Caso Celso Daniel

Recomeça o festival de bobagens
que assola o caso Celso Daniel

DANIEL LIMA - 08/11/2012

Articulistas de jornais e de mídias digitais, deputados, senadores e tudo o mais que se jogaram nas águas do caso Celso Daniel, agora estimulados pelas ondas do depoimento do publicitário Marcos Valério ao procurador-geral da República, seguem a mesma cartilha dos antecessores, quando não se repetem: usam e abusam de interpretações equivocadas sobre as investigações policiais e do Ministério Público para sustentar argumentos que dariam veracidade às versões de um dos homens-chave do mensalão julgado pelo Supremo Tribunal Federal.


 


Gente graúda da imprensa, gente que sempre pareceu equilibrada e cautelosa, joga-se nas águas da especulação geralmente canalizada por informações que repousam na Internet e estão à mão a uma simples busca. A preguiça associada ao vezo partidário, quando não ideológico, move a todos.


 


Não pretendo gastar tempo e espaço mesmo que virtual para citar novos incursionistas no caso Celso Daniel. Tampouco às figurinhas carimbadas de sempre. Basta surgir uma oportunidade – e Marcos Valério parece ser muito mais que isso – para esse esquadrão manifestar-se em coro organizado. Pouco interessa um ângulo ainda não abordado sobre uma reviravolta no processo, ante a possibilidade de Marcos Valério estar a dizer a verdade quando se refere à suposta chantagem do empresário Ronan Maria Pinto ao então presidente Lula da Silva e ao então e ainda ministro Gilberto Carvalho sobre a existência de propinas na Prefeitura de Santo André durante o período de Celso Daniel. Que reviravolta? Ora, se a verdade for tudo ou parte que Valério disse ou tem a dizer, certamente será fortalecida a conclusão da Polícia Civil.


 


Foram três inquéritos que movimentaram mais de 30 policiais de áreas múltiplas e que concluíram pela inexistência de conexão entre o sequestro seguido de morte do então prefeito de Santo André e as divulgadas irregularidades na Administração Municipal. A participação de Sérgio Gomes da Silva na ação criminal foi apenas uma estratégia do governo do Estado, Geraldo Alckmin, para dar o troco à politização do incidente pelos petistas.


 


Não teria sentido o empresário Ronan Maria Pinto chantagear o Palácio do Planalto nos meses seguintes ao assassinato de Celso Daniel se estivesse envolvido no crime, como cansou de anunciar os promotores criminais naquele período, colocando-o como um dos suspeitos na operação. Por isso, repito: as eventuais provas de Marcos Valério sobre a atuação de Ronan Maria Pinto serão a consagração da inocência de Sérgio Gomes mais que comprovada pelas forças policiais que atuaram no caso.


 


Evidências esquecidas


 


Por mais que existam evidências e provas que interditam a conexão entre as várias mortes e o assassinato de Celso Daniel, não faltam jornalistas renomados que compraram, entre outras, a bobagem de que o legista Carlos Delmonte teria sido executado porque saberia demais. Todos embarcam na tolice propagada por gente que não faz outra coisa senão criar fantasias, embora o façam com ares de sabedoria a ponto de tripudiar sobre relatos fundamentados.


 


Quem se der o trabalho de consultar arquivos do jornal O Estado de São Paulo (e há texto sobre isso nesta revista digital) vai verificar a publicação de uma reportagem que abordava o estado emocional do médico legista ante um contratempo amoroso, afastado que fora do convívio com a mulher. Uma espécie de carta suicida escrita poucos dias antes não deixa dúvida sobre a premeditação do ato, como apurou detalhadamente a Polícia Civil da Capital. Mas é muito mais verossímil, ante o cinematográfico enredo que se criou sobre a morte de Celso Daniel, acreditar em fofocas do que em fatos. Jornalistas experientes, mas notoriamente partidários e ideológicos, quando não loucos por audiência, mobilizam-se freneticamente em busca de novas adesões. Como se fosse necessário, porque a criminalização de Sérgio Gomes da Silva se consumou também fora da manifestação do Ministério Público ao Judiciário, tanto se monopolizou a opinião pública num massacre informativo de mão única.


 


Colecionador disciplinado de tudo que se refere ao caso Celso Daniel, entre outros motivos porque produzi ao longo dos anos o maior estoque de informações sobre o assunto, acompanho atentamente aquele acontecimento e os rescaldos políticos, criminais e jurídicos. Agora que Marcos Valério está na praça a revolver o passado, o provável é que teremos caudalosos capítulos a corar dramaturgos de plantão. Mas isso é ótimo, porque as tentativas de petistas desclassificarem o publicitário são tão estúpidas quanto pronunciamentos e textos que entendem estarem a caminho as provas que faltariam para desmentir as apurações policiais, corroborando portanto com o veredito dos promotores criminais.


 


Ainda sob a condicionalidade de que Marcos Valério sabe mesmo muita coisa sobre o suposto núcleo industrializador de receitas paralelas na Administração Celso Daniel, vai ser ótimo vir à tona aspectos que conflitariam totalmente com a versão do Ministério Público de assassinato de encomenda, resultado esse de investigações duramente combatidas por lideranças das forças policiais que ao longo de operações meticulosas, inclusive com suporte de agentes da Polícia Federal, refutaram qualquer conclusão que juntasse crime e desvios de recursos públicos.


 


Há articulistas de jornais irredutíveis no sentenciamento de que Celso Daniel foi assassinado a mando de Sérgio Gomes da Silva e que seus irmãos são a fina flor da sinceridade, da idoneidade moral e da retidão ética. Pobres deles que ainda não entenderam e jamais entenderão, porque amadores nessa tarefa, que quanto mais se aprofundarem as investigações sobre o mensalão, mais o homem apontado como mandante do crime vai se cristalizar como segunda principal vítima do caso.


 


Inocência desprezada?


 


Resta saber se interessa aos petistas e aliados trocar a inocência de Sérgio Gomes da Silva pela culpabilidade de figuras muito mais importantes no cenário político nacional. Quem garante que a iniciativa de Marcos Valério não demandaria uma operação abafa patrocinada não só pelos interesses de petistas mas também por opositores, embora estes se manifestem publicamente como agentes decididos à moralização da cultura política verde-amarela?


 


Traduzindo: não se estaria organizando um segundo golpe contra o homem que teve a infelicidade de estar com Celso Daniel na hora e no lugar errados naquela noite de 18 de janeiro, a reproduzir a condição de massa de manobra de forças muito mais poderosas nesse teatro de operações que os especialistas chamam de política? 


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