Administração Pública

Marco Zero: qualquer semelhança
com Lance Armstrong é realidade

DANIEL LIMA - 04/03/2013

O empresário Milton Bigucci e seu amigo íntimo Milton Casari poderiam ser convocados pelo Ministério Público Estadual de São Bernardo na apuração do Escândalo do Marco Zero denunciado por CapitalSocial. Bastaria que repetissem à promotora criminal Mylene Comploier o que disseram em momentos distintos mas entrelaçados sobre o movimento das pedras do mercado imobiliário na região para que dúvidas eventualmente persistentes fossem dirimidas.


 


A iniciativa ministerial faria cair a máscara de ilusionismo que pretende encobrir a falcatrua também sob o ponto de vista de valor de mercado da área pública arrematada de forma irregular por MBigucci, Even Construtora e Braido Construtora. Provavelmente a promotora criminal, que não prescinde desses testemunhos para mandar anular aquele leilão público, solicitaria de imediato o desengavetamento precoce do processo.


 


CapitalSocial publica este que pode ser chamado de terceiro macrocapítulo sobre o Escândalo do Marco Zero. Esta revista digital está ciente de que se trata de investigação jornalística que só deveria interessar como valor judicial complementar, como tantas outras que ainda serão abordadas. Afinal, a operação fraudulenta está mais que tipificada no macrocapítulo inicial, que diz respeito aos procedimentos autocondenatórios envolvendo as três empresas que fizeram do leilão público um palco teatral. Tudo comprovado por documentos que o Procurador-Geral do Município sonegou ao Ministério Público de São Bernardo, o qual, por sua vez, mesmo alertado por CapitalSocial, não alcançou as entranhas das providências esperadas.


 


Já quanto ao segundo macrocapítulo, que trata do depoimento de uma peça-chave denunciatória, no caso o corretor de imóveis José Azevedo Moreira, a promotora criminal do Gaeco (Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado), Núcleo do ABC, Mylene Comploier, ainda não se manifestou. José Moreira ainda não foi ouvido, uma semana depois de CapitalSocial revelar sua identidade e as razões que o colocam como peça central da desmontagem da operação fraudulenta.


 


O valor do arremate do terreno entre a Avenida Kennedy e a Avenida Senador Vergueiro, ponto nobre de São Bernardo, foi completamente subestimado quando do leilão em 10 de julho de 2008. O lance final de R$ 14 milhões oficialmente utilizados pela Big Top 2, empresa do conglomerado MBigucci, estava muito aquém do valor de mercado.


 


Vários especialistas ouvidos por CapitalSocial catapultam aquele terreno a no mínimo R$ 30 milhões à época, ou próximo a R$ 70 milhões atualmente. O anunciado sucesso de vendas de unidades do Marco Zero, empreendimento que se pretende erguer no terreno, confirma a configuração especial da área. Milton Bigucci jamais poderá ser avaliado como um empresário qualquer. Ele conhece muito bem o terreno em que pisa. Diferente, portanto, de muitos grandes players da Capital, que quebraram a cara na região e deixaram um rastro de micos imobiliários direcionados a um público residencial que não condiz com a realidade socioeconômica e cultural de quem vive à sombra da Capital.


 


Peritagem suspeita


 


O valor da área pública levado a leilão resultou de um contrato da Prefeitura de São Bernardo com a Planimob Planejamento, Desenvolvimento e Engenharia, empresa com sede na Capital e, segundo informações, sem lastro técnico para a atividade a ponto de atuar isoladamente no inventário do metro quadrado. Por se tratar de área pública, especialistas afirmam que o caminho eticamente mais ajuizado e independente em busca de um valor justo para o terreno de 15,9 mil metros quadrados seria a contratação de pelo menos três empresas consagradas do ramo.


 


O pré-processo licitatório não fornece pormenores sobre a escolha da Planimob, empresa que teria relações muito próximas a um dos secretários mais influentes da Administração William Dib. O valor de mercado do terreno foi estimado em R$ 11,656 milhões. Exatamente um ano depois, em julho de 2008, o terreno foi a leilão com leve correção monetária, e passou a R$ 11,986 milhões. Onde, afinal, estão os buracos que colocam em xeque o trabalho daquela empresa de assessoria imobiliária e os arrematadores do terreno – Milton Bigucci e seus parceiros da Even e da Braido?


