Administração Pública

Qual será o futuro
desse principado?

DANIEL LIMA, MALU MARCOCCIA E VERA GUAZZELLI - 05/03/2003

O temário pode não ser exatamente agradável para quem prefere comemorar merecidamente o presente do que acautelar-se sobre o futuro, mas não deve ser desprezado: qual é o destino que espera por São Caetano, esse oásis da Região Metropolitana de São Paulo condecorado por instituições prestigiadíssimas como campeã nacional do que poderia ser resumido como qualidade de vida?


 




Será que São Caetano conseguirá resistir indefinidamente às perdas econômicas tão evidentes quanto a desindustrialização escamoteada nas fotos aéreas transformadas em cartões postais estrategicamente colocados no hall de entrada do Paço Municipal?


 




Mesmo portadora de chagas prediais provocadas pela evasão industrial, São Caetano é urbanisticamente equilibrada nas poderosas lentes fotográficas que documentam uma obra coletiva de mais de um século. Mas o que será desse paraíso urbano incrustado na geoeconomia tão sofrida da Grande São Paulo? Será possível manter a blindagem externa que sofre fortes ataques na área de saúde e exige complexa engenharia no setor de segurança pública?  


 




O prefeito Luiz Tortorello garante uma São Caetano indestrutível nos próximos 10 anos se seu grupo político estiver no poder. Detentor de estado de confiança que beira a auto-suficiência, o prefeito em terceira gestão e há 10 anos no controle do Paço Municipal não se faz de rogado. Considera São Caetano um principado encravado num País complexo e mal administrado, densamente ocupado por excluídos e discriminador tributário dos municípios.


 




Civilização de Primeiro Mundo


 




Tortorello fala com eloquência dos 10 anos em que mantém o poder sob absoluto controle, administrado nos mínimos detalhes. Enquetes frequentes tomam o pulso de satisfação dos 140 mil moradores. São Caetano chega ao luxo de, segundo o próprio prefeito, exigir medidas para o recolhimento de fezes de cães companheiros de caminhadas diárias de donas-de-casa, aposentados e jovens que desafiam a correria das metrópoles mantendo ares de cidade interiorana a poucos quilômetros da paulicéia desvairada. É um estágio do que se convencionou chamar de civilização de Primeiro Mundo.


 




Entretanto, o bom humor e o prazer de falar de São Caetano que o prefeito saboreia como quem degusta um vinho francês ou italiano esfarelam-se e toma forma de irritabilidade quando contestado numa área em que demonstra pouca habilidade como interlocutor -- o comportamento econômico do Município.


 




Está na abalada economia o núcleo de conjecturas para diagnosticar preventivamente a São Caetano que a Grande São Paulo terá por volta do ano 2020. Ou existe alguma fórmula mágica de manter serviços públicos cada vez mais minuciosamente exigidos pela população mais bairrista da região sem a contrapartida de receitas orçamentárias no mínimo estabilizadas?


 


Para o prefeito do Principado de São Caetano, território de 15 quilômetros quadrados que imigrantes italianos e espanhóis, principalmente, começaram a esculpir na virada do século 20, não há absolutamente nada que possa provocar mudança de rota na eficiência administrativa nos próximos 10 anos. Mas ressalva, com entonação grave de quem aparentemente não confia nos opositores: "Desde que meu grupo político mantenha-se no gerenciamento público".


 




Entretanto, não é exatamente esse cenário cor-de-rosa que São Caetano tem revelado no passado recente, por mais contraditório que isso possa parecer, já que foram os últimos anos um período de láureas nacionais e internacionais. Os números indicam que o principado não pode se descuidar sob pena de ver encerrado o espetáculo do bem-bom urbanístico. 



 


Falta projeto econõmico


 



Por melhores que sejam as vantagens comparativas em qualidade de vida sobrepostas ao longo de décadas, estão se esvaindo as vantagens competitivas sobre as quais incidem fundamentos econômicos. Falta a São Caetano -- como aos demais municípios do Grande ABC igual ou menos atingidos pela desindustrialização -- um projeto econômico consistente que possa mudar os rumos de embicamento dos indicadores de competitividade.


 




Essa é a pedra no sapato que, do alto da euforia do reconhecimento nacional e internacional, São Caetano nem sempre admite. A indústria se foi em larga escala de São Caetano. O que se tem em seu lugar? Esforços da Casa do Mercosul não podem ser minimizados, mas os resultados vêm a conta gotas até porque a estrutura do departamento é modesta.


 




O Conselho de Desenvolvimento Econômico comandado pelo estelar André Beer também demora para colocar a locomotiva da competitividade nos trilhos e conduz, no desespero de apresentar resultados, uma inclinação triunfalista do vice-presidente Fausto Cestari. Recentemente, ele conseguiu enxergar recuperação econômica onde a exaustão industrial é explícita: substituiu-se a desertora Confab, que chegou a empregar 800 trabalhadores, pela Comercial Gerdau, com meia centena de colaboradores.


 




Poucos municípios paulistas acusaram tanta sangria orçamentária como São Caetano nos últimos seis anos -- a contar da vitória dos prefeitos em 1996 e reeleitos em 2000, caso de Luiz Tortorello. No Grande ABC, o principado de Luiz Tortorello é o que registra maiores perdas.


 




Tortorello contesta a informação, mas não dispõe de dados oficiais que sustentem a paixão que tem por São Caetano. Pelo contrário: a exposição de números que destoam de seu discurso o contraria. Um comportamento que dá força à massificação do conceito de que o temperamento do prefeito não resiste ao contraditório fundamentado.  



