Administração Pública

Carlos Grana recua e Bilhete Único
vira suspeito Bilhete Sem Volta

DANIEL LIMA - 25/04/2013

Comprometidíssimo com os empresários do setor de transporte coletivo de Santo André tanto quanto Pelé com a bola nos bons tempos de Rei dos gramados, o prefeito Carlos Grana não resistiu aos estáticos números orçamentários de uma Prefeitura encalacrada financeiramente para adaptações programáticas: o projeto Bilhete Único virou projeto Bilhete Sem Volta. Só a Imprensa ainda não se deu conta de que o prefeito petista vendeu gato por lebre e que aquele que é considerado um dos pontos mais relevantes da gestão petista virou piada de salão.


 


O noticiário impresso e digital dos jornais da região de ontem assinalou burocraticamente a apresentação do projeto Bilhete Único no Legislativo de Santo André. Foram, segundo os relatos, duas horas de debates entre o secretário de Obras e Serviços Públicos, Paulinho Serra, um executivo da agência municipal do setor e os vereadores. Duas horas a portas fechadas quando o Supremo Tribunal Federal e tantas outras instâncias abrem portas e janelas ao interesse popular.


 


Testa-de-ferro


 


Por que portas fechadas quando o que está em discussão é o dinheiro público? Simples, muito simples: Paulinho Serra é o instrumento que os operadores de transporte público de Santo André impuseram ao governo Carlos Grana na campanha eleitoral como homem-forte na defesa do setor, em caso de vitória nas urnas.


 


Por essas e por outras, muito mais que supostamente um representante do Poder Público, no qual já esteve por muitos anos como vereador tucano e eterno possível candidato a prefeito, Paulinho Serra é espécie de testa-de-ferro das empresas que se encarregam de transportar gente pelas ruas de Santo André – a Expresso Guarará e o Consórcio União Santo André. E o Bilhete Sem Volta, supostamente Bilhete Único, é o abre-alas a reciprocidades encomendadas e ajustadas.


 


Por mais que tenha lido com cuidado extremo o noticiário sobre o Bilhete Sem Volta não estou convencido de que todas as informações foram repassadas aos vereadores e igualmente transmitidas aos jornalistas. Certo mesmo é que o prefeito Carlos Grana escorregou na graxa, porque ao se deter sobre os valores potencialmente a ser despendidos, percebeu que a Prefeitura não teria tantos recursos para bancar a proposta. Talvez Grana ainda não saiba, porque se ausentou da região durante uma década e meia, mas Santo André é o Município que mais se esvaziou economicamente no País ao longo dos últimos 40 anos.


 


Sabe-se pelo noticiário que a Prefeitura entrará com R$ 1 milhão por mês para subsidiar a integração no transporte público municipal de Santo André. A iniciativa não redundará em aumento da tarifa de R$ 3,30, até porque só faltava essa aberração para anular completamente o conceito de Bilhete Único. A compensação financeira sairá dos cofres municipais, principalmente da Secretaria de Obras comandada por Paulinho Serra sob intensa assessoria dos transportadores de gente.


 


Um grande negócio


 


Quem conhece a realidade do mercado afirma que o Bilhete Sem Volta também conhecido por Bilhete Único é um grande negócio para os empresários, porque a expectativa de aumento de passageiros não alterará praticamente em nada a planilha de custos, já que a ociosidade média dos veículos é elevada entre outros motivos porque o transporte público de Santo André é uma calamidade para quem preserva o esqueleto e a alma, além da paciência à espera dos coletivos, é claro.


 


Imagine que cada ônibus tenha pelo menos, em média, por viagem, 10 assentos vazios. Ninguém paga por assentos vazios. Agora, com o Bilhete Sem Volta, as empresas reforçarão os respectivos caixas porque há projeção de que mais gente será transportada.