 


O valor comercial do terreno levado a leilão em 10 de julho de 2008 foi subestimado mesmo que se desse como inquestionável o trabalho da Planimob -- algo que especialistas do ramo em São Bernardo desclassificam. Referendar o preço da peritagem da Planimob exatamente um ano depois, com leve correção monetária, foi uma decisão da Prefeitura de São Bernardo que contrariou completamente o aquecimento do mercado imobiliário. Houve um quase congelamento do valor original, saído das planilhas da Planimob, como se o mercado imobiliário houvesse se mantido estático.


 


Aos depoimentos, senhores


 


É nesse ponto que entram os depoimentos sugeridos por CapitalSocial ao Ministério Público Estadual, de Milton Bigucci e de seu amigo íntimo, Milton Casari, presidente e vice-presidente da Associação dos Construtores do Grande ABC, entidade que só não é fantasma porque está registrada em cartório, tem sede e alguns funcionários pagos pelo Secovi, Sindicato da Habitação de São Paulo. De resto, não representa a classe. Muito pelo contrário: a maioria dos fundadores e associados desligou-se daquela organização por rejeitar os métodos de Milton Bigucci, há mais de 20 anos no comando. A chamada Acigabc produz periodicamente estatísticas deliberadamente fantasiosas sobre o mercado imobiliário regional. Números que não resistiriam a uma blitz técnica séria, porque não tem base informativa documentalmente confiável.


 


A valorização de mercado da área arrematada oficialmente por Milton Bigucci mas paga aos cofres públicos, irregularmente, também pela Braido e pela Even, parceiros ocultos do negócio, foi retratada numa entrevista que Milton Bigucci concedeu ao Diário do Grande ABC de 13 de fevereiro de 2008 ou seja, cinco meses antes do leilão. Basta Milton Bigucci repetir ao Ministério Público de São Bernardo aqueles termos para desmontar as alegações que apresentou como defesa ante a denúncia de irregularidades no leilão. É possível que a memória do dirigente da MBigucci e da Associação dos Construtores não capture o que se apresenta como bumerangue. CapitalSocial dispõe em página impressa o que se lê em seguida:


 


 Os terrenos na região sofreram valorização de até 100% no último ano em comparação com 2006, segundo afirmativa da Acigabc (Associação dos Construtores, Imobiliárias e Administradoras do Grande ABC). Um dos motivos apontados pelo presidente da entidade, Milton Bigucci, é a escassez de áreas para construção na região. “Há cada vez menos locais espaçosos para que grandes condomínios sejam erguidos”, diz. Sem um levantamento específico sobre o assunto, ele estima que daqui a 15 anos a situação da construção civil seja mais complicada. “As casas serão substituídas por prédios, que ocupam o mesmo terreno, mas acabam saindo mais baratos”. São Caetano, por exemplo, já está nesse processo. “Não há grandes áreas. As construtoras estão comprando imóveis residenciais e erguendo prédios nestes terrenos, diz Bigucci”. A tendência é a verticalização. Para 2008, a previsão é de mais uma valorização dos terrenos na região, porém menor que no ano passado.


 


Fazendo as contas


 


A importância das declarações de Milton Bigucci à interpretação dos fatos e dos documentos que envolvem o leilão fraudulento do terreno que daria origem ao Marco Zero é crucial. Basta uma simples conta. Se mesmo com possíveis vícios de uma empresa supostamente pouco habilitada a perscrutar o valor do metro quadrado daquela área chegou-se a quase R$ 12 milhões em julho de 2007, a quanto chegaria em julho de 2008, data do leilão, se a valorização anunciada por Milton Bigucci chegou a 100%. Ou mais ainda, já que os 100% anunciados por Milton Bigucci se referiram ao ano de 2007, quando o mercado imobiliário da região cresceu menos que o ano de 2008. O laudo pericial da Planimob que estipulou o valor do metro quadrado teria enquadrado a realidade de apenas os seis primeiros meses de 2007, já que foi entregue à Prefeitura de São Bernardo no começo de julho. Entre a entrega do laudo e a efetivação do leilão foram exatos 12 meses de defasagem monetária num ambiente de extrema especulação, por conta de recordes sobre recordes de vendas e lançamentos de imóveis – conforme números publicados no segundo macrocapítulo desta série. Todos dados que partiram do berço exploratório do dirigente Milton Bigucci, é claro.