 


Batata quente coletiva


 




Nesse caso específico, o comportamento do prefeito é um exagero, porque a batata quente do esvaziamento econômico é semelhante em outros municípios da região e não pode ser debitada na conta específica de um único prefeito. É um processo histórico sobre o qual o conjunto de gerenciadores públicos falhou em não detectar alternativas. É isso o que se pretende para que São Caetano sustente o melhor programa continuado de gerenciamento político-administrativo da Região Metropolitana de São Paulo no século passado. Ou é possível negar que os títulos que Tortorello e sua equipe comemoram hoje têm também forte carga genética dos antecessores?


 




O ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) é indicador infalível da temperatura econômica dos municípios. E nesse ponto São Caetano submergiu. Entre 1997 e 2002, acusou perda acumulada de R$ 281,63 milhões de repasse de recursos pelo governo do Estado -- muito mais que a previsão orçamentária de R$ 205 milhões deste 2003. Para que esse cálculo seja entendido é preciso considerar a arrecadação do ICMS no ano base de 1997 -- R$ 83,26 milhões -- e aplicar, anualmente, a inflação do IGP-M do período pesquisado, descontando-se a diferença do efetivamente arrecadado. 


 


São Caetano caiu a cada temporada em relação à anterior, retroalimentando perdas até chegar a R$ 281,63 milhões. Numa comparação mais simples, ponta a ponta, os R$ 83,26 milhões arrecadados em 1997 corresponderiam a R$ 154,78 milhões com a aplicação do IGP-M, mas foi rebaixada a R$ 76,19 milhões no ano passado.


 




Para se ter idéia mais precisa do comportamento do ICMS de São Caetano no período, a divisão da perda acumulada pelo número de moradores significaria R$ 200,93 a menos por habitante em cinco anos deflacionados, ou R$ 40 per capita por ano. Muito mais que os R$ 4,17 anuais perdidos por morador em Santo André, os R$ 13,13 anuais de São Bernardo, os R$ 10,45 de Mauá, os R$ 7,80 de Ribeirão Pires, os R$ 8,35 de Rio Grande da Serra e os R$ 3,42 anuais de Diadema.


 




O ICMS é importante medidor da economia municipal porque espelha em larga escala a capacidade de geração de riqueza. O peso ponderado do Valor Adicionado na composição dos índices do ICMS, torneira que regula a distribuição do imposto arrecadado pelo governo do Estado, é fundamentalmente a capacidade de um município transformar matéria-prima e serviços em produtos. Se São Caetano despencou em produção industrial nesse período, em contraste com as conquistas de títulos de qualidade de vida, sinaliza-se claramente que em médio e longo prazo essa vitrine que causa inveja à vizinhança poderá sofrer estilhaços.



 


Almoço e jantar


 




É verdade que a administração de Luiz Tortorello a partir de janeiro de 1997 não ficou espiando a banda da retração econômica passar. Mas a puxada no freio macroeconômico do País depois que a estabilidade do real começou a desgastar-se fez mais estragos que a reação inventiva do prefeito. Tortorello chama de criatividade gerencial a guerra fiscal no setor de serviços de leasing, informática, consórcio e empresas de segurança, principalmente.


 




Ao seguir os passos tributários de Barueri, o caso mais emblemático de guerra fiscal de serviços na Grande São Paulo, São Caetano evitou que a catástrofe orçamentária fosse mais aguda. Afinal, ao perder ano a ano participação em números absolutos e relativos de receitas do ICMS, São Caetano recorreu aos dividendos de alíquotas rebaixadas na área de serviços para produzir ISS (Imposto Sobre Serviços).


 




Como os números não costumam mentir, um balanço ponta a ponta do perfil do ISS em São Caetano a partir de 1997 explica a destreza do prefeito de chutar o pau da barraca da sonhada integração regional que se pretendia também na área tributária. "Se eu não os almoçasse, eles me jantariam" -- afirma Tortorello, referindo-se aos demais prefeitos da região que anunciaram no início dos mandatos na segunda metade dos anos 1990 disposição de um grande acordo tributário na área de serviços.


 




Essa espécie de salve-se-quem-puder é tratada por Tortorello com o pragmatismo de quem sabe que receitas orçamentárias perdidas jamais serão recuperadas. "Tanto estava certo que depois todos os outros municípios fizeram a mesma coisa" -- completa o prefeito, generalizando uma prática regional de guerra fiscal em serviços que de fato apenas São Bernardo e mais tarde Rio Grande da Serra empreenderam de forma incisiva, inclusive internamente. A explicação para Tortorello ter agido individualmente é a proximidade com a sedutora Capital, que só no final do ano passado decidiu guerrear também, além de outros municípios da Grande São Paulo, convertidos à simplicidade arrecadatória.   


 




Em dezembro de 1997 São Caetano contabilizava R$ 14,20 milhões de receitas com ISS, valor que corrigido a dezembro do ano passado salta para R$ 26,39 milhões. A atualização monetária está aquém da arrecadação de 2002, que atingiu R$ 34,78 milhões, ou seja, 32% de crescimento real. A participação do ISS no conjunto de receitas diretas e indiretas de São Caetano cresceu de 8,65% em 1997 para 17,72% do bolo cinco anos depois. Um comportamento estatístico diametralmente inverso ao da participação das receitas do ICMS, que despencaram de 50,76% para 38,83% do orçamento municipal.



