Administração Pública

Caixa-preta da Fuabc vai crescer
com novo contrato de parceria

DANIEL LIMA - 04/06/2013

Anunciou-se no Diário do Grande ABC de domingo que a Fundação do ABC, uma Organização Social de Saúde mais que suspeita, vai aumentar os tentáculos que já somam orçamento de R$ 1,1 bilhão. Provavelmente a partir do ano que vem, já que amarras administrativas e burocráticas impedem a medida neste segundo semestre, a instituição comandada por Maurício Xangola Mindrisz, homem de confiança do prefeito petista Luiz Marinho, incorporará o Centro Hospitalar Municipal de Santo André no rol de clientela.

 

Trata-se de um novo grande negócio para quem conhece as estranhas da Fuabc. Negócios tão extraordinariamente rentáveis que mantêm-se fortemente protegidos por acumpliciamentos interpartidários; ou seja, as agremiações políticas que se digladiam em vários terrenos formam uma dócil irmandade na gestão da saúde de Santo André, São Bernardo e São Caetano entregues à Fuabc.

 

É claro que o Diário do Grande ABC não entrou em suposta bola dividida da gestão mais que obscura da Fundação do ABC. A publicação se limitou a noticiar a mais que provável extensão das atividades da Fuabc a novo equipamento da Prefeitura de Santo André.  É esta revista digital que faz a interpretação baseada em denúncias sobre a metodologia aplicada na condução da Fundação do ABC por Maurício Xangola Mindrisz, ex-superintendente do Semasa, autarquia da Prefeitura de Santo André que trata de água e esgoto, da qual foi afastado após ser acusado de improbidade administrativa.

 

Recentemente, em 16 de abril, o Sindserv,  Sindicato dos Funcionários  Públicos de Santo André, manifestou-se sobre a contratação de 100 trabalhadores pela Fundação do ABC para prestar serviços no CHM. “O detalhe sórdido desta contratação é que os trabalhadores da terceirizada vão receber salários superiores aos concursados! Oras, se o principal argumento dos governos para as terceirizações é a economia, como explicar que a Prefeitura possa gastar mais, tanto com salários quanto com a taxa de administração da ONG? Por que, ao invés disso, não aumentaram os salários dos servidores, tornando-os mais atrativos para a realização de um concurso público?” – indagou uma espécie de editorial de primeira página do site da entidade. Que prosseguiu:


 “Entre os pretextos utilizados pela Secretaria de Saúde, temos a questão das nomenclaturas de alguns cargos, como nos casos dos Técnicos em Enfermagem e dos Condutores de Veículos de Urgência e Emergência. Uma resolução do Coren (Conselho Regional de Enfermagem), passou a obrigar a contratação de técnicos, não mais Auxiliares de Enfermagem, como sempre ocorreu em Santo André. Daí, ao invés de enviar um projeto de lei à Câmara dos Vereadores, a Administração preferiu terceirizar o serviço! Em Diadema, a Administração atendeu à reivindicação do Sindicato dos Servidores e criou o cargo de Técnico em Enfermagem, permitindo aos antigos trabalhadores, contratados como Auxiliares, a possibilidade de adequação à nova nomenclatura, o que garantiu a valorização tanto do serviço quanto dos servidores públicos”.

 

Também recentemente o jornal Repórter Diário publicou que o Centro Hospitalar Municipal de Santo André, porta de entrada dos casos de urgência e emergência do Município, ampliará os leitos da UTI (Unidade de Terapia Intensiva) adulto. Dos 17 atuais para pacientes potencialmente graves acima de 18 anos, o espaço dobrará capacidade com a criação de 17, que totalizarão 34 leitos.  Geralmente, uma UTI abriga casos mais graves, de alta complexidade ou com necessidade de internação pós-operatória, principalmente de pacientes idosos ou vítimas de traumas. O que implica em mais tempo de recuperação no leito.  Ainda segundo o jornal, O CHM também realiza cirurgias de grande porte, especialmente em alguns casos de câncer. O que, necessariamente, implica em demanda de leitos de UTI.

