Administração Pública

Novo ataque à mobilidade urbana
em São Bernardo. E ainda festejam

DANIEL LIMA - 08/07/2013

Anunciou-se com pompa e circunstância investimento de R$ 250 milhões da Setin Empreendimentos Imobiliários em São Bernardo. O grupo empresarial da Capital teve aprovado e começa a construir no começo do ano que vem um megacomplexo de hotéis, salas comerciais e apartamentos onde o Shopping Metrópole reservava parte do estacionamento à clientela. Mais da metade da atual capacidade hoteleira de São Bernardo chegará de uma só vez. Tudo muito certo e maravilhoso, desde que o prefeito Luiz Marinho não atirasse às feras do oportunismo a preocupação com a mobilidade urbana que tanto desfralda nas entrevistas.


 


O investimento vai ocupar o entorno próximo do Paço Municipal e causará novos impactos viários. Ali parece haver uma riqueza estonteante já que todos os grandes negócios são dirigidos àquele espaço. O empreendimento só não embananará de vez aquela área porque o Domo, lançado festivamente faz tempo e que reúne centenas de apartamentos e salas comerciais, deu como os burros nágua. É um tremendo mico. Mas um dia, como se sabe, mesmo que esse dia demore, vai estar totalmente ocupado. Para tanto, não têm faltado feirões que reduzem o metro quadrado a níveis que impactam empreendimentos semelhantes. É um processo de readequação à realidade regional.


 


O que mais me deixa encafifado porque não sei se é algo proposital ou tudo faz parte do mesmo enredo de ingênua ausência crítica da mídia é que o lançamento do empreendimento da Setin tenha obtido apenas aplausos. A generosidade da administração petista de Luiz Marinho mesmo nestes tempos de manifestações nas ruas e também nas proximidades do Paço Municipal do ex-sindicalista é esfuziante. Como pode mudar tanto um socialista enraivecido com o capital, como Marinho sempre foi, e cair tão efusivamente nas graças do capitalismo?


 


É claro que não estou a sugerir e jamais o faria que o prefeito de São Bernardo devesse manter o osso das propostas oníricas dos tempos de socialismo e tratasse a pontapés os empreendedores decididos a fazer de São Bernardo âncora de investimentos. Seria estultice. Mas daí a jogar-se nos lençóis capitalistas de forma tão seletiva vai enorme distância.


 


Cadê as contrapartidas?


 


Tudo parece ter sido publicado, mas nada se projetou em forma de contrapartidas por conta de impactos urbanos deletérios que empreendimentos de monta provocam no uso e ocupação do solo. Sobretudo no entorno do Paço Municipal, coalhadíssimo de torres residenciais e comerciais.


 


O prefeito de São Bernardo não só esqueceu olimpicamente o assunto que mereceria capítulo especial na aprovação do projeto como também teve momento de grandiloquência crônica ao afirmar, como afirmou, o seguinte, ao jornal ABCD Maior de 25 de junho:


 


 Este novo complexo dialoga com o modelo de cidade que preparamos para o futuro. Hoje temos uma alta demanda por acomodações e que são exportadas para município vizinho e para a Capital. Precisamos concentrar os empregos e os negócios em São Bernardo” – afirmou o prefeito.


 


Em seguida, Antônio Setin, presidente do grupo empresarial, não poupou elogios ao prefeito:


 


 ”Não houve nenhum tipo de incentivo fiscal para a nossa instalação na cidade. Apenas contamos com a agilidade na aprovação do projeto e na concessão do alvará. Esta carta representa apenas que o prefeito vê com bons olhos o modelo de empreendimento que iremos construir”, afirmou Setin.


 


Poderia dizer que a mesma agilidade vista na aprovação do projeto da Setin deveria ter sido seguida anteriormente, quando da contestação da fraude instalada durante o leilão da área pública que o Grupo MBigucci arrematou em julho de 2008 em São Bernardo, durante a Administração Willian Dib. Uma fraude mais que comprovada, inclusive com documentos que fazem parte do acervo da Prefeitura, mas que o prefeito Luiz Marinho preferiu ignorar, mesmo alertado pelo então Procurador-Geral do Município, hoje secretário de Finanças de Mauá.


 


Mas como esse é outro assunto, insisto na imperiosidade de contrapartidas para valer na ocupação daquela área privilegiada que, antes que se transformasse em preparação a um complexo de 472 novos quartos da rede hoteleira, além de salas comerciais e apartamentos residenciais, estava reservada à extensão da Avenida Aldino Pinotti.


 


Encalacramento total


 


Quem conhece o sistema viário em São Bernardo e tem o cotidiano submetido a utilizá-lo sabe o quanto de gravidade a questão da mobilidade urbana atinge. A concentração de empreendimentos ao longo de ruas e avenidas próximas das áreas mais valorizadas repete velha e surrada ação extrativista do mercado imobiliário, seguida de incalculáveis prejuízos à sociedade em forma de congestionamentos e esgotamento da infraestrutura de serviços públicos. Como estragos poucos é bobagem, em seguida afloram demandas por reforço do sistema de transporte público, cujos custos sobrecarregam ainda mais o bolso, principalmente da classe média tradicional, em forma de impostos. Tudo isso sem contar os desperdícios de queima de combustíveis em congestionamentos quilométricos naquela área e mais adiante também.


 


Por essas e por outras, quando se debate a questão da mobilidade urbana, é indispensável repensar o modelo de ocupação territorial, principalmente as restrições à chamada verticalização. Não adianta o prefeito Luiz Marinho, também presidente do Clube dos Prefeitos, ocupar páginas e páginas de jornais para desfilar inquietação com o estrangulamento viário e os desperdícios logísticos da região se, paralelamente aos planos de investimentos em transporte coletivo, não se fecharem as portas a insanidades como essa, de torres comerciais e residenciais bem no epicentro de um vulcão de improdutividades logístico-econômicas.


 


As autoridades públicas enxotadas nas manifestações de ruas, à direita e à esquerda do espectro político-ideológico, não se aperceberam, ainda, que há novas demandas éticas a observarem. Recepcionar novos investimentos em São Bernardo, depois de 40 anos de total desprezo da atividade hoteleira, como bem frisou o dirigente da Setin, seria uma notícia integralmente festiva se não comportasse completa omissão a compensações à cidade detentora do pior sistema viário da Província do Grande ABC. Situação que deveria merecer planejamento estratégico que ultrapasse os limites dos interesses de momento ou da próxima eleição.


 


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E ninguém fala sobre a origem do nó logístico, o abuso imobiliário


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