 


Mais imposto municipal


 



Não foi apenas o incremento do ISS turbinado pela guerra fiscal que impediu São Caetano de sofrer colapso orçamentário. Também o IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) foi impulsionado pelo gerenciamento realístico dos apertos de caixa. De R$ 7,11 milhões arrecadados em 1997, e que representavam 4,35% do total de receitas confirmadas de São Caetano, o IPTU passou para R$ 18,13 milhões em 2002, ou 17,72% do conjunto de receitas próprias e indiretas. Também em termos reais, descontada a inflação do período, os cofres de São Caetano ganharam volume com os aumentos do IPTU: os R$ 7,11 milhões de 1997 seriam R$ 13,21 milhões em 2002 com a aplicação do IGP-M. A diferença de R$ 4,92 milhões significa ganho real de 37%.


 




É fácil entender, portanto, o que o prefeito Luiz Tortorello quer dizer quando afirma que não depende de recursos federais e estaduais para administrar São Caetano. E nem por quê insiste em chamar de principado o território que administra com pulso forte e rigoroso controle de qualidade. Tortorello é contraditório nas afirmativas de que IPTU e ISS serão cada vez mais relevantes na readequação orçamentária de um Município que, como os demais, sofre com o centralismo tributário da União. Ele enfatiza a equação segundo a qual o peso dos impostos municipais será cada vez maior no bolo arrecadatório, mas nega que tenha aplicado a receita na cidade. Os números recolocam a questão no devido lugar: a soma de IPTU e ISS representava apenas 19,62% das receitas arrecadadas por São Caetano em 1997 e saltou para 26,97% cinco anos depois.


 




Trata-se de comportamento padrão dos administradores municipais pressionados pela Lei de Responsabilidade Fiscal, depois de estrangulados pelo estancamento dos ganhos inflacionários. Com o real relativamente estabilizado, as administrações públicas perderam o ganho suplementar de receitas garantidas pela corrosão da moeda desgastada nos débitos, mas preservadas nos créditos indexados. 


 




Se em dezembro do ano passado São Caetano estivesse a salvo das perdas econômicas registradas seguidamente desde 1997, a receita arrecadada, direta e indireta, teria atingido R$ 304,87 milhões, ou seja, os R$ 164 milhões da temporada de 1997 acrescidos inflacionariamente pelo IGP-M do período. Entretanto, o resultado foi muito abaixo do mínimo necessário, já que chegou a apenas R$ 196,2 milhões. Uma diferença de R$ 108,67 milhões na comparação ponta a ponta em cinco anos.


 




Informais multiplicados


 




Dá para imaginar o tamanho da encrenca orçamentária que o prefeito Luiz Tortorello teve e tem de gerenciar quando praticamente um terço das receitas deflacionadas desapareceram no ralo do esvaziamento econômico. O prefeito se esforça para colocar São Caetano num degrau acima do que os números apontam. Recorre à velha Itália que tão bem conhece como oriundi para exaltar o que chama de ramificação de empreendedores formais e informais no Município, em contra-ofensiva à perda de pequenas e grandes indústrias com milhares de empregos formais.


 




Estatísticas da Prefeitura divulgadas frequentemente dão conta de milhares de novos empreendedores no Município, mas essa contabilidade requer cautela porque o canibalismo grassa onde o volume de atividades comerciais e de serviços familiares convive com o refluxo do emprego e das riquezas industriais. Fosse diferente o impacto de pequenos negócios e inclusive de atividades informais que o prefeito acrescenta à lista de desdobramentos das transformações econômicas de São Caetano, os resultados apareceriam automaticamente nos registros do ICMS.


 




O fato é que Luiz Tortorello e sua equipe estão se tornando especialistas numa alquimia que, resultado da inelasticidade do desenvolvimento econômico local, se converterá em magias anunciadas -- arrumar frequentemente alternativas compensatórias de recomposição e realinhamento de receitas escassas para dar conta das demandas sociais crescentemente exigidas por quem nem de longe quer sofrer abalos na auto-estima de bater no peito e dizer que São Caetano, além do Azulão, tem os melhores indicadores socioeconômicos do Brasil. 


 



Nesse caso, o Pólo Tecnológico do Bairro Cerâmica, anunciado com pompa e circunstância há mais de dois anos, ainda não passou das primeiras movimentações de terra. Nem pensar que o prefeito de São Caetano veja algo no horizonte que não sejam dezenas de empresas de setores de tecnologia de ponta ocupando uma área nobre e gerando centenas de empregos. O problema todo é que um dos motes de incremento do espaço -- as vantagens fiscais na área de serviços -- foi abalado pela emenda constitucional que limita em 2% a alíquota mínima do ISS a partir deste ano.


 




Luiz Tortorello sentiu o golpe congressual. Afirma que o PT e o PSDB fizeram um troca-troca de vantagens, que consistiu na aprovação da renovação da CPMF pelo governo Fernando Henrique em contrapartida à quebra da espinha dorsal da guerra fiscal em serviços. Mas Luiz Tortorello não desiste: a emenda constitucional vale, em sua interpretação, apenas para investimentos a partir de janeiro de 2003, sem efeito retroativo sobre as alíquotas aprovadas anteriormente em São Caetano.


 




Projetos Zero


 




Se fomentar prosperidade econômica é um desafio e tanto para a diminuta São Caetano, garantir a estabilidade social é espécie de taça da qual o Poder Público não pretende tirar a mão. Mesmo com os alicerces econômicos abalados pela evasão de grandes indústrias e pelo restrito valor agregado, até agora, do setor terciário, não há indícios de que São Caetano vá baixar a guarda e pôr a pique índices paradisíacos que a instalam como Melhor Cidade em Qualidade de Vida do Brasil.


 




Na falta de receitas públicas próprias, a saída é buscar alianças na iniciativa privada para debelar alguns últimos pontos de estrangulamento do Município: os cortiços, que somam 702 moradias no universo de 52 mil imóveis cadastrados, vão ser reurbanizados em parceria com a ONG Soma e o analfabetismo, que atinge 0,7% da população de 140 mil moradores, está aos cuidados do Instituto Mauá de Tecnologia.