 


O testemunho de Milton Casari, amigo íntimo de Milton Bigucci inclusive em depoimentos solidários, ensaiados e irregulares ao Judiciário, quando se disse apenas companheiro de diretoria da entidade presidida pelo dono da MBigucci, é também de importância relevante ao Ministério Público Estadual. A promotora criminal Mylene Comploier pode dispor com facilidade de declarações prestadas pelo empresário de corretagem imobiliária, prestadas em 20 de março de 2001; portanto, há mais de sete anos do leilão da área do Marco Zero.


 


Milton Casari, sempre requisitado a entrevistas quando o assunto é a valorização dos espaços imobiliários da região, num jogo de cartas marcadas para impedir que algum empresário, inadvertidamente, saia do tom ufanista, foi ouvido pelo Diário do Grande ABC naquela data a respeito de áreas que a Prefeitura de São Bernardo pretendia negociar nas imediações da Avenida Kennedy para transferir a sede do Paço Municipal da Praça Samuel Sabatini àquelas imediações. A reprodução de alguns trechos da matéria:


 


 O Secretário de Obras de São Bernardo, Otávio Manente, vai contratar perito para uma análise de valores do terreno da Prefeitura atrás do Ginásio de Esportes, onde, até 2002, devem ser construídas as sedes do Paço Municipal e da Câmara. A perícia vai ser feita porque a Prefeitura tem intenção de utilizar o terreno como forma de pagamento pela construção do complexo Executivo-Legislativo. Segundo Manente, as obras poderão ter custo final de R$ 25 milhões. Manente ainda não arrisca números em relação ao tamanho da área que deve ser cedida à empresa que vencer a licitação. Segundo ele, o total pertencente à Prefeitura no terreno localizado no Bairro de Vila Marlene é de cerca de 200 mil metros quadrados. Para a Secretaria, o projeto deve utilizar entre 100 mil metros quadrados e 120 mil metros quadrados. O remanescente seria usado na permuta, o que representaria entre 80 mil metros quadrados e 100 mil metros quadrados. Segundo o secretário, o valor final de R$ 25 milhões representaria o novo Paço pronto, inclusive toda a reestruturação do sistema viário das imediações da Avenida Kennedy. Nisso estaria incluída a obra de extensão da Avenida São Paulo, que liga o Bairro Jordanópolis à Avenida Kennedy. “É difícil ainda falar em valores. O que podemos mencionar é que o laudo terá de ser solicitado externamente para, até o meio do ano, já termos a licitação”, afirmou.


 


Complemento esclarecedor


 


O complemento da matéria do Diário do Grande ABC daquele 20 de março de 2001 é o que mais de perto interessa ao Ministério Público Estadual quanto à qualidade das informações de especialistas ouvidos por CapitalSocial sobre o valor do terreno do Marco Zero à época do arremate irregular:


 


 O Diário consultou imobiliárias para obter uma prévia de quanto custaria a parte do terreno a ser utilizado na permuta. O presidente da Associação dos Construtores e Incorporadores do Grande ABC (Acigabc) e proprietário da MBigucci, Milton Bigucci, afirmou que é necessário fazer um levantamento para determinar um valor médio do metro quadrado do terreno. “Tem de ser feita a perícia para confirmar o tipo de zoneamento, a relação custo benefício da área e localização para depois chegar a um preço”, disse. Segundo o vice-presidente da Acigabc e proprietário da Casari Imóveis, Milton Casari, o metro quadrado sem urbanização naquela região custaria R$ 250. No entanto, Casari salientou que, se a parte do terreno contar com urbanização, o valor pode variar de R$ 400 a R$ 1 mil (se estiver de frente para a Kennedy) o metro quadrado. A área é considerada nobre pelo mercado imobiliário.