O Repórter Diário lembrou também que o CHM é referência regional nas áreas médicas de ortopedia/traumatologia, neurocirurgia, cirurgia geral, oftalmologia e bucomaxilofacial. Por isso recebe grande demanda diária de vítimas de acidentes de trânsito, principalmente de motociclistas. “O envelhecimento da população é outro fator que implica no recebimento de pacientes traumatizados, com os vários tipos de fraturas ósseas, principalmente de fratura do colo de fêmur!” – explicou a publicação.

 

Suspeições e escândalos

O gerenciamento da Fuabc ao longo da história é o encadeamento de suspeições que transformam a expressão “caixa-preta” em conceituação automática.

 

Instado por CapitalSocial recentemente, Maurício Xangola Mindrisz fugiu às respostas de interesse público. Nada que surpreenda, porque a Fuabc só é uma Organização Social de Saúde do estatuto para dentro. A transparência administrativa é de fachada.  As instâncias diretivas e consultivas são um emaranhado de interesses difusos, conflitantes, mas paradoxalmente irmanados na disposição à inviolabilidade externa. Não à toa, a Fundação do ABC é considerada exemplar único de integração regional. Uma integração acomodada não no compromisso com a sociedade, mas com os interesses específicos de representantes diretos.

 

A Fundação do ABC executa o que os mais radicais intérpretes de gestões públicas chamam de privatização da saúde. Em dezembro do ano passado o programa Fantástico, da Rede Globo de Televisão, deu destaque aos movimentos de uma quadrilha que desviava dinheiro público da saúde. Duas entidades que no papel eram sem fins lucrativos foram apontadas como suspeitas de ficar com 10% dos recursos contratuais, num total de R$ 10 milhões. As organizações chamadas “Sistema Assistencial à Saúde”, SAS, e “Instituto SAS”, eram responsáveis, segundo a reportagem do Fantástico, pela gestão de hospitais em Itapetininga, São Miguel Arcanjo, Americana, Araçariguama e Vargem Grande Paulista, além do Rio de Janeiro e Araranguá, em Santa Catarina. O papel destinado àquelas duas organizações sociais era semelhante ao da Fundação do ABC: gerenciar os hospitais, prerrogativa que inclui compra de medicamentos e contratação de pessoal. As entidades fazem a gestão e o governo municipal paga a conta com dinheiro do SUS (Sistema Único de Saúde). Como a Fundação do ABC. O Ministério Público constatou, no caso dos hospitais administrados pelo SAS e Instituto SAS, que a conta apresentada às Prefeituras era maior que os valores realmente pagos.

 

Casos semelhantes espalham-se por todo o Brasil. As obscuridades da Fundação do ABC, já publicadas por CapitalSocial, são solenemente ignoradas por instâncias sociais e legais. Não há por parte de qualquer das subseções da Ordem dos Advogados do Brasil na Província do Grande ABC mobilização no sentido de exigir completa transparência da gestão de Maurício Xangola Mindrisz e também dos antecessores. Os Legislativos de Santo André, São Bernardo e São Caetano, municípios que mantêm os contratos mais volumosos de recursos de transferência da gestão administrativa e operacional da saúde pública, permanecem em silêncio. Nada que surpreenda. A maioria dos vereadores não passa de extensão dos interesses hegemônicos dos respectivos Executivos.

 

Como a Capital?

 

CapitalSocial assegura por meio de fontes que a Fundação do ABC não resistiria a uma blitz bem coordenada por instâncias que resolvam aferir para valer muitos dos trâmites administrativos compulsórios de uma Organização Social de Saúde. A constatação de irregularidades na gestão da saúde pública na cidade de São Paulo seria extensiva à Fundação do ABC. Na Capital, conforme denúncias da Folha de S. Paulo, publicadas em abril deste ano, 30% das consultas com especialistas realizadas pelas Organizações Sociais de Saúde contratadas não foram executadas. As OSs deveriam ter realizado 530.151 consultas nos Ambulatórios Especialidade e nas AMAs (Assistências Médicas Ambulatoriais) no ano passado, mas apenas 347.454 foram realizadas. Em 2011, os números registrados foram ainda mais escandalosos: 41% dos atendimentos previstos deixaram de ser efetivados.