 




"Estatisticamente são problemas pequenos, mas preocupam" -- incomoda-se o prefeito Luiz Tortorello, que enche a voz ao dizer que São Caetano não tem contratempos diante do ebulitivo caldeirão socioeconômico da Região Metropolitana. "Uma das preocupações apontadas em pesquisa por 70% de nossa população é com o recolhimento de fezes de animais nas vias públicas" -- repete o dirigente público.


 




Se isso soa inacreditável, é porque é isso mesmo. São Caetano tem 100% de cobertura de rede de água e esgotos, 100% de crianças em creches e escolas, 63% de gestantes assistidas e quase metade da população está envolvida em alguma atividade esportiva -- o grande abre-alas da cidade, aliás, do qual o futebol da AD São Caetano é o maior expoente, seguido do hexacampeonato nos Jogos Abertos do Interior. A título de comparação, São Bernardo, a Capital econômica do Grande ABC, tem 97% de cobertura de água e 86% de rede de esgoto implantada. A população não-alfabetizada em São Bernardo soma 4,6% do total, enquanto 12,8% dos brasileiros não sabem ler nem escrever, conforme o Censo 2000.


 




Embora faça tempo que São Caetano é um fenômeno, está vivendo uma fase espetacular. Nos últimos dois anos só arrebatou prêmios superlativos: Melhor Cidade do Brasil pelo IDH (Índice de Desenvolvimento Humano da ONU), terceira melhor no atendimento à infância pelo IDI (Índice de Desenvolvimento Infantil da Unicef), primeiro Município em qualidade de vida pelo Atlas da Exclusão Social feito por USP, Unicamp e PUC, além de figurar entre as melhores gestões públicas no ranking do CFC (Conselho Federal de Contabilidade), que homenageia administrações em dia com a Lei de Responsabilidade Fiscal (aquela que manda prender o governante que gasta mais do que arrecada).


 




São Caetano também marcou época no Prêmio Desempenho de LivreMercado, ao arrebatar cinco estatuetas em 2001: o prefeito Tortorello foi eleito Destaque do Ano e Melhor do Ano como Empreendedor Esportivo, além de Personalidade do Ano no Grande ABC. A cidade também levou duas estatuetas de Destaque do Ano e Melhor das Melhores de 2001 com o case da Fundação Anne Sullivan, única instituição da América Latina para educação básica e profissionalizante de surdos e mudos. As conquistas são provas inapeláveis de que Tortorello acertou a mão quando priorizou educação, cultura e esportes. É sem dúvida o social que puxa a fama da cidade.


 




"Quero chegar a 31 de dezembro de 2004 com índice zero de analfabetos e cortiços" -- promete Luiz Tortorello para o final de seu terceiro mandato. Até lá, também estão nos planos debelar outras duas frentes que ainda borram a reputação primeiromundista da cidade: enchentes e rede de saúde sobrecarregada. O piscinão da Cerâmica São Caetano, que promete pôr fim ao flagelo das cheias na região do Ribeirão dos Meninos, está com as obras em licitação. E o Hospital Municipal, uma promessa da campanha de 1996 que deveria ser inaugurado em 1999, deve finalmente deixar os palanques. "Em meados deste ano concluiremos as obras e entregaremos mais 80 leitos à população" -- anuncia o prefeito. Se tudo correr como planeja, São Caetano passa a ofertar 150 leitos públicos. Hoje, dos 600 leitos hospitalares na cidade, só 70 são da rede pública e estão instalados no HM Infantil Márcia Braido.


 




"Como integramos o sistema universal de saúde e somos conveniados do Hospital Estadual de Santo André, nossa população está excepcionalmente assistida na área de saúde e de especialidades" -- garante o prefeito. Só no hospital de clínicas de Santo André, como é conhecido, 60 dos 350 leitos são de uso exclusivo de São Caetano.


 



Demanda externa


 


Tortorello rebate críticas sobre a demora no agendamento de consultas no Município e insiste que eventuais problemas na saúde se devem à demanda extra de moradores de Santo André, São Bernardo, Mauá e bairros vizinhos da Capital. Pelas contas da Prefeitura, São Caetano gastaria apenas R$ 1,5 milhão por mês com a saúde de sua população, mas a rubrica chega a R$ 4 milhões mensais com a procura de usuários de outras cidades.


 




A sobrecarga no sistema público é reflexo indiscutível do desemprego que assola o Grande ABC e da perda de convênios particulares. Para fazer frente a essa saia justa, São Caetano decidiu investir na saúde preventiva com dois propósitos: antecipar-se às políticas públicas da área e diminuir o volume de hospitalização. Implantado em 1998, o Programa de Internação Domiciliar atende pacientes em suas residências nas necessidades de curativos, medicação e consultas. Equipe com 16 profissionais entre médicos, enfermeiro, auxiliar e estagiários de fisioterapia, fonoaudiologia e serviço social dá assistência direta a 420 doentes cadastrados hoje, portadores de câncer, aids e doenças degenerativas, entre outras.


 




Desde o início dos trabalhos, o Médico da Família, como passou a ser chamado, atendeu 2,5 mil moradores, entre os quais Florinda Dias Pitareli, da Vila Santa Maria. Aos 84 anos, dona Florinda perdeu o movimento das pernas e o andador precisou ser substituído pela cadeira de rodas. Há quatro anos ela é atendida pelo programa e recebe inclusive medicamentos gratuitos. "Uma vez por mês o médico vem medir pressão, coração, passar orientações e acompanhar seu quadro. Se precisar podemos chamá-lo antes desse prazo, inclusive aos domingos, porque temos seu celular" -- elogia a filha Palmira, que se reveza com as irmãs Marlene e Maria nos cuidados com a mãe.