 


Mais de sete anos depois, como se sabe, uma parcela dos terrenos desmembrados pela Prefeitura de São Bernardo, o pedaço mais nobre entre todos, entre a Avenida Kennedy e a Avenida Senador Vergueiro, de frente à Ginásio de Esportes, à sede do Poder Judiciário e de uma das unidades do Carrefour na região, foi arrematado por menos de R$ 1 mil o metro quadrado. Exatamente por R$ 880,61.


 


É por essas e outras razões que os especialistas em mercado imobiliário ouvidos por CapitalSocial não escondem sorriso de desaprovação à notícia sobre o leilão público. A maioria vai além do preço de mercado de R$ 30 milhões para aquele terreno, quando do leilão em 10 de julho de 2008. Estimam o metro quadrado à época em pelo menos R$ 3 mil, o que elevaria o valor do preço de arremate a mais de R$ 40 milhões. Quem identificar aquela operação por natureza jurídica irregular também de um negócio da China não estaria exagerando, garantem os especialistas.


 


Na pobre e insustentável defesa que apresentou à promotora criminal Mylene Comploier, Milton Bigucci repetiu a cantilena de sempre de atacar este jornalista. Movido claramente a emocionalismo por conta de lhe faltarem provas que sustentassem a legitimidade da operação fraudulenta, Milton Bigucci acabou por fornecer mais combustível para atear fogo às próprias vestes de argumentação.


 


Mal imaginava o dirigente imobiliário e dono de um dos principais conglomerados do setor na região que ele mesmo, sempre solícito a entrevistas para estimular a especulação imobiliária forneceria dados que demarcariam o terreno na efervescência do setor na Província do Grande ABC.


 


Palavras insuspeitas?


 


A valorização imobiliária, especialmente de terrenos localizados em corredores viários disputadíssimos, caso da Avenida Kennedy e da Avenida Senador Vergueiro, sob a influência das notícias que davam conta da chegada do Paço Municipal, poderia estar subjugada a avaliações nem sempre confiáveis. Quando, entretanto, se trata do empresário e também do presidente de uma associação de classe, o peso é completamente diferente. Se em fevereiro de 2008 Milton Bigucci disse como disse que o valor do metro quadrado de terrenos daquelas características na região dobrou de preço, o parâmetro estava estabelecido, independente da realidade correr ou não na mesma raia de compatibilidade factual.


 


A mesma linha de raciocínio vale para Milton Casari, seu amigo íntimo e companheiro de Milton Bigucci na Associação dos Construtores. A reputação da Imobiliária Casari não foi construída sobre bases gelatinosas a colocar os clientes em apuros. Se Milton Casari disse como disse ao Diário do Grande ABC de março de 2001 que o metro quadrado de terreno na Avenida Kennedy custaria R$ 1 mil, convenhamos que não tem sentido que, em julho de 2008, fosse vendido por menos desse valor.


 


Parece fora de propósito dos fatos e da realidade que Milton Bigucci, em nome de uma das empresas do conglomerado que dirige, perderia a oportunidade de arrematar a área pública entre a Avenida Kennedy e a Avenida Senador Vergueiro. Afinal, se a avaliação de uma empresa de peritagem pouco conhecida e, segundo informações de especialistas, muito próxima a um influente secretário da Administração William Dib, então também muito íntimo de Milton Bigucci, dizia que quase R$ 12 milhões eram um preço justo, e que, um ano depois, levada a leilão, essa mesma área sofreu leve reajuste, como acreditar que o arrematante deixaria escapar a oportunidade se detinha informações sobre a valorização média de terrenos na Província do Grande ABC? Simplesmente o dobro do preço do ano anterior, sempre é bom sublinhar, porque se há algo que o regime capitalista ensina é que empresário algum despreza números em forma de valor monetário, datas, prazos, essas coisas.