 

A certeza de que a gestão da Fundação do ABC diz respeito aos próprios pares de administração e também aos caciques políticos que gravitam direta e indiretamente em torno da instituição transforma Mauricio Xangola Mindrisz num gerenciador do dinheiro público especial. O pretexto de que não aceita que se incorpore a seu nome um codinome que ele próprio disseminou em ambientes corporativos e políticos – Xangola – o levou oficialmente a fugir de entrevista proposta por CapitalSocial. 

 

Ardiloso, frequentador assíduo de bastidores de campanhas eleitorais, nas quais tem por missão específica sondar o ambiente social com pesquisas qualitativas e quantitativas, Maurício Xangola Mindrisz é uma das viuvinhas mais conhecidas de Celso Daniel. Integrante da turma de frente do então prefeito de Santo André, situação que o levou a relacionar-se com vários pesos pesados do Partido dos Trabalhadores na Província do Grande ABC que chegaram ao Palácio do Planalto e em instâncias federais valiosas, Maurício Xangola Mindrisz reina na Fundação do ABC. A relação de confiança com o prefeito Luiz Marinho e com a primeira dama Nilza de Oliveira o levou à administração da instituição que contrariaria os pressupostos históricos do socialismo defendido pelo Partido dos Trabalhadores, porque precarizaria o sistema de saúde tanto no atendimento como também na contratação de profissionais.

 

Em suma, a Fundação do ABC terceiriza grande parte da gestão e da operação de saúde pública de Santo André, São Bernardo e São Caetano, os principais integrantes da carteira de clientes. Os vazamentos de recursos orçamentários teriam como núcleo de possíveis denúncias públicas a chamada Central de Convênios, entregue aos domínios do ex-prefeito Maurício Soares, importantíssimo reforço que o PT seduziu para conquistar a Prefeitura de São Bernardo em 2008 e voltar a vencer no ano passado. Uma fonte de CapitalSocial assegura que a Central de Convênios não resistiria a uma investigação série e independente.

 

Entrevista Indesejada

 

CapitalSocial enviou em 1º de abril último uma bateria de perguntas a Maurício Xangola Mindrisz. A chamada “Entrevista Indesejada” foi solenemente ignorada pelo executivo público.

Eis as questões enviadas ao presidente da FUABC:

 

CapitalSocial -- Como o senhor explica a doação considerada irregular de R$ 20 milhões da Fundação do ABC à Faculdade de Medicina do ABC, em 2011, para tapar o rombo de uma instituição de ensino utilizando linha de empréstimo destinada exclusivamente à saúde?

 

Mauricio Xangola Mindrisz –

 

CapitalSocial -- A aprovação dessa doação passou pelo Conselho Curador sem qualquer tipo de restrição ou houve votação mesmo que minoritária em contrário?

 

Mauricio Xangola Mindrisz –

 

CapitalSocial -- Como o senhor avalia a informação de conselheiros que o colocam como bastante vulnerável às pressões de dirigentes da Faculdade de Medicina? Eles afirmam que foi lhe imposta resistência ao comando da FUABC, a ponto de negociarem a doação daqueles recursos como uma maneira de contornar as adversidades.

 

Maurício Xangola Mindrisz --

 

CapitalSocial -- O senhor acredita que o formato do Conselho Curador assegura legitimidade de cidadania no controle da Fundação do ABC, tendo-se em vista que mesmo conselheiros efetivos afirmam que se trata de cartas marcadas, de um jogo de encenação apenas para homologar decisões já tomadas pela presidência – como por exemplo nomeações de superintendentes e criação de cargos?

 

Maurício Xangola Mindrisz –

 

CapitalSocial -- O senhor fez alguma tentativa para incorporar ao Conselho Curador novos representantes da sociedade menos suscetíveis ao jogo de interesses políticos, partidários e administrativos dos municípios diretamente envolvidos na Fundação do ABC e das chamadas entidades mantidas?

 

Maurício Xangola Mindrisz --

 

CapitalSocial -- O senhor acredita que com eventual participação de outros municípios onde a FUABC presta serviços, como se pretende, mudará alguma situação no figurino de representatividade e efetividade do Conselho?