 




O pai Atílio também foi paciente do Programa de Internação Domiciliar durante quatro anos. Faleceu em outubro último, aos 88 anos. "Com a aposentadoria dele, não teríamos como custear o tratamento dos dois" -- comenta Palmira.


 




São Caetano também inova com o Projeto Censo Cadastro da Saúde, que o prefeito Tortorello garante ser caso único no Brasil. Um banco de dados informatizado está sendo montado com detalhes da saúde de cada morador -- desde doenças crônicas, vacinação infantil e problemas gerais das famílias. O objetivo é reforçar as políticas preventivas e subsidiar o cadastro nacional do SUS (Sistema Único de Saúde).


 


"Conheço todos os meus aidéticos, meus cardíacos e hipertensos e todos os que tenham qualquer tipo de deficiência" -- garante o prefeito Tortorello, preocupado com uma população que cresce aceleradamente rumo à Terceira Idade. São Caetano já contabiliza 32 mil aposentados, quase um quarto da população.



 


Desde o mês passado a área de saúde também ganhou a Central de Agendamento para Consultas. A agenda de todos os médicos das seis UBSs (Unidades Básicas de Saúde) passou a ser centralizada no novo organismo, o que permite marcar datas e locais conforme a disponibilidade e a moradia do paciente. Isso evita que ele se desloque desnecessariamente, planeja a Prefeitura. O Programa Saúde de Família, do Ministério da Saúde, é outra frente em implantação para trabalhar o conceito de medicina preventiva. Além do acompanhamento de um médico, um enfermeiro com auxiliar e um dentista, as famílias serão mapeadas por um perfil epidemiológico.


 




Habitações precárias


 




Pontuada por símbolos de modernidade como mais de 50% da população entre as classes A e B, um telefone para cada 1,86 habitante e 67% dos moradores com automóvel próprio, nem é tudo mágico em São Caetano. Não há favelas, mas os cortiços jogam água na fervura dos indicadores paradisíacos da cidade. São exatos 2.117 moradores e 702 cortiços, ou aglomerados precários de habitações coletivas, como são oficialmente nomeados.


 




É para tirar definitivamente essas habitações do mapa que São Caetano prepara parceria com a Soma (Sociedade Beneficente Mário Chekin), uma organização não-governamental ligada à Loja Maçônica Tijucussu que se incumbirá do financiamento e das obras de reurbanização desses locais. Segundo o assessor jurídico da Prefeitura, Antonio Gusman, como são investimentos sociais em áreas particulares, não há fins lucrativos e a ONG receberá o dinheiro de volta na forma de parte do aluguel pago ao proprietário, corrigido apenas pela indexação oficial. Conforme projeto de lei submetido à Câmara dos Vereadores, como se trata de habitação popular, no primeiro ano da nova moradia o aluguel estará congelado pelo valor antigo.




 


"O Poder Público se encarregou do cadastro das famílias, da parte documental e do projeto arquitetônico. No termo de parceria a Prefeitura entrará como interveniente (fiscalizadora) ao lado do inquilino, que terá assegurado o direito de voltar à nova moradia" -- explica o assessor jurídico, que calcula para início de abril próximo as primeiras intervenções. Os proprietários das áreas já estão sendo chamados. A idéia é remover os inquilinos para contêineres durante a construção ou reforma das casas, segundo Sílvio Cardoso Teixeira, engenheiro da Diretoria Municipal de Obras.


 




Há pelo menos dois anos a Prefeitura tem apertado o cerco a esse cartão de visitas negativo da cidade. A lei 3961, de abril de 2001, obriga proprietários de cortiços a dar condições de habitabilidade a esses locais. Cada unidade deve ter pelo menos um dormitório, uma cozinha, um banheiro com chuveiro, bacia e lavatório e área de serviço. Muitos proprietários, porém, não puderam atender aos custos, daí a alternativa de autorizar a Soma a executar as obras. São Caetano calcula em sete mil os moradores de baixa renda que demandam habitações populares. Além da reurbanização dos cortiços, os planos para essa população contemplam apartamentos do programa Domus Mea (Minha Casa, em latim). Desde 2001 estão para ser entregues 120 apartamentos no Bairro Mauá, adiados para meados de 2003. "Até dezembro deste ano pretendemos iniciar outros 80 apartamentos populares na Nova Gerti" -- afirma Gusman.


 


Ponto negativo


 




Embora com campos de pesquisas diferentes, os dois índices de qualidade de vida que coroam São Caetano como líder no Brasil têm em comum a educação, onde a Prefeitura alardeia alto e bom som que coloca 35% do orçamento, contra 25% obrigatórios por lei. Mesmo contabilizando todas as crianças na pré-escola e com pelo menos 18,5% da população diplomada em Ensino Superior (contra apenas 9% dos brasileiros que terminam uma faculdade), o Poder Público entende que o analfabetismo de 0,7% é um ponto negativo iluminado justamente pelos demais indicadores positivos da cidade.


 




Foi pensando em chegar a uma população 100% alfabetizada que a Prefeitura chamou em 1999 o Instituto Mauá de Engenharia para dar mão forte ao Proalfa (Projeto de Alfabetização de Adultos). São 10 núcleos funcionando em escolas estaduais e particulares ensinando as primeiras letras a alunos entre 18 e 80 anos. Até 2002 o Proalfa diplomou 1.868 adultos. Gente de cabelos brancos como a bisavó Francisca Leal Junqueira, de 78 anos, ou Maria Porfírio de Almeida, de 65, ou ainda Tereza Damasceno Pereira, de 56, que voltaram aos bancos escolares depois de abandonarem as salas de aula ainda crianças por causa de doença ou da precariedade nas zonas rurais onde viviam. "Queremos recuperar o tempo e aumentar nossos conhecimentos" -- fala a singela dona Francisca, cursando o 1º ano primário, ao lado de Tereza, no 2º, e Maria, da 3ª série. O Instituto Mauá custeia com bolsas os orientadores de alfabetização -- geralmente selecionados entre seus alunos -- enquanto a Prefeitura se encarrega da metodologia pedagógica e do material didático.