 


Declarações do empresário Milton Bigucci ao Ministério Público sobre desconhecimento prévio do leilão daquela área ganha tons de deboche entre os especialistas. Milton Bigucci sempre se mantém estreitamente ligado ao Poder Público de São Bernardo, entre outras administrações municipais. As relações com o prefeito William Dib eram frequentemente divulgadas pela mídia. Poucos meses antes do leilão fraudulento Milton Bigucci anunciou uma parceria com a Administração Dib, que jamais saiu das intenções. Eles convocaram a Imprensa e anunciaram que a Prefeitura e a Associação dos Construtores iriam criar e manter um Banco de Imóveis em sites compartilhados. Tudo para facilitar a vida de quem pretendesse adquirir imóveis.


 


A falta de estrutura da Associação dos Construtores e o calendário eleitoral de disputa sucessória municipal retiraram completamente aquela iniciativa do campo prático.  William Dib viu seu candidato à sucessão, Orlando Morando, amigo de Milton Bigucci, superado pelo petista Luiz Marinho. Mas não demorou para que o empresário e Marinho estreitassem relações, depois de um início de mandato beligerante por conta dos antecedentes político-empresariais do dirigente da Associação dos Construtores.


 


O que se deu foi um desenlace mais que manjado, porque é irresistível a força de atração entre políticos e mercadores imobiliários. Haja vista o escândalo envolvendo o Secovi, o Sindicato da Habitação, de São Paulo, o então prefeito Gilberto Kassab e dezenas de vereadores, financiados irregularmente por uma entidade fantasma que, segundo denúncia do Ministério Público, era o braço econômico-eleitoral do próprio Secovi. Milton Bigucci era e continua a ser dirigente do Secovi.


 


Ambiente macroeconômico


 


Não se pode desconsiderar o arremate do terreno defronte ao Carrefour da Avenida Senador Flaquer com a Avenida Kennedy do quadro macroeconômico nacional e principalmente do ritmo do mercado imobiliário. Uma reportagem publicada pelo jornal Valor Econômico em 11 de maio de 2009, portanto menos de um ano após a compra irregular do terreno por Milton Bigucci, dá bem a dimensão daqueles momentos de euforia:


 


 Os donos de terrenos viveram dois anos áureos e completamente atípicos – entre 2006 e meados de 2008. A disputa era tanta que construtoras faziam leilões e, além de excelentes ofertas, não hesitavam em pagar os ativos em dinheiro. O tradicional pagamento em permuta foi temporariamente deixado de lado. O humor do mercado virou e, com ele, a disposição das empresas em honrar os contratos acertados nos tempos de euforia. Agora, construtoras e donos de terrenos sentam para renegociar. Pode ser em uma conversa amistosa ou nem tanto – já há casos na Justiça ou perto de chegar lá. As empresas de capital aberto compraram juntas R$ 11,4 bilhões em terrenos, segundo dados dos balanços. Ainda falta pagar, no entanto, R$ 7 bilhões – entre dinheiro e permuta. Ou seja, as companhias têm um valor imenso a pagar em terrenos, justamente quando falta dinheiro no caixa e a obrigatoriedade é a construção das obras em andamento. (...). O custo do crescimento desenfreado nos tempos de bonança agora pesa – e muito. Muitas empresas se endividaram para comprar terrenos. Segundo fonte do setor, no ano passado antes da crise, a oferta de linhas de crédito para financiar a aquisição de terrenos era farta – e vinha tanto dos grandes bancos como dos pequenos. Do endividamento total das companhias, o passivo corresponde a 41%. É mais do que a dívida com debêntures, que soma 19% do total, dívida de capital de giro (21%) com Sistema Financeiro da Habitação (SFH), que corresponde a 17% e cambial, que responde por 2%. “Não dá para pagar CDI mais 4% ao ano para honrar compra de terreno, o mercado mudou completamente”, diz um executivo. A compra por novos terrenos, no entanto, não parou. Volta, aos poucos, por conta do pacote habitacional do governo. Há várias empresas procurando áreas para o mercado de baixa renda, sobretudo longe das principais capitais (...). A palavra de ordem agora, porém, é a permuta – que pode ser financeira (quando o comprador recebe uma fatia da receita dos empreendimentos), mais usual em empreendimentos de baixa renda, ou física (troca por unidades).


