Administração Pública

É muito fácil para Carlos Grana
sagrar-se bom administrador

DANIEL LIMA - 31/10/2012

Isso mesmo, é muito fácil para o prefeito eleito em Santo André, Carlos Grana, entrar para a história como administrador público valorizado pela população. Basta não repetir a mediocridade dos antecessores, o petista João Avamileno e o petebista Aidan Ravin. Santo André está há 11 anos seguidos, desde a morte de Celso Daniel em janeiro de 2002, entregue às baratas do gerenciamento público de qualidade. O esvaziamento foi gradual, doloroso e irritante. Chegou ao fundo do poço no ritmo de atomização do legado de Celso Daniel. O cavalo passa arreado para Carlos Grana. É preciso errar demais para perder a oportunidade que se lhe apresenta. Por isso é importante ter muito mais que calma nessas horas. É preciso ter informações confiáveis, dentro e fora do conglomerado de partidos que o tornaram competitivo eleitoralmente.


 


Nas primeiras declarações de Carlos Grana como prefeito iminente de Santo André, alguns pontos chamaram a atenção e merecem análise porque podem ditar o rumo inicial da Administração de Santo André a partir de janeiro.


 


Carlos Grana precisa entender que, ao se referir à “sociedade organizada” de Santo André como ponto preferencial de preocupações e encaminhamento de medidas, dirige-se a algo como Saci-Pererê, entre tantas outras abstrações. Sociedade organizada não existe em Santo André ou em qualquer dos municípios locais. Somos uma sociedade encabrestada, aquela porção de gente sob monitoramento compensador ou coercitivo de algum coronel setorial.


 


A comunidade como um todo, aquela sobre a qual qualquer estudioso, sociólogo, antropólogo, se refere como instância de interlocução e de sensibilização, está morta e enterrada há muito tempo. Tocá-la e ressuscitá-la compõem um exercício árduo, que deve ser iniciado sim, mas não seria sob o domínio dos coronéis, porque estes querem continuar a nadar de braçadas na aproximação sempre pecaminosa com instâncias públicas. Seria Carlos Grana suscetível a esses prevaricadores? Novos escândalos seriam escamoteados como contrapartidas de privilégios?


 


Coalizão social


 


A recomposição do tecido sócio-participativo da população de Santo André vai depender muito do ambiente emanado do Paço Municipal. As obras físicas que certamente virão em caudalosos investimentos do governo federal, implementadas na petista São Bernardo, só significarão intersecção com a sociedade se Carlos Grana não cair na bestagem de Luiz Marinho. Que bestagem? De privilegiar a periferia e, principalmente, de impor uma marca de sindicalismo ante uma classe média por demais desconfiada e, comprovou-se nas urnas eleitorais, avessa às mensagens petistas.


 


Carlos Grana deve, portanto, instaurar um governo de coalizão social em Santo André, com algumas vitrines que necessariamente não precisam ser retumbantes, porque pontuais, mas consistentes, porque duradouras. O replanejamento de Santo André como endereço econômico inserido numa região desprestigiadíssima como ponto de investimentos produtivos é um desafio e tanto. Primeiro porque é indispensável. Segundo porque é insuficiente, já que a regionalidade está presente na maioria dos estudos e das ações que se fazem urgentes para retirar esse território de 840 quilômetros quadrados da desconfiança e da frieza capitalistas. Não fossem as montadoras de veículos, estaríamos zerados em inversões de capital da indústria de transformação.


 


Também saltou das entrevistas de Carlos Grana um triunfalismo tão consistente quanto bolha de sabão. Não fica bem para o prefeito eleito afirmar que Santo André é um celeiro de craques administrativos, exportados para a cúpula dirigente do País. Ele citou o exército formado pelos ministros Gilberto Carvalho e Miriam Belchior. Excedeu-se. Gilberto Carvalho é tão legitimamente formado nas bases andreenses quanto Neymar no Centro de Treinamentos do Corinthians. Miriam Belchior sim é da casa e, graças a uma combinação de fatores, principalmente à vitória de Lula da Silva em 2002, bateu asas rumo à Capital Federal. Um salto ditado pela política. Fossem outras as circunstâncias, continuaria a ex-secretária de Celso Daniel por aqui, por mais competente que seja. A ausência de outros nomes locais em Brasília, em postos de relevância, é muito mais expressiva. Miriam Belchior é uma exceção que Carlos Grana pretende tornar regra com um discurso efusivo mas sem fundamentos. A autoestima de Santo André não será restaurada com falsas mensagens. 


 


Tomara que não seja esse o tom da Administração que se iniciará em 1º de janeiro. Não há nada pior para uma gestão pública que a fanfarronice verbal, a criar falsas expectativas. Comedimento é a palavra-chave para convencer as forças mais equilibradas. Santo André é um presente de grego para quem se mete na vida pública, principalmente depois da morte de Celso Daniel. A comparação será inevitável. Fosse conselheiro de Carlos Grana, procuraria orientá-lo a buscar no legado daquele administrador a origem de uma ação coordenada para retirar Santo André da mediocridade dos últimos 11 anos.


 


A medida, porém, precisa de digitais próprias do prefeito eleito. Contraditoriamente, buscar inspiração em Celso Daniel não significa manter Celso Daniel como fantasma a comparações inevitavelmente desvantajosas. Iniciativas precisam ser adequadas aos novos tempos. Um exemplo: Santo André Cidade Futuro, programa voltado para o ano 2020 que Celso Daniel discutiu com representações da sociedade, não tem mais razão de ser, porque Santo André já perdeu a corrida contra o tempo. É melhor esticar o calendário por mais uma década, porque uma década já foi perdida. Tanto quanto o encaixe técnico e social de muitos dos programas aprovados.


 


Em resumo, Carlos Grana tem tudo para iniciar uma nova fase de Santo André voltada ao futuro. Sem perda de tempo, porque o presente perdido e sacrificado já não permite procrastinações.


 


Secretariado sem CEP


 


O anúncio do prefeito eleito de que pretende montar o secretariado com gente da cidade contrapõe-se à filosofia que norteou a formação do governo de Luiz Marinho, em São Bernardo, inicialmente voltada a algumas estrelas lotadas principalmente na Capital. Carlos Grana mostra com isso, se confirmado, que não atrelará a Administração à maior expressão política do PT na Província do Grande ABC, igualmente da linhagem sindicalista mais próxima do ex-presidente Lula da Silva.


 


Não há pecado algum em montar equipe de governo com gente de fora, como os clichês jornalísticos ortodoxos sugerem. Tampouco é o extremo da virtuosidade convocar apenas gente da cidade. Competência não tem endereço. Um bom administrador público só precisa entender que há pastas mais apropriadas ao conhecimento local, à vivência local, ao profissional enraizado no Município, assim como há pastas que prescindem de qualquer imposição do Código de Endereçamento Postal. Espera-se que Carlos Grana no afã de contemplar gregos e troianos locais, ou seja, a coalizão diversificadíssima de apoiadores políticos, não coloque a lealdade e a gratidão acima da inteligência e da urgência.


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