 


Morador vip


 




O prefeito Luiz Tortorello não quer nem ouvir falar na possibilidade de o retrato de pujança social de São Caetano ser arranhado com a queda nas receitas municipais por conta da evasão da indústria dos ovos de ouro. Acha que a cidade ainda vai somar muitos dias de glórias e recheia a agenda de compromissos. O mais recente é o Conselho Municipal de Bairros. Pelo menos 50 moradores de cada bairro serão indicados como munícipes vip para assessorar o prefeito e ter livre trânsito nos órgãos públicos. Os serviços à comunidade já tinham ganhado fermento extra com o Governo Itinerante, através do qual prefeito e diretores municipais percorrem os bairros para ouvir demandas da população. Antes disso a cidade havia estruturado o 199 SOS Cidadão, que centraliza todos os atendimentos de emergência e desloca uma viatura em três minutos.




Variável que não figura nas estatísticas de institutos oficiais mas é pole-position entre os desconfortos da população, as enchentes são um bicho-papão à parte em São Caetano. Dois anos atrás ficaram famosas as cenas da Avenida Goiás totalmente submersa e vítimas sendo resgatadas de helicóptero. Um primeiro e definitivo passo para espantar pesadelos como esse pode estar sendo dado com o Piscinão Cerâmica, que promete conter a fúria das águas do Ribeirão dos Meninos, na divisa com a Capital ao longo da Avenida Almirante Delamare e Rua São Paulo.


 




O edital que abre a licitação das obras foi publicado em janeiro último pelo Daee (Departamento de Águas e Energia Elétrica), do governo do Estado. Pelo projeto, as obras iniciam em abril e serão concluídas em 10 meses ao custo de R$ 8,65 milhões do governo estadual. O alvo do benefício é o Centro Empresarial Cerâmica, um cobiçado pólo tecnológico planejado para atrair empresas de serviços e de tecnologia, além de condomínio residencial, na megaárea de 360 mil metros quadrados da antiga fábrica da Cerâmica São Caetano. Quem vai agradecer mesmo, penhorada, é castigada população do Centro, Jardim São Caetano e Bairro São José.


 




Futuro político


 




O futuro político de São Caetano está decidido na mente do prefeito Luiz Tortorello. O petebista que comanda pela terceira vez a menor cidade territorial do Grande ABC desenha o cenário eleitoral para 2004 com o que chama de precisão e clareza: mesmo diante do crescimento do PT nas últimas eleições, São Caetano continua sem espaço para a oposição, o que levaria o grupo formado pelo PTB e os situacionistas a arrebatar entre 60% e 70% dos votos para fazer o próximo prefeito.  As peças do xadrez já estão postas e os nomes de Wenceslau Teixeira, Nairo Ferreira e Iliomar Darronqui despontam entre os mais cotados do grupo de 12 possíveis pré-candidatos à sucessão municipal.


 




Tortorello faz a previsão embasado em consultas pré-eleitorais e embute a trajetória histórica de mandatos conservadores que transformaram São Caetano em um principado primeiromundista. O prefeito acredita que conseguiu blindar o Município contra quase todas as mazelas causadas pelos contrastes urbanos que tiram o sono de metrópoles vizinhas e tem certeza de que o reconhecimento do eleitorado virá na forma de votos, muitos votos. Subsidiado por 71,33% da preferência popular na última eleição, Tortorello afirma que vai conduzir pessoalmente uma sucessão que garante estar referendada pelo povo durante todo o processo. Está convicto da vitória, mas declina da posição de nominar seu candidato preferido.


 




Os três homens que despontam como prováveis postulantes situacionistas nunca ocuparam cargos majoritários em São Caetano nem integram listas de preferências pessoais, garante o prefeito.   Periodicamente o grupo situacionista promove consultas populares para conhecer quem está na ponta da língua do eleitor. Oito postulantes compunham a lista de prefeituráveis no início do processo. O número, no entanto, já teria subido para 12 e certamente os mais lembrados galgam posições de destaque dentro do grupo. Mas como político é político em qualquer lugar do mundo e São Caetano não está imune à fogueira das vaidades, Luiz Tortorello terá de trabalhar muito para não ferir suscetibilidades.


 




"Político que não trabalha com pesquisa não se moderniza, perde o pé do cenário e, consequentemente, perde a eleição" -- garante-se sob a roupagem de principal estrategista da próxima eleição municipal. Se a convenção para escolha do candidato situacionista fosse hoje, o diretor do DAE (Departamento de Água e Esgoto), Wenceslau Teixeira, levaria vantagem. Luiz Tortorello assegura que o nome do homem que é seu compadre e tem na paciência uma das maiores virtudes desponta como preferido entre os eleitores e o grupo de 12 postulantes. Wenceslau Teixeira já havia sido cogitado para a sucessão de Tortorello em 1992, mas não aceitou.