 


Como se observa – o que confirma informações do megacapítulo anterior – o mercado imobiliário vivia momentos de euforia quando o terreno da Prefeitura de São Bernardo foi levado a leilão. A pechincha não poderia ser desperdiçada. Havia tanta euforia que o preço do arremate poderia e deveria ter sido instalado em outro patamar. E o seria muito acima do valor mínimo especificado em leilão se não houvesse conluio entre Milton Bigucci e os dirigentes da Even e da Braido.


 


Anedota cronológica


 


A justificativa de dirigentes das três empresas que participaram em conjunto do leilão é uma anedota cronológica. Eles disseram que só se uniram no negócio (e mesmo assim após o leilão, o que é uma arrematada mentira) porque a crise econômica batera às portas do mercado imobiliário. Nada mais falso, como já foi mostrado nesta série de reportagem. Os efeitos macroeconômicos só desembarcaram no País três meses depois. O que Milton Bigucci e seus parceiros de negócios querem vender em forma de defesa indefensável é antecipar a cronologia dos fatos, embaralhando-os para buscarem retaguarda à versão descuidada que utilizaram para tentar asfixiar as irregularidades. Esqueceram-se de combinar com os registros jornalísticos que apontam aquele julho de 2008 como período de tranquilidade para os negócios do setor no País.


 


Além disso, jamais poderiam supor que tudo seria materializado de forma inquestionável, e juridicamente condenável, na cronologia e na forma de pagamento das parcelas à Prefeitura de São Bernardo. O princípio intocável determinado pelo Edital do Leilão, de que o arrematante paga, acabou inadvertidamente esquecido pelas empresas que fraudaram o processo licitatório, as quais confessaram o crime dividindo o pagamento de acordo com combinações pré-leilão.


 


O confisco das medalhas do campeoníssimo ciclista Lance Armstrong deveria servir de inspiração e de ação à Prefeitura de São Bernardo e ao Ministério Público Estadual de São Bernardo na avaliação das irregulares anabolizadas num leilão público de mentirinha. O Marco Zero é algo como as nove Voltas da França e a medalha olímpica de Lance Armstrong conquistadas com a ajuda de estimulantes proibidos pelas regras esportivas. Basta uma investigação rígida e o Marco Zero não sairá do chão ordinariamente arrematado.  


 


Novos capítulos da série


 


 A série especial sobre o Marco Zero da Vergonha ainda terá os seguintes capítulos:


 


Como a Even tinha conhecimento prévio do leilão.


 


 Como se inventou a farsa de que o terreno estaria sendo depreciado por conta de suposta e fantasiosa contaminação ambiental.


 


 As declarações em Juízo de duas testemunhas-chaves não ouvidas pelo Ministério Público Estadual e que sugerem o conluio entre os participantes do leilão.


 


 Os tropeços da farsa na forma de um contrato de intenção de consumação do negócio.


 


 Por que as testemunhas ouvidas pelo Ministério Público só poderiam dizer mesmo que o leilão seguiu naturalmente o curso de legalidade?


 


 A enigmática omissão do Procurador-Geral do Município.


 


 Por que a Construtora Braido se afastou do negócio depois de participar ativamente como sócia oculta?


 


 Por que a Even Construtora se afastou do negócio depois de encomendar estudos técnicos executados em período anterior à publicação do edital do leilão e, após a suposta disputa, negociar o material com as duas empresas que participaram da tramoia?


 


 Como Milton Bigucci quer fazer crer que o regime societário da Big Top 2 é comum no mercado imobiliário, mas cai em contradição ao sugerir pateticamente que os investimentos não asseguraram a compra consorciada do terreno, de forma irregular, mas sim a participação em cotas sociais.


 


 Por que Milton Bigucci, Braido e Even não se consorciaram durante o leilão de modo a assegurarem legalmente a aquisição farsesca do terreno?


 


 Por que houve seletividade combinada dos participantes do leilão?


 


Leiam também:


 


Luiz Marinho e MP têm provas de sobra para anular leilão farsesco


 


Testemunha-bomba está pronta para confirmar fraude da MBigucci ao MP


 


Marco Zero: fraudadores zombam do MP com estelionato informativo


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