 

Maurício Xangola Mindrisz –

 

CapitalSocial -- O plano de São Bernardo perpetuar-se no gerenciamento da Fundação do ABC, estando na presidência ou na vice-presidência, desconsiderando, portanto, a fórmula de rodízio que prevaleceu durante anos, é uma maneira de proteger os interesses do Município ou, como alegam os oposicionistas, não passa de ação deliberadamente voltada a dar continuidade ao controle dos cordéis políticos, partidários e financeiros da instituição? 

 

Maurício Xangola Mindrisz –

 

CapitalSocial -- Como o senhor analisa a avaliação de especialistas em FUABC de que o modelo tripartite de regionalidade administrativa só segue adiante há muito tempo porque há concessões mútuas que abrem as portas a irregularidades no gerenciamento de recursos financeiros, sem contar, entre outros pontos, os mananciais de empreguismo que não resistiriam a uma vistoria pelos nomes na folha salarial? E o que dizer do corporativismo médico, cada um criando seu próprio feudo e jogo de influências, além da despreocupação com custos de serviços e de produtos, a ponto de cada mantida pagar preços e se relacionar de forma totalmente diferente com um mesmo fornecedor?

 

Maurício Xangola Mindrisz --

 

CapitalSocial -- O senhor diria sem medo de errar que há controle efetivo sobre a atuação da Central de Convênios, por onde passa a maior parte dos recursos financeiros administrados pela Fundação do ABC?

 

Maurício Xangola Mindrisz –

 

CapitalSocial -- Como o senhor interpreta a avaliação de que a Central de Convênios é um reduto fortíssimo do ex-prefeito Maurício Soares, de São Bernardo, cujo apoio à candidatura de Luiz Marinho à Prefeitura em 2008 foi decisivo à vitória? A filha do ex-prefeito seria a ponta de lança de uma operação que tem por finalidade instrumentalizar série de contrapartidas àquele apoio?

 

Mauricio Xangola Mindrisz –

 

CapitalSocial -- Os números do balanço de 2012 aprovado na reunião do Conselho Curador em fevereiro último apontam que os níveis de eficiência da FUABC baixaram profundamente desde que o senhor assumiu a presidência. O senhor assumiu com um índice de liquidez de 1,23 obtido em 2008, número que baixou drasticamente para 0,74 em dezembro último, ou seja, a FUABC não tem caixa suficiente para honrar compromissos financeiros. Os resultados estão ligados diretamente à negligência ou afrouxamento no cumprimento de compromissos das organizações contratantes dos serviços prestados pela FUABC. O senhor tem conduzido a instituição segundo princípios político-partidários em vez de estritamente administrativos ou há alguma explicação para o fato de não ter firmeza para exigir pagamentos dos prefeitos contratantes dentro dos limites de responsabilidades mútuas?

 

Mauricio Xangola Mindrisz –

 

CapitalSocial -- O senhor acredita que a Fundação do ABC resistiria a uma blitz da Promotoria de Fundações, organismo do Ministério Público que fiscaliza as atividades de instituições do gênero? As fragilidades internas de fiscalização, explicitadas nas reverências de grande parte do Conselho Curador, não seria um convite a desvios?

 

Maurício Xangola Mindrisz –

 

CapitalSocial -- O senhor acha uma boa ideia solicitar ao Ministério da Saúde, do petista Alexandre Padilha, o envio de uma força-tarefa republicana, como a que decidiu vasculhar algumas especialidades atendidas pela previdência complementar, de planos de saúde, para passar a Fundação do ABC a limpo em todos os setores e atividades e, dessa forma, eliminar todos os focos que estariam comprometendo os indicadores de eficiência no atendimento social, que é a síntese de sua atuação?

 

Maurício Xangola Mindrisz –

 

CapitalSocial -- Há um movimento de representantes dos Legislativos da região que visa, entre outros pontos, tornar as obscuras entranhas da Fundação do ABC objeto de transparência pública. Como o senhor interpreta essa iniciativa?

 

Maurício Xangola Mindrisz -- 



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