 




Os outros dois mais cotados são Nairo Ferreira de Souza e Iliomar Darronqui. Nairo Ferreira é presidente da AD São Caetano, time de futebol que projetou o esporte da cidade para o mundo, e Iliomar Darronqui coordena a Duohma (Diretoria de Urbanismo, Obras, Habitação e Meio Ambiente), a Desem (Diretoria de Serviços Municipais) e o DAE. Iliomar foi vice-prefeito na gestão de Antonio DallAnese, de 1993 a 1996. "Os três são meus braços direitos. Ou melhor, o direito, o esquerdo e a perna" -- brinca Tortorello, com o devido cuidado de não deixar escapar predileções. O deputado estadual e filho do prefeito, Marquinho Tortorello, estaria fora da lista de prefeituráveis de 2004.


 




Sobe e desce


 




A trinca de preferidos está sujeita às intempéries próprias da dinâmica política que alçam ou derrubam lideranças num piscar de olhos. Ainda faltam dois anos para as eleições municipais e nada pode garantir que os 70% de votos que o prefeito Luiz Tortorello confere à equipe cheguem inabaláveis até o final da disputa. Desse total vantajoso, pelo menos 30% são atribuídos ao grupo de Walter Braido, outro respeitável cacique local que também já esteve três vezes no comando da cidade.


 




Os comentários de que o grupo político de Walter Braido terá peso decisivo nas eleições municipais ganham força na cidade. Há até quem diga que, para onde Braido pender, poderá eleger o candidato. O balão de ensaio eleitoral também rende declarações que podem desautorizar, mesmo que de raspão, a posição de mandarim político assumida por Tortorello. O vereador situacionista e de um clã igualmente tradicional da política de São Caetano, Tite Campanella, assumiu recentemente a intenção de ser o candidato do PFL. Tite declarou aos jornais que apesar de pertencer à bancada de sustentação, não precisa do aval de ninguém para concorrer, nem do atual prefeito. 


  



Por enquanto, Walter Braido, ex-PTB e atual PPB e Luiz Tortorello estariam caminhando lado a lado em cumprimento a tácito acordo de bastidores. Os dois sabem que grupo coeso tem mais oportunidade de vencer eleições porque já viveram história parecida tempos atrás. Se não houver mudanças na condução do processo sucessório, São Caetano assistirá a ascensão de novos nomes a cargos eletivos sob circunstâncias similares as que colocaram Luiz Tortorello pela primeira vez no Paço Municipal. 


 




Walter Braido conduzia a sucessão de 1988 também ancorado em consultas prévias e reuniu o grupo para avisar que só seria possível vencer se o candidato fosse Luiz Tortorello -- juiz aposentado e então deputado estadual que despontava nas consultas assim como acontece atualmente com Wenceslau Teixeira. Na época havia outros cinco postulantes, mas quatro não concordaram com a forma de escolha, abandonaram o barco e perderam a eleição.


 




Sem oposição


 




Nem mesmo a onda Lula que sufragou quantidade maciça de votos aos candidatos majoritários e proporcionais do PT nas eleições de 2002 tira do prefeito Tortorello a certeza de que São Caetano continuará nas mãos de seu grupo político. O fato até pode ser analisado como sinalizador de mudanças dentro do contexto conservador que reveste a história política da cidade. Os situacionistas, por sua vez, descartam o perigo de o pleito municipal ser contaminado pelo êxito petista federal. "A próxima eleição é doméstica e meu povo é inteligente" -- espeta Tortorello, para em seguida disparar "Em 10 anos à frente da Prefeitura não conheci oposição. A oposição nunca fez um projeto nem apresentou um trabalho sequer. Só houve denúncias. O PT deve ter denunciado de 400 a 500 vezes durante este período, mas nada vingou" -- revigora-se.   


 




O outro lado, no entanto, não se rende. A leitura do vereador petista Hamilton Lacerda também atribui à onda Lula parte do crescimento de votos que o PT registrou em São Caetano em 2002. O parlamentar lembra que o partido alcançou performance ascendente já em 2000, quando ele foi o vereador mais votado da cidade, feito que se repetiu no último pleito. Hamilton Lacerda terminou as eleições de 2002 como o deputado estadual mais votado em São Caetano, com 22,15% dos votos válidos. Não se elegeu, mas ficou à frente de Marquinho Tortorello. Marquinho obteve 20,01% dos votos -- 7,05% a menos que em 1998 -- e permaneceu na Assembléia Legislativa porque contou com o reforço de votos de outros Municípios. Horácio Neto, outro petista de São Caetano, chegou em terceiro, mas também não assegurou cadeira no parlamento paulista.


 




"Pela primeira vez na história de São Caetano o PT tem possibilidades reais de vencer uma eleição majoritária" -- confia Hamilton Lacerda. Ele joga lenha na fogueira e acredita que os situacionistas vão ser vítimas do próprio know-how político que acreditam dominar, porque dificilmente essa maneira de conduzir o processo sucessório vai deixar de produzir descontentes. A hipótese de rachas na base governista e o eventual lançamento de mais de um candidato da situação levam o petista a sonhar sem tirar os pés do chão. 



 


Segundo Hamilton Lacerda, o PT precisa montar chapa forte de vereadores para aumentar a representatividade na Câmara, restrita a três dos 21 parlamentares. Tanto seu nome quanto o do companheiro e também vereador Horácio Neto são cogitados para concorrer à Prefeitura. O sindicalista Jair Meneguelli estaria fora do páreo porque dificilmente abdicaria da recém-assumida presidência do Sesi Nacional para disputar eleições. Em 2000, Jair Meneguelli foi o candidato do PT à Prefeitura de São Caetano e obteve apenas 13,76% dos votos.


