são uma coisa, percentagem é outra coisa. Exemplo: a diferença entre a pesquisa do Diário do Grande ABC e as urnas reais em Santo André apontou um fosso de 6,15 pontos percentuais favorável a Carlos Grana, do PT. Percentualmente, a diferença entre o que foi projetado pelo Diário (0,13% pró Aidan) e o que responderam as urnas (13,11% pró- Grana) significa que o candidato petista superou o petebista em 13,24% em relação à pesquisa do Diário. Ou seja: nesse caso, 6,2 pontos percentuais são 13,24%. No caso de Mauá, Donisete Braga eliminou uma diferença da pesquisa do jornal de 29,72% favorável a Vanessa Damo e estabeleceu uma vantagem real de 11,58%. Somando-se a desvantagem estatística à vantagem real, chega-se a uma diferença de 41,30%. Que vem a ser, no caso, os tais 17,47 pontos percentuais a separar os dois finalistas da corrida ao Paço Municipal, sempre tendo como suporte a contabilidade do Diário frente às urnas. É um buraco profundo demais. Haja margem de erro de paciência.


 


Gato por lebre


 


Este texto já havia sido redigido quando recebo o exemplar desta terça-feira do Diário do Grande ABC que, sem surpreender quem conhece o provincianismo regional, estampa em manchete principal de uma das páginas da Editoria de Política: “DGABC Pesquisas perto do TSE”. O material é revestido de ampla embromação e meias verdades, quando não de mentiras inteiras, a culminar com declaração patética do diretor de Redação do jornal, Sérgio Vieira. “Demos importante passo ao criar instituto de pesquisa, que já no primeiro teste acertou a grande maioria dos resultados. Isso reforça a credibilidade do Diário e nos dá força para realizarmos o mesmo trabalho no segundo turno”.


 


É muito provável que o jovem jornalista não entenda bulhufas de pesquisa eleitoral e pratique em relação à presidência daquele veículo de comunicação um ritual ao qual jamais me submeti naquele cargo durante período suficiente para manter o compromisso de honrar a confiança do distinto público consumidor de informação. Não foi, aliás, por outra razão, que criamos e deixamos de legado, entre tantos trabalhos, um Conselho Editorial com 101 representantes da chamada sociedade civil, colocando-os para nos fiscalizar em reuniões de pauta. Tudo não passou de grande desperdício: a instância de representatividade social foi desativada logo após trocarem minha cabeça por favores judiciais. 


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