 


Sei que o leitor está indócil porque quer saber de onde retirei a expressão Bilhete Sem Volta em substituição a Bilhete Único. Ora, ora, do próprio projeto porque, conforme explicou o jornal Bom Dia ABCD, tarifa com baldeação gratuita em até três ônibus para chegar ao destino num período de 90 minutos custará ao usuário R$ 3,30. O beneficio não se estenderá ao custeio da passagem de volta, para a qual o usuário deverá desembolsar outros R$ 3,30 para cada trajeto que cumprir. Até prova em contrário, a expressão Bilhete Único adotada em várias capitais para caracterizar uma modalidade de transporte que facilita a vida dos passageiros vale tanto para a ida integral como para a volta integral, completa. Se valerá, em Santo André, apenas para a ida, então é Bilhete Sem Volta, só de Ida, e estamos conversados.


 


Falta transparência


 


Segundo cálculos do secretário municipal Paulinho Serra, o benefício contemplará cerca de 300 bilhetes por mês, montante que significa 6,8% do total de 4,5 milhões de passagens vendidas a cada 30 dias. A ociosidade das concessionárias de transporte público de Santo André seria facilmente medida (e deveria constar da planilha de projeção de valores a serem transferidos para os empresários) tendo como bases de cálculos o total da frota associado ao número de poltronas disponíveis, multiplicando-se pelo número de deslocamentos. Uma fórmula simplificada, apenas indicativa de que é possível extraírem-se dados mais confiáveis e transparentes para as operações subsidiadas.


 


É claro que o secretário Paulinho Serra está cumprindo fielmente o propósito de transformar o Bilhete Sem Volta em ponta de lança de modernidade no setor de transporte público. Tanto que disse ao Diário do Grande ABC, cujo proprietário é um dos cardeais da atividade em Santo André, que, entre os principais destaques do projeto, estão a disponibilidade da localização do ônibus via Internet, por meio do site da AS Trans, e a integração com os demais modais de mobilidade. “Já servirá para adaptar com as futuras linhas 18-Bronze do Metrô e da estação Pirelli, da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos).”


 


Menos mal nestas alturas do campeonato—sempre seguindo a lógica das informações publicadas por jornais – que vereadores de Santo André estão de antenas ligadas nos desdobramentos da aplicação do Bilhete Sem Volta. Teme-se que o projeto vire bola de neve, com os custos de subsídios aumentando além da conta inicial por causa de eventual elevação do número de passageiros.


 


Não ficou claro nas reportagens qual seria o mecanismo de elevação do subsídio bruto para sustentação do sistema, mas depreende-se que o índice de 6,8% do total de bilhetes utilizados teria elasticidade que poderia agravar ainda mais a margem de manobra do orçamento geral do Município. Se os estudos iniciais subestimaram o universo de passageiros que farão três itinerários diferentes no limite de 90 minutos, a elevação do subsídio será inexorável. Há especulações que levam a R$ 2,5 milhões o potencial de repasse extra mensal aos transportadores.


 


Além do secretário Paulinho Serra também participou do encontro com os 21 vereadores o executivo da AS Trans, a agência publica municipal que supervisiona o transporte público em Santo André. Leandro Petrin também explicou que há limitações orçamentárias para que o sistema cobrisse os custos de ida e volta. Disse que o projeto é similar ao de São Bernardo, o que torna a iniciativa de Carlos Grana mais que uma réplica de Luiz Marinho, igualmente petista, mas a consagração de um engodo batismal, ou seja, Bilhete Único é uma forçada de barra da qual a mídia ainda não se deu conta ou prefere fechar olhos e ouvidos.


 


Desconfio muito da eficiência e da transparência do projeto Bilhete Sem Volta em Santo André, porque não existe mágica no gerenciamento de recursos públicos. Quando empresários do setor de transporte público e Administração Pública comemoram conjuntamente uma iniciativa que vai criar novos custos aos contribuintes, porque é do coro que sai a correia, alguma coisa não dá liga. Ainda mais quando se sabe que juntamente com o setor de lixo e da construção civil, o transporte público é uma das maiores fontes de financiamento eleitoral no Brasil.


 


Apesar do empenho de alguns vereadores, também tenho sérias dúvidas sobre a qualidade do detalhamento e de inspeção da planilha de custos que norteará ajustes dos valores a repassar aos empresários. O lobby do transporte público é poderosíssimo e não costuma dar espaço à transparência porque os contratos que mantêm com as prefeituras são espécies de vacas leiteiras.


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