 




A boa votação dos candidatos do Partido dos Trabalhadores na última eleição faz acender as luzes da esperança. Lula teve 42,48% dos votos, contra 27,56% de José Serra no primeiro turno, e depois 50,19% contra 44,69% na segunda etapa.  No Senado, Aloizio Mercadante bateu Romeu Tuma por 60,02% a 34,57% e entre os 10 deputados federais mais votados na cidade, seis eram petistas. Antes dessa performance, o PT só havia vencido em São Caetano com o senador Eduardo Suplicy. Lula até chegou à frente no segundo turno das eleições presidenciais de 1989 -- 48,11% contra 45,97% de Fernando Collor. O preferido da cidade era Paulo Maluf, vencedor local do primeiro turno que não conseguiu chegar entre os dois mais votados para disputar a primeira eleição direta para presidente após 1964. 


 




O conservadorismo que sempre emerge das urnas em São Caetano está diretamente ligado a fatores que tornaram a cidade peculiar dentro do Grande ABC e da Região Metropolitana. Enquanto nos demais municípios o descontentamento com a política tradicional é expresso pelo voto, São Caetano costuma ratificar nomes que levaram a cidade a figurar entre os melhores indicadores socioeconômicos do País. A população importa-se bem mais com a manutenção de seu bem-estar do que com ideologia partidária ou os desdobramentos do cenário político nacional. É exatamente nisso que Luiz Tortorello e seu grupo apostam as fichas: no fato de São Caetano possuir, até agora, características adversas ao trabalho de base da esquerda. 



 


De qualquer forma, oposição e situação concordam num ponto. Tanto Hamilton Lacerda quanto Luiz Tortorello preferem não apostar na polarização do próximo pleito. O petista acreditar ter a companhia do PV, do PSB, do PC do B e até da atual executiva provisória do PDT na seara dos críticos à atual administração. É prematuro falar em alianças, mas a idéia soa tentadora. Já Luiz Tortorello trabalha com a possibilidade de PSDB, PL, PMDB, além é claro de PT e PTB, lançarem candidaturas próprias. Nesse caso, até admite ligeira queda nos 70% de votos que estima obter. Nada, porém, que comprometa o resultado das eleições a seu favor.


 




Integração duvidosa


 




A avaliação de Luiz Tortorello é sempre confortável, seja qual for o ângulo analisado. Suas palavras denotam a confiança inabalável dos que têm o controle da situação e acreditam que nada pode mudar o que está sendo planejado. O prefeito transpira segurança até quando fala de integração regional, assunto que já lhe rendeu várias declarações contraditórias. Crítico contumaz das atividades consorciadas nos primeiros tempos, Tortorello não teve dúvidas em proferir discurso eloquente recheado de elogios durante a inauguração da sede própria do Consórcio de Prefeitos, em dezembro do ano passado.


 




Detalhe: Tortorello estava na presidência da entidade e agora enxerga a Câmara Regional como um parlamento. Já com relação à Agência Regional mantém a postura crítica e revela que discordava do prefeito morto Celso Daniel sobre o fato de políticos dirigirem o órgão criado para trabalhar o desenvolvimento econômico do Grande ABC. "Tem de ser um empresário, um executivo remunerado para exercer o trabalho com imparcialidade. O prefeito sempre vai dar preferência à sua cidade" -- admite.


 




Seja qual for o desfecho do movimento pré-eleitoral em São Caetano, uma coisa é praticamente certa: Luiz Tortorello planeja concluir o mandato e sair da vida pública. Quer dedicar-se à gestão de suas escolas e descarta veementemente a possibilidade de mudar de domicílio eleitoral para tornar-se candidato de oposição ao PT em Santo André. "Teve gente graúda que me procurou para falar sobre a possibilidade. Mas não quero alimentar essa idéia" -- encerra o assunto.


 




O prefeito também garante que não se incomoda de ficar fora do cenário político depois de ocupar três vezes a Prefeitura da cidade brasileira com os menores índices de exclusão social. Avisa que não pretende mais concorrer a cargo eletivo e aceitaria, se tanto, ser secretário de Estado em área de seu interesse, como a Educação. Questionado sobre a possibilidade de tornar-se prefeito pela quarta vez numa região onde nenhum político alcançou tal façanha, sinaliza com a velha máxima de que na vida, e principalmente na política, nada é definitivo.


 




“Se no futuro o grupo estiver em dificuldades e precisar de mim...".  


Leia mais matérias desta seção: Administração Pública

Total de 813 matérias | Página 1

15/10/2024 SÃO BERNARDO DÁ UMA SURRA EM SANTO ANDRÉ
30/09/2024 Quem é o melhor entre prefeitos reeleitos? (5)
27/09/2024 Quem é o melhor entre prefeitos reeleitos? (4)
26/09/2024 Quem é o melhor entre prefeitos reeleitos? (3)
25/09/2024 Quem é o melhor entre prefeitos reeleitos? (2)
24/09/2024 Quem é o melhor entre prefeitos reeleitos? (1)
19/09/2024 Indicadores implacáveis de uma Santo André real
05/09/2024 Por que estamos tão mal no Ranking de Eficiência?
03/09/2024 São Caetano lidera em Gestão Social
27/08/2024 São Bernardo lidera em Gestão Fiscal na região
26/08/2024 Santo André ainda pior no Ranking Econômico
23/08/2024 Propaganda não segura fracasso de Santo André
22/08/2024 Santo André apanha de novo em competitividade
06/05/2024 Só viaduto é pouco na Avenida dos Estados
30/04/2024 Paulinho Serra, bom de voto e ruim de governo (14)
24/04/2024 Paulinho Serra segue com efeitos especiais
22/04/2024 Paulinho Serra, bom de voto e ruim de governo (13)
10/04/2024 Caso André do Viva: MP requer mais três prisões
08/04/2024 Marketing do atraso na festa de Santo André